Resilience escrita por lilithfx


Capítulo 11
Uma montanha de erros - Parte 2


Notas iniciais do capítulo

"De erro em erro, vai-se descobrindo toda a verdade.”
Freud , Sigmund



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Shelby solta um profundo suspiro, seus olhos marejados mostram toda dor e sofrimento que o passado trás. Ela sai das memórias de um tempo distante, para encarar o presente e sua filha. Numa voz forte e cheia de emoção, diz:

__Você Rachel, não nasceu de uma transação comercial e de minha ambição, mas sim do amor. O meu amor por Gabriele, por Carmem, Jean e principalmente o amor e o desejo de dar aos seus pais uma oportunidade de ter a família que sempre desejaram. Eu sabia que eles iam amar você tanto quanto eu. E por conta disso, em nenhum momento me arrependo de ter feito essa escolha, você foi e será sempre, minha melhor decisão.

Rachel não pisca, é tudo tão surpreendente que está sem palavras. Tantos anos tentando entender o porquê da mãe ser barriga de aluguel, da falta de contato e carinho. Tantos anos sofrendo bullying, onde o pior insulto era ouvir que nem a mãe a queria e por isso tinha abandonado ela com seus pais gays. Ali estava à verdade nua e crua, sua mãe, é uma pessoa que ela poderia admirar, não só pelo seu talento, mas por ser uma mulher digna de orgulho e que resolveu ser mãe por amor.

Suas lágrimas correm livres, não consegue conter o choro. Olha a mãe e pede para continuar o relato.

Shelby balança a cabeça concordando, sem esforço, retorna ao passado, precisa contar todos os fatos a sua filha.

Apesar de repentina, minha decisão foi baseada em várias noites de reflexão, o aparecido do meu irmão, só antecipou o momento.

Fiz a comunicação aos meus dois queridos amigos da decisão de gerar um filho para eles, ser sua barriga solidária. A única exigência que tinha era mudar para uma cidade com um clima ameno e ritmo de vida mais calmo, por conta das necessidades de Gabi.

Não é possível mensurar o tamanho da felicidade de ambos. Leroy então, resolveu aceitar uma proposta feita por um colega de faculdade e trabalhar no Battelle Memorial Institute, um dos maiores centros de inovação médica do mundo. E assim, Hiram, Leroy, Gabriele e eu, mudamos para Columbus/Ohio. Uma medida ótima para o tratamento de Gabriele, cuja recuperação ocorreria em pequenos passos.

As únicas pessoas que sabiam do nosso paradeiro eram Jean e Carmem.

Minha relação com Carmem estava um tanto estremecida, ela não aceitou muito bem o fato de eu abrir mão da minha carreira para cuidar de Gabi e ter um filho. Mas era minha escolha e nada faria mudar minha opinião. No fundo, Carmem queria que eu estivesse por perto, já que, enfrentava problemas em seu casamento e precisa de um suporte amigo.

Tivemos sorte e na primeira tentativa eu engravidei. Lembro a festa que seus pais fizeram, Não sabíamos qual dos dois era seu pai genético, e nem era preciso saber. Em meu coração, aceitava que os dois eram seus pais.

À medida que a gravidez avançava, eu me via mais e mais agarrada à ideia de ser mãe e com dificuldades em deixa-la com seus pais, apesar de saber que era a decisão mais sensata.

Como, uma garota de 22 anos, com uma namorada em reabilitação e financeiramente sem estabilidade, cuidaria de um bebê? Entre o coração e a razão, escolhi a razão, sabia que eles seriam ótimos pais, mas precisava garantir que eu não ficasse tentada a estragar tudo e fiz a exigência de colocar no contrato, a observação de só falar com você, depois que tivesse 18 anos.

O casal Berry não quis e tentaram me convencer por todos os meios, mas eu sabia que se tivesse oportunidade de vê-la, seria quase impossível deixar você.

Seu nascimento foi tranquilo e emocionante. Tinha cumprido minha missão e dado aos seus pais o presente mais valioso, minha filha, que seria amada, educada e protegida por eles.

