A Dama da Névoa escrita por Karina Saori


Capítulo 14
Você consegue me encontrar?


Notas iniciais do capítulo

Desculpem-me o mega atraso, mas o ânimo não apareceu nesses dias kkkk

Enfim, o capítulo ficou mais curto do que eu esperava, mas espero que gostem c:



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Já faz três dias que tínhamos saído de Sandbolt. Deixaremos a praia amanhã de manhã. Pensando em ter que voltar para casa e como esses dias passaram rápido, não pude conter o suspiro apesar de ter acontecido tanta coisa nesses dias.

— Quê foi, Lina? Receberemos alta hoje, então não se preocupe...

Eu estava deitada na cama e avistei Rafael sentado na sua, balançando as pernas para fora como uma criança ansiosa.

— Estou feliz por não termos que continuar nesse hospital, mas também estou feliz por não estar em Sandbolt. Não sei o que pensar, na verdade, depois de tudo isso que aconteceu... Não estou livre em lugar nenhum. Em qualquer lugar que eu vá-

— Eu estarei por perto, tentando te proteger. — completou minha frase.

Essa frase me emudeceu. Encarei-o e o mesmo me respondeu com um sorriso aconchegante, inclinando levemente a cabeça para o lado. Sorri e o agradeci por tudo que havia feito por mim até hoje.

— E me desculpe, de novo — fiz uma pausa, procurando palavras no chão — Será que... Não é melhor nos afastarmos até eu estar verdadeiramente livre disso tudo?

Ele não me respondeu. Levantou vagarosamente da cama, com a cabeça baixa. Arrancou o esparadrapo que prendia a agulha que fornecia soro e andou agressivamente até mim, afundando os pés no chão bege desgastado. Segurou meu braço não com força o suficiente para machucar e me olhou com uma expressão furiosa e chorosa.

— Nunca, mas nunca mais cogite essa hipótese, entendeu? Acha mesmo que eu me sentiria melhor com você longe, sabendo que algo te atormenta infernalmente?

— Eu sei que não e eu entendo sua reação. Mas como você acha que eu ficaria se você se machucasse por minha causa?! Seu idiota, você quase morreu tentando me salvar!

Ele continuou me fitando com aqueles olhos verdes e marejados. Suspirou e diminuiu a força com que segurava meu braço e me puxou para abraçá-lo.

— Não vamos entrar nessa discussão interminável novamente, ok? Eu não ia te deixar morrer, mesmo que me pedisse. E do mesmo modo, você também me salvou, não foi? Então estamos quites. Por isso, retire o que acabou de dizer. Não precisa passar por tudo isso sozinha, quero estar com você. Estarei bem melhor se eu estiver ao seu lado quando tudo isso finalmente acabar.

Senti que me apertou ainda mais em seus braços, enquanto encaixava o queixo em meu pescoço. Sorri após soltar um suspiro, respondendo a teimosia do cabelinho enrolado. Dei tapinhas consecutivas em suas costas.

— Tá bom, desculpe. Não irei mais falar essas coisas egoístas. Eu, de fato, não quero ficar sozinha mais nenhum momento da minha vida, mas também não quero que alguém se machuque. Muito menos você.

Perpetuamos em um silêncio incômodo. Senti seu queixo e sua bochecha se moverem, como se estivesse sorrindo.

— Bom, — continuei, um pouco incomodada com a nossa proximidade — Quando vamos poder sair daqui, hein? Já passam das 10 horas...

Mudei de assunto, arrumando uma desculpa para desgrudar-me dele, verificando o relógio em cima da mesinha que ficava ao lado da cama. Segundos depois, dona Virgínia e seu Osmar chegaram junto com o médico e dois -julgando pelas suas vestimentas- pescadores.

— Crianças, esses são os homens que trouxeram vocês até aqui.

Os dois deram uma passo para frente, tímidos e felizes por nos verem bem.

— Vocês... Muito obrigada, de verdade. Não estaríamos aqui se não fossem vocês.

Rafael levantou, surpreso. Até agora não havia se perguntado como nós escapamos com vida. Foi até os dois e apertou suas mãos.

— Obrigado, de todo o coração. Nós devemos muito à vocês.

— Quê isso, menino, não nos deve nada, não. Só fizemos o que deveria ser feito.

— Nossa recompensa é ver que vocês estão bem — o outro sorriu, mostrando os dentes amarelados e a ausência de alguns deles.

Agradecemos mais uma vez e eles foram embora. Tratamos de trocar de roupa e ouvir do médico que precisávamos descansar o máximo possível.

De carro, o caminho do hospital até a casa levou cerca de 25 minutos, que foram preenchidos com explicações do porquê fomos tão fundo a ponto de quase nos afogarmos. Nós não podíamos falar a verdade, então apenas inventamos que uma correnteza nos puxou, que eu tive câimbra etc.

Ao chegarmos, dona Virgínia nos preparou um café da manhã mais do que farto, com uma variedade incrível de frutas. Após comer, senti o cansaço apoiar em meus ombros. Passei a mão na nuca para tentar relaxar e Rafael pareceu ter percebido.

— Vai deitar, Li. Você deve estar cansada, não dormiu direito...

Consenti, pedi licença e me retirei da cozinha, indo em direção ao quarto. Troquei de roupa e, antes mesmo de chegar até a cama, senti minhas pernas enfraquecerem. Caí de lado no chão congelante. Senti uma dor incômoda nas pernas e tentei me levantar para descobrir sua origem e o que estava acontecendo, mas eu simplesmente não consegui me mexer. Meu corpo estava paralisado. Tentei chamar Rafael, mas nem ao menos conseguia mexer a boca. "E agora?" Comecei a entrar em desespero, sem saber o que fazer. De repente, senti algo tocar a minha perna. Tentei olhar, mas não consegui mover minha cabeça. Enquanto isso, a agonia aumentava; o desespero ao sentir o toque gelado apertando o meu tornozelo e não conseguir fazer nada. Com uma explicação que nem ao menos eu possuía, pensei instintivamente no que estava escrito no coelho de pelúcia: Beatriz. Reunindo todas as forças, tentei pronunciar este nome, que acabou escapando de meus lábios enrijecidos, soando como um resmungo. Senti o toque apertando um pouco mais, mas logo se esvaneceu junto com a paralisia do meu corpo.

