The Game escrita por diego_soquetti


Capítulo 12
Parte 1 - Capítulo 11 - It's Time to Duel!




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A Transição foi automática, como era de se esperar. Em menos tempo que o piscar dos olhos, a distância entre os dois jovens foi aumentada. Todo o entorno se transformou, o ambiente assumindo um tom branco homogêneo. Olhando ao redor, era como se estivessem em uma enorme esfera: não havia horizonte em local algum e visualmente o próprio chão era indistinguível do céu. A única estrutura que quebrava aquela homogeneidade era a plataforma de mármore que agora surgia na frente de cada um dos garotos.

Hélcias olhou para ela. O coração se acelerando. Ele tentava manter o controle, mas estava claramente nervoso. Era apenas sua terceira Transição e apenas a segunda vez que via aquele mundo. Mesmo assim, engolindo em seco ele tentou deixar os medos de lado. Fora até ali, agora precisava sair por conta própria. Pousou a mão no pescoço de forma quase instintiva. As três pedras penduradas no colar.

Na plataforma, em sua extrema direita, um maço de cartas fora posicionado. Estavam todas viradas para baixo e Hélcias pode ver o shield que protegia a carta: era azul escuro. Aquele era seu deck de Yugioh. Para além disso, contudo, um pouco acima da posição do deck estava uma série de quatro números, aparentemente encrustados no mármore, que deviam marcar seus pontos de vida iniciais: 8000. Certamente não havia engano quanto ao jogo em que teria de enfrentar seu oponente.

–Está pronto para começar? – A pergunta veio de Duo, que tirou Hélcias de seus pensamentos, forçando-o a olhar para frente – Como desafiado você tem o direito de começar, então ande logo com isso.

Hélcias meneou um sim com a cabeça. Apreensivo, pode sentir a mão tremendo enquanto sacava cada uma das cinco cartas. Com a mão montada, Hélcias puxou então a sua primeira carta, pousando-a em sua mão. Tomando seu tempo, observou bem as seis cartas antes de fazer o primeiro movimento do jogo. Tinha muito em risco para ser descuidado.

–Certo – Declarou, pegando uma das cartas de sua mão – Primeiro, eu seto um monstro em campo – Pousando a carta na plataforma de pedra, à sua frente o esperado fenômeno ocorreu: uma carta em tamanho imenso, virada para baixo, surgiu no vasto espaço que distanciava ambos – Além disso, eu seto uma carta – Pegando outra carta, ele a colocou abaixo da anterior, com a cena se repetindo na sua frente – e encerro meu turno.

Por um instante, Duo não fez nada. Ficara apenas olhando a Hélcias com uma expressão de claro desgosto, antes de finalmente quebrar o silêncio.

–Esse é o seu melhor, Hélcias? – Sua voz era carregada de obvio desprezo – Aproveitando-se da vantagem de começar, setar duas míseras cartas é o melhor que você consegue fazer? Mas que merda de deck você montou? – O tom ia se elevando, até se tornar quase um grito – Para alguém que queria me desafiar você agora vai simplesmente se esconder atrás de uma ou duas barreiras? Mas será que não consegue nem mesmo me dar uma partida decente?!

–Você realmente gosta de falar, em Duo? – Hélcias gritou. A raiva estava crescendo enquanto ouvia aquelas palavras – Deixe então eu fazer duas colocações. Primeiro: alguém cujo alvo preferencial são os mais fracos não tem o mínimo de direito de falar em covardia. E segundo: cale a merda dessa boca e jogue a porra desse jogo!

–Hunf... Que seja – Duo não parecia ter qualquer reação às palavras de Hélcias. Se ficara irritado com aquelas palavras não deixara transparecer – Draw – Declarou, puxando uma carta. Mal a olhou já a jogou diretamente na plataforma de mármore à sua frente – Eu ativo a carta mágica Mystical Space Typhoon!

Os céus escureceram. Hélcias não teria como dizer de onde vieram, mas uma série de nuvens começaram a se aglomerar acima do campo de batalha. Nuvens negras, carregadas, das quais trovões e raios pareciam emanar esporadicamente. E, então, ele surgiu. Saindo destas nuvens, um enorme furacão desceu. De formato espiral, com sua ventania se espalhando pelo campo, a base de seu funil atingiu diretamente a carta mais atrás no campo de Hélcias. Ao menor toque ela foi completamente destruída.

–Tsc. Um Typhoon logo agora – Hélcias olhou para campo. Ainda que não a tocasse, sua carta simplesmente desaparecera de sua posição na plataforma, apenas para reaparecer, virada para cima, um pouco acima de onde estava seu deck. Fora destruída. Estava no cemitério.

