A Fórmula do Amor escrita por Gabriel Campos


Capítulo 4
Perdição


Notas iniciais do capítulo

Recomendo ouvir "About a girl" do Nirvana
https://www.youtube.com/watch?v=nEJy3RqvT3Q

e "Under the Bridge" do Red Hot Chili Peppers (é minha banda favorita)
https://www.youtube.com/watch?v=O9TunCtR3dQ



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Diário do Berg

Depois do tal primeiro beijo a melação aumentou mais ainda. Como eu já disse antes, até que eu estava gostando da Madalena.

Nosso namoro foi ficando cada vez mais sério, mas em um estilo comportado e respeitador. Ela me levou até pra conhecer os pais dela, gente boa, aliás. A mãe dela ficou tão feliz que não desmanchava o sorriso do rosto. E eu fingindo que estava gostando, na verdade estava morrendo de vergonha e medo. O pai dela parecia ter uns dois metros de altura, gordo e peludo... Meu irmão, só de imaginar já dá um frio na barriga. Eu olhava pra ele e imaginava um pitbull espumando pela boca de raiva. Ave Maria, cruz credo!

— Quais são suas intenções com a minha filha? — perguntou o pai dela, em um momento que estávamos a sós (Madalena estava na cozinha fazendo o jantar com a mãe dela).

— As melhores, senhor.

— Vejo que você é um bom rapaz.

Depois das duas tapinhas que o pai da Madalena dera no meu ombro, percebi que ele era mansinho.

O jantar foi um manjar: lasanha (meu prato preferido) e um suco de uma fruta que eu não sabia qual era.

— É sapoti. — explicou.

Só sei que ela tinha ótimos dotes culinários e eu devorei tudo como se tivesse vindo da seca antes daquele jantar.

O nosso namoro estava sério, bem sério. Madalena tinha sede de beijo. Meus beiços já estavam dormentes, aliás.

Ciumenta que só ela, eu não podia olhar para os lados que a Madalena achava que eu estava traindo ela só com os olhos. Beleza, mas daí depois ela querer ficar grudada em mim quase vinte e quatro horas por dia era demais. Ave Maria, cruz credo!Nosso namoro ficou assim desse jeito durante um mês e depois a coisa começou a dar treta. Treta pura.

Sometimes I feel like I don’t have a partner
Sometimes I feel like my only friend….

Era época de interclasse na escola. Alguns colocavam até boas músicas em seus Mp4’s (como essa citada acima) quando não era a “Dança do Créu”, funk do momento. Todos estavam felizes, pois para uns era o período mais esperado do ano. Havia jogos de futsal feminino e masculino, e carimba (queimada) feminino. A quadra onde aconteciam os jogos ficava do lado de fora, ou seja, na pracinha.

Aquele dia era de futsal feminino, e Madalena iria jogar. Eu fiquei assistindo tudo pela grade que cercava a quadra. Antes do jogo ela soltou um beijinho pra mim e soprou. Eu fingir pegar o beijo imaginário e guardar no bolso.

Desculpem-me os termos, mas Madalena não jogava porra nenhuma. Não sou nenhum expert em futebol, mas gostava até de assistir – apenas de assistir (espero que ninguém deixe de ler, mas torço pro meu timão...).

Voltando ao fio da meada, enquanto eu assistia ao jogo (que mais parecia uma luta livre, pois Madalena praticamente quebrou as canelas de todas as jogadoras) fiquei muito distraído e não estava esperando que alguém esbarrasse em mim com uma bicicleta.

Eu lembro muito bem de como era aquela deusa dos jogos RPG naquela época. Fiquei boquiaberto vendo a pobre garota no chão tentando se recompor. Até que voltei para o meu mundo e ofereci minha mão para ela se levantar.

— Obrigada. Me desculpa, minha bike ta sem freio.

— Que nada, a culpa foi minha. Tava distraído no meio da praça. Sou lesado mesmo.

— De boa. É uma pena, minha camisa rasgou aqui atrás com a queda. — era uma camisa do Nirvana. — Era a minha única e preferida.

— Se tiver algo que eu possa fazer...

— Deixa. Eu compro outra. Já tava na hora mesmo...

Ela pegou a bike e saiu pedalando. Os negros e curtos cabelos de Valentina (depois eu fiquei sabendo do nome dela) voavam contra o vento na mesma velocidade em que ela pedalava sem controle.

Depois de ter reparado que ela estudava no mesmo colégio que o meu, e no mesmo turno, fiz um verdadeiro dossiê do amor (pode rir, é brega mesmo) de Valentina. Descobri que ela fazia o 6º ano, tinha doze anos e curtia rock clássico. Descobri também que ela morava no Bom Jardim II, ou seja, a parte punk do meu bairro. Nesse meio tempo, Madalena mostrava-se uma namorada chata e eu desejava cada vez mais conhecer melhor a Valentina.

