Always With Me escrita por Menta


Capítulo 5
Auld Lang Syne/For Old Long Since - Primeira Parte


Notas iniciais do capítulo

Olá queridas! Venho com mais um capítulo neste lindo domingo à noite, tratando de como foi o Ano-Novo da Cordelia e a relação dura e controversa que ela tem com a mãe. Além disso, mostra mais sobre como a família dela tem de esconder a origem celta, e como eles celebram a magia deles quanto realmente estão livres para tanto.
É uma introdução da Guinevere, e é uma contraposição entre o que aconteceu com ela durante o Ano-Novo, e também com o Sirius (de quem será a parte dois).
Espero que gostem. Está recheado de menções à cultura celta, e teremos um final pouco usual. Heheh. Esse capítulo é docemente melancólico, porque o próximo vai ser bem triste mesmo. Mas espero que gostem!
Beijos!



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Should auld aquaintance be forgot

and never brought to mind?

Should auld aquaintance be forgot

and auld lang syne!

For auld lang syne, my dear

For auld lang syne

We'll take a cup of kindnessyet

For auld lang syne

And surely you will buyyour cup and surely I'll buy mine

And we'll take a cup of kindness yet

For auld lang syne

We two have run about the slopes

And pickedthe daisies fine

But we've wandered many a weary foot

Since auld lang syne

For auld lang syne, my dear

For auld lang syne

We'll take a cup of kindness yet

For auld lang syne

We two have paddled in the stream

From morning suntil night

But the seas between us broad have roared

From auld ang syne

For auld lang syne my dear

For auld lang syne

We'll take a cup of kindness yet

For auld lang syne...

~ Auld Lang Syne - Robert Burns




— O que você fez, Cordelia? — Guinevere segurava a filha pelos ombros, com uma raiva contida, parada em meio à árvores e plantas diversas do jardim do castelo do Clã MacLearie. As duas se encontravam à beira do lago, no ponto mais ao norte e oeste dos terrenos, que tinha uma visão privilegiada dos fogos do festival de fim de ano festejado no povoado bruxo próximo de sua casa.

Horas atrás, mãe e filha tinham liderado a procissão durante o festejo improvisado de Hogmanay bruxo — a celebração escocesa e celta de Ano-Novo do calendário solar, uma celebração menor em comparação a outras do calendário celta, cíclico — na qual cada membro do festejo encantava cada qual um balão com símbolos celtas de renovação, amor, alegria, proteção e outros bons votos e virtudes para o ano novo que estava por ter seu começo, e caminhavam por florestas e terrenos entoando cânticos benignos mágicos. Nem sequer imaginaria que estariam discutindo, depois de tantos ritos benéficos.

— Eu tive que fazê-lo, mãe — Cordelia respondeu, sem conseguir encarar a mãe nos olhos. Seu olhar se perdia no lago semi-congelado que banhava todo o entorno do terreno do castelo, mas a mãe rapidamente puxou seu queixo com destreza de forma que a menina não foi capaz de desviar seus olhos outra vez.

— Olhe para mim enquanto falo. Achei que ao menos boas maneiras eu tivesse lhe ensinado. Será que nem isso? — A raiva de sua mãe parecia cada vez mais vir à tona. A garota sabia ser uma questão de tempo até que ela explodisse, estando as duas tão longe dos convidados.

— Você me ensinou muito bem — Cordelia respondeu, tentando manter a voz em um tom monocórdio e sério — e foi por isso que fiz o que fiz. — Ela defendeu sua atitude.

— Foi por ter te educado que você jogou todo o seu futuro fora? — Guinevere disse, irônica, franzindo os lábios de desgosto.

— Mãe. Por favor. — A garota loira tentou apelar à sua mãe, e reparou que seu queixo tremeu pela ira contida. — Por favor — ela insistiu.

— Sabe quanto tempo demorei para conseguir a simpatia da família Graeme? Sabe quanto ouro, quantos negócios vamos perder pela sua postura impensada? Essa maldita Revolução está chegando, e precisaremos de proteção. Não sei que tipo de caos se instalará no mundo bruxo, mas precisamos estar preparadas! — a mulher loira ralhava com a filha tão parecida consigo fisicamente, arregalando os olhos verdes-claros, agora repletos de desgosto.

