No dia seguinte, acordei com um sentimento estranho e uma pergunta que me intrigava: O quê tinha acontecido com o Killian?

Depois que ele me "abandonou" no meio da rua, não conseguia pensar em mais nada. Fiquei a noite inteira em claro tentando imaginar uma boa razão para aquilo acontecer.

Levantei com meus sentidos pedindo para que eu permanecesse na cama. Tomei um banho gelado a fim de me despertar. Coloquei um casaco preto e calças jeans. Deixei os meus cabelos caírem naturalmente pelo meu ombro enquanto minha maquiagem deixava minhas bochechas rosadas.

Saí do quarto com a mochila nas costas.

–Bom Dia- meus pais disseram ao mesmo tempo quando avistaram que eu adentrava a cozinha.

–Bom Dia... -falei apressada- Vou ter que chegar mais cedo para organizar alguns livros.

–Eu já tinha pensado nisso- minha mãe disse me entregando uma garrafa térmica- É chocolate quente.

–Com canela?- falei pegando a garrafa morna.

–Com canela- ela repetiu dando um beijo em minha testa- Acho melhor você ir- ela olhou para o relógio de pulso.

–Tchau, mãe. Tchau, pai- falei enquanto calçava as botas que hoje tinham um salto significativo.

Saí pela porta da frente e entrei em meu fusquinha amarelo. Botei a chave na ignição e joguei a mochila para o banco de trás. Passei todo o percurso até a universidade ouvindo algumas músicas country que sempre tocavam no rádio pela manhã. Hoje perguntaria a Killian o que havia acontecido na outra noite.

Estacionei o carro no pátio principal. Poucas pessoas já haviam chegado. Peguei minha bolsa e me dirigi ao prédio anexo dos armários. Peguei minha chave e encaixei-a na fechadura.

Notei uma figura alta e de cabelos negros que eu reconheceria em qualquer lugar que eu fosse. Ele colocava alguns livros e cadernos dentro do seu armário. Caminhei até ele.

–Sério, o que aconteceu com você ontem à noite?- falei chamando a sua atenção.

–Nada... - ele disse seco, ainda colocando os livros no armário.

–Ei!- fechei o armário- Olhe nos meus olhos.

–Eu já disse, aconteceu um problema- falou me fitando sem nenhuma expressão.

–Isso está ficando extremamente estranho. Na verdade, VOCÊ está estranho- falei sem paciência.

–Eu não mudei nada- ele falou ríspido.

Eu não conhecia aquele lado do Killian então fiquei surpresa dele agir de tal forma.

–Eu fiz alguma coisa?- estava começando a desconfiar que eu fosse o problema ali.

–Não, mas eu acho que o melhor séria que nós nos distanciarmos um pouco.

–O quê diabos está acontecendo com você?- perguntei revoltada.

–Com licença, Swan. A Tinker me espera- ele falou se afastando de mim e indo em direção à loira que me deu um aceno quase imperceptível.

Mais uma vez ele tinha me deixado sozinha.

Passei as três primeiras aulas distraída. Não conseguia pensar em mais nada a não ser em Killian. Alguma coisa estava extremamente errada. Ele foi o cara, depois de meu pai, que me tratou de maneira mais gentil e agradável em toda a minha vida.

Na hora do almoço corri para o refeitório a fim de encontrar todo o pessoal. Entrei na fila e peguei uma bandeja na qual coloquei um pouco de carne e salada. Sentei a mesa onde todos estavam. Menos Killian, Tink e Graham que já tinha concluído todas as matérias pendentes.

–Oi- falei me sentando entre Ruby e Ariel.

–Oi- todos falaram com a atenção voltada para um canto do refeitório atrás de mim.

–O que aconteceu?- indaguei tirando os talheres do saquinho de plástico.

–Olhe com seus própios olhos- Regina falou fazendo-me virar um pouco a cabeça para observar a cena.

Tink e Killian estavam sentados sozinhos em uma mesa. Eles riam e conversavam, bem diferente da maneira que ele tinha me tratado mais cedo.

