A Saga de Ares - Santuário de Sangue escrita por Ítalo Santana


Capítulo 52
Capítulo 49 – Guerra em Jamiel: O santo de Virgem


Notas iniciais do capítulo

Ares está ciente da situação de seu exército em Jamiel e envia reforço. Antíope, filha de Ares e a nova rainha das amazonas, chega em Jamiel após a morte de sua irmã. A semideusa está decidida a matar todos os cavaleiros sobreviventes e vingar Hipólita, mas tem seu caminho bloqueado por um Cavaleiro de Ouro. Em Senkyou, a Terra encantada, a deusa Ênio inicia um confronto acirrado com o deus celestial da guerra e seus Taonias.



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Capítulo 49 – Guerra em Jamiel: O santo de Virgem


Bluegraad — Túnel secreto no subsolo das masmorras do Palácio – 1º dia

         O caminho era escuro e bastante úmido. Hyoga formou um cristal de gelo na palma da sua mão que refletia a luz do seu cosmo, e assim iluminava um pouco o caminho, revelando paredes de pedras escuras e cobertas por mofo.

         Freya parou diante de uma entrada que dava para uma pequena sala escura. Ela estreitou os olhos ao ver várias silhuetas curvadas no chão, como se estivessem sentados. Ela acenou para que Hyoga iluminasse o ambiente, e ao fazer descobriu que as silhuetas eram na verdade dezenas de corpos esqueléticos com pele morta e enrugada preservada pelo frio. Eles estavam acorrentados e em seus rostos havia expressão de pavor.

— Por Odin! — disse ela surpresa, levando a mão até a boca.

— Assim como em Asgard, Bluegraad também sabe cuidar de seus prisioneiros. — disse Hyoga, que um dia foi preso e torturado na prisão do Palácio Valhalla. — Vamos! A saída não está longe. Esse caminho vai nos levar até o interior do palácio.

Eles caminharam até encontrar uma escada de pedras que levava para uma porta quadrada. Como a porta de um alçapão. Hyoga a levantou, e a forte luz do ambientou inundou o subterrâneo e os cegou. Antes que dessem conta havia dezenas de soldados vestidos com armaduras azuis e armados com lanças afiadas apontadas para eles.

— Mas vejam só o que temos aqui. — disse uma mulher, com trajes azuis que pareciam roupas militares e um manto marrom de pele de raposa preso ao ombro. Seus cabelos eram verdes e curtos, sua pele era clara e seus olhos azuis e frios pesavam para Hyoga e as Valquirias. — Parece que encontramos alguns ratos. Vocês estão presos!

 Os soldados se apressaram para segura-los antes que tentassem algo. Correntes prateadas marcadas com símbolos azuis foram postas nos punhos de Freya e das valquírias, mas hesitaram coloca-las em Hyoga.  Pareciam ter medo de chegar perto dele.

— Não acharam que poderiam entrar sem serem notados, não é?! Sabiam que invadir o Palácio Azul é um crime gravíssimo?! Pela sua indumentária dourada eu diria que é um Cavaleiro de Atena. Um dos Doze Cavaleiros de Ouro, sendo mais exata. Já essas que lhe acompanham... Vocês são de Asgard? Valquirias de Valhalla?! E a situação só piora.

— Elas estão comigo. Levem-nos até o governador de vocês! — disse Hyoga.

— Com certeza iremos. Guardas! Prendam ele também e comuniquem ao Senhor Alexei! Avisem a ele que um Cavaleiro de Ouro invadiu Bluegraad acompanhado por raposas traiçoeiras enviadas pelo palácio Valhalla.

— Espere um momento! Não temos tempo para isso!  — disse Hyoga, resistindo as mãos dos soldados. — Bluegraad foi invadida pelos berserkers de Ares! Tenho que falar com Alexei o mais rápido possível!

A mulher fez uma expressão de reprovação e colocou a mão no rosto de Hyoga, apertando-o.

— Escuta aqui! Como se já não bastasse você invadir o palácio, ainda ousa gritar dizendo que guerreiros de Ares estão na cidade? O que você é? Um anarquista vestindo uma armadura de ouro enviado pelo Santuário para propagar o caos aqui em Bluegraad? Acha que não estamos cientes de quem entra e quem sai na cidade? Portanto, abaixe o seu tom de voz. Você já está bastante encrencado. Não piore a sua situação. Não pense que só porque é um Cavaleiro de Ouro tem algum tipo de autoridade aqui.

Hyoga virou o rosto com força para sair do alcance das afiadas unhas.

— Então vocês sabem sobre os berserkers?

— Não lhe devo satisfações, mas... Nós da segurança, sim. O povo da cidade, não. E queremos manter assim até que os berserkers saiam de Bluegraad.

— E porque sairiam? O que eles vieram fazer aqui em Bluegraad?

— Isso já é uma informação que não cabe a você.

— Como eu disse antes, não tenho tempo para isso! — disse tentando se livrar das correntes, mas todo seu esforço se mostrou inútil.

— Desista. São correntes que prenderiam até mesmo um deus. Somos uma civilização antiga assim como o Santuário, só que mais enraizados. Estamos vigiando um dos três grandes deuses do Olimpo. Não acha que temos alguns brinquedinhos para usar se for necessário? Agora, em silêncio e sem resistência, levarei você e elas até o Senhor Alexei. Tente fazer algo contra ele... E arranco a sua cabeça antes que pisque duas vezes.

—...—


Jamiel – Horas antes da luta entre Kiki e Hipolita

         Ênio seguia entrando cada vez mais fundo na floresta escura a procura de Edgard, mas se quer conseguia sentir a presença do Taonia. Era como se ele tivesse apagado a própria existência. Além disso, havia algo de estranho ali. A sensação de alerta crescia cada vez mais na medida em que ela avançava. E quanto mais ela corria, mais tinha a impressão de que talvez nem estivesse saindo do lugar, como se andasse exaustivamente no mesmo lugar.

         Ela parou e olhou em volta. Notou que o vento não soprava e que as folhas não balançavam. Era tudo muito quieto e escuro. A luz da lua era fraca, quase apagada, como se ela quisesse fugir da floresta.

         — Por acaso está tentando me prender em uma armadilha, capitão? — perguntou, mas não teve resposta. O silêncio continuou absoluto. — Não teste a minha paciência. Se acha que eu vou ficar perdendo tempo correndo atrás de você, está muito enganado. — o cosmo rubro de Ênio se elevou e girou ao seu redor formando uma cúpula. — Basta que eu destrua tudo!!

