* Berlim, três semanas atrás.

– Você vai se lembrar disso pra todo o sempre, Nat?

Duas semanas se passaram com a Viúva-negra e o Gavião Arqueiro dentro daquela base, e a cada dia se tornava mais difícil enganar os outros agentes. Quanto mais se aproximava o dia em que a HIDRA sairia das sombras para luz, mais tensa a missão se tornava, apenas tonando o clima mais pesado entre os dois.

– Clint, estamos em missão.

– Não tem ninguém por perto mesmo...

– Você que pensa.

– Qual é, Natasha! Você não fala direito comigo há dias! Bem... Você nunca fala direito direito comigo, mas quero dizer... Você não tá sendo grosseira do jeito bom.

– Não sabia que tinha jeito bom de ser grosseira.

– Você sabe do que eu estou falando.

Ele pronunciou sério e escorou o corpo no encosto metálico da varanda. Sim. Ela sabia do que ele estava falando. A verdade era que, por mais que quisesse evitar, ela sentia que Clint não havia deixado o passado para trás. Morse, Wanda, Kate, Jessica... Clint Barton era um exemplo de mulherengo sem futuro, e infelizmente, Natasha não podia evitar se incomodar todas as vezes que ele citava o nome de alguma delas, coisa que Barton com toda a sua ignorância masculina, não estava notando que acontecia frequentemente.

– Nós estamos em missão – ela repetiu secamente, tentando com todas as forças drenar qualquer fio de sentimentalismo que pudesse permear as suas palavras. – Não me enche.

– Tudo bem. Pode se esconder atrás da sua lógica sem sentido – ele apenas soltou os braços ao lado do corpo e deixou a varanda, caminhando em direção ao seu posto de observação. – Ah, e esse disfarce não cai bem em você.

Ele não estava mais com cabeça para tentar entendê-la. Naquela noite não.

Natasha continuou estática, sentindo o vento frio da noite afagar os seus cabelos com certa violência. Apertou os braços em volta do corpo, tentando manter-se um pouco aquecida enquanto avistava o fraco movimento dos carros ao longe. Dentro do peito, seu coração batia compassado, a despeito dos pensamentos frenéticos na sua cabeça. Ela estava apaixonada por aquele idiota, mas odiava pensar que pudesse realmente ser capaz de se relacionar com alguém assim. Detestava o fato de estar se tornando tão frágil por conta desse sentimento.

– Eu não quero sentir isso, Clint – ela sussurrou, como se no fundo desejasse que ele ainda pudesse ouvi-la. – Não sou o tipo de mulher que se casa e tem filhos... Não sou o tipo de mulher que alimenta os próprios sentimentos. Eu apenas não consigo pensar em ter você completamente e nem te perder de vez. Prefiro dançar entre uma coisa e outra do que acabar correndo riscos demais. Se você me magoar, eu precisarei matar você.

Um longo suspiro e uma lágrima silenciosa selaram o acordo que ela fizera consigo naquele instante. A partir daquele momento, Natasha estaria focada no trabalho, na missão, na S.H.I.E.L.D. Na HIDRA. Clint Barton seria banido de seu posto nos pensamentos dela, e a forçaria a esquecer tudo que aconteceu entre eles.

– Acabou, Clint. Você não consegue esquecer seu passado e eu não consigo deixar o meu para trás – ela pronunciou, ainda encarando o horizonte distante. – Estamos quites.

(...)

– Minhas coisas já estão prontas – Skye soltou uma enorme mochila no chão, causando um barulho metálico. – E você Kate?

– Que coisas? – ela perguntou como se fosse óbvio. – Só preciso da minha aljava, minhas flechas e minha motocicleta voadora. O resto é resto.

– Ótimo. Estou louca pra frustrar os planos daquele bastardo. – ela admitiu, fechando o punho com força.

– Ele pisou feio na bola contigo, não foi? – Kate pôde perceber a veia do pescoço dela se enrijecendo. – Como ele é?