–Parece que muita coisa mudou nesse final de semana- Robin disse enquando cerrava os olhos para enchergar melhor.

–O Killian mal falou comigo- Eric interrompeu.

–Ele estava muito estranho hoje- falei enquanto observava-os se levantarem da mesa e seguirem para a porta da saída do grande pátio.

Ela enganchou seu braço ao dele do mesmo jeito que eu fazia. A expressão séria que Killian tinha me dado anteriormente havia se transformado em um sorriso.

Raciocinei um pouco. Todas as peças estavam se encaixando perfeitamente. Eles estavam namorando. Mas quando isso tinha acontecido? Ontem pela manhã ela era apenas uma amiga e hoje já estão andando juntinhos.

Não que eu não apoiasse o relacionamento dos dois, pelo contrário, eu fui uma das que mais incentivou, mas eu não queria que Killian se afastasse de mim e era exatamente isso que estava acontecendo. Apesar de ter dito a ele que eu não era possessiva, eu sou. Eu ainda queria ser “a garota do Killian", mas provavelmente eu tinha sido substituída.

–Quando será que isso aconteceu?- Belle perguntou fechando o livro e marcando a página com um pedaço de papel.

–Vocês acham que eles estão namorando?- Regina perguntou apreensiva.

–Eu acho que... - Robin começou, mas foi interrompido por uma voz irritante.

–Que coincidência encontrar você por aqui, Emma- Joey disse sarcástico- Acho que já não devemos lhe chamar de "A garota do Killian", porque pelo o que eu percebi agora a pouco você foi substituida pelo senhorita TinkerBell- ele falou dando ênfase na palavra “substituída”.

Um nó se formou em minha garganta. Até agora ninguém tinha dito que eu tinha sido trocada, eu só tinha criado isso na minha cabeça, mas quando Joey jogou isso na minha cara, meu mundo caiu.

–Joey... - falei levando o braço para investir um soco no meio de sua cara, mas Ruby conseguiu segurar meu antebraço bem a tempo.

–Ele não vale a pena, Emma- Ela disse, me fazendo recuar.

Joey saiu gargalhando e indo ao encontro de seus amigos. Mil coisas passaram pela minha cabeça, entrei em estado de choque.

–Você está bem?- Regina, que estava sentada a minha frente, segurou minha mão.

–Claro, claro- falei saindo do transe- Só preciso de um pouco de ar.

Caminhei até a saída com a cabeça baixa. Andei pelos corredores evitando olhares de outros alunos.

Passeei pelo jardim da universidade até a próxima aula começar. Levantei a cabeça e limpei uma lágrima que tinha se formado "involuntariamente". Estava perdida em meus pensamentos, quando Ruby tocou em meu ombro e me fez parar.

–Eu não acho que você falou a verdade sobre "estar bem"- Ela falou acompanhanto os meus passos.

–Por que você acha isso?- pergunteu encarando-a.

–Porque ninguém passeia sozinho por um jardim quando não precisa refletir- ela deu uma pequena pausa- e também por causa dessa lágrima- ela disse limpando a gotinha que tinha feito um rastro de água pelo meu rosto.

–Ele precisava deixar de ser meu amigo?- falei com amargura em minha voz.

–Ninguém deixa de ser amigo de uma hora para outra- ela tentou me confortar- Ele deve ter um bom motivo.

–Você acha que eu não perguntei?- falei aumentando meu tom de voz- Ele me respondeu com um "É melhor nos distanciarmos".

–Sempre achei que ele tinha sentimentos fortes por você... - ela disse me fazendo suspirar.

–Não é o que parece, agora- falei magoada.

–O melhor é você sentar e ter uma conversa sincera sobre o que realmente está acontecendo- aconselhou.

–Vou fazer isso- falei determinada.

O sinal tocou e nos despedimos com um abraço.

–Obrigada, Ruby.

–É para isso que as amigas servem- ela me deu um beijo na bochecha e voltou para dentro da universidade.

Corri para não me atrasar para a aula. O salto da minha bota fazia um som irritante toda vez que batia no chão de porcelanato.

