Waisenkind escrita por HarpiahAvalon


Capítulo 8
Capítulo 8


Notas iniciais do capítulo

Acreditam que eu postei esse capítulo na minha história Sollay sem querer? kkkk



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  Os meses foram decorrendo lentamente enquanto a pequena chama da esperança de Simone de sumia. Ela aos poucos foi se conformando, mas nunca deixava de olhar pela janela, como se algum dia ela fosse ver a sombra do seu amado no horizonte.

Sharon desde então não sonhou mais. Dormia mais tranquilamente e nem usava mais o diário como o registro dos sonhos malditos. Tom e Bill voltaram a ter suas vidas de volta. A menina ficava sempre escondida e era proibida de sair de casa, e só podia respirar um pouco de ar puro quando chegava à noitinha, e mesmo assim, os dois (discretamente) ficavam sempre à espreita a fim de ver se alguém os observava. Em umas dessas noites, aconteceu o inesperado.

 

          Em meio ao suor e ao desespero, seu sonho lhe mostrou que podia ser tão real quanto o hálito doce da morte. Ela se rendeu ao sonho mais uma vez, mas dessa vez... Surpreendeu-se:

 

         “As ruas estavam desertas e meu corpo está gelado. Não sinto mais pés no chão. É como se eu flutuasse no nada. Eu ouço gritos agonizantes por todos os lados. A dor das pessoas me parece tão real que eu posso senti-las. O fogo que surgiu do nada consome todas as casas. É um grande pesadelo. Acho que estou morrendo por dentro... Nada parecia ser pior. Até que eu vi vários soldados devastando todas as casas, pegando os judeus que insistiam em se esconder e prendê-los, para que depois fossem queimados vivos. Um arrepiou me correu pela espinha quando percebi que eles estavam indo em direção da casa dos meus novos protetores. Talvez alguém tivesse me denunciado, quem sabe? Minhas escapadas à noite andam freqüentes. Ando sentindo algo ruim no ar há um bom tempo. ”

 

Tremores e suor. Meu rosto estava pálido de medo.

 

        “Eles não estão me caçando. Isso é um alívio, por um minuto senti que minha vida pudesse estar em perigo e também a de meus protetores. Mas juro que me surpreendi com o que disseram para a minha nova família:

         - Simone Kaulitz Trümper? – perguntou um oficial louro, dos olhos bem azuis – vim comunicar-lhe a morte de seu marido.

Ela sentiu um buraco abrir sob seus pés e a engolir. No fundo sabia que tinha acontecido algo pesado com o Gordon, mas receber a notícia daquela maneira lhe pareceu demasiado pesado para a ocasião. Sentou-se no chão sujo com a sua saia recém-lavada enquanto seus joelhos viraram gelatina:

         - Como isso aconteceu? – indagou.

         - Ele fora morto por comunistas. – Senti que neste momento ela queria desmaiar de tristeza, mas levantou-se e olhou nos olhos do oficial com o pouco orgulho que lhe restava.

 

‘Mentirosos!’ Pensei. Ele tinha sido morto por alemães!

 

         - Quando?

         - Há alguns dias. Mas a nossa visita não é somente por isso.

Simone pareceu surpresa, mas obteve calma para aquele momento:

         - Aconteceu algo com mais alguém da minha família?

         - Mais ou menos – disse ele pegando sua prancheta, como se tivesse conferindo algum dado – é sobre os seus filhos.

         - O que eles fizeram? Eu não estou sabendo de nada!

         - Calma, ele só precisam participar da Juventude Hitlerista. Seus filhos ainda não foram inscritos. Vim avisar-lhe com boa vontade por que eu conhecia seu marido e o admirava muito. Caso contrário eu já teria mandado ‘resolver o assunto de outra maneira’, entende?

         - Sim, obrigada por avisar. Eu não saio de casa há muitos dias. Desliguei meu rádio e não tenho muito contato com o resto da Alemanha.

         - Por quê? – ele queria saber – o que você esconde? DO QUE você se esconde?- ele estava desconfiado de algo. Não era normal alguém se isolar daquela forma.