A cúpula de cosmo cresceu e se espalhou varrendo tudo pelo caminho. A terra se desprendeu e explodiu, fazendo tudo ir pelos ares e erguendo um denso cogumelo de poeira e cosmo. O desabamento dos destroços gerou um forte de tremor de terra e a nuvem de poeira se espalhou.

         O que restou foi uma planície de terra revirada com troncos de arvores retorcidas e em pedaços. Não havia sinal da presença de Edgard. O taonia havia sumido. Talvez morto pela expansão do cosmo da deusa, mas Ênio não acreditava nisso. Foi então que algo estranho aconteceu. O vento finalmente soprou, e dessa vez soprou forte, mas diferente da noite fria o vento que soprou era quente como uma respiração profunda e veio acompanhado de uma presença poderosa.

         Um forte bater de asas seguido por uma forte respiração deu a deusa a impressão de ter um enorme dragão sobrevoando atrás dela, mas ao virar-se deparou-se com um homem de semblante sereno, mas ao mesmo tempo rígido. Seus cabelos brancos eram longos e esvoaçantes, e seus olhos eram dourados como uma moeda de ouro. Não havia pupila. Era apenas a íris. Seus pés e braços estavam cobertos por uma indumentária de escamas brancas com bordas douradas. O resto do corpo estava coberto por uma roupa branca esvoaçante de manga longa e trazia uma katana na cintura.

E ele não estava sozinho. Alguns metros atrás dele havia três Taonias. Dois homens e uma mulher, e cada um vestia armaduras as quais eles chamam de “tatuagens”.

         — Veja o tipo de marca que esse seu cosmo perverso deixou nesta terra sagrada. E é esse o tipo de ferida que vocês pretendem deixar na Terra. Deuses malignos como você devem ser erradicados. — a sua voz era tão serena quanto sua presença, mas ao mesmo tempo imponente.

         — Quem é você e onde está aquele Taonia desgraçado? — disse desconfiada.

         — Edgard foi apenas uma distração. Desde o início a nossa intenção era dar suporte aos cavaleiros com alguns soldados, e arrastar você até os arredores de Senkyou.

— O que foi que você disse?! — a deusa ficou surpresa.

— Queríamos trazê-la sozinha até aqui e ele fez isso atraindo você. De uma forma ou de outra, ele a levaria para a floresta, mas você mesma acabou fazendo isso. E se fosse um pouco mais atenta teria desconfiado que uma floresta tão verde e viva estava em um local tão inóspito como Jamiel.

— Então aqui é... Senkyou!! — Ênio estreitou os olhos e viu ao longe uma cidade entre altas montanhas cercada por rios e árvores. — A cidade espiritual!! Mas... O que espera me trazendo até aqui?

— Não lhe parece óbvio?

O homem desembainhou a katana que carregava em sua cintura. Era longa e levemente curvada, com a palavra 龍 gravada em dourado.

“Dragão”. — leu a deusa, esboçando um fino sorriso em seguida — Claro... É você. Ora, ora... Não sabia que eu estava diante do grande deus dragão. Seiryu, um dos quatros deuses celestiais da China. Então suponho que aqueles três ali atrás sejam Taonias que representam os signos do zodíaco chinês que são regidos por você. Tigre, Dragão e Coelho. Que bom que está aqui. Assim já me poupa o esforço de ter que atravessar a cidade só para matar você!!

Ênio girou sua espada e avançou contra o dragão branco, mas o deus se defendeu usando sua espada. Os Taonias deram um passo para intervir, mas o deus ergueu a mão sinalizando para eles não interferir.

         — Não vim até aqui para lutar com você. Não serei eu o seu adversário. Aquele que irá derrota-la ainda se aproxima, seguido por seus servos. Vim até aqui para garantir que você não chegue à cidade nesse meio tempo.

— Pode não ser eu a chegar na cidade, mas com certeza outros virão.

— Com essa mesma convicção eu lhe garanto que não. A não ser que Ares esteja disposto a mirar todo o seu exército contra nós. O que eu acho difícil de acontecer, pelo menos agora, já que ouvi boatos de que ele declarou guerra à Atlantida. — a katana brilhou e disparou rajadas de cosmos que obrigou Ênio a recuar. — Depois que você e os berserkers que estão em Jamiel forem derrotados, irei selar a China e traze-la para cá. Deixando-a livre de qualquer ameaça. Se os atlantis, e posteriormente Atena, não conseguirem deter Ares, nós iremos!

— Ah, claro. — disse a deusa sorrindo e com tom debochado. — Irá deter Ares, algo que Atena peleja a séculos para conseguir. Você e seus Taonias covardes são ratos perto do exército do meu senhor. Já lhe adianto que morrerá miseravelmente. Todos vocês.

O céu trovejou e nuvens de tempestades se formaram. O clima que parecia ser mais agradável com a presença calorosa de Seiryu, se tornou frio e foi tomado por ventos ferozes que pareciam rugir. As folhas das arvores que haviam caído, perderam sua cor verde ficando amareladas, murcharam e se desprenderam unindo-se ao vento forte. Das nuvens carregadas outro trovão rugiu e em seguida um raio azul desceu feroz.

A expansão de um cosmo azul acompanhado de raios afastou a nuvem de poeira. E em pé, acompanhado de três Taonias, estava um homem de cabelos negros trajando uma indumentária branca com traçados azuis e seu elmo tinha o formato de cabeça de tigre. Seus olhos eram azuis, mas sem pupila. Assim como os de Seiryu, havia apenas a íris. Ele segurava em sua mão direita a mesma lança que Edgard havia usado antes. 

— Quando o Outono chega, a primavera deve se retirar. — disse Seiryu, dando as costas para Ênio e se dirigindo aos três Taonias que faziam a sua guarda. — E trouxe consigo a espada forjada para conter a carnificina. Lhe vejo mais tarde, Byakko.

O cosmo branco e dourado de Seiryu envolveu ele e seus taonias e desapareceu subindo ao céu na forma de um dragão branco.

 — Então você é Byakko? O deus celestial da guerra. Tantos séculos de existência e nunca nos conhecemos. — a deusa olhou para a mão de um dos Taonias e notou que ele trazia com sigo uma katana dentro de uma bainha negra. — Sinto cheiro de sangue vindo dessa katana. Um cheiro tão forte quanto a da espada que eu carrego.