Regina estava na mesma aula de Psicologia que eu. Quando a encontrei sentada em uma das cadeiras no fundo da sala, fui ao seu encontro.

–Você está melhor?- ela falou voltando sua atenção para mim.

–Sim- me sentei na cadeira atrás dela.

–Então, o quê você... - Regina começou mas foi interrompida pelo professor.

–Alunos, sentem-se. Vou escrever os assuntos da prova no quadro, então anotem- O homem de cabelos escuros falou.

Peguei meu caderno e procurei uma caneta em minha bolsa. Quando finalmente achei, notei um papelzinho em cima da minha mesa. Um bilhetinho de Regina.

"Voltando ao assunto... O quê você acha que aconteceu com eles? Tink não falou comigo desde sábado”.

"Vou tentar conversar com ele, mas provavelmente ele não quer minha amizade”.

"Não acredito nisso, Emma. Killian lhe considerava como melhor amiga”.

"Até então..."

Voltei a copiar a matéria que estava na lousa. Depois da aula, andei até o pátio da frente e notei que Tink estava sentada em um dos bancos perto das árvores. Fui ao encontro dela.

–Tink... - falei animada.

–Oi... - ela disse indiferente.

–Você sabe se aconteceu alguma coisa com o Killian?- perguntei tentando manter o bom humor.

–Muita coisa aconteceu ultimamente, Emma- ela falou com certo rancor na voz.

–Você sabe onde ele está?- eu estava começando a ficar desconfortável.

–Provavelmente com os meninos. Mas tenho quase certeza que ele não vai querer te ver agora.

Tinker estava me surpreendendo com suas atitudes. Sempre a imaginei como uma menina fofa e frágil, mas agora ela estava me tratando de forma grosseira.

–Não é questão de querer- falei sem paciência- Eu preciso vê-lo agora.

Saí batendo o pé. Procurei em toda a escola por Killian, até que enfim encontrei-o no refeitório junto com Eric e Robin. Eles riam como se nada tivesse acontecido.

Aproximei-me tentando não chamar muita atenção. Robin notou a minha presença.

–Vem, Eric, vamos deixar-los a sós- ele disse se afastando.

Killian, que estava de costas para mim, se virou e mudou completamente seu semblante.

–Eu preciso ir- ele disse pegando os livros atrás de si. Ele desviava seus olhos dos meus.

–Espera- protestei- agora você vai ficar me evitando? Depois dos seis meses de amizade e todos os momentos que passamos juntos?- Virei seu queixo com a mão direita e forcei-o a me olhar nos olhos- Depois de todos os sentimentos que eu sentia por você, você vai jogar tudo fora?

Seus olhos azuis estavam perdidos. Os olhos que eu costumava ver quase todos os dias. Eu não conseguia decifra-los. Ficamos nos olhando por alguns segundos, até que Killian recuou.

–Eu não posso... - ele disse soltando seu queixo de minhas mãos e saindo correndo.

Encostei-me na mesa que estava perto de mim. Uma lágrima solitária correu pelo meu rosto. O refeitório vazio me dava a sensação de abandono. Era assim que eu estava me sentindo agora. Abandonada.

Eu repassava todos os nossos momentos juntos, buscando alguma coisa que eu havia feito de errado. Será que eu tinha sido uma má amiga? Será que eu não tinha valorizado a nossa amizade o suficiente?

Voltei para casa com a minha cabeça entrando em parafuso.

–Emma- minha mãe disse quando me viu entrando - Venha almoçar.

–Não estou com fome- falei subindo as escadas sendo seguida por Duck.

–Eai, garotão?- falei acariciando seus pelos, ele pulava e corria pelo meu quarto- Pelo menos um de nós está feliz hoje.

A semana de aulas se passou. Killian continuava me evitando e desviando quando eu ia em sua direção, mas conversava com os outros normalmente. O problema era realmente comigo. Tink não tirava o sorriso do rosto, toda vez que eu tentava conversar, ela me tratava de maneira seca e grossa.

Minha mãe tinha percebido a minha diferença de comportamento, mas eu sempre mudava de assunto e falava que eu estava com enxaqueca. Eu não queria me abrir para ninguém, nem para as minhas novas amigas e nem para a minha própria mãe.

Todo o meu sofrimento ficou guardado dentro de mim, toda a minha angústia por falta das conversas e brincadeiras que eu tinha com Killian estava escondido dentro do meu coração.

O sábado chegou e eu tomei coragem de ir ao cais. Vesti uma blusa larga e um short jeans curto, coloquei óculos escuros e fiz uma trança em meus cabelos desgrenhados. Me despedi da minha mãe e saí de casa pela manhã ensolarada de Storybrooke. Caminhei até o porto onde os meus amigos já estavam embarcando em suas respectivas lanchas.

–Oi... - Regina correu até mim e deu um beijo em minha bochecha.

–Oi- falei retribuindo o beijo.

–Emma- Ruby gritou saindo da lancha de Eric e vindo ao meu encontro- O Graham me ligou dizendo que teria que ficar resolvendo umas papeladas na delegacia.

–Tudo bem... - falei baixando a cabeça.

–Ei- Regina levantou o meu queixo com as pontas dos dedos- Vai ficar tudo bem. Você e o Killian vão se resolver.

–Vocês estão prontas para subirem a bordo, meninas?- Killian disse da parte de trás de sua lancha, ele ainda não tinha percebido minha presença.

–Killian, a Emma poderia ir com vocês?- Ruby me empurrou para frente.

A expressão de Killian enrijeceu.

–O quê você está fazendo?- falei ao pé do ouvido dela.

–Uma chance de vocês se acertarem.

–Sim- ele disse depois de um grande suspiro.

–Vai lá, garota- Regina falou para que só eu ouvisse.

Subi nas pequenas escadas que facilitavam a entrada na embarcação. Tink estava apoiada no Timão enquanto Killian pegava bebidas no pequeno frigobar que estava encostado em um dos cantos da lancha.

Sentei no sofá de trás do barco e de vez em quando olhava para Killian implorando mentalmente para que ele me olhasse de volta, mas não aconteceu. Tink perguntou se eu queria uma bebida, balancei a cabeça negativamente enquanto olha as águas claras abaixo de nós.

No resto da viagem fiquei sentada na areia conversado com Regina, Ariel, Ruby e Belle. Killian caminhou com Tink pela orla da praia. Lembrei-me da primeira vez que estive aqui. Eu não queria entrar na água, então Killian me colocou em seu colo e me levou até o mar gelado. Sorri lembrando da ocasião.

Voltei para casa sozinha. As meninas me ofereceram companhia, mas preferi fazer uma caminhada reflexiva. Todas as minhas tentativas de reaproximação com Killian tinham falhado. Sempre Tink estava lá com ele.

Dormi cedo pedindo para que quando eu acordasse tudo não passasse de um pesadelo e que Killian bateria na minha porta e me cumprimentasse com o sorriso lindo que eu tanto adorava.

Mas eu acordei e tudo era real. Domingo era o nosso dia de caminhada. Eu ainda tinha esperança que ele viria. Levantei da cama e fui ao banheiro tomar banho e botar minhas roupas de caminhada.

Depois de pronta, sentei no sofá-cama que ficava na janela do meu quarto. Olhava esperançosa para a rua de minha casa, procurando por Killian.

Passei a manhã toda sentada perto da janela e Killian não tinha vindo.

Levei a mão até o pingente de cisne no meu pescoço, uma das poucas lembranças que tinham sobrado dele.

Em um impulso arranquei o colar. Eu estava furiosa. Por que eu teria que continuar com aquilo? Afinal, nós não éramos amigos, não éramos? Ele me odiava.

Continuei repetindo aquelas palavras na minha cabeça. Ele me odiava... Ele me odiava...

Lágrimas começaram a cair incessantemente pelo meu rosto. Levantei e fui até a minha caixinha de joias com o colar ainda em minhas mãos. Coloquei-o dentro dela como se fosse a coisa mais preciosa que eu tivesse.

Enxuguei as lágrimas e tranquei a caixinha com a chave dourada que estava ao seu lado.