Renascer escrita por Ana C


Capítulo 6
O livro de memórias


Notas iniciais do capítulo

Postando mais rápido do que eu esperava! Hoje um grupo de alunos me disse que eu sou a melhor professora do mundo e eu estou tão absolutamente feliz, que decidi compartilhar minha alegria com vocês! Então, capítulo novo!

Muito obrigada a todos os que estão comentando, isso é importantíssimo pra mim! Eu adoro que vocês me digam o que acham, o que sentiram quando leram... É emocionante!

Eu quero chegar a 10 comentários neste capítulo! Não é pedir muito, né? Sei que tem um montão de gente que lê e não comenta, passa só pra me dar um oi que eu vou ficar feliz! :p

Então, o capítulo de hoje, pra mim, é o melhor de todos, mas... Leiam até o final e não me xinguem!

Novamente capítulo narrado pela Katniss! Beijos e boa leitura!



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Entrar na casa de Haymitch nunca é uma experiência agradável. Desta vez, quando entrei, fui quase nocauteada com a mistura de cheiros de produtos de limpeza e bebida e comida podre. Percebi que tinham incontáveis sacos plásticos do lado da porta e me dei conta de que Peeta iria jogar metade da casa de nosso mentor no lixo. Não o culpo. Acho que se ele não fizesse isso, todos no Distrito 12 morreríamos intoxicados com alguma coisa que saída daqui. Chamo pelos dois dando um pequeno grito, mas nenhum deles vem me atender, então continuo andando pela casa. A sala está consideravelmente melhor e a cozinha parece ser uma cozinha. É a primeira vez que a pia não é usada como depósito de bebidas. Não encontro os dois em lugar nenhum. Talvez eles tenham decidido sair, ou talvez estejam na casa de Peeta, mas logo percebo que estava enganada. A risada de Haymitch é inconfundível.

– Vai, garoto! Quero ver você continuar sua boa ação do dia - Haymitch obviamente está se divertindo com a situação

– Ah, Haymitch... Que nojo! Meu Deus, quanto tempo isso está desse jeito? Como você consegue tomar banho neste chiqueiro?! -Peeta interroga, enojado

– Isso é tão fácil responder - Falo, dando um susto nos dois, que nem sequer haviam notado minha presença - Se você der uma olhada nas camisas de Haymitch, vai perceber que ele não toma banho há muito tempo... Nem precisa ser na camisa, você pode olhar o cabelo, a barba, ou qualquer parte do corpo dele...

– E eu te amo tanto por isso, docinho - Haymitch diz - Você é mesmo a pessoa mais carinhosa deste mundo, não é mesmo?

– Katniss! - Peeta sorri, feliz pela surpresa - Aconteceu alguma coisa para você aparecer aqui?

Saudades? Jamais vou dizer isso para ele...

– Não, nada... Pensei em passar aqui para ver se este bêbado ainda estava te escravizando. - Rosno - Pelo visto, vejo que sim!

– Oh, que grande mulher você é Katniss Everdeen! Você escraviza o menino desde sempre, mas acho que pensa que é a única a ter esse direito, não é mesmo? - Retruca meu mentor

Touché.

– É claro que não! - Tento parecer indignada com a verdade que ele me diz

– Não vou discutir com você docinho... E eu não o escravizei coisíssima nenhuma. Na verdade ele me obrigou a arrumar essa casa toda com ele. Ameaçou quebrar todas as garrafas de licor que eu tenho e como ele tem o dobro da minha força, decidi aceitar por livre e espontânea pressão essa ajuda tão desinteressada...

Escuto as risadas de Peeta, enquanto ele sai do banheiro. Sei que ele não vai falar nada, já encheu o saco de interromper as batalhas de ofensas que eu e Haymitch sempre travamos.

–Acho que vou terminar essa arrumação por hoje, Haymitch. Aquele banheiro me deixou mal de verdade... Vou pra casa, tomar banho com álcool... - Peeta reclama - Você, que fez essa sujeira toda, arrume um jeito de começar a limpar. Nosso trato ainda está de pé, ok?