Após seu nascimento, decidi mudar, precisava trabalhar e ficar longe, era doloroso ser parte da sua vida, sem ser sua mãe. Seus pais assumiram o custo do tratamento de Gabriele e prometeram mandar noticias suas sempre, era o mínimo que eu queria e precisava.

Voltei para New York, lá moravam meus amigos. Reatei minha relação com Carmem e ela foi de suma importância na minha carreira acadêmica, estimulando minha volta à faculdade, e indicando pequenos papeis em peças da Broadway, que garantiam meu sustento na metrópole. Não era a protagonista ainda, mas tudo é uma questão de tempo e esforço.

Tinha uma vida tranquila, estava mais madura, mas com uma sensação de vazio enorme, meus dois amores estavam longe da minha vida, tudo que restava, eram as notícias, que seus pais mandavam, e fotos suas e da Gabi.

Cinco anos foram embora numa rapidez enorme, agora com 27 anos, tinha conquistado o respeito de produtores e diretores da Broadway. Não virei uma estrela, mas tinha uma carreira de respeito,

Durante esse tempo, descobri outra paixão, estimulada por minha boa amiga Carmem, eu era professora de NYADA e adorava ensinar jovens talentos, sendo reconhecida por meus colegas, como uma ótima professora, para o orgulho de Carmem e meu também.

Minha vida amorosa não existia, meu coração ainda estava preso com Gabriele e no que poderíamos ter sido uma pra outra, se não tivesse ocorrido à tragédia. Era uma existência solitária, mas eu ainda tinha esperanças numa recuperação milagrosa do meu primeiro amor.

Carmem, Jean, seu namorado Sebastian e eu, estivemos em seu aniversário de cinco anos. Eu estava com tantas saudades sua, que não resisti quando Hiram e Leroy fizeram o convite. Foi emocionante e estranho ao mesmo tempo.

Ver uma miniatura minha, com o nariz de Hiram a capacidade e vocabulário de Leroy me fez ter certeza sobre minhas decisões. Sua família era bem ajustada, feliz. Aquele casal adorava o chão que você pisava e mesmo assim, sabia impor limites.

Você esteve em meu colo por aproximadamente cinco minutos, tal era a energia existente em seu pequeno corpo. Lembro-me do seu fascínio ao abrir meu presente, um microfone todo dourado, imitando ouro. E como imediatamente reuniu seus amiguinhos e fez uma apresentação impecável. Jean registrou esse momento e tenho a foto comigo sempre.

Foi estranho ver os pais de seus amigos indagarem quem era eu, já que a semelhança era óbvia demais. O casal Berry, mais uma vez, sugeriu que estivesse presente em sua vida, voltei para New York pensando seriamente nessa possibilidade.

De volta à cidade, recebi uma visita inesperada e que de novo mudou meus planos, meu rumo. Meu pai, o pastor, estava a minha espera, no meu escritório em NYADA.

Olhava para ele e tudo que sentia, podia ser traduzido em raiva e temor. Como chamar de pai, alguém que é responsável por ter machucado o amor da minha vida?

Nossa conversa, tensa e recheada de gritos, foi traumática. Ele tinha descoberto sobre você e queria sua localização para efetuar o que chamou de “Resgate de inocente”. Segundo ele, não deixaria uma criança que compartilhava seu DNA viver no pecado e com aberrações imorais que não seguiam as leis de Deus. Ele gritava sobre precisar resgata-la para purificar sua alma, através de orações e castigos.

Fiquei sem ação na hora, apesar de tudo, ainda temia aquele homem. Foram anos de obediência cega. Temia o poder e influência que ele tinha, e após dispensa-lo, tomei outra decisão difícil.

Liguei para os Berry e expliquei tudo o que estava acontecendo, falei para mudarem e que eu não queria e nem podia ter mais contato algum com você ou eles. Eu torcia para que essa medida fosse o suficiente para garantir sua proteção.

Cortar o vínculo fez doer meu coração, mas precisava pensar no seu bem estar e agir como mãe.