Levantei do chão e sentei na cama, tentando entender o que havia acontecido. Por que senti vontade de dizer aquele nome? Quem é Beatriz?

Suspirei por falta de respostas e finalmente deitei, descarregando o peso de meus ombros no colchão. Ao afundar a cabeça no travesseiro macio, imediatamente peguei no sono.

~

" — Você consegue me encontrar?

Em volta da escuridão, uma voz desconhecida e infantil abriu uma linha de luz que me mostrou novamente aquela casa que me era tão familiar, mas não havia chamas dessa vez. Enquanto explorava a casa com os olhos, ouvi passos vindos de onde seria a cozinha. Paralisei, esperando e tentando imaginar o que estaria por vir.

— Lina, acabei de assar um bolo. Você quer um pedaço? — uma mulher de cabelos enrolados e castanhos apareceu diante de mim e sorriu, estendendo os braços com o pequeno prato de cerâmica branca com uma fatia de bolo. — O que foi? Não quer? Mas esse é o seu bolo preferido!

Receosa, peguei o prato de suas mãos. Era bolo de laranja, de fato o meu preferido. O seu aroma dançava em minhas narinas, me trazendo uma sensação nostálgica, mesmo que essa lembrança não existisse.

Aquela mulher ainda me encarava com um sorriso confortante nos lábios. De repente, se aproximou e tocou delicadamente meu cabelo, logo passando as costas do dedo em minha bochecha, delineando-a.

— Como você cresceu... Está tão linda, minha querida...

Sua frase ecoou dentro da minha cabeça.

— ...Mãe?

Ela sorriu enquanto uma gota de lágrima acariciava sua bochecha, confirmando o que eu havia dito. O cenário começou a se afastar e eu corri em direção àquela mulher. Com o braço estendido, tentei alcança-la como uma criança que quer colo. Quando a nossa distância parecia estar diminuindo, um clarão, como um raio, caiu sobre ela. Protegi o rosto com os braços e, quando a olhei, estava em chamas. Ainda continha o mesmo sorriso doloroso, mas não pelo fogo borbulhando sua pele, mas talvez uma dor chamada saudade.

Corri até ela, mas quanto eu mais corria, mais distante parecia ficar. A pele de seu rosto começou a escorrer, pingando em suas mãos, até o osso do crânio se tornar aparente. O fogo repentinamente desapareceu, junto com o sorriso mais bonito que já tinha visto. Dela restou apenas ossos, que se empilharam no chão e logo viraram pó, dançando com o vento.

Eu apenas queria sair dali. Enxuguei o rosto e segui explorando o restante da casa. A cada passo que eu dava, ouvia passos apressados e uma risada de criança às minhas costas.

— Vamos, me encontre! Como você é péssima nesse jogo!

A mesma voz pairava no ar; não tinha como saber de onde ela vinha. Subi as escadas que rangiam a cada passo. O andar de cima continha quatro quartos; entrei nos dois à direita da escada e não havia nada diferente, apenas eram duas suítes com camas de casal. Nas outras duas à esquerda, eram os quartos de uma criança e uma adolescente. O quarto da criança era o mesmo que o da outra vez: rosa e cheio de brinquedos espalhados pelo chão, inclusive o coelho de pelúcia. Peguei-o e analisei a etiqueta que, em bom estado, continha de fato o nome 'Beatriz' legivelmente à caneta.

Deixei o coelho onde estava e percebi que havia uma menina de longos cabelos negros e lisos sentada na cama, virada de costas para mim, cantarolando alguma música. Sua estatura me permitia dar a possibilidade de que tinha apenas cinco ou seis anos. Ao dar um passo para dentro do quarto, o assoalho gritou em um rangido alto. No mesmo instante, a menina parou de cantarolar e se escondeu imediatamente debaixo da cama. Deitei no chão e levantei a colcha, revelando a pequena menina encolhida, abraçando as pernas.

— Desculpe se te assustei, não vou te machucar. Como é o seu nome?

Ela deu risada. Virou o rosto vagarosamente.

— Você me achou bem rápido dessa vez! Acho que está melhorando nesse jogo. Da última vez eu acabei dormindo! — gargalhou. Ao me mostrar o rosto risonho, me arrastei para trás, mantendo uma certa distância da criatura que se encontrava debaixo da cama.

Seu rosto estava deformado. O cabelo de antes tinha se resumido à pequenos chumaços em seu couro capilar. A pele gelatinosa escorria pelo osso aparente do crânio.

— Quê foi, Li? — começou a engatinhar em minha direção. Sua dicção mole e afável não combinava com sua aparência horrenda. Enquanto vinha até mim, sorrindo, seu olho direito descolou, saltando e grudando na pele derretida, preso apenas pelo nervo óptico.

— Não se aproxime! — bati com as costas na parede com as mãos na frente para me proteger.

Ela sentou, aparentemente triste por eu ter gritado. Sua pele parecia entrar em ebulição. Estava totalmente queimada.

A menina soltou um último sorriso.

— Sabe, Li... Bia estava com saudade de você. Foi bom te ver de novo. Volte mais vezes para a gente brincar. Beatriz vai estar te esperando, tá bom?"


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Notas finais do capítulo

Obrigada por ler c: