Estava sentada em minha cadeira reclinável, lendo mais um dos meus livros de navegação, como de costume. O clima estava abafado quase insuportável, Robin estava ao meu lado concentrada em sua leitura, diferentemente de mim que não parava quieta, talvez fosse o calor me afobando. De longe vi Sanji trazer alguns copos com limonada, isso me animou bastante, minha boca estava realmente seca, mais seca do que o habitual.

- Nami-san, Robin-chan, trouxe refrescos para vocês!! - Ele se curvou nos servindo como um legítimo cavalheiro.

Peguei a bebida gélida da bandeja tomando um enorme gole, senti meu cérebro congelar com o líquido escorrendo em minha garganta, aquilo havia me revigorado, mas o nó que ainda estava preso na garganta não havia sido arrebentado. Me sufocava.

-Obrigada, Sanji-kun.

Agradeci pouco satisfeita,queria ser educada, ainda mais com Sanji, não gostaria que ele descobrisse que eu não estava no meu melhor dia. Coloquei o copo vazio sobre a mesinha que havia ao lado, notara que Robin mau havia bebido a limonada, curiosa perguntei.

- O que foi Robin? - Minha voz soou um pouco receosa.Ela não mantinha olhos convictos como sempre, seus olhos estampavam manchas negras, suas sobrancelhas finas cerradas sinalizavam em direção a ilha que estávamos ancorados, voltei meu olhar para a mesma direção, enormes nuvens negras e algumas púrpuras estavam encobrindo a costa. Fiquei chocada, pois eu havia visto há poucos segundos atrás e nada estava ali, como agora estava, seria possível? Acho que sim. O céu era azul vibrante, era como se de repente alguém tivesse derrubado acidentalmente um balde de tinta negra.

- Nami-san, o que é aquilo?

A voz de Sanji soou aguda em meus ouvidos, me tirando do tranze em que permanecia, respondi sem um pingo de confiança em minhas palavras.

- Eu não sei, mas aquilo não é normal, nunca vi nuvens assim em toda a minha vida.

Robin largou o copo sobre a mesa, estava séria, séria demais para o normal, acho que não era só eu que estava tendo um pressentimento ruim, ela também estava. Um vento quente uivou baixo sobre o navio, as velas dançavam tristemente pelo céu negro. Aos poucos senti ser sufocada, mais e mais, olhei para os demais que apareciam de dentro do navio, eles pareciam normais, ou estava tentando me enganar... no fim, achei que aquelas sensações eram fruto da minha imaginação, era mais fácil pensar assim, era mais fácil, fugir dos problemas era mais fácil, dei de ombros.

- Oe, o Zoro, o Luffy e o Franky ainda não voltaram?

Quando aquelas palavras chegaram aos meus ouvidos, ou melhor, ao meu raciocínio, pude ter a certeza que eu não estava errada, muitas coisas estranhas a minha volta, rapidamente zelei que todos estivessem bem, teria que buscá-los, nem que fosse a força, aqueles garotos...zelava mais uma vez para a segurança deles. Dei um pequeno pulo quebrando meus banais devaneios, corri até a borda do navio, Usopp me fitava sem entender, eu já esperava essa reação, afinal, nem eu me entendia... não havia nenhum sinal... nenhum sinal que aqueles três idiotas estavam regressando.

- Nenhum sinal deles, Usopp.

Minha voz saiu comprimida, mais do que já estava, aquela típica sensação de choro reprimido, uma criança prestes a chorar, chegou num ponto em que eu estava ofegando tentando inalar o ar, olhei assustada para a tripulação.

- O que foi Nami? Esta sentindo alguma coisa?

Chopper chegou de mansinho, aqueles olhos brilhantes e puros que ele obtinha me fizeram ficar mais sensível, sorri para ele, acenando que estava bem, apesar de ser pura mentira. - Estou sim.- Afirmei tentando não o preocupar com incertezas.