— Essa katana se chama Muramasa. — respondeu Byakko, com uma voz grave. — A katana de sangue também conhecia como espada demônio. É uma katana proibida de ser utilizada em guerra e só deve ser desembainhada uma vez e com um único propósito. Selar demônios. Como você.

— Vejo que você tem a mesma esperança ilusória que aquele dragão velho. Me derrotar. Eu acabarei com você e depois brincarei com seus Taonias antes de ir para a cidade e matar todos!!

— Tente.

Byakko estendeu sua lança e disparou uma rajada de raios que formaram anéis de cosmo na medida que avançava. Antes que o golpe a acerta-se, Ênio girou sua espada e cravou no chão, erguendo uma barreira que bloqueou o ataque em uma explosão. A nuvem de poeira nem havia abaixado e a deusa arrancou a espada do chão e avançou contra o deus da guerra. Certa de que o pegaria desprevenido, mas teve seu avanço detido quando círculos azuis surgiram formando e fechando um círculo maior que a restringia.

O corpo de Ênio ficou pesado e ela se curvou como se uma pressão esmagadora caísse sobre ela. A pressão começou a afunda-la e uma cratera ia se formando.

— Meu corpo... O que você esta...

Ela franziu o cenho ao notar que aqueles círculos não haviam sido formados por Byakko. Havia um cosmo se elevando, mas não era o dele. A força da técnica vinha de alguém que estava atrás de Byakko. Um dos Taonias. Vinha de um homem de cabelos cinzas e expressão serena. Sua tatuagem, a armadura que ele vestia, representava o Galo. Um dos signos chineses que é regido por Byakko.

— Vai colocar seus subordinados para me atrapalhar? — a deusa sorriu debochando. — Entre as suas pernas lhe faltam culhões para me enfrentar no um a um? Mas que covarde.

— Silêncio. Se fossemos lutar poderíamos estender esse combate para níveis que colocariam o equilíbrio de Senkyou em risco. Vou encerrar isso aqui e agora.

O deus segurou firme em sua lança e avançou para dentro do círculo. O que ele não esperava é que Ênio se levantaria após fingir ter sido pega pela técnica do Taonia. Ainda que seu corpo pesasse bastante, não era suficiente para prende-la no chão, mas ela sentia que sua velocidade havia diminuído um pouco. Mesmo assim, os dois entraram em confronto direto.

Se a batida da lança e da espada entre Edgard e Ênio era de proporção esmagadora, o choque entre os dois deuses era incomparável. O manejo da lança nas mãos de Byakko conjurava raios que o acompanhavam, rasgando o solo e levando pressão esmagadora de cosmo para todos os lados. Os raios acertavam Ênio que era obrigada a deter o avanço da lança, caso contrário seria acertada em cheio pelos dois ataques simultâneos. Mas ela sabia que se continuasse nesse ritmo iria perder. De nada adiantava parar a lança se seria atingida pelos raios devido a guarda aberta. Depois de consecutivos ataques ela iria acabar cedendo e virando alvo fácil para um ataque definitivo. Ela teria que deter os dois ataques paralelos, mas para isso precisaria se livrar da restrição do Taonia.

Byakko atacou novamente, mas dessa vez a deusa optou por desviar da lança e dos raios enquanto passava direto pelo deus. Ela foi em direção ao Taonia mirando o peito do guerreiro, mas freou seu ataque quando colunas de fogo explodiram do chão. Não era um fogo comum. Era um fogo verde e azul que emanava um calor insuportável. Ela tinha a impressão de que sua pele poderia derreter se chegasse mais perto.

— Não dará um passo para fora desse círculo — disse o Taonia. Sua tatuagem amarronzada com traçados laranja representava o signo do macaco, e era ele que segurava a katana Muramasa.

— Macaco desgraçado!! — urrou a deusa. Os olhos dela ficaram completamente vermelhos e seu cosmo explodiu. As colunas de fogo estremeceram e os círculos azuis trincaram. — Saiam do meu caminho!!!

Ela apontou a espada e disparou uma rajada de cosmo que se chocou com um dos círculos e começou a trinca-lo. Ela estava quase conseguindo rompê-lo quando o terceiro Taonia, o qual representa o signo do Cão, disparou uma corrente em direção ao círculo. A corrente atravessou no centro do círculo e envolveu a mão da deusa. Ela ergueu a mão para romper a corrente, mas foi detida por outra corrente que se materializou vindo de um dos círculos na lateral. Em seguida o mesmo se repetiu vindo dos outros círculos, e logo seus membros e tronco estavam presos. Mas foi quando a espada caiu de sua mão que ela se sentiu, pela primeira vez naquele confronto, verdadeiramente encurralada.

— Ênio!!

Gritou Byakko. A deusa virou o rosto a tempo de ver o deus saltando e apontando a lança para ela e em seguida disparando uma rajada poderosa de raios. Ela gritou e se contorceu enquanto era eletrocutada. As correntes esquentaram e ela as balançava desesperadamente tentando fugir.

— Hóu! Agora! — gritou Byakko.

O Taonia de Macaco estendeu a mão manipulando as colunas de chamas. Elas pareciam ter criado vida, como se fossem serpentes circundando a vítima antes de dar o bote. O ataque foi simultâneo, resultando em uma grande explosão que ergueu uma devastadora coluna de fogo.

Os gritos de Ênio atravessavam a coluna de chamas e superava o som ensurdecedor daquele turbilhão. O desespero para fugir dali fazia as correntes se agitarem cada vez mais. Todas as tentativas de fugir das chamas foram frustradas pelo Taonia que manipulava as correntes. Ele garantia que a deusa não sairia de lá. As chamas não eram comuns e a temperatura era incomoda até para quem estava apenas acompanhando. Mesmo o calor sendo concentrado para não se espalhar, o ar em volta da coluna estava superando mais de 12.000º C. Duas vezes mais que o calor emanado pela superfície do sol. Isso significa que no centro da coluna a temperatura poderia estar quatro vezes maior.

Depois de bastante insistência e resistência, os gritos sessaram e as correntes relaxaram e cederam. Byakko fez sinal para que Hóu desfizesse as chamas e assim ele fez. O local onde a coluna se ergueu estava borbulhando. Um lago de lava se formou e Ênio estava no centro dele, com seu corpo em carne viva e severamente queimada. Seus cabelos caíram e seu crânio estava exposto. Em seu rosto restou apenas um olho em meio a carne e ossos expostos. Sua ônyx prendeu em seu corpo, fundindo-se na carne. Um humano comum teria virado cinzas, mas o ikhor que corre em suas veias diminui o dano, mas não o suficiente para ela se erguer.

