Até o fim escrita por Isabella Cullen


Capítulo 19
O homem




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Uma mulher nova se aproximou dele calmamente e falou em inglês depois de algumas horas de espera.

– Você fala inglês? – Edward se assustou com a moça do seu lado, fez um sim com a cabeça. - Fui designada para ser sua tradutora, o médico quer falar com você. Acompanhe-me, por favor.

Eles foram andando por um corredor até entrar numa sala no final do corredor. Ela bateu na porta e entrou. O médico fez um sinal para ele se sentar. A tradutora foi logo fazendo o seu trabalho quando o médico começou a falar rapidamente.

– O estado dela é muito delicado, ela está desnutrida e muito fraca. Precisamos reanimá-la e ela está com dificuldades para respirar. Estabilizamos e a demos uns sedativos para ela não se agitar e descansar um pouco. Ela só deverá acordar amanhã então não precisa ficar aqui, mas ela já está sendo monitorada num quarto se você quiser vê-la.

– Fale para ele que eu quero ficar. – ela traduziu imediatamente e ouviu a resposta do médico.

– Ela não vai acordar, mas você pode ficar com ela. Ela é sua esposa?

Edward parou uns instantes e pensou. Pensou na palavra “esposa”. Eles aguardavam respostas e a tradutora repetiu a pergunta.

– Ela é uma conhecida, nos encontramos no aeroporto. Gostaria muito de ficar aqui e acompanhar.

O médico fez um sinal que sim e ele agradeceu os esforços de toda a equipe e a tradutora o acompanhou até o quarto que ficava no segundo andar. Ele não sabia direito como ela tinha parado ali, mas quando a olhou magra, o rosto pálido e os tubos ficou pensando sobre o estado dela. Teve certeza que ela não estava de férias ali, alguém a salvou do suicídio e a guardou naquele país. Ela não tinha documentos na mão e não sabia como seria dali por diante, ele se sentou num sofá na frente da cama e ficou ouvindo o som do monitor. A tradutora ainda ali com ele. Ela se sentou numa cadeira perto da janela e ficou distraída com o movimento da rua. Depois de uns minutos de calmaria a porta se abriu e uma chinesa baixinha e velha entrou calmamente pela porta. Ela nem olhou para Edward ou a tradutora, apressou o passo quando viu Isabella ali inconsciente e fez um leva carinho nos seus cabelos. Ela falou com a tradutora algo que ele não entendeu e a tradutora olhou para ele algumas vezes.

– Ela está perguntando qual seu nome.

– Edward. – ele disse olhando para a senhora.

Ela se aproximou de Edward e disse o nome.

– Xiaoli.

– O nome dela. – ela falou algo e ele olhou diretamente para a tradutora. – ela perguntou se você a conhece de muito tempo?

– Muitos anos atrás, antes dela vir para cá. O que aconteceu com ela? Por que ela está assim?

Quando a tradutora terminou de falar ela olhou para Isabella com um olhar de compaixão e sentou-se ao lado dele. Começou a falar olhando diretamente para os olhos de Edward e a tradutora ouvia atentamente cada detalhe.