Fui até aos demais tripulantes que mantinham os olhos fixos para o céu escuro, ainda tomado pela coloração púrpura, por dois segundos pensei que era o fim do mundo, e vai saber se era ou não. Me aproximei impondo ordens diretas e específicas, elas proferiram tão rápido dos meus lábios que os demais se assustaram.

- Chopper, Sanji-kun, Robin vamos procurar aqueles três idiotas... não estou com um bom pressentimento desde que chegamos nessa ilha. - Robin não muito diferente confirmou minhas especulações. Não estava louca, ela também notara.- Eu também me sinto um pouco receosa sobre essa ilha, navegadora-san.

Era o que eu precisava escutar para ter certeza de tudo, ter certeza de ir atrás daqueles três, afinal o que estava se passando ali não era normal, não somente o clima, mas sim o que se passava comigo.

- Usopp e Brook cuidem do navio, recolham as velas para que não sejam danificadas com o temporal! - Os dois fizeram gestos positivos com a cabeça, Sanji olhou irritado para eles e com muita audácia falou aos berros.

- Escutaram o que a Nami-san!!

Desci as escadas do Sunny apressadamente, Sanji e Chopper simplesmente deram um pulo para fora do navio, e Robin usou suas “ mãos ” para descer. Minha falta de capacidade, às vezes,  me irritava muito. Quando botei os pés no chão, o céu sobre minha cabeça estava numa coloração preto avermelhado mais inteso, preenchido agora com muitos raios que iluminavam por de trás das nuvens. O céu estava rachando em minha imaginação.

- Vamos!!- Arfei.

Assim seguimos para cidade, o caminho não era muito longo, aos podia ser visto várias casas, todos corriam um pouco a minha frente, me esforcei ao máximo para conseguirmos manter um ritmo constante. Chegamos lá, as ruas estavam sendo rapidamente esvaziadas, as pessoas sumiam como o vento, procuramos por todos os cantos e nada deles, muitos já estavam se trancando em suas casas, mal olhavam para nossas caras, como se o fim do mundo estivesse se aproximando. Era exatamente como havia pensado, a única lei para poder sobreviver era ignorar quem pedisse ajuda, bando de idiotas.

- O que tem de errado com essas pessoas, qual o problema em nos ajudar! - Minha voz irritada estrangulava mais minha garganta, Sanji tragou seu cigarro, ele também estava ficando perturbado com tudo isso,e também quem não estava? Eu estava perturbando todos.A cada minuto que se passava o clima parecia castigar com enormes rajadas de vento, numa dessas alguns pedaços de madeira vieram em minha direção, um pouco assustada fechei meus olhos posicionando os braços contra meu rosto em proteção, mas antes que me atingissem, Sanji me pegou no colo se desviando do que voava.

- Droga! - Murmurei baixando os braços.

- NAMI-SWAN, NUNCA VOU DEIXAR NADA ACONTECER COM VOCÊ, O SEU PRINCIPE SEMPRE ESTARA AQUI!

Ele sorria para os meus olhos angustiados, desci do seu colo, soltei um longo suspiro, Sanji era um bom rapaz, mas esses modos dele sempre me incomodaram, gostaria que ele fosse mais sério, por mais que eu tentasse incentivar mudar esse jeito bobo com as mulheres era inválido... Resumido se comporta como uma criança em busca do doce.

- Espero que Robin e o Chopper estejam bem. - Estava muito preocupada com os outros também, sabia que podiam se proteger... mas era inevitável, porque eu amo toda essa tripulação que se tornou minha família, parte de mim. Nesse exato momento um raio caiu exatamente no morro mais alto do pequeno vilarejo, isso me fez dar um tremendo pulo, o chão tremia, mas logo ficou inerente, um círculo parecia se formar no céu, um circulo de fogo. O calor condensavasse com a umidade, daqui há alguns minutos iria chover, uma chuva fria iria amenizar a dor daquele solo seco e sem vida, naquela direção só podia ver altas chamas.

- Mas que merda foi essa? - O olho de Sanji reluzia contra o fogo, voltei meus olhos pelo caminho ha nossa frente, não podíamos perder mais tempo ali, tínhamos que achar os outros, mas infelizmente o meu coração gritava, gritava e doía, pois sabia que aquelas catástrofes tinham haver com meus companheiros. Estava ciente disso. - Não sei mais vamos lá ver!