A tentativa de se levantar foi inútil. Os ossos das pernas estralaram e trincaram, ameaçando partir-se ao meio. Seus músculos estavam morrendo e já não garantiriam forças para dar continuidade ao duelo.

Hóu entregou a katana a Byakko, e o deus a desembainhou. Um cosmo roxo e sinistro emanou dela como se estivesse com uma fome insaciável e sendo atraído por Ênio.  

— A sua batalha contra Senkyou termina aqui. Mas acho que isso você já percebeu. Foi um erro de vocês apontarem as suas lanças contra nós e nos subestimar com tão pouco poder de batalha, mas isso não é de todo mal. Ainda assim sua persistência lhe trouxe até aqui, e por isso não é à toa que você lidera uma parte do exército de Ares. — ele cravou a Muramasa no centro do peito da deusa até a Katana atravessar o corpo e romper nas costas. Não houve grito ou gemido. Talvez ela se quer sentisse dor. A essa altura a percepção dos nervos já não atuava como antes. — O que também termina aqui é a vida desse seu corpo. Nunca mais voltará a usá-lo, pois sem a alma ele será submetido ao processo natural da decomposição, e isso lhe obrigará a escolher um corpo humano na próxima vez que vier se manifestar na Terra. — O cosmo de Ênio começou a ser drenado pela katana e com isso a essência da sua vida. A sua alma. Simultaneamente seu corpo começou a se decompor, reduzindo a cinzas até que desabou por completo e restou apenas a katana na mão do deus. — Mas quanto a isso... Iremos garantir que você demore séculos para retornar.

O deus da guerra devolveu a katana para a bainha e a selou com o seu cosmo em forma de selo.

— E o que faremos com o campo, senhor? — perguntou o Taonia de Galo. — Ele foi devastado.

Byakkou virou-se e olhou para trás. Para onde antes Seiryu estava. Havia um lírio branco nascendo em meio a uma porção de grama verde e bastante viva.

— A primavera já passou por aqui e deixou sua semente. Logo irá florescer. Mas duvido muito que onde a deusa caiu floresça alguma coisa. É uma cicatriz que ficará ai eternamente. Vamos! Temos que levar a Katana para um local seguro e darmos início ao isolamento completo da China. Seiryu deve ter ido para a sua posição. Genbu e Suzaku também devem estar me aguardando.

— E quanto a Jamiel e Rozan? — perguntou o Taonia de Cão.

— Jamiel está entre a China e a Índia. Os cavaleiros terão acesso indo pelas montanhas indianas. Já Rozan... A torre na montanha que sela os espectros de Hades será vigiada por Suzaku.

— E os cavaleiros irão concordar com isso, senhor? — questionou Hóu.

— Descubra isso para mim. Vá até Jamiel e anuncie o plano. Diga que começará logo após o amanhecer. Se eles estiverem com problemas com algum berserker, dê um jeito. Não temos muito tempo. Ares pode mandar reforços.

— Sim senhor.

—...—


Grécia — Santuário de Ares — Templo de Ares — Manhã do 2º dia

— E então, o que você fez? — perguntou Dionísio, que andava no corredor do Templo ao lado de Ares.

— Enviei Antíope para dar suporte.

— E? Não me diga que enviou apenas ela! — o deus da guerra caminhou calado. — Sério Ares? Acha que é suficiente?

— Enviei uma semideusa e isso vale mais que muitos berserkers. Estou me preparando para atacar Atlantida. Não posso ficar deslocando berserkers e soldados para Senkyou. Uma deusa e duas semideusas deve ser suficiente.

— Você sabe que Senkyou pode ter sido avisado assim como Asgard. E se seu exército perder?

Ares parou diante da porta e olhou para Dionísio.

— Ai deixamos eles acharem que ganharam e depois invadimos novamente. Mata uma boa parte e escraviza a outra. Como sempre faço.

A porta que dá para a lateral do grande salão do trono foi aberta e logo um forte cheiro metálico tomou a narina dos deuses. Ao entrarem no salão se depararam com dezenas de corpos de mulheres mutiladas em meio a um lago de sangue que escorria entre as brechas do piso. Não dava mais para distinguir o que era tapete e sangue. Nas paredes e colunas também havia bastante sangue, assim como mais corpos pendurados nos ganchos onde antes estariam as tochas para iluminar o recinto.

Ares andou entre os corpos um pouco surpreso. Eram as suas concubinas. As damas que o acompanhavam a poucos minutos atrás. Os pescoços delas estavam quebrados e alguns de seus membros haviam sido arrancados. Pareciam bonecas quebradas depois de passarem pelas mãos de uma criança furiosa.

— Gostou? — perguntou Afrodite, sentada no trono.

Ela estava acompanhada de Deimos, em pé a sua direita, e Alceu, o berserker de pantera, que estava ajoelhado a sua esquerda e com as garras à mostra meladas de sangue. A borda do seu vestido estava encharcada de sangue e havia respingo em seus braços, rosto e cabelo.

— O sangue não combina em sua pele, Afrodite. — disse Dionísio, com um leve sorriso no rosto.

— Foi você quem fez isso? Mas... Porquê?

— Não cabe mais de uma mulher em nossa cama, Ares. Já lhe disse isso antes, mas parece que você não levou a sério. Da próxima vez, serão os seus subordinados que estarão espalhados por todo o Santuário. — ela caminhou até ele e colocou as mãos em seus ombros, se aproximando e cochichando no ouvido do deus. — E você sabe que eu não preciso de um exército para isso. Sou tão antiga quanto qualquer um aqui. Em meu sangue corre o ikhor de Uranos. Não se esqueça disso, querido. Leve outra mulher para a sua cama, e eu sozinha reduzo essa guerra santa a uma brincadeira de criança. 

Ela passou pelos dois deuses e fechou a porta com um estralar de dedos.

A frase “O amor mata” nunca fez tanto sentido em todos os meus séculos de vida. Mas veja que engraçado. Ela deixou para você um caminho repleto de corpos e sangue. Cuidado para não cair entre os cadáveres.