Existia também Gabriele. Com a saída de Leroy do Instituto, tive que trazê-la de novo para New York.

Seu progresso tinha sido enorme em 5 anos. As marcas da tragédia estavam mais suaves, ela mancava de maneira discreta, a memória do passado tinha retornado e sua fala, apesar de confusa em alguns momentos, mostrava-se mais consistente. Tinha saudades de vê-la cantando, porém. Sentia falta da paixão existente em sua voz quando executava uma música, perder isso, foi o mais triste.

Depois de muito pensar, decidi pedir a Carmem para ajuda-la. Minha amiga era uma professora talentosa, tinha um tempo que eu não possuía e poderia contribuir para melhora do meu amor.

Ter Gabriele por perto foi uma dádiva, ver a menina que era meu amor, ir recuperando a vitalidade o espírito de antes, fez meus dias felizes. O tempo, porém, me fez perceber que nossos sentimentos já não eram os mesmos. Nosso amor não tinha mais a paixão da adolescência, ela foi substituída por um sentimento fraterno, éramos irmãs, amigas, não mais amantes e namoradas.

As provocações e brincadeiras que antes eram destinadas a mim, agora eram feitas para outra pessoa. Ambas, não tinham percebido ainda, mas eu vi o sentimento nascer entre Gabriele e Carmem. Mais uma preocupação, já que Carmem ainda estava amarrada em um casamento fracassado. Fazer minha amiga ver o quanto poderia ser feliz, era minha meta, além de finalmente deixar Gabriele amar e ser amada por alguém merecedor desse amor. No fundo, ainda existia culpa, pelos anos roubados de Gabi e da sua juventude desperdiçada pelo meu pai.

Mais uma vez, o sentimento de vazio estava presente em minha vida. Sentia a solidão cada dia maior, no fim do filme, a moçinha terminava só. Aos 27 anos, com uma vida inteira pela frente, eu sentia que ninguém poderia preencher meu coração, e começava a acreditar nas palavras do meu pai, que estava destinada a não ter um amor e nem ser amada por ninguém.

E outros 4 anos correm. Minha carreira sedimentou, sou uma das principais professoras de NYADA, além de trabalhar dando consultoria para várias faculdades e escolas. Nunca mais tive notícias dos Berry, de você. Estava com 31 anos, ainda solitária, fechada no meu mundinho.

Era feliz com meus amigos, mas sentia falta de amar e ser amada. Meu coração precisava de amor, mas o medo era absurdo. Tive pequenos flertes nesses quatro anos, com algumas mulheres e homens, mas nenhum despertou meu amor e paixão, tudo se resumia ao lado físico e não envolvia sentimento.

Tudo mudou no início do ano letivo, finalmente encontrei alguém que despertou meu interesse, apesar de ser moralmente questionável e proibido, já que ela era minha aluna.

Lutei com todas as forças contra esse sentimento, fiz de tudo para fugir, mas ela não deixou. Eram 10 anos de diferença, ela tinha talento e arrogância de quem nasceu em berço de ouro, status social, e uma família que cuidava dos seus interesses. Eu era apenas uma professora com uma bagagem emocional extensa e dolorosa.

Carmem acompanhava tudo, ela sabia dos meus dilemas morais e apesar de tudo torcia para eu ser feliz e dava toda cobertura que eu precisava. Carmem era uma boa amiga, eu também torcia para ela resolver sua vida e ser feliz com Gabriele, era tão óbvio o amor das duas, mas ambas fingiam não ver esse sentimento, o que me deixava bastante triste.

A garota não dava trégua, aproveitava cada pequeno momento para se insinuar e sabotar minhas defesas. Nossos embates em sala de aula eram homéricos e assustavam os outros alunos, já que eu era uma professora normalmente calma. Um semestre inteiro dessa doce tortura, foi o suficiente para eu cair de amor definitivamente por essa menina.

Por conselho de Carmem, mantivemos nosso relacionamento em segredo por mais um semestre, eu ainda era professora dela e poderiam surgir comentários de privilégios concedidos ou favorecimentos injustificados. Coisa que em nenhum instante precisei fazer, aquela garota tinha talento suficiente para brilhar por si, sem precisar de qualquer ajuda.