– Ela disse que há muitos anos um homem chegou e perguntou se poderíamos cuidar de uma moça que talvez precisasse de abrigo por uns anos. Ele nos garantiu que ela não nos daria nenhum trabalho com relação a dinheiro, ele mesmo nos garantiria que isso não iria faltar, mas que ela precisaria de cuidados especiais, pois ela tinha perdido a família e estava num estado muito ruim. No início não queríamos nos comprometer, mas ele disse que ela estava correndo um perigo muito grande e precisaria usar nossa casa como abrigo. Meu marido perguntou como dois velhos poderiam fazer bem a uma jovem cheia de vida num lugar tão isolado como Yunnan. – Nesse momento a tradutora pediu que ela parasse e explicou a Edward que era uma província muito distante do centro e que só haviam alguns agricultores morando lá. Ela fez um sinal para Xiaoli continuar. – Ele nos respondeu que poderíamos ajudar a acolhendo. Naquela hora senti que deveria tê-la conosco, tinha certeza que tê-la era algo que deveríamos fazer. Uns meses depois ela chegou carregada nos braços desse homem, parecia morta. Sua aparência era muito bonita, seus cabelos e seu perfume inundaram minha casa e fiquei feliz por tê-la ali. O homem me garantiu que apesar da aparência ela iria acordar e depois de umas horas ela abriu os olhos. Assustada e com muito medo falou coisas que não entendíamos e ficamos preocupados, entregamos a carta nas mãos dela e ela chorou, chorou até perder as forças. Depois de uns dias quase em estado de choque ela se fechou, não ouvimos mais sua voz. Foram anos em silêncio e sem sair de casa direito, era uma luta fazê-la ir tomar um sol na frente de casa. Tudo que a rodeava a afetava de uma forma estranha, nada a deixa feliz apesar de nossos esforços, ela estava ali de corpo, mas sua alma não. Foi difícil ver uma jovem tão bonita se deteriorar dessa maneira. Uma vez nossos netos foram nos visitar e ela piorou o som das crianças a machucava de uma forma indescritível e nós nunca mais os recebemos com medo dela não aguentar. Todo mês uma carta chegava com notícias desse homem, ele dava instruções sobre comunicação e alguma ajuda. Mandávamos cartas semanais para ele e isso sem deixarmos ela saber, não que esconder algo dela fosse complicado, na maior parte do dia não parecia que ela estava ali. Comer era um sacrifício muito grande, ela quase não comia e o fazia quando depois de horas percebíamos que não tinha almoçado ou até jantado. De início pensamos que ela não gostava da comida ou da forma como preparávamos, mas depois não adiantava nada que fazíamos ela não queria comer. Uma tristeza sem igual batia nela alguns dias e nesses dias era difícil fazê-la andar pela casa. Fomos instruídos a fazer o possível para distraí-la, mas não tínhamos muito que fazer. Ela não queria fazer nada. Quando escrevemos da dificuldade distraí-la chegou uns dias depois uma mala muito grande para ela era um monte de coisas para ela pintar. Ficamos animados em saber do talento dela, mas ela só chorou quando abriu e viu os pincéis e as tintas. Foi difícil, mas ela um dia pegou na mala e começou a pintar. Coisas escuras, coisas sem sentido e tudo que havia nela ficava no papel. Um dia, muitos anos depois ela desenhou seu rosto, ela sabia com exatidão cada detalhe e chorou olhando aquilo por dias. Os anos se passaram sem muitas mudanças, ela pintava, desfazia as pinturas, não falava e mal comia. Uma vez ou outra a pegávamos fugindo para ver o pôr-do-sol e fechando os olhos, mas era raro. Mais raro ainda era um sorriso, só conseguimos isso nos últimos meses. Ela estava sentada e uma criança correu para dar um abraço nela, era o filho de uma vizinha. Magra e sem forças, sabíamos que uma hora ela iria morrer, mas o homem nos dizia para aguentar mais um pouco. Na última carta ele enviou alguns recortes de jornais e eu deixei em cima da mesa, estavam em outra língua, só vi a foto com seu rosto e outra de um homem. Quando ia guardar ela chegou na cozinha, os olhos dela se arregalaram e leu aquilo como se fosse as notícias mais importantes do mundo. Numa reação inesperada ela começou a arrumar as coisas, não sabia para onde ela estava indo nem se deveria impedir. Fiquei confusa com aquilo. Ela falou a primeira coisa em anos, nos comunicamos através de desenhos e gestos. Foi a coisa mais maluca que já vive. Uma força brotou do seu interior e isso a impulsionava para fora da casa queria sair, estava com pressa, uma urgência frenética. Tentei mostrar a ela que ela não aguentaria a viagem, que estava fraca. Nos últimos meses ela desmaiava a toa, ficava doente com muita facilidade e os médicos não davam muito tempo se ela continuasse nesse ritmo. Ela parecia não se importar com nada, ansiava por outra vida. Parecia mais doente e pálida a cada mês apesar dos esforços. Pintava muito pouco e não conseguia se sentar direito sem querer deitar logo depois. Quando leu aquilo ela ressuscitou, todas as forças foram para sair de casa, eu e meu marido tentamos acompanhar ela. A viagem foi difícil e nós sabíamos que estávamos fazendo algo errado levando ela para o aeroporto, mas queríamos ganhar tempo, acalmar ela para ver se ela voltava para casa. Quando voltamos ela não estava mais lá, os documentos estavam conosco ela não poderia ir longe. Um segurança disse que ela saiu com um rapaz meio apressada, começamos a perguntar para os taxistas e eles disseram que um levou vocês para um hotel não longe e ao chegarmos lá nos avisaram que ela tinha passado mal e viemos para cá.