– Ele é um covarde, isso é o que ele é! Quase matou meus amigos, Fitz-Simmons e... Ainda traiu a May, mentiu pra todos nós... Mas tudo bem. Vamos ver quem ri por último.

– Você gostou dele, não foi? – Kate não desistiria de perguntar. – Tá na cara de que tem alguma coisa muito pessoal nessa missão.

– Claro que é pessoal! Ele é um traíra! – Skye respondeu indiretamente e Kate cruzou os braços, deixando o pescoço pender para o lado. – Tá bem, tá bem... Eu gostei um pouco dele um tempo aí...

– Eu sabia! – a garota de cabelos pretos deu um brado de animação. – Mas como foi, vocês ficaram ou algo do tipo?

– Não foi nada de mais – Skye revirou os olhos, irritada. – A gente só se beijou algumas vezes. O babado com a May foi mais forte. Muito mais forte.

– E você não teve problemas com ela?

– Não mesmo. Pelo contrário, nós duas nos unimos contra ele. – a morena de longos cachos sorriu ao lembrar-se da cena de Ward puxando uma perna logo após lutar com a piloto. – Aquela mulher é a melhor.

– Deve ser mesmo – Kate alisava a ponta de uma das suas flechas, sentada de pernas cruzadas na cama de Skye. – Mas é um pouco intimidadora também.

– Ei, você conhece a Harpia?

– A Bobbi? – Kate levantou os olhos para a garota e voltou a encerar a ponta da flecha. – Claro que sim. Ela é a ex-mulher do Clint.

– O QUÊ?! – Skye quase colocava os olhos pra fora das caixas. – O arqueiro foi casado?!

– Ih, minha filha... Aquele ali é mais rodado do que a Times Square na virada do ano! – Kate largou a flecha e encarou a garota, descontraída. – Ele já pegou geral. Conheci Morse e as garotas quando elas moravam na mansão dos vingadores. De vez em quando elas iam atrás de mim quando o Clint se metia em problemas, o que devo dizer, era muito frequente.

– As garotas?

– É, você sabe: Viúva-Negra, Harpia, Mulher-Aranha... Parecia um zoológico aquilo! E pior que eu não posso falar nada, cara... Eu sou a Gaviã-Arqueira! – Skye riu do comentário da garota. – Não, mas é sério, Skye! Se contar só com nós quatro, deu empate. Duas aranhas e duas aves!

Skye virou para trás na cama, às gargalhadas. Kate tinha um senso de humor mais bizarro do que ela própria. Coulson estaria se metendo numa enorme encrenca se decidisse deixar Kate compor a equipe principal após a missão. Ela e Skye juntas seria simplesmente devastador.

– Ei, mas você deixou escapar algo – Skye percebeu, ainda tentando parar de rir. – Você se incluiu na lista de mulheres da vida de Clint Barton ou foi impressão minha?

– Claro que me incluí. Eu sou a irmã mais nova dele, praticamente.

– Você entendeu o que eu quis dizer. – Skye lançou um olhar malicioso para ela.

– Não, Skye – ela suspirou. – Eu e Clint nunca ficamos. De nenhuma maneira.

– Mas bem que você queria!

– Eca! Eu mesma não! – Kate encenou uma cara de nojo. – Seria como beijar o meu irmão, Skye! Prefiro beijar os pés de Loki a beijar aquele cara.

– Poxa, meu! Você nem se deu ao trabalho de disfarçar! – Skye agora ria da expressão que Kate fizera. – Tá na cara que você gosta dele, Katie! Você negou demais!

– Eu exagerei, okay... Mas falando sério... Eu já me imaginei pegando ele...

– Óbvio que imaginou – Skye sorria, nada surpresa. – Metade das mulheres desse Bunker já imaginaram isso, querida...

– Acho que metade delas já até ficaram com ele!

As duas garotas bolavam na cama, se divertindo às custas da fama de mulherengo que Clint havia alcançado. Até que Kate tocou num nome que fez as bochechas de Skye assarem repentinamente.

– O que foi isso tudo?

