Skye terminara seu árduo trabalho de separar e analisar os arquivos dos novos agentes e subiu para o quarto de Jemma segurando uma xícara de chá e dois pacotes de rosquinhas, esperando encontrar a amiga acordada. Abriu lentamente a porta e avistou Simmons sentada na cama, com os olhos semiabertos e remexendo no seu cabelo um pouco bagunçado. Skye sorriu com a cena: a britânica estava completamente desnorteada – já que ela não tinha o hábito de dormir durante o dia – e eram exatamente cinco da tarde quando ela despertou.

– Sabia que você acordaria a tempo para o chá. – Skye brincou, sentando-se na cama ao lado da amiga.

– Skye – Jemma coçava os olhos delicadamente, enquanto tentava expulsar o sono. – que horas são? A britânica tinha as duas mãos massageando o rosto marcado pela cama.

– Hum... Deixa eu ver – Skye esticou-se na cama para pegar o despertador – Cinco horas.

– O quê?! – Simmons praticamente gritou. – Eu dormi isso tudo?! Oh meu Senhor!

– Calma, calma, Jemma – Skye segurou os braços de Simmons e a fez olhar pra ela. – São cinco horas da tarde. – ela explicou. – Ainda estamos no mesmo dia, relaxa...

– Ah, graças – a cientista suspirou aliviada. – Achei que tivesse hibernado.

– Nossa, que exagero – Skye fez uma cara feia pra ela. – Toma, aqui está seu chá das cinco, lady. – A hacker entregou a xícara para a garota recém-acordada. – E as rosquinhas, obviamente.

Jemma pareceu despertar completamente ao ver aquele pequeno pacote brilhante com pequenos aneizinhos dentro. Era como dar um remédio para um doente.

– Ah, Skye – Simmons deu um largo sorriso. – Obrigada.

– Nada de “Obrigada” senhorita – Skye colocou as mãos na cintura e encenou uma expressão séria – Juntando tudo são quatro dólares. – ela arqueou a sobrancelha e Simmons virou os olhos.

– Skye – Simmons deu um leve empurrão na amiga com o ombro e a hacker liberou a risada que estava presa em sua garganta. – O que eu faço com você? – a britânica não conseguia evitar o sorriso.

– Me ame – Skye abriu um enorme sorriso e fechou os olhos, numa cara engraçada.

As duas começaram a rir desenfreadamente, aquela morena tinha mesmo algum tipo de poder. Se entrasse na cota, o altruísmo seria um deles. Skye morreria para que os que ela ama estivessem em segurança e Jemma já havia descoberto isso há muito tempo.

– Você está melhor? – Skye deu um gole no seu chá e endireitou-se na cama, sentando-se de frente para a amiga.

– Estou – a cientista suspirou e deu um leve sorriso. – Eu explodi com você... Com a May...

– Hey, pode parar – Skye segurou as duas mãos da amiga, confortando-a. – Você estava tensa, preocupada. Você não fez de propósito, eu sei. E a May sabe disso também.

– May... Como ela está?

– Coulson está cuidando dela.

– Que bom.

– Hello?! – Skye estalou os dedos na frente dos olhos dela. – Você ainda está dormindo, gênia?

– O quê? Por quê? – Jemma franziu a testa, confusa.

– Você não ouviu o que eu disse? – Skye levantou uma das sobrancelhas, maliciosa. – O A.C está “cuidando” da May!

Simmons revirou os olhos. “Lá vem a Skye de novo.”

– Oh meu Deus, Skye! – Simmons a repreendia. – Lá vem você com essa história de novo! O Coulson e a May...

– Namoraram nos velhos tempos!

– Eles o quê?! – Simmons quase tossiu a rosquinha que estava comendo. – De onde você tirou que...

– Coulson me contou ainda a pouco – a morena mordeu os lábios sorrindo enquanto Jemma arregalava os olhos. – Ele estava me contando sobre eles dois antigamente. A May deu um banho de lama nele quando se conheceram!