— Já andei por caminhos mais ensanguentados que este. — na medida em que Ares caminhava até o trono, seu cosmo tocou no sangue derramado. E como fogo quando toca no álcool ou na palha seca, ele queimou e se alastrou. Eram chamas vermelhas e vivas sendo alimentada pelo sangue enquanto cremava os corpos reduzindos a cinzas. — E em breve andarei novamente.

 —...—


Fronteira entre a China e a Índia — Jamiel — Manhã do 2º dia

— Quem é você? — perguntou Shalom, que segurava Kiki apoiando-o em seu ombro.

A mulher era aparentemente mais nova que Hipólita, mas de semblante tão duro quanto o da rainha derrotada. Seus cabelos alaranjados na altura dos ombros eram ondulados e dois cachos, um de cada lado, caiam sobre seus ombros. Sua pele era clara e seus olhos eram idênticos ao de Hipólita. Olhos vermelhos enegrecidos em meio a escleras negras.  Ela estava trajando uma Onyx negra com uma capa vermelha presa ao ombro e trazia uma espada em cada mão.

— Pelo visto... — a berserker olhou para o corpo de Hipólita caído no chão em uma poça de sangue. — Sou a próxima na linha de sucessão da rainha das amazonas. Meu nome é Antiope. Filha de Ares e irmã mais nova de Hipólita. Antiope de Taraxippus.

— Uma semideusa. — Cochichou Kiki. — Ela deve ter sido enviada como reforço. Esse cosmo... É tão poderoso quanto o de Hipólita. Não podemos deixar que ela passe desse ponto.

— Eu cuidarei dela. Não se preocupe.

— É meu dever proteger Jamiel. Desculpe-me por fazer você lutar em meu lugar.

— Não tem problema. — disse se afastando de Kiki. — Eu vim aqui para ajudar. Vá para o palácio. Avise a Kastor e cuide dos seus ferimentos.

— Não! — disse a berserker.

Ela deu um passo e em seguida já estava diante de Kiki.

— Mas como?! — disse o ariano, surpreso. — Se moveu tão rápido que eu mal pude ver!!

— Pelo estado em que você está... Foi você quem derrotou a minha irmã?! Um mero Cavaleiro de Ouro que acabou de sair das fraldas? — ela deu um sorriso abafado. — Vou matar você para limpar a honra da minha família.

Antíope elevou o cosmo e lançou um ataque com sua espada, mas ele foi edito por um escudo em forma de vitral angelical.

— Seu oponente sou eu. — disse Shalom. — E não ele. Deixe-o ir e lute comigo.

— Meu oponente será quem eu quiser... Virgem, não é? Quer servir de sacrifício para poupar seus amigos?! Estará apenas adiantando o seu fim.

— Eu insisto. Lute comigo, e deixe-o ir.

Antíope olhou para Shalom com os olhos cerrados. Ele estava confiante e tranquilo demais. Não transmitiu nenhuma expressão de preocupação desde o mesmo em que ela chegou em Jamiel. Toda aquela convicção que fluía dos seus olhos castanhos acabou atraindo o interesse da semideusa, que esboçou um singelo sorriso no canto da boca.  

— Está bem. Vou deixa-lo ir. — disse guardando as duas espadas nas costas. — Está morrendo mesmo. Assim como outros que estão lá dentro. Posso escutar daqui os corações acelerados dos seus amigos. Batendo rápido e forte, tentando desesperadamente salvar os companheiros feridos em batalha.

Ao ouvir aquilo Kiki correu para o palácio ignorando todas as dores e cansaço, temendo perder seus irmãos de combate.

— Me impressiona que ainda tenha tanta gente viva. Mesmo após Ênio e minha irmã com as suas amazonas passarem por aqui. Quando fui convocada até pensei que havia oponentes poderosos para exigir um reforço do meu nível, mas... Olho para vocês e vejo apenas um monte de abelhas perdidas zumbindo para todos os lados depois de terem perdido a rainha. Quantos são agora? Tem você, o Áries e... Você disse Kastor, não foi?! Se não me engano, ele é o Cavaleiro de Gêmeos. Então são três Cavaleiros de Ouro, alguns ratos de prata e de bronze. Ah! E ainda tem esses soldados taonias que não passam de peso nos ombros para você. — ela ergueu o braço direito concentrando uma grande massa de cosmo — Pois bem, vou fazer o que Ênio e minha irmã não fizeram. Vou mata-los. 

— Não enquanto eu estiver aqui.

— Sua autoconfiança pode até mascarar a situação, mas você não é capaz de me deter. Sua insolência irá mata-lo sem que eu precise me esforçar para isso. Castigo de Hipólito!

Da massa de cosmo saltou dezenas de vultos negros de olhos vermelhos e com forma de cavalos. Eles não eram sólidos, eram como se fossem feitos de fumaça. Os cavalos relincharam e galoparam em direção a Shalom e os soldados. O santo de virgem estendeu o braço para criar uma barreira, mas deteve seu movimento quando os cavalos simplesmente desapareceram no percurso. Como se a técnica de Antíope tivesse sido desfeita pelo forte vento que soprou. Mas não foi isso que aconteceu. Shalom e os taonias foram acertados violentamente por incontáveis ondas de impacto invisíveis que os arrastaram de forma brutal e os arremessaram para o alto.

Mesmo com a armadura de ouro, Shalom sentiu os danos do golpe e se levantou com o corpo pesado. Havia pequenas rachaduras em sua armadura nos pontos em que foi acertado. Já os taonias não tiveram a mesma sorte. Todos os soldados estavam mortos. A maioria deles com a cabeça esmagada. Suas indumentárias pareciam ter sido pisoteadas por uma manada de elefantes, o que acabou provocando lesões internas também.

— “Eu... Eu não consegui ver o golpe! Eu o senti, mas... Será que seu golpe supera a velocidade da luz? — pensou Shalom Por um momento eu vi o ataque na minha direção, mas de repente... sumiu. Porém... Eu tive a impressão de escutar cavalos relinchando enquanto estava sendo atacado.

— Um reles cavaleiro de ouro não é capaz de me impedir. Você teve a proteção da sua armadura de ouro, mas provavelmente morrerá no segundo ou terceiro golpe. Será que o seu amigo, o Cavaleiro de Áries, sobreviveria ao primeiro ataque? Hm... Duvido muito. A armadura de ouro dele está tão danificada que ficaria em pedaços. Assim como seu corpo ferido. Os soldados já foram. Agora resta você. Depois partirei para o palácio.

— Já disse... Não vou permitir isso!