É o suficiente para que eu e Peeta comecemos a escutar toda a sorte de palavras sujas vindas de nosso querido vizinho. Nenhum de nós parece se importar com o pequeno escândalo que ele dá. Vamos embora antes que a situação fique pior. Nós nos separamos e ele promete estar na minha casa na hora em que formos dormir, o que ele obviamente cumpre. Ele deita, me olha profundamente e pergunta.

– O que houve, Kat? Você está diferente. Não havia a menor necessidade de você aparecer no Haymitch agora, há alguma coisa que você quer me dizer?

– Não é nada demais. Eu falei com o Dr. Aurelius hoje, acho que foi bom ter ligado para ele, afinal... Eu tive a ideia de fazer um livro de memórias, da mesma maneira em que fizemos aquele livro de plantas, lembra-se? O doutor diz que eu preciso transformar minhas memórias afetivas relacionadas a Prim, Rue, Finnick e o resto. Que elas precisam ser felizes. Talvez o livro me ajude a lembrar deles dessa forma.

– Essa é uma excelente ideia! -Peeta parece realmente feliz com que eu digo

– Você me ajudaria? Eu não tenho muitas fotografias, você poderia pintar o rosto de alguns deles...

– Será um prazer! Eu vou adorar te ajudar a montar esse livro! Quando começamos?

– Não sei, temos que comprar os materiais, acho. Mas eu quero que seja logo.

– Tudo bem, então... Eu vou gostar de voltar a pintar... - Peeta não termina a frase, pois dorme no meio da conversa. Acredito que ele esteja cansado porque teve que me aguentar gritando de madrugada e fez uma quantidade de exercícios enorme na casa de Haymitch. Eu aproveito para observá-lo. A tranquilidade com que ele dorme me dá uma pontada de inveja. Me enrosco nele, esperando que eu possa ficar tranquila também...

Dois dias depois da ligação que eu fiz para o Dr. Aurelius, recebo uma caixa cheia de folhas de pergaminho. Encomenda vinda diretamente da capital. Não preciso pensar muito para entender que meu terapeuta me mandou tudo isso para que eu pudesse começar meu livro. Peeta está em sua casa, então eu vou buscá-lo, querendo começar a tornar reais, novamente, todos aqueles que eu amei. Quando chego, nem me dou ao trabalho de bater para que ele me atenda. Sei que a porta não está trancada e que as janelas estarão escancaradas, do jeito que ele gosta. Peeta consegue ser uma alma livre apesar de tudo. E eu jamais vou parar de admirá-lo.

– Peeta, você está ocupado? Dr. Aurelius nos mandou um monte de material para que a gente possa fazer nosso livro de memórias. Eu queria começar hoje - Digo, com uma empolgação na voz que até eu estranho. Mas ele não me responde - Ei! Peeta! Você não vai me responder?

Começo a me preocupar. Ele pode estar tendo algum de seus ataques. Corro para buscá-lo e o encontro em um de seus quartos. A casa dele é impecável, ao contrário da minha, e não parece que ele mora sozinho. Peeta está sentado em um banco, arrumando algum de seus armários. Parece querer encontrar algo incessantemente, mas não consegue achar. Resolvo parar com a busca antes que isso o aborreça.

– Peeta?

Ele pula do banco na mesma hora, assustado. Ele não me escutou entrar, ou subir as escadas de sua casa o que mostra que meus passos ainda são bastante silenciosos. Ou que ele estava muito absorto no que estava fazendo.

– Boa tarde, Kat! Nossa, não te vi chegar! Tem muito tempo que você está aqui me observando? - Ele pergunta, já com seu habitual bom humor

– Na verdade não, acabei de chegar -Respondo. Não resisto em fazer a pergunta que está rondando minha cabeça - O que você está fazendo?

– Depois que eu estive na casa do Haymitch anteontem, eu decidi arrumar minhas coisas também. Há tantas roupas aqui que ninguém nunca mais vai usar. Tantos objetos inúteis para mim, mas que eu posso doar para as pessoas que estão voltando para o 12... - Peeta me mostra algumas roupas dobradas - Depois que nós vencemos os primeiros Jogos, minha família e eu ganhamos muitas roupas e coisas desse tipo. Era importante que eles aparecessem minimamente decentes em frentes as televisões da Panem. -

O discurso é feito em um tom tão sombrio que eu tenho certeza que não foi uma decisão fácil de ser tomada. E eu entendo esse sentimento como ninguém.