– Espera, espera! – Simmons levou as mãos à cabeça, apertando os olhos, confusa. – É muita informação em tão pouco tempo! E você ia me fazendo tossir com essa rosquinha. Por favor, não faça mais isso!

Skye gargalhava, segurando sua xícara de chá.

– Ou pelo menos me avise para eu estar preparada! Não se conta essas coisas desse jeito! – Simmons continuou.

– Ei, mas o Coulson fez isso comigo, viu? Ele quis descontar o que eu fiz com você no café-da-manhã. – Agora foi a vez de Simmons soltar a risada. – Ele esperou eu dar um gole no meu chocolate pra dizer: “Foi o dia em que a pedi em namoro”.

A garota imitou a voz e a expressão do chefe, fazendo Simmons cair para trás na cama de tanto rir.

– Para, para, eu preciso de ar – Simmons estava rindo como uma hiena. – Skye, você não é normal!

– Não sou mesmo não! – a garota deixou a xícara em cima do criado mudo e deitou-se também, trazendo o saco infindável de rosquinhas para cima de sua barriga. – Deve ser um saco, sabe... “Ser normal”.

– Sabe – Simmons virou-se pra ela e roubou algumas rosquinhas do pacote. – Você é a melhor amiga mais louca que eu já tive. – ela sorriu, colocando uma das rosquinhas na boca logo em seguida.

– E você é a melhor amiga mais viciada em rosquinhas que eu já tive. – Skye disse, sorrindo. – Ou melhor... É a única melhor amiga viciada em rosquinhas que eu tenho – Jemma soltou um pequeno riso, ainda com a boca cheia. – Mas também é a mais doce e meiga que eu conheço – a garota deu uma pausa no seu discurso, Jemma era realmente importante para ela. – Sabe, eu nunca tive muitas amigas de verdade... Eu passei minha infância no orfanato e quando eu enfim encontrei uma amiga ela foi adotada dois meses depois. Não que eu estivesse triste por ela, eu fiquei feliz, mas fiquei sozinha de novo. E depois que eu fugi, eu tive o Miles e os garotos, então, nada de “noite das garotas” – Elas sorriram. – Mas agora... Eu tenho você... E eu não te trocaria por nenhuma outra.

Skye sorriu e voltou a encarar o teto, ela sabia que Simmons ficaria um pouco constrangida com aquela afirmação. O pacote de rosquinhas estava no final e Skye comia as últimas unidades, antes que Jemma atacasse o saquinho novamente.

– Ah, Skye – a cientista estava corada, obviamente. – Eu também não trocaria você por ninguém. – a britânica disse docemente com seu sotaque delicado.

– É mesmo? – Skye colocou uma das mãos na cintura, numa expressão intimidadora. – Isso porque só tem eu de garota aqui. Se surgisse uma nerd igual a você e ela viesse morar conosco, eu iria pro canto rapidinho! – Ela disse, jogando-se com as costas na cama e cruzando os braços, numa cara de criança.

– Você... – Jemma esboçou um sermão, mas acabou por rir da cara engraçada que Skye fez. – Claro que não! – ela empurrou a amiga com uma das mãos. – Deixa de ser ciumenta, Skye! Você sabe que eu te amo!

– Sei não, você nunca disse isso...

Jemma percebeu que era realmente verdade. Claro, ela já havia dito praticamente para todos no Bus que amava aquela garota, menos para a própria Skye.

– Bem, agora eu disse. – ela manteve-se séria, mas estava ficando vermelha.

– E você sabe que suas bochechas estão...

– Skye! – Simmons enfiou a cara no travesseiro e Skye começou a rir.

– Sim, e por falar nisso – ela puxou o travesseiro das mãos da amiga e o colocou de lado. – Como raios você consegue dormir com a cara enfiada nisso aí?