— Você não foi capaz de proteger os pobres soldados. Tão pouco terá sucesso em proteger os outros vermes da sua laia. Cadáver não precisa permitir nada! Seu nome é Shalom, não é?! Agora lembrei... Soube que você é de uma religião oriunda do Oriente médio, mas mesmo assim se tornou um Cavaleiro de Atena. Com a sua deusa morta, apenas lhe resta o deus antigo que você venera. Invoque-o. Chame-o para que ele lhe proteja. Talvez seja a sua única esperança.

— Não zombe da fé de um homem, pois é dela que ele tira suas esperanças para vencer.

— Tolo! Um homem deve confiar apenas em suas próprias capacidades, e não se agarrar as divindades. Agora, receba novamente o meu golpe! Castigo de Hipólito!

Mais uma vez os cavalos fantasmas surgiram e galoparam, desaparecendo em seguida. Rapidamente Shalom estendeu a mão e disparou o Angeli Specularibus para se defender, formando um vitral angelical de defesa, mas foi inútil. Ele recebeu o golpe mais uma vez e foi arremessado novamente.

“A minha defesa foi inútil! A técnica dela por acaso atravessou o vitral?! Não! Nem mesmo uma rachadura foi formada. Mas como?!  A não ser que...

— Mas que ridículo. — disse Antíope, se segurando para não gargalhar. — É o cavaleiro de ouro mais patético que eu já enfrentei. O que houve Shalom? Por acaso não consegue ver o meu golpe ou compreende-lo? Se quer consegue bloqueá-lo. Por mais que você apresente um cosmo poderoso, vejo você despreparado para o nosso combate. Você já está a um passo de morrer e se quer chegou perto de entender o meu golpe. Talvez esteja na hora de tirar da sua fé a sua vitória. Caso contrário, vou dar um fim a sua vida... e farei isso com minhas próprias mãos.

Antíope avançou tão rápido que Shalom se quer teve tempo de se defender. Assim como Hipólita, o avanço da berserker deixava um rastro de cosmo e rasgava o solo em seu avanço. Ela cerrou o punho e desferiu um soco na barriga do santo de virgem, lançando-o contra a parede do alto planalto e fazendo-o cuspir sangue.

— Qual o seu problema, Virgem? Não sabe lutar ou não quer? Não vi você erguer um punho contra mim ainda.

— Luta corporal não faz o meu estilo. — respondeu serenamente. — Sou apenas um pescador escolhido para ser um cavaleiro. Nunca precisei levantar a mão contra alguém.

— O quê?! Então você nunca treinou?! Se tornou um cavaleiro de ouro sem passar por um rigoroso treinamento?! Está brincando comigo, não é? — ela sorriu, incrédula. — Eu não acredito nisso. Meu oponente é um reles pescador fingindo ser um cavaleiro de ouro. Que piada de mal gosto. Mesmo que um cavaleiro de ouro nasça predestinado a tal cargo, precisa de um treinamento para poder ser habilidoso em combate e dominar o cosmo. Como você conseguiu tanto poder sem passar por isso? Dessa forma você não passa de uma criança que não pode dar conta dos poderes que tem.  

— Não sei explicar. Talvez eu seja um prodígio. Apenas nasci com esse poder, mas sempre o suprimi por achar que não era normal. Depois que vesti a armadura de virgem esse poder simplesmente explodiu. Era como se em toda a minha vida eu tivesse criado uma barreira no rio, mas ai essa barreira desmoronou e o rio fluiu com força. Dessa forma.

Shalom estendeu a mão e disparou uma rajada de cosmo que pegou Antíope de surpresa. A berserker resistiu com os braços fechados frente ao corpo e saltou para trás, aterrissando com força.

— Mas um combate corpo a corpo nem sempre é necessário para vencer. — continuou Shalom. — Um bom combate pode ser decidido por paciência e astucia. É verdade que estou tendo dificuldade para compreender o seu golpe, minha defesa aparentemente não funciona e também não tem como desviar de algo que eu não vejo, mas confesso que estou interessado em descobrir. Duvido que você explique, então quero que me ataque novamente.

— O que disse?!

— Me acerte novamente. Você disse que seu golpe me mataria no segundo ou terceiro ataque. Vejo que, por mais que eu esteja bastante ferido e com a armadura danificada, ainda estou vivo. Talvez o terceiro golpe acabe com tudo.

— Só pode estar louco. Está vivo, mas não por muito tempo. O terceiro golpe com certeza irá lhe derrubar de uma vez por todas. E já que faz tanta questão de morrer, eu irei realizar o seu desejo. O seu despreparo e descaso serão o preço que você pagará com a sua vida. Esse será o último golpe! Depois de recebe-lo certamente levarei o seu cadáver para os seus amigos. Castigo de Hipólito!

— Com certeza será o último golpe.

...

Kiki entrou correndo dentro do palácio e logo viu Johan deitado no chão, em cima de um lençol cor de pergaminho, sendo atendido por Miguel, que com as mãos tremulas e com os olhos cheios de lagrimas cuidava do amigo.

 O cavaleiro de corvo gritava e se contorcia de dor todas as vezes que Miguel passava em seu ferimento um pano molhado que ele embebecia com ervas. Ele implorava para que Johan aguentasse mais um pouco, pois precisava limpar o ferimento, mas não adiantava e Johan se debatia ainda mais. Láthos de Sagita tentava ajudar, segurando ele o máximo que podia enquanto amassava algumas ervas anestésicas em um prato de barro.

— Acabe logo com isso!! — suplicou Johan.

— Você tem que aguentar mais um pouco. — pediu Miguel. — Não posso cuidar do ferimento sem antes limpa-lo. Você pode pegar uma infecção e morrer.

— Como ele está? — perguntou Kiki.

— Conseguimos estancar o sangramento com o cosmo, mas... — as palavras de Miguel se perderam na garganta. Doía ver o amigo, a quem ele também considera como um irmão, naquele estado. Hipólita foi desumana ao arrancar os olhos de Johan e a única coisa que Miguel desejava além de salvar o amigo era poder se vingar, mas isso ele sabia que não seria mais possível, pois Hipólita estava morta.

— O mais difícil está sendo limpar a cavidade. — completou Láthos. — Se fecharmos o ferimento do jeito que tá...

— Façam o que deve ser feito. — disse Johan, entre os dentes. — Apenas acabem logo com isso.

— Onde está Marin? — perguntou Kiki.

— Está lá em cima. No primeiro andar. O senhor Kastor está cuidando dela. — respondeu Miguel.