– Admiro a sua coragem. Eu ainda não consegui mexer nas coisas de Prim e nem sei se algum dia eu poderei. Só de sentir seu cheirinho, ver seus vestidos... Eu não sou capaz - A essas alturas as lágrimas já correm livres pelo meu rosto

– Acredite, Katniss, não está fácil para mim também. Mas isso tudo estava me sufocando então achei melhor doar essas coisas. - Peeta me contesta e seu sorriso habitual sumiu

– Bom, eu ia te chamar para nós começarmos o livro de memórias. O nosso terapeuta mandou um monte de folhas de pergaminho e outras coisas, então vim te chamar. É um mau momento? Você pode passar lá em casa depois, não sei... Nós temos muito tempo para fazer isso, afinal.

– Sem problemas, Kat. Eu prometi e realmente estou empolgado com isso! Podemos ir juntos para sua casa, se você me ajudar a colocar essas roupas que estão em cima da cama dentro daquela caia do canto - Ele aponta para uma grande caia de papelão que eu acredito que um dia abrigou os licores do nosso vizinho

– Claro que eu ajudo! - Me ofereço prontamente, apesar de não querer cumprir a tarefa.

Guardo a roupa nas caixas e espero Peeta pegar seus lápis e aquarelas. Assim que ele os acha, voltamos para minha casa, o que deixa Buttercup felicíssimo. Ele adora as visitas de Peeta, em grande parte pelo fato de ter engordado uns 4 kg desde que o “Garoto com o Pão” voltou a ser meu vizinho, amigo e parceiro. O gato nos acompanha até a sala e nos observa enquanto arrumamos a mesa para o nosso novo projeto. Tudo é feito em silêncio, mas não precisamos de grandes conversas para nos entendermos. As folhas são separadas e quando vamos começar a preenchê-las, não necessito dizer quem é a primeira pessoa que eu quero que ele pinte.

– Vamos começar pela Prim. Acho que posso pintá-la com a cabra de estimação que ela tinha, a Lady, contanto que você me dê alguns detalhes fisionômicos para mim.

Eu me apresso em ajudá-lo. Conto como a cabra era, suas cores, a lambida que ela deu em minha irmã, o sorriso que a minha patinha deu em retribuição. Espero para escrever tudo isso do lado da pintura que está sendo feita, mas tenho que esperar Peeta terminar seu trabalho. Vejo-o dar, em cada minuciosa pincelada, em cada contorno do lápis, vida à pessoa que mais amei e consigo concluir porque esses papeis chegaram tão rápido. Encosto minha cabeça nos ombros do homem sentado ao meu lado, de uma forma que não o atrapalhe, e deixo que ele faça a sua mágica. As habilidades que ele tem para pintar podem não ter sido tão bem aproveitadas nos jogos, apesar de sua camuflagem perfeita na arena, mas é o tipo de dom que pode fechar um pouco da enorme ferida que eu carrego na alma. E, pela milésima vez, agradeço por ele existir.

Os dias passam, os personagens de nosso livro vão se multiplicando e a história dura de nossa vida é contada cada dia com mais detalhes. Todas as pessoas que estão registradas em nossa obra pessoal são de suma importância para nós.

O desenho do tridente de Finnick e de seus olhos penetrantes trazem de volta sua força, sua amizade, seu amor por Annie e a sua coragem infinita. Os braços abertos de Rue a transformam em um doce pássaro. Quase posso ouvir sua voz fina a ecoar por toda a casa, a irmã que ganhei e perdi em tão pouco espaço de tempo. A aquarela que retrata Cinna, entre seus tecidos, mostra toda a sua inteligência e tenacidade que meu estilista possuía, o poder de me transformar na “Garota em Chamas”, de me fazer desejável. Depois Madge, Boggs, Leeg 1 e Leeg 2. Tantos outros, que as vezes pensamos que nosso trabalho é interminável.

E chega o momento de registrar os familiares de Peeta. Pouco a pouco vou conhecendo seus irmãos, os rostos doces como os do meu companheiro, os mesmos sorrisos abertos e olhos ligeiramente tristes. E depois surge sua mãe, tão amargurada. Tão aflita com seu futuro e os de seus filhos. Tão desgostosa da situação inumana em que vivia. Agora, a entendo mais do que nunca. Apesar de ela ter me negado comida, reconheço naquele rosto angustias que eu mesma carreguei e ainda carrego. Como é possível amar estando em pedaços?