— Você tinha tudo, tudo e jogou fora! — a mãe reiterou, irritada, passando as mãos pelos cabelos, penteados encaracolados como os de uma princesa celta, as mangas soltas de seu vestido longo e verde escuro caindo com elegância pelos seus braços alvos. Vestia-se com vestes celtas lindíssimas, com inúmeros símbolos de seu povo desenhados em dourado pela borda das roupas, dando-lhe uma postura etérea e admirável como a de uma fada da beleza, mesmo em meio a um sermão. Cordelia sentia-se não apenas pequena em importância, quando perto da mãe, mas inclusive menos bela e menos capaz. Guinevere parecia captar e sugar para si todas as atenções, mesmo que a filha primogênita estivesse usando trajes muitíssimo parecidos com os seus, apenas de uma cor diferente: azul-claro.

— Não foi impensada — ela falou, monocordicamente, sentindo raiva de si mesma por não conseguir se impor perante a mãe. Ela já estava velha demais para ter medo de ofendê-la.

— Eu tive de terminar com o Latrell, mãe. Ele estava me fazendo mal. Ele estava me machucando. — Cordelia conseguiu colocar um pouco mais de emoção em sua voz, e mais uma vez desviou seus olhos para o lago. Não queria chorar de novo, não por causa daquilo. Não por Latrell e pelo que ele lhe fizera. Ele não merecia.

— Olhe para mim! — A mãe puxou o rosto de Cordelia com menos delicadeza, agora, e os olhos da garota se encheram de lágrimas, não apenas de tristeza como de raiva. Ela já tinha idade para pensar por si mesma, mas por que era tão difícil fazer frente à sua mãe? Por que tinha tanto medo de decepcioná-la?

— Ele estava me machucando — Cordelia falou, sincera, sentindo-se ridiculamente impotente.

Os olhos tão verdes e redondos de Guinevere, idênticos aos de Cordelia, faiscaram em meio à luz dos balões com símbolos celtas que dançavam voando delicadamente pelos jardins naquela noite de ano novo.

— Ele te bateu? — Ela sussurrou, devagar, como se dizer aquelas palavras fosse quase como dizer uma maldição imperdoável.

— Não. Ele não me machucou fisicamente — Cordelia respondeu, mas a mãe revirou os olhos antes que pudesse continuar a se defender.

— Então pare de infantilidades, menina! Eu já lhe ensinei que não podemos confiar nos homens. — A garota tentou protestar, sem sucesso. A mãe levantava os braços, afastando-se da filha, parecendo falar mais consigo mesma do que com a garota.

— Não namoramos por amor, não casamos por amor, e quem pensa diferente está errada, é tola, ingênua! Todos eles querem nos usar, eles não são capazes de amar, não como nós sabemos, não como eu amo você e as suas irmãs. Os homens são volúveis, infiéis, cruéis. Sempre lhe ensinei isso, você viu isso... — Guinevere passou a discursar, soltando a raiva pelas atitudes recentes de sua filha loira, e Cordelia não queria mais uma vez lembrar dos fantasmas do passado que sempre a perseguiam, por mais que tentasse fugir. Movida por um instinto de auto-proteção que a fazia superar até o medo de ofender a mãe, ela a interrompeu rapidamente:

— Eu sei. Eu sei de tudo isso. Eu sei do... Do meu pai — a menina disse, tentando fugir do assunto o mais rápido que pudesse — mas ele me traiu. Me traiu com várias meninas diferentes. Ele me humilhava em público, pelas costas, mãe. Você me ensinou que o mais importante é o nosso sangue. E não podemos deixar que tripudiem de nós. Não mais do que é suportável — a garota defendeu-se falando justamente do ponto fraco da mãe.

Guinevere pareceu refletir, olhando para o musgo em alguns dos salgueiros ao redor das duas.

— Eu não precisarei depender de homens para sobreviver. Nossa família brilhará outra vez, eu serei grande — Cordelia assegurou à mãe.

— Filha... — Guinevere passou a falar com mais carinho, aproximando-se da garota loira. — Sabe como é difícil viver sozinha — ela tentou convencê-la uma última vez.

— Sei, mãe. Mas tive um bom exemplo de força em casa — Cordelia respondeu, elogiando sua mãe. Ela enfim sorriu, mais calma, e abraçou a filha com carinho. Por mais que Guinevere atuasse como uma mulher fria e distante perante a nobreza bruxa, era alguém muito carinhosa na intimidade.