         Por um minuto senti raiva de mim mesma por estar dando tanto trabalho para ela. Eu queria sumir de lá:

        - Não escondo nada – disse ela com certa rispidez – apenas não quero ficar perto desse fogo cruzado! Há brigas por todas as partes e ver aquelas pessoas mortas de fome na rua me dá nojo.

       

        Ela se referia aos judeus. Ao contrário do marido, não enfrentou os oficiais até porque ela estava sozinha e tinha três pessoas pra cuidar. Para ela foi muito duro ofender aquelas pessoas daquele jeito, mas não podia me expor aquele risco:

       - Então tudo bem. Você tem uma semana para inscrever seus filhos.

       - Tudo bem.

Eu fiquei surpresa ao ver Simone concordar em alguma coisa que um oficial alemão disse.

       - Tenha um bom dia – disse ele para ela, desejando de todo o coração.

Ela apenas sorriu e em poucos minutos entrou para dentro de casa. Jogou-se em cima da cama e pôs se a chorar como nunca. Bill e Tom tinham ouvido a conversa e ficou com pena da mãe. Depois de várias horas de choro e de muito consolo, Simone levantou-se da cama e só tinha forças pra dizer uma coisa:

       - Bill, Tom, Shari... Façam as malas. Eu prefiro morrer a ver vocês nas mãos desses imbecis.”

Sharon acordou naquele momento com várias batidas na porta. Simone fora atender a porta. Era um oficial alemão.

 

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        - Bill, Tom, Shari... Façam as malas. Eu prefiro morrer a ver vocês nas mãos desses imbecis. – disse Simone, revoltada depois que o Oficial saiu. Ela estava com os olhos vermelhos de choro.

 

       - O que você está dizendo mãe? – pergunta Bill, incrédulo.

 

       - Você pega seu irmão, a Shari e fogem.

 

        - Para onde? Por quê? – dessa vez Tom pergunta.

 

        - Eles querem levar vocês de mim pela Juventude Hitlerista! Eu não vou deixar! FILHO MEU NÃO VAI FAZER ESSE TIPO DE COISA! EU PREFIRO MORRER A PERMITIR ISSO!

 

       - Mãe calma! – Grita o gêmeo mais novo – nós não vamos permitir que isso aconteça. Eu... Eu prefiro morrer.

Simone foi respirando vagarosamente, até recobrar a calma e a fala:

 

        - Você me promete? Promete morrer do que fazer isso?

 

        - Eu te juro. Nunca vou concordar com isso, mãe.

 

        - Nem eu mãe. – disse Tom, sentando em sua cama com Simone abraçando-o em seguida.

 

Bill fez o mesmo e durante algum tempo ficaram se abraçando com ternura. Sharon chegou até a porta do quarto e ficou observando a cena, com uma dor imensa no peito. A dor chamada saudade (saudade de sua antiga vida... sua família), bateu na porta do coração e Shari não teve outra alternativa que não fosse deixá-la entrar. Até que Tom teve a grande idéia de dizer algo:

 

       - Venha Shari. Você é da família agora.

 

Sentiu-se lisonjeada e com vontade de chorar de felicidade. Simone a abraçou com muita força e Bill com todo o amor que podia. Tom aproveitou-se da situação e pegou na bunda dela.

 

Ela nada falou, mas deixou pra dar o tapa na cara dele mais tarde.

 

      Uma semana se passou com toda a calma. Tinha terminado o prazo que o oficial tinha dado e eles já tinham feito as malas para irem embora de

madrugada. Durante a semana, todos beijaram e abraçaram Simone o quanto podiam. Porque sabiam que nada poderia ser feito assim que eles passassem porta afora. Os três sumiram da cidade na calada da noite. Simone não chorou na partida para que eles não perdessem a coragem. Ela se manteve forte até que eles se foram.

 

Para onde foram? Isso nem eu sei.

 

Mas Sharon sabia. E seria o próprio inferno.

 

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     - Onde está seu diário Shari? – pergunta Bill, depois de alguns dias.

 

     - Está dentro da minha bolsinha, Bill – respondeu ela, enquanto terminava de cozinhar o ovo para o almoço.

 

Era só isso o que eles comiam em muitos dias. Simone tinha ido ao mercado e comprado muitas coisas para a viagem. Suas bolsas estavam cheias de ovos, pães, punhados de sal, e algumas chávenas de açúcar, além de várias caixas de doces e alguns trocados:

 

- Você escreveu tudo o que o oficial disse para a mamãe, não é? – disse Bill depois de ler a última coisa que estava escrita no caderninho.

