Jonas teve alta naquele início de noite. Recebeu ordens expressas para repousar, os exames indicaram um agravo na doença. A Família Marra não era mais a mesma. Naquela noite, Megan apenas fechou sua porta e se encolheu na cama como se fosse uma menininha com medo.

Seus pais não eram mais nem a sombra do casal que um dia foram. Toda aquela agitação de antes, o típico: "Champanhe para quem tem sede" de Dorothy nunca mais fora ouvido, os beijos ardentes de Marra Woman e Marra Man eram agora beijos rápidos e frios que demonstravam ressentimento de Pamela e a distância de Jonas, a sensação de que todos naquela casa pareciam estar sempre embalados ao som de California Dreamin se perdera.

De bom, o Brasil só dera Davi para a garota. Mas naquela noite, Megan precisava ficar só. A conversa que teve com o pai envolveu lágrimas de emoção quando ela lhe "ordenou" que ele não morresse, recebeu um "Não pretendo, peanuts!". O que veio em seguida foi um abraço que ela agora tentava simular sozinha com os próprios braços, como se precisasse do aconchego dele ali.

Megan sabia que Jonas tinha um passado sombrio. Soube disso porque lhe disse, baixo em determinado momento da conversa: "Eu não tenho medo do futuro, mas meu passado ainda me atormenta. Como aqueles pesadelos que você têm várias vezes, exatamente iguais." Aquela conversa tinha sido tão intensa, mas tão diferente de todas as que já tiveram. Pamela quase não falou, mas seus olhos estavam tomados pelas lágrimas. Amava o marido, mas o fantasma da desconfiança rondava sua mente, assim como a de Megan.

Na Gambiarra, Davi perdera o sono. Nunca em sua vida imaginou que estaria tão ligado à Família Marra. Que se apaixonaria por Megan, que se preocuparia com o futuro daquela empresa. Sim, porque a situação não era das melhores. As ações caíram drasticamente após o escândalo. Milagrosamente, Jonas não tocou nesse assunto quando conversaram. Sua preocupação estava na filha, o que de certa forma, deixava Davi feliz.

Como Herval era um dos motivos da sua insônia, decidiu ir até a Plugar. Ele devia estar acordado a essa hora. Sempre estava.

O homem o avistou na porta de sua sala.

–Davi? -Ele o viu e rapidamente saiu do computador. - Nossa, quanto tempo que você não vem aqui pra gente conversar. Aconteceu alguma coisa? -Disse batendo no ombro dele e trazendo para dentro da sala, educadamente.

–Não, tudo bem. Só insônia mesmo.

–Entendo. Cê vai enfrentar uma barra hein? -Disse após sentar em sua cadeira. -Com aquela empresa indo pro buraco, acho que nem Jonas Marra dá jeito. -Disse cheio de deboche, e um sorrisinho de lado.

–Tá feliz, Herval? -Davi disse como que brincando, para ver a reação do amigo.

–Não diria isso. Mas eu sempre soube que isso ia acontecer um dia. Como está a Megan?

Davi suspirou.

–Megan... Ela não me pareceu bem no telefone. Tá confusa, triste. Uma barra! Tô achando que é melhor pra ela passar uns dias em casa, se entender com o pai, o que acha? -Davi resolveu testá-lo. Tinha que formar uma opinião antes de tomar qualquer decisão.

–Sinceramente? Vai ser bom pra ela continuar aqui, fazendo o que gosta, a polícia vai passar a frequentar a mansão, ela pode acabar ouvindo coisa que não deve.

–Não sei, o Jonas tava bem preocupado com ela.

–Ah não Davi! Não tô acreditando que você tá pensando nesse cara depois de tudo que ele fez.

–O que ele fez, Herval? Sério, me fala, porque por incrível que pareça, eu ainda posso confiar em você.

Herval encarou Davi e se levantou, começou a mexer alguns livros na prateleira enquanto disse:

–Não sabia que tinha deixado de confiar...

–Eu não sei de mais nada! -O rapaz tapou o rosto com as mãos. - Minha vida era tão mais fácil antes desse concurso!

–E porque você não se afasta disso tudo? Sei lá, pede demissão, para de ajudar esse cara!

–Nem se eu quisesse! Eu tenho a Megan, ela me liga ao Jonas.

–Você vai ver que ela vai acabar voltando com a mãe pra California e vai te esquecer!

Davi ergueu os olhos e se levantou alterado.

–Tá maluco? O que a gente tem não é uma coisa que se acaba assim de uma hora pra outra. Já ouviu falar em amor?

O homem deu uma risada.

–Amor? Davi, olha pra você, olha pra ela! A garota é gente fina, mas é mimada e imatura. Quando ela cansar de brincar, vai te descartar que nem... -Herval foi interrompido por um soco do jovem. Foi sem pensar, mas ele não se arrependeu.

Herval olhou entre os dedos o sangue que escorria do nariz, mas não disse nada.