Kiki correu em direção as escadas, mas parou no primeiro degrau quando um manto branco no chão do cômodo ao lado chamou sua atenção. Ele foi até o recinto e viu um corpo coberto deitado no chão.

Láthos olhou para Kiki e viu a dor que o ariano sentia. O jovem cavaleiro de bronze de Golfinho morreu confiando em uma promessa prematura feita por Kiki, e isso doía como uma facada para ele.

— Senhor... Não pode se martirizar por isso. O senhor não teve a intenção de...

— Eu falhei com ele. — disse cerrando o punho. — Eu deveria ter protegido ele! Johan... Marcel... Marin... Todos estão nessa situação por minha causa. Não fui forte o suficiente para protege-los. Se o Mestre Mu estivesse aqui... Ele era poderoso o suficiente para resolver tudo isso sem que vocês se ferissem dessa forma. Eu...

— Está enganado, senhor. — disse Johan, lutando contra a dor que ainda sentia. — O senhor foi um Cavaleiro de Ouro excepcional. Não culpo o senhor pelo o que me aconteceu, e certamente o Marcel também. O que houve com o Golfinho foi apenas uma lastimável perda. Nada que o senhor deva se culpar.

De cabeça baixa e punho cerrado, os olhos de Kiki ficaram tomados por lagrimas. A pior dor de uma batalha não eram as feridas, pois essas cicatrizavam. A pior dor é a perda. Perde algo ou alguém dói tanto quanto um golpe de espada, e naquele momento era isso que ele e Miguel estavam sentindo. A dor de perder alguém.

— Johan... Quieto! — disse Kiki. — Cuide do seu ferimento.

Ele deu as costas e subiu as escadas indo até Kastor. O cavaleiro de gêmeos estava sem armadura, vestia apenas calça escura, sapatos pretos e camisa social verde escuro com estampa cor de âmbar. As mangas estavam dobradas acima do cotovelo e suas mãos sujas de um liquido amarronzado. Ele estava delicadamente passando um pano molhando nas feridas de Marin, que estava deitada em cima de uma mesa e sem roupa. Apenas com uma máscara no rosto, a qual não era de sua armadura, e duas peças de tecido que cobriam os seios e a genitália. O coração de Kiki acelerou. Marin não podia estar morta. Antes de perguntar pela amazona notou que havia outra pessoa no quarto.

No canto do quarto, sentado em um poltrona, estava Marcel dormindo. O Cavaleiro de Medusa estava sem camisa, com o tronco enfaixado e com o braço direito em uma tipoia improvisada feita com pano rasgado.

— Ele está bem?

— Kiki! Meu Deus! Você é quem não está. — disse Kastor. — Ele está bem sim. Teve múltiplas fraturas na costela, ombro e braço direito, mas fora isso está tudo bem. Vai sobreviver. Basta descansar. O cosmo dele vai acelerar a recuperação. Já a Marin... Essa aqui me surpreendeu.

— Por acaso ela está...

— Morta? Não! Ela praticamente virou uma peneira, mas nada grave. Não sei se foi proposital do cavaleiro de capricórnio ou se foi sorte, mas as lâminas que conseguiram atravessar a armadura de prata não causaram ferimentos fatais. Ela teve algumas hemorragias internas, mas eu consegui conter com o meu cosmo. Não tem ferimentos na altura do coração ou a nível cerebral, então ela não corre risco de morrer. Providenciei uma máscara que eu achei em meio as suas coisas, e agora estou apenas limpando seus ferimentos para depois colocar o curativo. Porém...

Kastor pousou o pano na mesa e virou um pouco o corpo de Marin, mostrando para Kiki um ferimento na região lombar.

— Uma das lâminas atingiu a coluna e aparentemente rompeu os ligamentos e nervos. Já fiz o teste de sensibilidade e ela não apresentou qualquer reação quando toquei em seus membros inferiores. Acredito que, diferente das outras lesões, dessa ela não irá se recuperar sozinha. Como eu tenho a capacidade de me curar devido o Ikhor que corre em minhas veias, coloquei um pouco do meu sangue misturado com ervas e apliquei no ferimento. Tenho esperança que isso resolva, caso contrário quando ela acordar teremos que explicar que ela não voltará mais a andar.

Os ombros de Kiki desabaram, como se a armadura fosse um fardo.

— Graças aos deuses ela está viva. Sobre o ferimento na coluna, podemos tentar reverter essa situação caso seu sangue não funciona. O que importa é que ela esteja viva.

— Pode ser apenas impressão minha, mas noto uma preocupação maior de vocês com ela. E não é apenas por ser uma companheira de batalha. Por que a vida de Marin é tão importante assim?

— Porque ela... Treinou o homem que está entre os mais poderosos e importantes do exército de Atena. Ela é a mestra de Seiya. O Santuário inteiro a respeita assim como respeitam seu discípulo. Salvar Marin é o mínimo que podemos fazer para de alguma forma mostrar nossa gratidão ao Seiya por tudo o que ele fez. Temos algumas dívidas com os Lendários. Aqueles cinco fizeram mais do que qualquer outro cavaleiro, e o Santuário está ciente disso e tenta recompensa-los de alguma forma. O nome de Marin está na lista de pessoas que o Santuário deve proteger com uma determinada prioridade.

— Existe uma lista? — perguntou Marcel, curioso.

— Existe e geralmente, dependendo da pessoa, a proteção é feita por soldados ou cavaleiros de bronze. — respondeu Kiki.

Uma forte batida seguida por um tremor de terra interrompeu a conversa dos dois cavaleiros de ouro. Marcel acordou saltando da poltrona, mas rapidamente seu corpo lhe lembrou das inúmeras fraturas que ele sofreu.

— Esse cosmo... Shalom está lutando? — perguntou Kastor.

— Uma nova berserker apareceu. Antiope, a irmã mais nova de Hipólita.

— Ares deve estar impaciente para ter enviado mais uma semideusa amazona. Mas não precisamos nos preocupar. Shalom dará conta da situação. Mesmo com toda aquela serenidade, ele é um homem a ser temido em um combate.

...

Antiope disparou seu golpe pela terceira vez, como Shalom havia pedido, e mais uma vez o cavaleiro de virgem ergueu sua barreira.

Angeli Specularibus!