 

- Sim. Na verdade, eu tinha sonhado com isso. Quando eu dei por mim, o oficial tinha chegado e dito tudo o que eu tinha previsto.

 

Bill nada disse, mas suspirou. Ele não queria que as coisas acontecessem daquela maneira. Quando deu por si, já estava consolando a mãe, em prantos com a notícia da morte do seu amado. Ficava tentando imaginar como a sua mãe estaria se virando agora sozinha, sem mais nenhum filho pra cuidar, nem pra ajudar. Como o seu pobre coraçãozinho de mãe está se virando agora?

 

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Simone andava em sua casa de um lado para o outro. Ela estava aflita quando percebeu que a polícia estava nas redondezas, e ficou amedrontada

com a idéia de morrer na mão dos inimigos, afinal infringira as regras. Começou a limpar a casa freneticamente para poder se distrair, e estava pronta para enfrentar Deus e o mundo para proteger as suas crias. E quando percebeu; o que lhe mais a amedrontava estava batendo à sua porta:

 

- Simone? – disse o mesmo oficial da semana passada – Como vai?

 

Ela não conseguiu responder, apenas sorriu e o cumprimentou com a mão fria:

 

- Sua mão está gelada Simone! Devia se agasalhar – disse ele.

 

- Sim – disse ela finalmente depois de refletir alguns segundos – eu vou me agasalhar. Eu estava mexendo com água, arrumando a louça da pia.

 

- Entendo – falou ele tentando ser simpático – mas... Tem algo diferente em você... Aconteceu alguma coisa?

 

-Sim, na verdade aconteceu – disse ela – meus filhos... Não sei o que houve com eles – mentiu a mãe.

 

- Oh. – ele parecia espantado – Não se alistaram para a Juventude?

 

- Não. – ela fingiu um choro falso – Eu não sei o que houve com eles...

 

- Quando eles desapareceram?

 

- Acho que há uns três dias. Talvez mais, não sei. Estou há muito tempo ansiando pela volta dos meus amados filhinhos! Mas receio que...

 

Ela fez uma pausa bem dramática e depois continuou:

 

- Receio que eles tenham morrido.

 

E engatou num choro amargo. Chorava pela ausência de seus amados filhos, mas algo no fundo lhe dizia que eles estavam bem vivos:

 

- Eu sinto muito. Mas... Como você sabe que eles estão mortos?

 

- Porque ouvi muitos tiros na noite do desaparecimento – disse ela, chorando – tenho certeza que ouvi. Eu pedi tanto a eles que não saíssem à noite!

Está muito perigoso para um passeio noturno! Mas adolescentes... Esses garotos não me escutaram!

Ficaram silenciosos por algum tempo e o oficial teve tempo de refletir. Decidiu ir embora, mas não antes de desejar os pêsames:

 

- Meus pêsames – falou ele – espero que se recupere bem.

 

Ele foi embora e deixou Simone em paz.

 

Ela ainda chorava. Mas dessa vez não fingia a dor.

 

A noite caía lentamente e Simone pensou pela milionésima vez no que seus filhos estariam fazendo. Mas o sono a venceu.

 

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O oficial sempre achara a Simone atraente. Pudera, ela era muito bonita, muito mesmo. Ele sempre quisera a oportunidade de tê-la, nem que seja por uma noite, mas a luxúria era impedida pelos três homens que Simone mais considerava em sua vida: Gordon, Bill e Tom.

 

Gordon já tinha sido morto, Tom e Bill estavam desaparecidos. Seria a oportunidade perfeita. Perfeita para uma noite de sexo sem permissão.

 

Seria na calada da noite. Todos dormiam, mas ele estava aceso, louco, fantasiando uma noite com a loira que o fazia arder. A casa dela era relativamente remota, e seus gritos não seriam facilmente ouvidos. Sua mente maléfica arquitetava cada passo. Ele não seria pego, e mesmo que fosse, poderia dizer que ela estava ajudando judeus e ninguém o castigaria.

 

Seria o plano perfeito. Ele só não contava com uma coisa.


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