Nos intervalos das aulas eu ficava sentado olhando pra ela, enquanto a Madalena ficava com a cabeça pousada no meu ombro. Mal imaginava ela que eu estava pensando em outra.

Meus sonhos depois daquele dia não eram mais com faíscas saindo entre os beijos entre mim e minha namorada por causa dos aparelhos ortodônticos, e sim a Valentina vestida de heroína (Aeon Flux, para ser mais exato) me salvando dos valentões do colégio.

***

— Valentina, meu amor! Sem você não viverei.

Eu a puxei e dei um baita de um beijo naquela boca dela. Valentina, depois de um profundo suspiro respondeu:

— Então Berg, não me deixe sozinha...

De repente, o rosto de Valentina foi tomando o rosto de Madalena. Era eu abrindo os olhos aos poucos e acordando daquele sonho pra viver um pesadelo.

— Berg, acorda! — minha mãe interrompeu meu sonho.

— Ave Maria, cruz credo, mãe! Não se pode dormir em paz? Hoje é sábado, pô. E são seis da manhã!

— Tua namorada ta aí na sala. Ela é um amor de pessoa.

Desculpem-me os termos novamente, ma porra! Em quase dois meses de namoro, eu nunca tinha dito nem a minha irmã Andreza, a quem eu contava tudo, que eu estava vivendo um relacionamento sério.

Cheguei à sala. Minhas irmãs mais novas, Lina e Lana, cantarolavam coisas de irmãs:

— O Berg ta namorando, o Berg ta namorando...

Esfreguei as mãos nos olhos para ver melhor e acreditar no que estava acontecendo: Dona Hilda, Andreza e Madalena de altos papos e sentadas no sofá e falando de mim. Cara, aquilo foi o cúmulo dos cúmulos. Madalena ao me ver, correu, me abraçou e me cobriu de beijos.

— Amor! Que saudades!

— A gente se viu ontem! — respondi, sério.

— Bobinho... Estávamos vendo umas fotos suas de quando bebê. Como você era lindo! Dava vontade de apertar suas bochechas gordinhas. — ela disse aquilo com uma voz enjoada, como se estivesse falando com um bebê.

— Tenho que concordar com você cunhada, mas hoje em dia, a coisa é diferente. — brincou minha irmã.

— Cala a boca, Andreza.

— Ele continua lindo, ta cunhada? Então, Berguinho, vamos?

— Pra onde? — perguntei.

— Ora, à praia! Não lembra que a gente combinou ontem?

Velho, eu tinha esquecido geral. Mas também, tudo o que ela falava eu apenas concordava sacudindo a cabeça!

A sogrinha da Madalena acabou me convencendo a ir à praia. Tocava uma música inesquecível, na voz de uma cantora carioca ou baiana, sei lá. Só sei que era a versão de uma música do Led Zepellin (que por acaso, Valentina deveria adorar), mas era mais puxada pro axé. Dizia:

Oh, oh, oh, oh, oh, you don’t have to go…

Paguei mico, claro. Madalena tirou sua canga e ficou de maiô. Eu fingi não estar com ela quando do nada ela começou a fazer inexplicáveis polichinelos na areia da praia.

— Me acompanha amor!

Confesso que me deu uma diabólica vontade de jogar terra no olho daquela infeliz. Ela parou de fazer a ginástica vergonhosa dela e fez uma pergunta cuja resposta mudaria minha vida:

— Não está gostando do passeio, amorzinho?

— Madá, eu queria te falar uma coisa.

Ela desfez o sorriso e sentou na areia, ao meu lado. A vista era linda, pois estávamos de frente para o mar.

Será que eu deveria abrir o jogo com ela e dizer que eu não tava mais a fim? Por mais que ela fosse chata, não era justo o que eu estava fazendo com a Madalena.

— Pode dizer meu amor.

Provei do beijo dela de novo. Aquele beijo tinha um gosto de última vez.

— Eu... Eu...

— Desembucha Berg!

Eu não sabia como dizer, afinal nunca terminei um namoro! Resolvi ser um pouco sincero:

— Eu to gostando de outra, é isso.

Madalena não disse mais nada. Olhou para o meu rosto, eu acho, não sei bem ao certo porque eu estava com a cabeça abaixada de tanto medo. Saiu correndo me deixando sozinho naquela praia. E de boa, pensei que ela iria fazer o maior escândalo, mas eu nem imaginava o quanto fria e calculista ela era.


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Notas finais do capítulo

E agora, Berg?