Em Família escrita por Aline Herondale


Capítulo 29
O Agregado


Notas iniciais do capítulo

Olá!
Como passaram o carnaval? Acabei empolgando e passei do prazo, me desculpem. Em compensação postarei outro capítulo nesse final de semana mesmo.
Espero que gostem



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Apesar do extremo cuidado que todos os empregados tinham para com aquela casa, existiam coisa com as quais eles não conseguiam lutar contra. Por isso quando Charlie abriu a porta da frente, para retornar ao aconchego e morno interior da mansão, ela rangeu. A alvorada estava quase no fim e ele havia se levantado junto à ela.

– Os óculos de sol do meu pai eram idênticos. – Evie disse do topo da escada no mesmo segundo em que Charlie fechara a porta.

Ele demorou alguns segundos cabisbaixo antes de levantar a cabeça e observar sua sobrinha apoiada no corrimão, no alto da escada. Calado ele observou o cabelo negro dela, agora, um pouco maior e mais liso, o nariz pontudo e reto e o macacão rosa bebê de renda balançando.

Pelo canto do olho visualizou um ponto preto e quando desceu a vista enxergou sua mala de mão no meio da escada, deixada cuidadosamente sobre um dos degraus.

Evie viu seu maxilar trincar.

– Ele só usava para dirigir por isso estavam sempre no posta-luvas. Agora devem ter derretido junto com o resto do carro. Por favor, vá embora antes que minha mãe acorde. – Evie concluiu.

Charlie sorriu e vagarosamente retirou os óculos do rosto, revelando seus tão temidos olhos azuis. Evie pediu mentalmente que ele os colocasse de volta.

– Voce não quer saber o que houve com o Bryan? – Charlie perguntou fitando-a ainda no mesmo lugar.

– Quero saber o que houve com o Jonathan. – Evie pediu com certa dificuldade. Mesmo que de longe, escutar a voz grave do seu tio era algo com que ela ainda não conseguia lidar da forma que gostaria, e talvez nunca conseguisse.

Evie acreditava que, no mínimo, deixaria escapar um lampejo de surpresa dos seus olhos mas Charlie manteve-se normal, e a menina lembrou das palavras escritas por ele:

“Você é uma menina especial Evie.”

Seu próprio tio já sabia algo nela sem nem ao menos conhecê-la. Sem ela se quer dar conta disso em si. Aguardava esse momento à muito tempo.

Charlie começou a narrar uma história que duraria todos os degraus daquela escadaria.

– É uma parte inseparável do que ouve com o Bryan. Bryan estava totalmente encantado com o Jonathan, nosso pequeno e loiro irmão. Naquele verão Jonathan tinha acabado de aprender a subir escadas. – Charlie pisou nos primeiro degraus. Não olhava mais para Evie, imerso nas lembranças daquela época. – Ele não resistia a subir todas as escadas que via pela frente. E Bryan não cansava de subir junto com ele, principalmente as escadas do nosso enorme escorregador. Então, quando nossa mãe o chamou para cortar a grama do nosso quintal peguei meu balde e pá e fui até o campo de areia que ficava junto ao escorregador. Levei uma hora para fazer um castelo de areia tão grande quanto eu e assim que o terminei, busquei Jonathan para escorregarmos juntos. Ele desceu primeiro e caiu exatamente no buraco que eu havia cavado para captar toda a areia necessária, com o castelo na frente tapando a visão de qualquer um que pudesse ver Jonathan ali. E quando Bryan ligou o cortador de grama, abafou o choro de nosso irmãozinho.

– Depois disso meus pais doaram a nossa mansão para o Instituo Crawford e me colocaram lá. Por vinte anos. – Charlie fez uma pausa e soltou um riso desprovido de humor. – Lembro-me de que na época Bryan ainda tentou cavar o buraco com as mãos, depois de cortar toda a grama e entender o que eu havia feito. Mas assim como eu, você e ele já entenderam que era tarde demais.

Charlie tornou a subir as escadas e continuou.

– Eu era atendido pela mesma senhora de cabelos brancos e roupas pretas. Com seu salto alto que ecoava irritantemente pelos corredores feito de pedras do Instituto. Eu nunca recebia visitas. E, finalmente, chegou o momento da minha alta, é claro. Eu não poderia viver lá para sempre.

Agora Charlie olhava para Evie , e ele viu a expressão da menina ficar cada vez mais séria. Será que ela já descobrira o final da história?

Sorriu e seus olhos pareciam mais reveladores e sedutores do que nunca.

– Seu pai foi me buscar naquele dia, que eu escolhera para ser exatamente o dia da minha alta. Me despedi daquele Instituto para sempre e entrei no carro com seu pai. – Charlie se lembrou do irmão assustado que fora buscá-lo e riu. – Ele parecia que via um fantasma.

E no mesmo segundo Charlie fechou os lábios e um lampejo de ódio com remorso ocupou suas orbes azuis, e Evie se viu no meio de um mar enfurecido.

– Mas seu pai mentiu para mim. Ele me enganou. Chovia naquele dia e Bryan parou no meio da estrada, dizendo que me mandaria para Nova York e me dando o carro preferido do nosso pai. Se quer perguntou o que eu achava sobre isso. Me deu dinheiro, passaportes, cartões de créditos e uma bolsa de mão com uma carteira de couro marrom.