Subimos correndo aquela enorme ladeira, minhas pernas estavam pesadas devido ao cansaço, mas em hipótese alguma pararia de correr. Havia sinal de destruição em todos os cantos, casas queimavam com a brasa que se alastrava pelos campos, arvores arrancadas com a força do vento e entre os destroços vejo o chapéu de Luffy rolando pelo chão, o seu chapéu.. tão precioso, não acreditaria que o capitão tivesse perdido.

- LUFFY!!

Corri atrás do chapéu e o peguei, estava aflita, não enxergava nada direito por causa da fumaça e da areia que entrava em meus olhos, eles ardiam muito.Tentei sair daquela confusão, virei e vi Robin com Chopper, acabei por me cortar tentando sair pelos escombros, poucos e grossos pingos de chuva caiam chicoteando a terra seca, mas uma vez gritei em suplica para que aqueles três aparecem.

- LUFFY!! ZORO!! FRANKY!! - Sanji tentou me acalmar, mas não adiantava, eu o empurrei fracamente para trás, vi o desgosto assumir em sua face.- Nami-san, volte!!

Quando me virei para dizer que não adiantava me consolar, meus olhos ficaram surpresos com o que via, Franky estava com uma enorme pedra sobre o corpo, fazendo muita pressão contra seu corpo metálico, estava desmaiado, algumas faíscas saiam teimavam em aparecer, nunca o havia visto naquele estado, era como se algo tivesse o apedrejado várias vezes. Sanji deu um chute certeiro quebrando a pedra em vários pedaços, Robin usou seu poder para tirá-lo de lá, enquanto eles atendiam o cyborg alguns pequenos grunhidos vinham ao meu ouvido, foi quando noto Luffy encostado sobre um pedaço de madeira.Corri até aonde estava,seu corpo sangrava bastante, mantinha muitas escoriações, fiquei estática ao ver seus olhos, olhar vazio e cheio de raiva e medo.

- LUFFY!! O QUE ACONTECEU?! - Aproximei dele, mas fui empurrada com força para trás, não estava entendo o que havia acontecido ali, estava assustada, aquele olhar que ele me lançava era como se suplicasse por algo.

- ZOROOO!!! VÁ ATRÁS DE ZOROO!!!

Seus gritos passaram como um choque em minhas veias, não pensei duas vezes, larguei o chapéu sobre seu peito e parti que nem uma louca sobre os escombros, chamas, arvores, pessoas... nada importava, só tinha que achá-lo para que pudéssemos ir embora daquele maldito lugar. A única coisa que eu tinha certeza era que algo de muito ruim estava acontecendo, os poucos pingos que caíam se transformaram em uma densa chuva, molhava a minha pele quente trazendo sensações gélidas conduzidas por tremelicos. A fumaça aos poucos foi baixando, limpando o meu campo de visão, quando de longe vi aquele corpo atirado ao chão, fixei melhor meu olhar, pude ver atentamente três laminas de espada reluzindo aos relâmpagos que clareavam o céu, com certeza aquele era ele... Zoro. Fui aproximando lentamente, mas quanto mais perto eu chegava mais meu peito gritava, meus pés arrastavam-se pelo barro, os metros transformavam-se em centímetros, e assim por diante... Ele não estava com uma cara brava para mim... não estava rindo por eu tê-lo encontrado...não estava com uma cara de dor... simplesmente estava como Zoro... parei lançando um olhar baixo para aquele corpo totalmente ferido, minhas pernas tremiam demais, o peso do meu corpo me fez cair de joelhos no chão.

- ZORO!! Zoro... fale comigo?! - Minha voz saia em suplicas.

Ele não se mexia, coloquei meu rosto contra seu peito, seu coração batia fraco, fraco demais... era muito baixo o som, eu não sabia o que fazer, nervosamente comecei a fazer uma massagem, mas de nada adiantou... as batidas continuavam fracas...Coloquei sua cabeça sobre meu colo, eu já não sabia quem eu era naquele momento, não sabia se tremia por causa da chuva fria ou por culpa.