Já estamos trabalhando no livro há quase duas semanas e sempre nos organizamos na mesma posição. Os ombros de Peeta me abrigam até que a minha hora chegue e eu comece a contar cada história retratada naqueles papéis. Mas hoje o seu corpo não está me confortando da mesma maneira, algo ruim está acontecendo.

– O que foi, Peeta?

Ele gira seu corpo em direção ao meu e quando meus olhos encontram os dele, percebo que sua mirada está vazia, os azuis de sua íris sem brilho algum. Sei que não é efeito do veneno das teleguiadas, pois quando os flashbacks sucedem, seus olhos ficam completamente negros. Estou mais preocupada do que nunca. Este sintoma é algo novo, que eu não sei se vou conseguir lidar.

– Meu pai... Eu não consigo pintá-lo... Eu amo o meu pai, e ele de repente sumiu da minha memória. Eu consigo vê-lo, mas é tão embaçado, como se ele nunca tivesse existido. Como se a presença dele na minha vida fosse o efeito de uma alucinação qualquer. Mas eu tenho certeza que ele existe. É por ele que eu sou assim. Eu só queria poder lembrar do meu pai...

Os olhos de Peeta continuam tão perdidos quanto antes. A dor que ele está sentindo neste momento deve ser excruciante. Se a falta de minha irmã me faz tanto mal que eu não sou capaz de descrever, o desaparecimento gradativo dela de minha mente seria fatal. Tento acalmá-lo. É o mínimo que posso fazer pelo homem que deita e acorda todos os dias ao meu lado, me abrigando, me amando tanto.

– Dê um tempo para você, Peeta. Você vai se lembrar do seu pai. A lembrança dele está viva em você, basta que você a deixe vir à tona.

– A lembrança dele se perdeu junto com o que eu era, no meio daquela sala terrível, na mão daqueles doutores, na minha cela de prisão. Eu deveria ter morrido naqueles dias. Sobreviver é somente a continuação de tudo o que eu vivi.

As palavras de Peeta saem desprovidas de qualquer sentimento, como se ele estivesse lentamente se esvaziando. Eu começo a me desesperar.

– Peeta, não fale assim, por favor! Eu estou te pedindo,.. Vai ficar tudo bem.

Eu sou uma mentirosa. Se há alguma coisa em que eu não acredito é que tudo vai ficar bem. Mas eu tenho que tentar trazê-lo a tona outra vez. Não posso perdê-lo

– Katniss, você mente muito mal, sabia... - Ele simplesmente constata - Nada vai ficar bem... Nada vai voltar a ser como antes e nosso antes já não era grandes coisas... E eu achava que ia ter o meu final feliz, apesar de tudo. Pensava que ia poder te ajudar, que ia te reerguer, que nossa vida seria boa afinal.

Eu não quero que ele deixe de sonhar com esse nosso futuro porque, de certa forma, também sonho com ele. O que me sobra se eu não tiver ao menos a alegria dele? Eu não sei o que fazer, então recorro à minha tática favorita: a inércia. Ficamos os dois naquela sala, assim como fazíamos quando ele voltou ao 12. A tarde dá lugar a noite e eu não consigo me mover. Tenho medo de sair de perto dele, que ele sucumba a tristeza de uma vez por todas, mas então a fome fica insuportável e eu vou até a cozinha ver se algo que possamos comer. Por sorte há muita comida na geladeira, Peeta nunca me deixa sem as coisas que eu gosto de comer, e eu sempre posso pedir ajuda a Greasy Sae. Além disso, não sou uma inválida. Posso fazer a nossa comida enquanto ele estiver assim, mas espero que não dure muito tempo para essa tormenta passar. Quando ele se levanta para voltar à sua casa, não o impeço, pois penso que talvez a casa dele o traga as lembranças que ele espera. Mas também não me impeço de ir atrás dele.




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Notas finais do capítulo

Garanto que o Peeta vai melhorar, ok? Não me matem! Mil beijinhos e até o próximo!



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