–Eu sempre te respeitei, como se você fosse um pai pra mim. Mas você tá muito doente, cara! -Cuspiu essas palavras sobre aquele que um dia foi seu maior exemplo. E hoje era um desconhecido. Um homem estranho que mudava de personalidade o tempo todo. Então ele saiu dali, transtornado. Enquanto isso, deixou Herval pensando alto:

–Desconfiando de mim, Davi? Que decepção...

*** *** ***

Na manhã seguinte, mais uma matéria, em outro site. Inúmeras acusações. O que significava mais, problemas, mais depoimentos e mais perturbação para Megan, que era com quem Davi mais se preocupava. Ele leu cedo de manhã e seguiu para a Marra. Tinha muito trabalho acumulado e, sem Jonas. Porém teve uma surpresa. O empresário foi trabalhar, os dois chegaram juntos.

–Achei que tivesse que ficar de repouso. –Davi disse enquanto seguiam o rumo para suas salas.

–Não dá pra repousar com a empresa nessa situação, Davi. E mais tarde, reunião com os acionistas. Quero você lá e... traga seu projeto Júnior. –Davi parou de andar e Jonas fez o mesmo.

–Sério? Achei que tivesse que apresentar na Califórnia.

–Eu sei. Mudança de planos. –Assim ele entrou em sua sala e Davi sorriu. Só esperava que Jonas não mudasse uma vírgula do projeto original.

*** *** ***

–Você enlouqueceu, Jonas Marra? Sim, porque na atual situação da empresa, produzir algo que não vai render grandes lucros só pode ser loucura!

–Senhores, quando foi que eu decepcionei vocês? A Marra está precisando de um projeto como esse, que mude o nosso perfil, que inove. Vocês não queriam uma cabeça jovem à frente da empresa? Pois está na hora de termos novas idéias. Eu também tive que engolir meu orgulho pra estar aqui convencendo a todos vocês, o que nem precisava, já que ele tem meu apoio, de Pamela e Megan.

Nesse momento Davi sorriu, aquilo era bom demais pra ser verdade.

Mais tarde, na sala de Jonas, os dois conversavam.

–O que houve, Jonas? Quero dizer, tudo bem, você já tinha concordado em produzir o Júnior mas... por quê agora?

–Foi exatamento o que eu disse na sala de reunião. Eu percebi que se a Marra tá precisando inovar, eu preciso arriscar. O tempo tá acabando, eu tô morrendo.-Jonas não era do tipo que se fazia de vítima, estava sendo sincero. -Mas eu preciso saber se você tá disposto a colocar o Júnior em jogo num momento tão complicado.

Davi analisou a expressão de Jonas por alguns instantes, antes de falar:

–Estamos juntos nessa, Jonas. Eu vou até o fim. Vamos salvar a Marra! -Sorriu e apertou a mão do empresário. Pela primeira vez, os dois trocaram um olhar de parceria.

À noite, Davi tinha acabado de sair do banho. Os cabelos molhados e vestia apenas um shorte que usava como pijama. Ele esperava uma pizza, que comeria sozinho. Pelo menos ele achava. Assim que pagou o entregador, uma certa loira apareceu por detrás do homem que saiu em seguida. Megan deu um meio sorriso e entrou. Abraçou Davi bem forte. Ele estava quentinho e com um irresistível cheiro de uma fragrância masculina que ele usava após o banho. Aquele abraço, melhor lugar do mundo. Dava a sensação de conforto e proteção. Ambos estavam com saudade, um dia inteiro sem se verem. Megan o olhou e começou a falar:

–Você viu que saiu outra... -Mas foi impedida de continuar quando ele a puxou de volta e selou seus lábios. Davi sempre era movido por impulso. Já perdera as contas de quantas vezes tinha calado Megan com beijos, e isso aconteceu até quando não eram namorados e fingiam não sentir nada um pelo outro. Claro que ela não se importou, colocou os braços atrás do pescoço e a mão direita entre o cabelo úmido. Ele parou o beijo e disse baixo:

–Não fala no Jonas, na Marra, nem em nada mais nesse mundo. Pra quê falar agora? -Ela sorriu e falou em seu ouvido:

–Só a linguagem do corpo?

Foi a vez dele rir.

–Só a linguagem do corpo.

Mais um beijo. Enquanto isso, Megan passava de leve as unhas pelas costas, depois em sua nuca que se arrepiou. Ela sentiu todo o corpo dele corresponder e sorriu em meio ao beijo. Davi estava de novo empenhado em fazer com que ela esquecesse de tudo. Não apenas porque lhe prometera, mas porque não podia suportar a ideia de ver aquela garota tão cheia de vida e que ele amava, se sentindo mal. Se esqueceu da fome, da pizza, da porta apenas encostada. Megan tinha o poder de roubar toda a atenção para ela. Ela nunca deixaria essa característica de bagunçar seu emocional. E ele aprendera a amar isso.