– Isso tudo o quê? – Skye se fez de desentendida.

– Eu falei no nome do Capitão América e você ficou mais vermelha do que minha conta no banco.

– Não fiquei não.

Kate se esticou um pouco para pegar o espelho que se encontrava ao lado da cama da garota e o colocou na frente do rosto dela.

– Diz que não tá vermelha agora!

– Tá legal, culpada! Bem...

– Pode ir contando tudo mocinha! – Kate a pressionava, batendo palmas e se mexendo compulsivamente na cama.

– Okay... Bem, há alguns dias que Steve e eu estamos... Próxima os um do outro.

– Próximos quanto?

– Não sei ao certo... Mas admito que não consigo manter a calma quando estou na frente dele.

– Parece que alguém aqui quer ser a nova Miss Rogers!

– Para com isso, Kate – ela empurrou o ombro da garota com o próprio ombro. – Isso nunca vai acontecer.

– Hey, pare de falar assim! Você é linda, inteligente e divertida... Qual o cara que não fica completamente bobo quando encontra um pacote desses?

– Valeu, Katie. – a garota deixou um sorriso escapar. – Mas talvez não seja uma boa hora pra se entrar em um relacionamento.

– Isso não te impede de tentar conhecê-lo melhor.

– Agente Skye?

Uma voz masculina preencheu o cômodo, seguida de três batidas leves na porta. Kate colocou uma das mãos na boca e Skye arregalou os olhos. Era ele.

– Skye? – Steve repetiu a pergunta, deixando Skye mais nervosa do que já estava. – Preciso de você na sala dos computadores.

– Vai logo! – Kate cochichou, empurrando Skye em direção à porta.

– Espera, calma! Meu cabelo! – ela voltou-se para o espelho e deu uma última conferida no visual.

– Tá linda, vamos! – Bishop continuava a pressioná-la.

– Hey, Cap – a hacker falou com a cara lisa, apoiando uma das mãos na porta. – O que o traz aqui?

– Coulson pediu pra que eu recolhesse algumas plantas e especificações de Montreal, mas aparentemente o sistema está configurado pra não atender aos meus comandos. – ele passou a mão de leve no cabelo, um pouco desconcertado. – Mas então, as duas damas já estão prontas para a missão?

– Sim, estamos. – as duas responderam em uníssono.

– Vocês são incrivelmente parecidas. – ele comentou, fazendo as duas rirem.

– É, parece que sim – Kate afastou-se da porta e colocou sua aljava em cima da cama. – Skye, pode levar o Capitão até os computadores, preciso me trocar antes de sairmos.

– Mas por que se trocar se você já está de lilás? – Skye não pôde perder a piada.

– Sai fora logo daqui, garota! – ela empurrou Skye para fora do próprio quarto e se trancou por dentro.

– Bom, parece que você não tem escolha. – Steve falou, fazendo Skye corar um pouco.

– Tudo bem, Capitão. Acredito que não será tão desagradável assim.

Ele sorriu e os dois seguiram pelo corredor em direção à sala dos computadores. Skye tinha as mãos geladas e elas estavam suando mais do que o normal. A cada instante o sorriso de Steve a cativava mais, ele conseguia ser encantador em cada detalhe.

– E bem, aqui estamos – ele suspirou, apoiando as mãos na cintura. – A sala que bloqueou o Capitão América.

– A sala que Skye tem completo acesso. – ela aproximou-se do painel e colou seus olhos no leitor biométrico. – Agente Skye, Protocolo de ativação S23-O.

Em apenas dez segundos a sala estava à disposição, com todos os computadores funcionando perfeitamente.

– Se eu não executar esse comando, a sala abre as entradas, mas não libera a chave de ativação dos computadores. Eu precisei bloquear o acesso devido às últimas ameaças da HIDRA que enfrentamos. Não dá pra brincar com questões de segurança.

– Muito engenhoso. – ele observava a garota ligando os painéis e alguns computadores.