–Se você se surpreende com tão pouco então é pior do que eu imaginava – Duo comentou, olhando o nervosismo aparente de Hélcias. Pegando outra das cartas em sua mão, ele a jogou na plataforma sem demora – Agora, eu ativo a carta mágica Nobleman of Crossout!

–O que?! – Os olhos de Hélcias se arregalaram. Conhecia bem aquela carta. Pelo seu efeito, o jogador que a controlar poderia destruir um monstro que estivesse setado no campo. Para além disso, uma vez usado este efeito, se o monstro setado era um com efeito em flip, ambos os jogadores teriam de enviar todas as cópias daquele monstro para o cemitério, caso tivessem alguma.

No campo de Duo, uma estranha luz surgiu do solo. Se elevando a partir dela, aparecia na frente de Hélcias o que só poderia ser descrito como o arquétipo do cavaleiro medieval. A armadura reluzente parecia emanar luz, tão polida que era. O manto vermelho lhe descia as cortas até quase os pés. Os cabelos loiros ondulados lhe caiam nos ombros, deixando o elmo. Finalmente, em sua mão havia uma brilhante espada de aço com o cabo dourado. Foi esta figura que, demonstrando imensa agilidade, cortou o campo, correndo até a carta setada de Hélcias e a cortando ao meio.

Tal e qual a tempestade de até há pouco, uma vez cumprida sua função o cavaleiro prateado simplesmente desapareceu do campo, como se nunca houvesse estado ali. Mas já não importava. O monstro de Hélcias fora destruído. Seu campo agora estava completamente aberto.

–Sem monstros e sem armadilhas. Como é estar completamente desprotegido, Hélcias? – Duo perguntou, um leve sorriso de escárnio se fazendo notar em sua face. Hélcias não respondeu, limitando-se a lhe lançar um olhar mesclado de raiva e medo – Bom, que seja. É hora de encerrar esse duelo – Pegando mais uma carta de sua mão, ele a lançou na plataforma de mármore – Eu ativo a minha carta mágica Power Bond! – Uma enorme luz se fez surgir à sua frente enquanto a magia de fusão tinha lugar – E pelo efeito desta carta, eu envio três Cyber Dragons da minha mão para o cemitério...

–Três Cyber Dragons?! – Hélcias quase gritou quando ouviu aquela declaração. Usar uma carta como a Power Bond em si já era perigoso, dada a situação completamente aberta que ele tinha. Mas usar como materiais de fusão três cyber dragões... O resultado final disso seria sua completa derrota... Em um turno!

–Como você pode imaginar, só existe um monstro que surgiria desta fusão – Duo comentou, o sorriso arrogante fixo em seu rosto – Apareça agora, meu Cyber End Dragon!

Da luz que preenchia o campo de Duo, uma imensa criatura foi se erguendo. Do corpo completamente revestido em metal, três longos pescoços sustentavam cada qual uma cabeça de formato draconiano. Nas costas, duas imensas asas metálicas sustentavam a criatura em pleno ar, enquanto que da base de seu corpo saia uma longa cauda metálica. Soltando um estridente rugido, o monstro cujas próprias dimensões já eram difíceis de compreender deu o sinal de que fora invocado com sucesso.

–Cyber End Dragon... – O comentário de Hélcias era quase um sussurro, dado o estupor que sentia. O monstro cujo ataque original já era de 4000 tinha agora seu poder dobrado pelo efeito da magia de fusão. Com agora 8000 pontos de ataque, um só ataque dele significaria a sua derrota.

–Entenda Hélcias – Duo comentou, sua voz ressoando pelo campo – Este é o mais longe que alguém como você consegue chegar. Cyber End Dragon, ponha um fim nisso: Ataque diretamente!

Das três gigantescas cabeças do monstro um intenso brilho branco teve lugar. Hélcias mal teve tempo de plenamente compreender o que acontecia quando viu três intensos raios de luz vindo em sua direção. Os olhos arregalados em pavor, o jovem pode ver quando os três raios pareceram encontrar o que parecia uma parede invisível, criando nela ondulações bem visíveis. Uma barreira de proteção, que impedia que ele recebesse um ataque diretamente em seu corpo. Mas que certamente não protegia seus pontos de vida: se tivesse sido capaz de olhar para baixo, Hélcias teria visto o contador rapidamente cair de 8000 para 0. Havia perdido o jogo.

–/-/-/-

–Hum...

–O que foi? – O olhar de Jewel se desviara da janela por um momento. Ainda com o olhar no exterior, centrada nos dois garotos do outro lado da rua, a garota de vestido negro parecera esboçar alguma reação a o que quer que tivesse ocorrido – Viu algo de interessante?