— Vamos voltar. Tem de dançar para os convidados. Acha que Mairéad consegue seguir a coreografia hoje? — Guinevere falou, fingindo que jamais haviam tido aquela conversa desagradável e difícil. Era típico da mãe evitar sentimentos mais pesados, considerando-os em geral fúteis e dramáticos.

— Certamente. Treinamos juntas desde que voltei de Hogwarts — Cordelia afirmou, sorrindo docemente, lembrando da irmã mais nova e de seu afinco em aprender os passos da dança ceilidh, a dança celta de tradição de sua família.

— Bairbre tem tocado o fiddle com maestria — Guinevere elogiou, enquanto as duas caminhavam.

— Fale para ela. É bom ouvir elogios de vez em quando — Cordelia brincou, provocando a mãe. Guinevere raramente elogiava suas filhas.

— Não seja petulante, menina! Ou vou te obrigar a escutar as histórias dos primeiros druidas de seu tio Desmond — Guinevere brincou de volta, porém a ameaçando discretamente.

— Prometo que serei boazinha! — Cordelia respondeu, fazendo uma careta, e ambas riram. Caminharam por um caminho de pedra em meio à neve daquela noite de inverno, até que finalmente chegaram as tendas repletas de símbolos e runas celtas para trazer sorte e bons presságios para o ano novo que estava prestes a começar.

— Mamãe! Cora! Já começou a contagem! — Bairbre caminhou, acenando alegremente, porém mantendo a compostura da forma que agradaria sua mãe. Estavam perto da meia-noite, e os balões encantados já voavam por todo o lago congelado, dançando alegremente em suas luzes.

Juntaram-se ao grupo de bruxos escoceses e irlandeses, parentes distantes dos MacLearie e dos Gilios, que praticavam a magia celta com discrição, na Grã-Bretanha. Acompanhando o ambiente, muitos bruxos tocavam em suas gaitas de foles e fiddles celtas, trazendo uma doce sensação de familiaridade e tranquilidade, para o coração agora alegre de Cordelia. Alguns, inclusive, sorriam e dançavam ao tocar e cantar a conhecida melodia do "Auld Lang Syne" em gaélico.

Eram inúmeras famílias unidas pelas mesmas dificuldades, tendo sofrido represálias por muitos séculos pelos bruxos puro-sangue anglo-saxões que consideravam sua magia de segunda classe, por ser quase inteiramente ligada à natureza e a vida, incapaz de trazer maiores poderes de destruição. Além disso, havia também a perseguição de muitas eras por trouxas que os consideravam alguma espécie de entes sobrenaturais de outro mundo, pela grande compreensão e poderes que detinham dos fenômenos da natureza e dos elementos e animais em geral.

Em alguns minutos, Guinevere, Cordelia, Bairbre e Mairéad se encontraram, todas usando as mesmas vestes de celebração da magia celta, cada uma com cores diferentes. Guinevere, a matriarca, usava verde em uma simbologia com a terra, Cordelia, azul-claro, representando a água, Bairbre, vermelho, representando o fogo, e Mairéad, branco, representando os ventos e a neve, trazendo renovação e outras fases da vida.

— Cinco... — Cordelia levantou os olhos para o céu escuro, nevando intermitententemente. Protegiam-se junto aos outros bruxos debaixo das tendas, encantadas para suportar qualquer intempérie, mas aquela nevasca estava especialmente bonita. Lia gostava de todos os fenômenos da natureza, e sentia sua magia mais forte quanto maior seu contato com os elementos naturais. Seu sangue celta pulsava firme em seu peito, e sua magia estava em pleno fulgor, movida por sua juventude e desejo de auto-superação.

— Quatro... — Ela fechou os olhos, sorrindo, abraçando suas duas irmãs pequenas, um dos braços passando pelos ombros de Bairbre, o outro acariciando os cabelos morenos de Mairéad. Talvez sua calma de agora não viesse apenas do contato com a neve e da celebração ao ar livre que faziam, além da prática da magia celta por toda aquela noite. Talvez estivesse aliviada por ter se livrado da farsa, de suas atitudes anti-naturais a respeito de Latrell e de suas companhias desagradáveis.