O soar do ângelus, o cântico dos anjos, ecoou junto com a formação do vitral, que dessa vez cobriu todo o corpo de Shalom formando uma cúpula sobre ele. Os cavalos fantasmas golpearam a barreira por todos os lados e pela primeira vez o golpe de Antiope foi detido. Foi então que Shalom compreendeu o mecanismo do ataque. Os cavalos da berserker nunca atravessaram a barreira do Angeli, eles na verdade seguiam pela lateral, atacando onde a barreira não o cobria. Dessa forma o santo de virgem era nocauteado com poderosas ondas de impacto que vinham de várias direções simultaneamente.

— Conseguiu deter os meus cavalos??!

— E agora irei cumprir a minha promessa. Esse foi o seu último golpe. — da palma da mão de Shalom brotou chamas vermelhas e vivas que se espalhou pelo chão e tomou todo o ambiente. — Essas chamas irão consumir a sua vida de acordo com os seus pecados.

Angelus, o som dos anjos, ecoou no céu na medida em que os pilares de chamas subiam e se uniam acima de Antiope, fechando a área ao redor da amazona.

— Amazona da guerra, arrependa-se de seus crimes enquanto sua vida é consumida até os ossos! Receba as chamas que vem da parte de Deus! Ignis iudicio!

Raios crepitaram juntos com as chamas e em seguida desceram violentamente. O estrondoso impacto fez o chão se erguer e as chamas se alastraram pelas rachaduras formadas. Uma espessa coluna de fumaça se ergueu enquanto as chamas continuavam a queimar e estralar, até que um cosmo agressivo se ergueu em meio as chamas e dispersou a fumaça.

— Santo de virgem... Como você é tolo. — Shalom virou-se surpreso e enrugou o cenho. Em meio as chamas havia uma silhueta em pé um pouco curvada, dando paços curtos e arrastados. — Essas chamas fracas jamais iriam me consumir.

— Impossível! Varri o exército de amazonas com essa técnica.

— Não me compare com as outras amazonas. — disse a semideusa saindo das chamas. Seu corpo estava completamente em carne viva. Em alguns membros era até possível ver os ossos, mas na medida em que ela andava o seu corpo se regenerava. — Sou uma semideusa e em meu corpo corre o ikhor do deus da guerra. Se quer me matar... Vai ter que ser mais objetivo!!!

Antiope desembainhou as espadas gêmeas que carregava nas costas e partiu pra cima de Shalom, tomada por fúria e em uma velocidade absurda. Rapidamente o santo de virgem ergueu sua defesa para se proteger do fio das espadas que era.

— Esse seu escudo de cosmo não vai durar por muito tempo. Irei parti-lo em pedaços e espalhar o seu corpo por toda a China! Desapareça!!

Ela não está blefando. A minha defesa já está apresentando rachaduras. Se isso continuar...

A barreira cedeu e explodiu em pedaços. O impacto arrastou Shalom para trás e abriu uma brecha para Antiope atacar, mas o santo de virgem desviou antes que o corte duplo de espada o acertasse.

— Irei detê-la a qualquer custo! — gritou, elevando o cosmo. Rajadas de cosmos foram disparadas, mas a semideusa desviou de todas e avançou para um novo ataque. — Nem que para isso eu precise recorrer a minha técnica mais poderosa! — O cosmo de Shalom se ampliou e tomou toda a área, isolando em um mar de nuvens que tomaram a forma de sete anjos. Os seres angelicais pareciam ser feitos de mármore branco e tinham expressões dura em seus rostos. Suas asas eram volumosas e quase tocavam o chão. Tecidos soltos cobriam suas partes intimas, deixando o tronco a mostra. Cada anjo trazia em sua mão direita uma trombeta dourada e estavam preparados para toca-las. Rompimento do sétimo selo! Soar das trombetas de Deus!

— Que cosmo absurdo é esse que sinto vindo desse homem?! Como alguém desprovido de treinamento pode ter todo esse poder? Será que este homem... Recebeu o poder de um deus?

...

Dentro do palácio, Kastor e os outros sentiram a pressão do cosmo de Shalom. Era uma sensação esmagadora e dava a impressão de que seu cosmo iria explodir e varrê-los de Jamiel.

...

— Este golpe irá encerrar o nosso combate. Na verdade eu não queria que chegássemos a esse ponto, mas não tive escolha. Agora... Que seja tocada a primeira trombeta.

O primeiro anjo tocou a trombeta e houve um tremor no céu, como um trovão. As nuvens se tornaram vermelhas, e delas foram disparadas uma saraiva de fogo misturado com sangue. Antiope elevou seu cosmo e disparou uma rajada de cosmo, mas o ataque de Shalom anulou a investida da semideusa, e ela recebeu o golpe como uma chuva ardente que corroeu sua pele e parte de sua onyx. A berserker gritou desesperadamente quando a saraivada tocou em seu corpo e tentou fugir do alcance da chuva infernal, mas a saraiva a acompanhou até ela desabar em desespero. 

— Que dor infernal é essa que estou sentindo? — gritou a berserker.

— Não adianta fugir ou se esconder. Essa técnica impede a evasão do oponente, prendendo-o até que as sete trombetas sejam tocadas. — explicou Shalom. — Ate lá, você vai suplicar pela morte, mas ela fugirá de você. Sinto dizer que as outras trombetas irão soar até que a sua vida seja consumida, ou até que eu as detenha. Continuando... Que seja tocada a segunda trombeta.

—...—


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Notas finais do capítulo

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Contato: 81 97553813

Próximo capítulo: indefinido.
Sinopse: indefinida.
Data de publicação: indefinida

Ora Ora quem voltou... Eu ^^ Depois de mais de 2 meses, tá ai o capítulo. Esse demorou porque tinha nada mais nada menos que a luta de um Cavaleiro de Virgem, e isso é algo muito pesado. Virgem é uma das constelações mais bem apresentadas na franquia Saint Seiya. Não existe um Gold de Virgem que não tenha sido foda (com perdão da palavra), então no minimo senti uma cobrança quanto a isso. Não podia fazer algo fraco. Teria que deixa-lo no mesmo nível que Asmita, Shaka, Shijima, Fudou e Shun. Bem... Não sei se consegui. Preferi dividir a luta dele para poder melhor na segunda parte. Mais do que nunca eu preciso que vocês me digam o que acharam. Principalmente sobre Shalom. Portanto, não esqueça de deixar a sua opinião. A sua critica é sempre bem vinda e fundamental para a história. E é ela que incentiva a continuação e melhoras da fanfic.



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