Edward ficou atordoado com aquilo, pediu desculpas e saiu do quarto. Precisava de ar fresco para absorver as novas informações. Pensou durante horas antes de chegar a qualquer conclusão, muitas coisas ainda não entendiam, queria desesperadamente que ela acordasse poder ouvir sua voz, tocar nos seus cabelos, saber de sua dor. Uma conversa mais calma devido a sua saúde ou talvez conversa nenhuma. “Como não vi?” Ele se perguntava como não havia percebido seu estado frágil e reviu o modo como a tratou, a raiva o cegou completamente.

Porém, sabia que ela estava ela viva, mas morrendo. Sofrera tanto quanto ele, mas perdeu a vontade de viver. Isso o atordoou até um pensamento que cortou aquilo tudo, ele voltou para o quarto em que Isabella estava com Xiaoli. A tradutora estava mais perto de Isabella e Xiaoli estava no sofá sentada olhando para o marido. Um homem baixo, também um pouco velho, talvez mais novo que a esposa. Ele olhou arregalado para Edward, sabia que era o homem da pintura, mas duvidara que ele estivesse vivo. A tradutora começou a falar assim que o homem, ainda em choque, começou com as primeiras palavras.

– Meu nome é Ho, tomei conta dela esses anos.

– Edward. – ele disse olhando para os olhos dele. – Quero saber quem é o homem que a trouxe. Vocês o conhecem? – Depois de uma rápida tradução ele respondeu gesticulando para todos os lados. Edward ficou confuso e olhou para a tradutora que tentava explicar que ele precisa ser mais devagar com a explicação. Ele ficou ansioso, tinha chegado num ponto importante.

– Ele disse que nunca o viu antes daquela primeira visita antes dela chegar. Mas que ele tinha dado instruções de mantê-la aqui, sem contato nenhum com ninguém. O que não era tão difícil já que ela não saia de casa. Depois ele falou um endereço para nos correspondermos, pediu cartas semanais e caso precisássemos de dinheiro era só pedir. Ela não dava despesas, nunca pediu nada e tudo chegava pelo correio. Não sei como ele fazia isso, mas ele mandava coisa raras por lá e dinheiro, sempre mandava dinheiro. Foram anos e anos sem vê-lo, não lembro exatamente da sua aparência. Era magro, alto e falava muito bem nossa língua. – Edward percebeu que o homem não era mais que um mero mensageiro. Isso não deu muitas dicas de quem o mandou. Isabella tinha amigos com recursos quase ilimitados, poderia ser qualquer amigo ou pai de algum amigo. – Mas ele deu um número para nos contatar se algo acontecesse, ele está vindo para cá.

– Como... – Ele iria conhecer o bem-feitor. – Como você... quando...

A tradutora traduziu e Ho voltou a falar.

– Ele disse para nunca ligarmos, mas entendia que tinham coisas que precisariam da presença dele, como na vez que ela ficou doente. Ele mandou alguém para cobrir as despesas e ajeitar a papelada, ela não era nascida aqui. Esconder era fácil, conseguir tratamento era outra coisa, ela não tinha documentação nenhuma até aquele dia. Ele chegou com certidões de nascimento, vários papéis que o governo nos manda ter e um monte de histórias que devíamos manter até ela sair do hospital. Precisei recontar algumas hoje.

– Ele está vindo aqui ou vai mandar alguém? – Ele disse nervoso.

– Acho que dessa vez ele mesmo vem, foi o que me disseram no telefone.

– Quando ele chega? – Isso foi quase um grito e a tradutora o mandou falar baixo ou expulsariam todos dali.

– Amanhã pela manhã, foi só o que me disseram.

Edward ficou impaciente de novo, andou pelo quarto tentando se acalmar, olhou para Isabella desacordada ainda cheia de tubos e respirou fundo. De repente tudo tinha mudado, rápido demais para ele conseguir acompanhar. O que seria dele agora? O que seria dela agora? O que ele deveria fazer em seguida? Mas uma coisa era certa para ele, nunca mais iria perder ela de vista.


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