– Ah, não sei... Durmo assim desde criança.

– E você consegue respirar? – Ela disse, ainda apontando para o travesseiro.

– Claro! Se não conseguisse eu já teria morrido, não acha?

– Uau – Skye deu um sorriso e bateu palmas. – Onde você está aprendendo a falar assim, Dra. Simmons?

– Adivinha? – Jemma deu um sorriso. – Hey... Onde estão as rosquinhas?

– “Onde estão as rosquinhas?” – Skye imitava a voz e o sotaque da amiga – Acabaram, ora! Você comeu o seu e metade do meu e ainda queria que sobrasse alguma coisa? Coragem a sua!

– Vamos procurar mais? Por favor! – Simmons pediu, com uma carinha que não dava pra recusar.

– Tá bom, tá bom! – Skye respondeu, revirando os olhos. – Mas é o seu último por hoje, eu tô avisando. Vou esconder o resto!

– Claro que vai esconder...

– Vamos, levanta dessa cama e ajeita o seu cabelo, tá parecendo que isso aí tem vida própria!

– Skye! – Jemma atirou o travesseiro na direção da garota que já estava de pé.

– Não tá mais aqui quem falou! – disse a garota, numa risada peralta.

Segundos depois as duas garotas desapareceram pelo corredor em meio a risadas. O amor que elas tinham uma pela outra era nítido e parecia se espalhar por todo o ambiente. Skye sentia-se feliz pela sua amiga, adorava vê-la sorrindo daquela maneira. Estava feliz por tê-la ajudado. A pior coisa do mundo era ver Jemma Simmons chorando em desespero e não conseguir fazer nada para ajudar.

(...)

* Washington DC, um ano e alguns meses atrás.

– Vem almoçar comigo hoje?

– Não sei, meu anjo – Hill assoprava o expresso macchiato enquanto encarava um enorme arquivo com o logo da S.H.I.E.L.D. – Acho que nunca trabalhei tanto na vida!

– Eu imagino – Hill percebeu o tom de desânimo do outro lado da linha. – O meu também está uma loucura, o Departamento reabriu o caso H7-1009. Faz dois dias que eu não durmo.

– O do atirador? Aquele lá da torre?

– Esse mesmo. O cara foi liberado sem a nossa permissão e está foragido. A cada cinco minutos a Central recebe uma notificação das famílias que estão no serviço de proteção à testemunha. Aquele lugar está insano!

– “Aquele lugar?” – Hill estranhou – E você tá aonde?

– Há meia quadra da cafeteria, senhorita Hill. Ah, e eu adorei o seu cachecol preto com listras lilás – Hill olhou pela janela rapidamente procurando pela dona da voz. – A propósito, quem te deu esse?

Hill ainda olhava para a rua, vasculhando cada rosto como se procurasse por um criminoso dos grandes, quando a voz pareceu estar mais perto e ela olhou para o ambiente interno novamente.

– Que tal bem aqui? – Sammy tocou o ombro de Hill, que tomou um susto com sua presença repentina.

– Que susto, Samantha! – Hill fechou os olhos e pôs seu café sobre a mesa novamente. – O que você quer aparecendo desse jeito? Me matar?!

Samantha apenas riu e abriu os braços, esperando um gesto carinhoso da parte da amiga, que mesmo assustada, levantou-se a abraçou carinhosamente. A agente da CIA tomou o assento mais próximo à agente da S.H.I.E.L.D, deixando de lado a bolsa muito bem trabalhada em couro.

– O de sempre, Martha. – Samantha sinalizou para a atendente, que sorriu igualmente simpática e acenou positivamente com a cabeça.

– O que faz aqui, Sam? – Hill perguntou sorrindo enquanto segurava as mãos dela sobre a mesa.

– Ora o quê... Eu vim te ver, criatura! – Maria abaixou a cabeça sorrindo – Há dez anos a gente toma café no mesmo lugar, sabe?