–Não muito – Ela respondeu, apática – Como eu pensava, aquele garoto não é mesmo capaz de fazer o que é necessário – Completou, falando sem olhar para Jewel. O olhar ainda concentrado no outro lado da rua

–/-/-/-

Hélcias pode sentir as pernas fraquejarem e por muito pouco não caiu de joelhos no chão. A cabeça baixa e a respiração ofegante. Para alguém tão inexperiente, voltar de uma Transição ainda era uma experiência estafante. Contudo, o que fazia seus joelhos ainda tremerem era bem menos o estresse mental causado pela Transição do que a lembrança daquele jogo. Por mais que a longa conversa que tivera na Fighters havia alguns dias lhe tivesse preparado para o que poderia ver, ainda era incrivelmente assustador.

–Eu espero que fique agradecido – A frase de Duo tirou a Hélcias de seus pensamentos, forçando-o a olhar para frente – Nesta partida, decidi apostar apenas duas pedras, então você vai poder sair daqui com os próprios pés. Use essa chance e saia do meu caminho, de uma vez por todas – As duras palavras eram acompanhadas de uma expressão de completo desprezo e insatisfação.

Conforme Duo se virou, claramente intentando seguir até a loja de cartas, uma série de pensamentos e sentimentos atravessaram a mente de Hélcias. Primeiro, sentir-se surpreso. finalmente se dera conta de que ainda estava vivo. Consciente. Estivera tão assustado com a derrota que se quer parara para pensar em quais foram, ou poderiam ter sido, suas consequências. Em seguida, sentiu medo. Levando a mão até o pescoço, a presença de uma única pedra solitária era ainda mais desconfortável do que suas até então três pedras. Finalmente, sentiu raiva. Uma raiva intensa para consigo mesmo. Depois de tudo o que falara, no final teria mesmo de deixar Duo fazer o que bem entendesse.

Era isso justo? Tudo o que ele quisera fora ajudar. Só queria evitar que alguém tivesse de passar por aquilo. Evitar que alguém sofresse. Mas, no final, sua tentativa de amenizar uma situação problemática terminou por apenas deixar a ele próprio em uma situação desvantajosa. Era aquilo tudo o que podia fazer? Como Duo dissera, era mesmo só até ali que ele poderia chegar? Cerrou os punhos, chegando mesmo a considerar atacar a Duo fisicamente. Infelizmente, ele não tinha qualquer experiência de luta e pensava se seria capaz de vencer a quem fosse em uma briga. E foi então que outro pensamento cruzou sua mente. Uma solução, afinal.

–Duo! – Ele gritou, a plenos pulmões, atraindo mesmo a atenção de outros visitantes daquela galeria – Olha pra cá agora, desgraçado!

–Desista garoto – Duo se virou, lançando um olhar para Hélcias – Aproveite essa chance antes que eu perca a paci... – A frase, contudo, foi interrompida. O cenário mudou. O conhecido tom homogêneo de branco tomou lugar. Hélcias havia forçado uma Transição – Mas o que?! – Duo gritou, surpreso – Me desafiando com apena suma pedra... Você ficou louco?!

–Eu não diria tanto – Hélcias disse. Em seu rosto havia um claro sorriso arrogante. O olhar confiante diretamente apontado para o adversário – Duo. Esta aqui você perdeu.

Tão logo Hélcias assim proferiu o cenário se alterou. O espaço branco desapareceu por completo mais rapidamente do que o piscar de um olho. Estavam de volta ao vão principal da galeria. Estupefato, Duo centrou o olhar em Hélcias. No pescoço deste o colar exibia agora duas pedras.

–Mas... O que diabos aconteceu aqui? – Duo gritou, o olhar uma mescla de confusão e irritação – O que foi que você fez?!

–Muito simples, Duo – Disse Hélcias, dando alguns passos na direção de Duo. Usava grande parte de sua energia para não cair no chão conforme caminhava. As pernas bambas pela exaustão que sentia. Mesmo assim, não pretendia fraquejar – Eu te desafiei para um jogo de weiss Schwarz

–Um jogo de que? – A pergunta foi automática, mas tão logo a fez Duo compreendeu as implicações do que Hélcias dizia – Você...

–Entendeu, não é, Duo? – Hélcias disse. Estavam novamente a poucos passos um do outro. O sorriso confiante ainda estampado no rosto de Hélcias – Foi uma aposta perigosa, na verdade... Se você tivesse um deck desse jogo eu poderia ter problemas, mas felizmente ele parece ser tão desconhecido quanto eu pensei que era.