Ao fim do ano, o vínculo acabou e pude fazer a coisa certa, conhecer sua família e pedir sua mão em namoro, eu era afinal de contas, uma garota do interior e faria tudo como manda a tradição.

Sua família me recebeu com toda pomba e honra e a princípio pensei que seria aceita sem restrições, mas eles tinham grandes planos para sua filha, que não incluíam uma namorada mais velha e com bagagem.

A sabotagem era sutil e traiçoeira, faziam questão de acentuar as diferenças sociais e de idade que tínhamos. Minha menina não percebia essas artimanhas e eu ia sofrendo calada, para não deixar que ela sofresse uma grande decepção com os pais.

Jean e Carmem ouviam minhas lamentações, dúvidas e tristezas, o conselho sempre era o mesmo, contar tudo para ela.

Mas como falar sobre seus pais se nem coragem para contar da minha filha, Gabriele ou meu pai assustador eu tive?

Era tudo confuso, tinha medo dela não suportar minha história de horror e me deixar, o fato de não querer contamina-la com os horrores do mundo e principalmente proteção, Ela era muito jovem para ser jogada numa realidade brutal como a minha e assim confiei pouco no seu amor.

Segurei ao máximo os ataques de seus pais, principalmente sua mãe. Minha garota estava feliz, ia realizar seu sonho e estrear na Broadway num papel de destaque, não seria eu a estragar esse momento único.

No dia da sua estreia, porém, todos os meus sonhos de novo foram destruídos. Sua família descobriu a história envolvendo meu pai, o fato de eu ter uma filha e o que Gabriele representava na minha vida. Fui chantageada e mais uma vez, precisei afastar quem amo, era minha triste sina.

Nem cheguei a terminar nossa relação, só desapareci da sua vida, sem nenhuma explicação, deixando sua mãe, inventar coisas horríveis e cruéis ao meu respeito. Sai de NYADA, não resistiria vê-la sofrer e contaria toda verdade, por isso, aceitei um dos inúmeros convites que recebi, para trabalhar fora dos Estados Unidos.

Carmem era meu elo com ela, mandando notícias nada tranquilas da minha garota. E mesmo com o coração dilacerado, decidi que não bastava o afastamento, precisa fazê-la sentir raiva de mim e conecta-la de novo ao mundo.

Foi o que fiz e não me orgulho disso. Precisei deixa-la sentir ódio e raiva de mim, assim como fiz com você. Perceber que sempre vou ferir e afastar quem eu amo é devastador, me questiono até quando vou resistir.

Nesse instante Shelby não conseguia conter as lágrimas, ali estava um fragmento da sua história, sua filha agora sabe uma parte importante de sua vida, tinha cumprido sua missão. Tudo que podia fazer era esperar e ser merecedora de seu perdão e amor.

Rachel olha a mãe dilacerada a sua frente e mal consegue processar todas as informações que recebeu. Seu corpo treme, diante de tantas emoções. Era um longo dia, repleto de subidas e descidas emocionais, estava desgastada. Mas sabe o que precisa fazer.

Num gesto emotivo, típico da sua personalidade afetiva, envolve sua mãe num abraço recheado de carinho e proteção, coração com coração.

Ali estava à resposta de Shelby, ela seria perdoada e amada, era a natureza da sua filha falando mais alto, finalmente Shelby estava em casa.


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Notas finais do capítulo

Como prometido,eis a segunda parte.
Vamos ver agora,como o impacto da história de Shelby,repercute na vida da Rachel.
Agora a parte chata,tenho mais um capítulo quase pronto e depois da sua postagem,preciso de um pequeno hiato para estudar.Tentarei manter semanalmente,mas pode atrasar.
Gostaria de saber seu comentário e o que está achando da história.
Esse capítulo é dedicado a minha fã,quase beta.Namorada,sem você essa fic não sairia do papel ou do pc,te amo.Bons sonhos e boa semana!