- CHOPPER!!! CHOOPPERRR!!!

Gritei... e gritei, as lágrimas queimavam em meus olhos, eu fazia carinho em sua face, seus olhos abriram lentamente, o sangue não parava de escorrer de sua cabeça, manchando a minha pele ligeiramente bronzeada de vermelho, vermelho vívido que rapidamente se mesclava com a água da chuva. Estava nervosa, minto, nervosa era pouco perto do que estava sentindo, eu não podia fazer nada... mais uma vez não pude fazer nada por ele.

- Me perdoe por antes... eu não queria... ter brigado com você... se eu não tivesse falado nada você não teria saído do navio e nada disso haveria .... acontecido.... ZORO!!! Prometa que vai agüentar até Chopper vir...

Ele mexeu os lábios com grande dificuldade soltando um pequeno sorriso para mim, aquilo foi como uma flecha contra o peito, porque ele fez isso, para me detonar de uma vez, ou era somente um pedido de desculpa? As desculpas que eu deveria dizer. Ele foi fechando os olhos lentamente, eu gritava interiormente para não assustá-lo, não queria ver aquela face relaxada, queria algo como " Bruxa, você vai ver!",  mesmo me irritando eu saberia que estava bem e esbanjando energia...mas ele não estava. Naquele momento Chopper vinha em nossa direção, ele ficou chocado, parecia não acreditar na cena a sua frente, assim como eu estava, pegou o estetoscópio colocando sobre o peito do espadachim, os olhos da rena se arregalaram, o pavor inflou sua cara, rapidamente ele começou a apertar o peito de Zoro, uma vez, duas vezes, três vezes.

- CHOPPER COMO ELE ESTÁ? ...CHOPPER!!

Eu arfei agoniada, os olhos de Chopper estavam cheios de lágrimas, estava tremendo feito criança no frio, ele não conseguia balbuciar qualquer palavra, minha mente não podia acreditar no que eu estava pensando, abracei o corpo gélido do espadachim... o corpo tinha que estar frio por causa da chuva, tinha certeza disso, olhei mais uma vez muito zangada para o médico e gritei.

- COMO ELE ESTÁ? FALA AGORA?!

- ele... ele está...morto, Nami....

Não... eu não havia escutado aquilo, estava só tendo um pesadelo, era mentira, o que leva um médico mentir para você, ou melhor um amigo ... olhei para Chopper incrédula, até que ele se afastou chorando...espere,então aquilo era verdade?... Zoro estava morto?...Morto?... eu olhei mais uma vez para aquele corpo machucado, isso era impossível, até uma hora atrás estávamos brigando, brigando como sempre fizemos... quando me dei conta estava chorando feito criança abraçada naquele corpo que sempre me protegeu, o homem que sempre me culpou e que eu sempre admirei... eu o beijei contra a testa, já não era nem a chuva que o molhava e sim minhas lágrimas, minhas simples lágrimas, meus simples soluços e agonias que nada valiam perante uma vida. O peso de culpa estava abraçando meu ser, meu longo caminho de vidro se quebrou me deixando sem estrada para seguir. Uma das cordas de minha essência havia se rompido, como se um arco-íris estivesse perdendo uma das cores.

- ZOROOO!! FALA COMIGO!! QUALQUER COISA!!

Senti uma mão quente sobre meu ombro, Robin olhava para mim com olhos tristes, todos atrás de mim estavam cabisbaixos, todos ali não conseguiam olhar com franqueza em meus olhos, não via Chopper, estremeci. Eu não sabia mais o que era real ou não, uma fraqueza invadiu meu corpo, cai de vez contra o chão, deixei a chuva lavar meu corpo, agarrei-me ao seu corpo gelado, o cheiro e o sangue de Zoro estava impregnado a mim... foram as últimas sensações que meu corpo recebeu antes de minha mente apagar.