–Usando do sistema de derrota por W.O. para garantir a própria vitória... – Um sorriso surgiu no rosto de Duo. Sorriso de irritação. Da mais pura raiva – Eu acho que preciso admitir. Você pode ser um noob, mas pelo visto não é tapado.

–Saia daqui, Duo – Hélcias declarou. Sua expressão ficou séria. Mantinha a cabeça erguida, olhando para o oponente – Se você continuar aqui eu vou simplesmente continuar te desafiando para um jogo que você não tem nenhuma chance de ganhar. Então... – Um sorrisinho de escárnio surgiu no rosto de Hélcias – Aproveite essa chance e saia do meu caminho!

–/-/-/-

–Hum...

–“Hum” outra vez? – Jewel apontou, novamente desviando o olhar para a morena à sua frente – Incrível, acho que nunca te vi se expressar tanto – Comentou, com um sorriso zombeteiro – Então... O que houve dessa vez?

–Talvez nada – Ela comentou, ainda aparentando completo desinteresse – Mas parece que a Resolução de ambos aumentou consideravelmente desde que chegaram.

–O que é isso, afinal? – Jewel perguntou – Você já me explicou essa história de Resolução antes, mas eu ainda não entendo direito o que é – Era mentira. Em fato, Jewel já havia decorado a explicação para aquilo. Ainda assim, o único momento em que a morena parecia esboçar algum interesse em algo era quando explicava seu poder.

–É bastante simples – Ela começou, sem questionamentos, ainda olhando pela janela – Todo ser humano possui em si a vontade de viver. Porém, viver não é apenas existir. Trata-se de seguir seus desejos, sonhos, esperanças, ambições... Um ser humano que não faça isso está morto e apenas não sabe ainda – Ela fez uma rápida pausa, deixando a ideia assentar – A Resolução de uma pessoa determina até onde ela está disposta a ir para realizar suas ambições. O quanto de esforço está disposta a fazer, o quanto está disposta a sacrificar... Em ultimo caso, você poderia dizer que a Resolução determina o desejo de viver de uma pessoa.

Jewel gostava de ouvir aquela explicação. Por algum motivo aquelas palavras pareciam afetar à morena, que as falava com relativo interesse. O que já era uma enorme mudança para uma pessoa que à primeira vista se mostra fria e apática. Claro, o assunto em si era um tanto quanto desconfortável, especialmente pela implicação de que alguém era capaz de ver a vontade de viver das pessoas. Em um mundo onde todos se contentavam em existir, deixando de lado sonhos e esperanças em troca do primeiro salário mínimo, não era de se admirar a completa apatia que aquela garota parecia sentir com absolutamente tudo.

–Mas você disse que a resolução dos dois aumentou, não? – Comentou Jewel. Fingia confusão, procurando prolongar a conversa – Então ela não é algo estático, certo?

–Via de regra, ela na verdade é – A morena prontamente respondeu. Desviando o olhar do lado de fora, agora encara Jewel – A Resolução de uma pessoa está embasada em elementos como a autoestima, valores morais, crenças religiosas e uma série de outros elementos que, em alguém que já passou da infância, estão consolidados o bastante para que suas resoluções seja bem firme, sejam fracas ou fortes. Contudo, existem dois sentimentos que podem fazer a resolução de uma pessoa mudar drasticamente. E estes são: o desespero e a raiva.

–Dois sentimentos que cegam as pessoas e jogam por terra seus valores morais e inibições – O comentário de Jewel foi seguido de um aceno positivo vindo da morena – Acho que entendi... Ah, mas deve ser bem chato ver esse tipo de coisa, não? Quero dizer, em um mundo onde a maioria das pessoas não parece ter uma resolução lá tão forte...

–Hum, é... Eu suponho que seja assim... – E, com essas palavras, ela voltou a olhar pela janela – A maioria das pessoas se satisfaz com qualquer coisa. Se deixa assentar em qualquer canto e se diz feliz recebendo migalhas. Abandonam a si próprias em troca de uma falsa sensação de conforto – Fez uma pausa, deixando suas palavras se assentarem. O olhar melancólico parecia tornar aquele um dos pouquíssimos momentos em que a garota exibia qualquer emoção clara – Bom... Suponho que isso é o que chamam de “ordem das coisas”, não?

–/-/-/-

–Sair do seu caminho? – Os punhos cerrados, a raiva de Duo aumentava a cada momento – Está bem garoto, conseguiu o que queria – Com um sorriso de puro ódio, os olhos de Duo pousaram nos de Hélcias. Um olhar fulminante que fez a este se inclinar levemente para trás – Eu não vou mais me segurar!


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