– Estamos recrutando alguns agentes para ficarem responsáveis por essa sala, afinal de contas, não temos mais clones de Skye. – ela disse, divertida. – Aqui é o melhor lugar do mundo pra mim.

– Essa sala de computadores?

– A S.H.I.E.L.D.

– Hum – Steve acenou positivamente com a cabeça. – Percebi o quanto você ama isso daqui.

– É. – ela sentou-se sobre uma escrivaninha de metal e retirou a case do seu velho notebook. – E pensar que tudo começou com esse notebook que eu ganhei numa aposta. Olha onde estou hoje... Eu sou uma Agente da S.H.I.E.L.D.

Ela sorriu encantada ao lembrar-se de seu distintivo. Retirou-o da gaveta e o segurou entre as mãos. Levou-o até a boca e o beijou delicadamente, fazendo carinho na águia imponente estampada sobre ele. Steve assistia à cena, comovido e feliz por estar presenciando um momento como este. Skye era de longe, uma das mulheres mais intensas que ele havia conhecido na vida.

– Acho muito bonito o modo como você se doa para esta organização.

– A recíproca é verdadeira. – ela sorriu e ele se encostou à mesa em que ela estava sentada confortavelmente.

– Você... É muito linda quando sorri. – ele despejou, olhando fixamente no rosto dela.

– É mesmo? Então eu geralmente estou linda...

Skye se atrapalhava nas palavras, não sabia ao certo se agradecia pelo elogio ou brincava com a situação, então, preferiu ficar com a opção número dois, fazendo Steve Rogers sorrir com o seu jeito engraçado de responder as coisas.

– E espontânea. – ele aproximou-se um pouco mais dela, ficando a poucos centímetros de seu rosto.

– Espontânea? – Skye o encarava com o coração aos pulos, mas tentava manter-se controlada. – Sabe que eu não notei?

– Você tá falando baixo demais – Steve notou a fraca entonação da garota.

– É porque você está perto demais. – ela sussurrou, revezando seu olhar entre os olhos e a boca dele.

– E isso representa algum perigo pra você? – ele arriscava, ficando mais confiante a cada segundo.

– De maneira nenhuma – ela levou uma das mãos à nuca dele, alisando seus cabelos loiros e perfeitamente alinhados. – Poderia ficar aqui o dia todo.

– Então você é mais forte do que eu.

– Por quê diz isso? – ela sussurrou, ainda percorrendo os cabelos dele.

– Porque eu não consigo ficar mais nem um segundo sem beija-la.

Ela o olhava intensamente, já quase perdendo a noção do tempo ou do que eles tinham ido fazer naquela sala pra começo de conversa. Steve sentia que seu coração iria explodir se ele não a beijasse, se não pudesse tê-la em seus braços naquele instante. Sinceramente, ele não a havia chamado para aquilo, mas o momento estava proporcionando aquela oportunidade para ele e ela também estava cedendo. Estava na cara de que estava.

– Então não fique.

Ela lançou a outra mão em volta do pescoço de Steve, diminuindo mais um pouco a distância que [ainda] existia entre eles. Rogers segurou o rosto dela com as duas mãos e a beijou delicadamente e com certa pressa. Havia dias que ele pensava nela, não estava sendo fácil segurar aquele sentimento dentro de seu peito. Ele precisava arriscar.

– Você é linda.

Steve parou o beijo apenas para dizer isso e voltou a beija-la mais uma vez, trazendo Skye mais ainda para si. Ele não queria ter de soltá-la, mas alguma voz na sua cabeça o lembrava do que ele tinha ido fazer naquela sala.

– Temos trabalho a fazer – os dois disseram ao mesmo tempo e acabaram por rir, um pouco desconsertados.

– Bem... Isso foi... – Skye buscava ar para reabastecer os pulmões. – Forte...

– É... Forte – Steve tirou as mãos da cintura dela e procurou com os olhos o computador mais próximo. – Temos que encontrar as plantas para o Coulson.

– Isso! – Skye descia da mesa, um pouco constrangida. – Encontrar as plantas.