A medida que Charlie lhe contava a história, juntando-se às informações que ela descobrira, um quebra cabeça imaginário ia sendo montado na sua cabeça e ela arregalava cada vez mais os olhos.

– Comecei a chorar, eu só queria ir para casa com ele, conhecer você. Mas não. E eu não entendia o porquê. Você não me ama mais? , perguntei e Bryan respondeu: “É claro que eu amo você. Só preciso te amar um pouco menos agora. Não posso deixar que fique perto da minha Evie. Da minha família.” E eu disse, Mas eu sou da família. Que tipo de família é essa que não se leva para casa?

Charlie havia se tornado outro. Mais intenso, nervoso e de certa forma sensual. O movimento que fazia com seu corpo, enquanto subia as escadas, hipnotizara Evie da mesma forma que um réptil fica ao olhar para uma luz, imóvel e sem conseguir tirar os olhos de lá. Vislumbrados demais para tal ato.

Até mesmo seu tom de voz ficara mais grave, fazendo com que a garota almejasse escutá-lo ouvir contar o mais horrendo dos atos como se fosse algo banal. Evie só pedia que ele continuasse falando.

Nesse momento duas partes do seu cérebro travavam uma luta interna onde o irracional estava ganhando – mais uma vez. Pensar, de fato, quando Charlie estava por perto havia se tornado algo de extrema dificuldade para a nossa heroína.

– Desci do carro e fingi que ia vomitar só para ter a oportunidade de pegar a pedra mais pontuda que havia do riacho. E quando retornei para o carro matei seu pai com ela. Peguei seus óculos e não soltei a pedra mesmo co Bryan perguntando o porque. Enquanto batia na sua cabeça sangue voou para todos os lados e manchou o vidro e eu tive a certeza de que precisava queimar tudo. – Charlie se agachou para pegar sua mala de mão colocada no meio da escada. – Mas antes dele morrer disse as mesma palavra que ele disse à mim: “É claro que eu te amo. Eu só preciso te amar um pouco menos agora.”

Charlie havia chegado ao topo da escada e parado em frente à sua sobrinha. E no momento em que ele terminou, Evie levantou a mão e lhe de u um tapa.

Ficaram em silêncio por alguns segundos.

– Porque agora? Porque voltar agora? – Evie conseguiu perguntar, lembrando todo o sofrimento pelo qual ela e sua mãe passaram. E sem saber, acomodando o próprio assassino e causar de tanta dor.

Charlie demorou alguns minutos antes de vagarosamente virar o rosto para encará-la.

– Quando eu sai de Crawford. O dia em que seu pai sofreu o acidente. Que dia era, você se lembra?

Ela não queria mas foi inevitável não se lembrar de todos os acontecimentos daquele dia e como sua vida mudara desde então.

– Meu aniversário de dezoito anos.

Charlie sorriu de canto.

– Eu estava esperando por você. – Anunciou. Charlie terminou de subir o último degrau. – Tudo o que eu fiz foi por você, Evie.

Charlie se agachou na frente da menina e abriu sua mala.

Qualquer pessoa racional ou que, no mínimo, tivesse algum senso, teria corrido ou empurrado um assassino que acaba de confessar seus crimes do topo de uma enorme escada. Mas Evie não era qualquer uma e nem também pensava mais por si só.

Evie estava tonta, inebriada, zonza e com sono, tudo isso de uma vez. Seu corpo formigava e ela parecia não saber mais aonde estava. Se sentia em transe com seu corpo explodindo em milhões de sensações, mais boas do que ruins.

Ela observou seu tio Charlie pegar a caixa branca envolta na fita amarela que ela havia encontrado meses atrás, quando sua mãe fizera o primeiro passei com ele. Houve uma certa expectativa da parte da menina para saber o que havia dentro, e quando ela encontrou um par de escarpens Christina Loubouttin ficou surpresa. Ainda queria encontrar um par de oxfords preto com branco.

Charlie os retirou da caixa e os colocou na frente dela. Começou pelo pé direito, desamarrou os cadarços, retirou delicadamente o tênis e encaixou o pé da menina no sapato de salto.

Fez o mesmo com o esquerdo e antes dela se acostumar com a altura estendeu uma de suas mãos para ajudá-la a continuar de pé.

Evie não praticamente não sentia o corpo e quando Charlie tocou seus pés e começou a alisá-los e manuseá-los com tamanho cuidado, teve a certeza de não estar mais agindo com controle. Ela sentia seus tornozelos e canelas quentes demais, assim como todos os outros lugares que Charlie tocava.

Quando Charlie tornou a ficar de pé, não soltou a mão da menina – e ela muito menos se lembrou desse detalhe – e ele abriu um sorriso rápido.

– Feliz aniversário Evie. – Desejou.

Evie não conseguia entender porque se sentia assim e nem como sair desse estado. Os olhos de Charlie não a deixavam pensar direito e o timbre da sua voz fazia tudo se intensificar.

E quando ela viu ele se aproximar como um animal sedendo por desejo aceitou o fato de aceitar com bom grado, o que quer que estivesse vindo, afinal, ela nada conseguia fazer.

Evie conseguiu sentir o aroma inebriante do seu tio mais próximo do que nunca, lavanda com couro e um toque específico só dele.

Foi quando a campainha tocou.


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Notas finais do capítulo

Eai, o que acharam??? Por favor me digam!
XOXO



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