“Há verdade em suas mentiras

Dúvida em sua fé

O que você constrói você põe a perder.”

Sara

A manhã passou devagar e graças a Deus Jana não mencionou mais a minha saída do dormitório, ela deve ter visto algo na minha cara que a impediu de perguntar mais.

Eu continuava irritada com o Luke e comigo mesma por ter ido até o apartamento dele e ter deixado as coisas fugirem do controle mais uma vez.

Encontramos Pedro no almoço e ele também percebeu meu humor.

– Aconteceu alguma coisa? – perguntou quando eu disse que estava sem fome e só iria tomar um suco.

– Não é nada, só não estou no meu melhor dia hoje!

Eu o ouvi murmurar algo para Emerson parecido com “acho que é TPM”.

Eu passei o dia todo repassando o que acontecera no jantar e no apartamento de Luke. Pensando no que prometera a Edna e procurando uma forma de cumprir com minha parte no plano. Estava sendo mais difícil do que eu imaginava. Eu estava mesmo perdida.

– Vamos nos reunir hoje à noite lá no meu dormitório, já avisei todo mundo. Temos algumas coisas pra discutir sobre aquele assunto. - Pedro me dizia enquanto me acompanhava até o meu quarto.

– Teve alguma ideia depois daquele dia? – perguntei esperançosa.

– Eu andei pensando em algumas coisas, mas precisamos discutir mais isso.

– Tá, eu só vou tomar um banho e trocar de roupa. – respondi.

Tomara que a ideia dele seja mesmo boa! Seria ótimo ter um plano alternativo se eu falhasse, e no momento era muito provável que isso aconteceria.

Nos reunimos naquela noite. Eu não sabia como os meninos fariam para acomodar doze pessoas no quarto, mas eles haviam empurrado as camas para as paredes e espalhado almofadas no chão. Depois eu descobri que Mandy havia dado a ideia.

Jacson pegou alguns filmes na locadora pra disfarçar a reunião e não despertar a atenção de ninguém. Já tínhamos popularidade demais.

Depois que já estávamos todos acomodados em um círculo de almofadas, Pedro começou a falar.

– Eu não sei se vocês já haviam pensado em algo depois da nossa última reunião que foi há um mês...

Um mês? Como havia passado tão rápido? Eu bati minha mão na testa ao perceber que meu tempo estava acabando rápido demais...

– Algum problema? – Mandy perguntou e eu percebi imediatamente que todos estavam me olhando.

– Não, é só que passou rápido demais! – respondi dando um sorriso amarelo.

Percebi que Jana me olhava como se eu estivesse ficado louca e Ângela parecia preocupada. Eu sei que Angela iria querer saber como foi o jantar com Luke, mas ela era discreta demais pra perguntar e ela sabia que se eu quisesse lhe contaria.

E eu queria contar tudo, talvez eu até contasse, mas eu tinha medo de acabar falando demais e ela descobrisse que por trás da minha inútil tentativa de tirar Luke do lado negro, houvesse outros interesses...

Desviei minha atenção do meu diálogo interior para Pedro que voltara a explicar a ideia que tivera.

– ...parece louco, mas pode dar certo e tenho certeza que é o único jeito.

Eu fiquei boiando, havia perdido toda a conversa, mas percebi pela expressão torturada de alguns e séria de outros que a ideia não era muito boa.

– Pode explicar de novo eu não entendi muito bem! – pedi.

– Acho que ficou bem claro! – disse Rose – Identidades falsas, sair do país, cortar contatos com todos os conhecidos...

Eu olhei atônita para Pedro, ele já havia falado desse plano antes e eu havia rejeitado completamente.

– Já lhe disse que não vou ficar longe da mamãe...

– Ela pode ir com a gente!

Eu olhei bem para ele me recusando a acreditar que havia mesmo dito aquilo. Não, eu não podia tirá-la do seu mundo iluminado e empurrá-la para as trevas do meu.

– Eu não vou fazer isso com ela!

– Se vamos fazer isso, todos terão que concordar, não podemos deixar ninguém para trás. – ele argumentou.

– Não. Deve haver outro jeito, tem que haver!

– Sara tem razão! – Ângela concordou – Embora seja um bom plano, somos muitos pra nos escondermos e mesmo que não deixemos rastros, eles virão atrás das nossas famílias e só Deus sabe o que farão com elas.

Ele suspirou, dando-se por vencido.

– Alguém tem mais alguma ideia? – Jacson perguntou.

– Eu andei investigando alguns membros da Ordem, mas ainda não encontrei nada que pudéssemos usar contra eles. – informou Eric.

– Esqueça os outros membros da ordem e concentre-se em descobrir algo sobre o Luke, é ele quem precisamos derrubar. – Emerson falou. – O pai dele é praticamente o dono da Ordem e se pegarmos o Luke pegaremos o pai dele também.

Ouvi todos murmurarem em concordância, Ângela me olhou um instante e desviou o olhar em seguida.

– Não sei se existe algo para ser descoberto, eles são muito bons em manipular informações. – Falou Bruno

– Mas se houver algo para ser descoberto, não tenho dúvidas de que Eric vai conseguir. Ele é o melhor hacker que eu conheço. – disse Jana.

E ela tinha razão. Eric era muito bom com computadores, tinha certeza que ele era capaz de invadir até o sistema da CIA se quisesse.