– É, mas em horários diferentes. – Hill pontuou, levantando a cabeça para olhar para ela novamente.

– É, em horários diferentes. – Samantha concordou rindo.

– E é só quando estamos em Washington.

– Isso, só quando estamos em Washington. – Sam repetiu, virando os olhos e rindo da amiga.

– Mas me diz, como você está?

– Trabalhando muito...

– Está comendo direito?

– Eu nunca comi direito, Maria...

– O Sr. Connor está se comportando?

– Sim, ontem mesmo eu dormi no apartamento dele. – Sam começava a responder com uma cara de tédio e com a voz arrastada.

– E aquela dor que você sentia no...

– Pelos céus, Hill! Até parece que eu não te liguei semana passada! – Ela alterou um pouco o tom, mas voltava rapidamente ao normal. – Eu estou bem, de verdade! E eu não vim aqui para ter uma conversa robótica ensaiada! Eu só quero passar algum tempo com a minha irmã!

Hill não poderia negar-lhe aquilo. Samantha era altamente independente e madura, mas tinha um jeito meigo de lhe pedir as coisas de forma que era praticamente impossível alguém resistir àqueles olhinhos meio cor de mel, meio esverdeados que brilhavam implorando por algo.

– Tudo bem, meu anjo. Eu também sinto sua falta. Eu sei que eu sou meio fria às vezes e te atropelo com perguntas, mas... Dividíamos o mesmo apartamento até um dia desses... Eu acho que ainda não me acostumei com essa história de Connor... Sei lá!

– Você é uma irmã mais velha muito ciumenta! – Sam sorria, enquanto recebia seu cappuccino com canela.

– Essa é a primeira característica de um irmão mais velho. – Hill argumentava enquanto olhava o relógio de pulso. – Um almoço, então? – Maria se preparava para levantar-se da mesa. – Fury deve estar enlouquecendo a May a essa hora...

– Hey Shield! Vai me deixar tomando café sozinha?

– Você sempre toma café sozinha quando eu não estou aqui, Sam.

– E desde quando você anda me vigiando?

– Desde que descobri que você fazia o mesmo comigo!

– Ah, Shield, qual é!

– Um almoço – Hill levantou-se e pegou sua bolsa. – É pegar ou largar.

– Tá bem, tá bem! – ela levantou as mãos se rendendo. – Eu não tenho escolha mesmo...

– Ótimo. Às 13h tá bom pra você?

– Pra quê? Pra você engolir a comida ainda quente e voltar praquele prédio secreto da...

– Tá bom, tá bom! – Hill se corrigiu, antes que Sam começasse com o sermão. – Às 12h então.

– Tem certeza que não vai ser um incômodo... – a garota de enormes cachos castanhos amava ver a cara irritada da irmã.

Hill bateu em Samantha com a bolsa.

– Eu vou embora antes que eu volte minha palavra atrás!

– Não, não, não... Tudo bem, desculpa, Shield...

– E para de me chamar de “Shield”, Que coisa!

Samantha prendeu o riso.

– Okay, tudo bem. Sem chamar de “Shield”. entendido.

– Preciso ir, tá? Se cuida, Miss Impossível.

– Se cuida, Sra. Responsabilidade.

Hill sorriu, acenando para a garota e desaparecendo pela cafeteria.

Parecia que havia séculos que não a via, mas por incrível que pareça, eram apenas três semanas. Tempo suficiente para que a morena surtasse internamente por ficar longe daquela garotinha dos cabelos dourados que chegara tão assustada à sua casa naquele dia. Hill cuidaria dela daquele dia em diante, então, não conseguia evitar toda essa preocupação. Por mais que se mostrasse fria e indiferente, ela sentia a falta da irmã. A prova disso era o cachecol preto com listras lilás que Hill havia ganhado de Samantha no último inverno. Era um jeito de mantê-la por perto e se manter aquecida ao mesmo tempo.