— Três... — Bairbre a apertou pela cintura, e Mairéad puxou uma de suas mangas, as duas ansiosas.

— Dois... — Guinevere encarou a filha mais velha, e moveu seus lábios, sorrindo discretamente, de forma a dizer as seguintes palavras:

“Estou orgulhosa de você.”

— Um! FELIZ ANO NOVO! — Bairbre e Mairéad gritaram, se abraçando e abraçando também Cordelia, puxando-a para uma dança em roda desajeitada. A garota tentava controlar as irmãs, para que se portassem bem perante os convidados, mas ria da mesma maneira solta e leve que elas. Guinevere levou uma das mãos aos lábios, no mesmo gesto que Cordelia fazia quando estava emocionada, e se aproximou discretamente das três.

Mãe e filhas se abraçaram, em silêncio, enquanto fogos de artifício encantados explodiam vindos do povoado vizinho, desenhando em pleno ar cores deslumbrantes, assegurando alegrias e realizações para o ano que estaria por vir. Estouravam como chuva dourada pelo ar, dançando alegremente como as luzes dos balões celtas do castelo dos MacLearie. A música ecoava alegre pelos jardins do Clã MacLearie, e Cordelia realmente sentiu, intuiu, com uma força que só poderia ser mágica, que aquele poderia ser um bom ano, talvez... Um dos melhores de sua vida.

Em minutos, os fogos cessaram, e Guinevere voltou a agir como uma boa anfitriã, circulando pelo ambiente, conversando e dando atenção à todos os convidados. Cordelia dançou, cantou e recitou antigas canções naquela noite, acompanhada por suas irmãs, sendo aplaudida pelos poucos bruxos que restaram do povo celta. Era algo bonito e simultaneamente melancólico, considerando que tais tradições estavam fadadas a se perder com o tempo. Mas naquele momento eram celebradas com a honrosa lembrança e o carinho de seu povo restante, como se jamais pudessem ser esquecidas, ou sequer perdidas.

A magia celta era herdada pelo sangue, e ainda havia quem a valorizasse e amasse, mesmo em meio a tamanho preconceito e dificuldades.

Depois de todas as celebrações, quando o dia estava prestes a amanhecer e os últimos convidados se foram, Bairbre e Mairéad já haviam adormecido, juntas, sentadas embaixo de um grosso tronco de um pinheiro, e Cordelia as acordou com delicadeza, para levá-las ao seu quarto. Guinevere dava ordens aos elfos domésticos que recolhessem as tendas, os restos de comes e bebes, e limpassem a sujeira deixada pelos convidados.

Ao levar as pequenas meninas pelos braços, levantando-as com delicadeza, pensou no que faria durante seu último dia de estadia em casa. Queria escutar um dos discos dos cantores trouxas americanos e ingleses que gostava, em segredo, antes de voltar a Hogwarts, onde os apetrechos eletrônicos não funcionavam com tamanha concentração mágica no ambiente.

Lembrando-se do feitiço que deveria fazer para que os discos de vinil rodassem no aparelho trouxa que conseguira em um dos becos próximos a estação de King’s Cross em Londres, sem que sua mãe soubesse, Cordelia ouviu, muito ao longe, um cachorro uivar em meio à alvorada.

Ela imediatamente soltou a mão das irmãs, e levou a mão esquerda ao peito, na direção de seu coração. Sentiu uma pontada aguda, como se aquele som fosse muito triste, um pedido de ajuda, e a atingisse profundamente.

— Vocês... Vocês ouviram? — a irmã perguntou às mais novas, que apenas menearam os rostos em negativa, já muito cansadas.

Estranhamente, Cordelia lembrou de imediato do simpático cachorro que conhecera há alguns dias atrás, durante a última noite antes das férias de Natal em Hogwarts.

Lembrou-se, e preocupou-se profundamente, como se movida por algum vínculo maior que ainda não tivesse capacidade de compreender.


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Notas finais do capítulo

Para quem tiver interesse, tem uma música com o título, composta por um escocês em 1788, simbolizando uma nova vida, outros começos, outras alegrias, porém lembrando-se de tudo que foi bom e belo do passado: http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=wPnhaGWBnys
Acho muito emocionante. Recomendo que todos escutem.



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