– Ok, se tiver alguma coisa sobre ele, seja onde for, eu vou descobrir. - Garantiu Eric.

– E aí, quem esta de acordo da gente pedir uma pizza! – Gritou Emerson.

O pessoal começou a gritar os sabores que queria e eu peguei minha bolsa para ir embora.

Pedro notou meu gesto e veio falar comigo.

– Não vai ficar? Depois vamos assistir aos filmes que o Jacson pegou.

– Eu queria muito ficar, mas eu não estou com cabeça para isso.

– Sara, está rolando alguma coisa que eu não sei? Ultimamente você anda muito estranha e...

– Pedro - ouvi Emerson gritar - empresta o teu telefone pra eu ligar pra pizzaria? O do Alex está sem sinal.

Pelo visto eu não estava escondendo nada dele. O que eu iria responder?

“Não está acontecendo nada, eu só tenho que dar um jeito de arrancar o paradeiro de Daniel do Luke nem que eu tenha que virar amiguinha dele para isso”.

Não, eu não podia contar a verdade. Acho que a história da TPM ainda era a melhor opção.

– O meu está sem bateria. Tá com o teu aí? - ouvi Pedro perguntar pra mim, mas eu ainda estava estática, pensando no que eu iria responder, então só ergui a bolsa para ele e continuei pensando.

Ele não acreditaria na história da TPM, nenhuma TPM dura tanto tempo, ou dura?

– Sara? – ouvi ele me chamar e olhei pra ele que parecia estar sufocando. – O que a chave do quarto do Luke faz na sua bolsa?

Ele me mostrou a chave que eu havia guardado na bolsa de manhã. Havia esquecido de devolvê-la ao Luke e andara com ela na bolsa o dia todo.

Eu perdi a capacidade de falar por um tempo. Continuei olhando paralisada para a chave.

Burra! Não devia ter deixado a chave na bolsa, num lugar que qualquer um poderia ver.

– Sara! – ele ergueu minha cabeça pra ele e segurou–a ali, meus olhos encontraram os dele. – Como a chave do apartamento do Luke foi parar na sua bolsa?

Ele repetiu a frase bem devagar como se estivesse perguntando algo para uma criança.

Então eu não tinha opção a não ser contar a verdade, ou parte dela.

– Desculpe! Luke me convidou pra jantar ontem e eu aceitei. – comecei a contar, mas ele me interrompeu.

– Ontem? Mas você estava aqui no quarto com cólica! Ângela me disse que...

Ele soltou meu rosto e olhou para Ângela.

Ela olhou indecisa pra mim, sem saber se dizia a verdade ou não. Parecia que todos haviam parado o que estavam fazendo para nos assistir.

– Eu pedi a ela para mentir pra você. – confessei.

– Você mentiu pra mim? – Eu podia ver a força que fazia pra controlar sua voz. – Por quê?

– Lembra da nossa conversa no carro? Eu não acreditava que Luke que havia sido seu amigo pudesse ter se tornado totalmente mau. Aceitei o convite porque queria ouvir a história dele, precisava saber se ele realmente estava contra nós.

– Enlouqueceu? – Rose perguntou – Depois de tudo o que ele fez, você ainda duvida que ele é mau?

– Eu sei que fiz besteira, Rose! Foi exatamente isso que ele me respondeu, que ele havia feito tudo por livre e espontânea vontade.

– Devia ter me contado! – falou Pedro.

– Se eu te contasse, você não me deixaria ir. E eu precisava ouvir a verdade dele.

– Tem razão, eu nunca teria deixado você ir. Mas eu não entendo porque você queria tanto que Luke fosse bonzinho a ponto de duvidar do que ele é capaz de fazer.

– Eu só achei que ele seria um bom aliado se estivesse do nosso lado.

– Isso é loucura!

– Eu sei! Já me convenci disso.

– Mas afinal o que aconteceu nesse jantar? Como a chave dele foi parar na sua bolsa?

– Eu derramei vinho no meu vestido e ele me ofereceu o casaco dele pra voltar. A chave estava no bolso do casaco dele. Eu não vi na hora, só percebi quando já estava em casa. Eu a coloquei na bolsa pra devolvê-la depois.

– E o jantar?

Eu contei tudo o que acontecera no jantar, mas omiti a parte da conversa sobre vinhos.

– Foi só isso? Eu sei que aquele canalha quer ficar com você, ele te fez alguma coisa?

– Não, eu deixei bem claro pra ele que só tinha aceitado o convite porque queria ouvir as explicações dele. Eu já disse a ele que eu amo você.

Ele pareceu se acalmar.

Eu respirei fundo. Então alguém bateu na porta e Alex atendeu.

Ele voltou trazendo um envelope de papel pardo e o entregou a Pedro.

Ele pegou o papel e o olhou.

– Não tem remetente! Não viu quem largou?

– Não! – respondeu – Quem quer que o tenha deixado, foi rápido.

Pedro abriu o envelope curioso para ver o conteúdo. Tirou o que parecia ser um bolo de fotos de dentro dele.

Eu o vi fechar os olhos e atirar as fotos para mim. Minha falta de reflexo fez com que eu segurasse apenas uma foto, as outras caíram e se espalharam pelo chão.

Não precisei olhar para o chão para saber do que se tratavam as fotos porque a que eu tinha em mãos, dava uma boa ideia.

Era uma foto de Luke e eu.