Tourette escrita por B Mar


Capítulo 10
Capítulo 10 - Meus pêsames.




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Capítulo 10 - Meus pêsamente

Peter PDV:

Nos dias seguintes, a correria deu lugar ao silêncio, que só era interrompido pelos meus constantes tiques.

Não que nossa casa fosse uma bagunça completa, mas mamãe sempre deixava um som ambiente automatizado, o que dava um ar alegre ao dia.

Hoje ele estava desligado.

Mamãe pouco falava, eu não ia para a escola e toda a família estava se preparando para o funeral. Além de nós, outras famílias também haviam perdido pais, filhos ou irmãos no ataque. Os escombros do avião haviam sido encontrados com corpos carbonizados, e cada família havia recebido seu devido parente.

No dia marcado para ir, nos vestimos em silêncio, encontramos minha avó e meus tios, e mamãe dirigiu com seu carro até o lugar. O carro dele estava lá, estacionado há meses.

Durante todo o tempo me fiz de forte. Mamãe precisava de mim. Ela que tanto cuidou de mim e me ensinou a ser forte, precisava ser ensinada novamente, e eu faria isso por ela.

Cada funeral ocorreu em uma tenda diferente (eles alugaram um parque verde inteiro), com a fotografia do falecido soldado na porta e ao lado do caixão fechado.

Todos que eram importantes estavam lá. Nossos amigos, parentes e colegas próximos. Eu não conhecia algumas pessoas, mas fiquei feliz em saber que eles se importavam.

Kit e Bella acenaram para mim e acenei levemente de volta. Eles eram meus melhores amigos há anos, e eu sabia que estavam respeitando meu espaço.

Todos ficaram em silêncio quando o Pastor começou a falar. Ele leu alguma passagem da bíblia que eu não conhecia, sobre morte e ressurreição, e deu espaço para que os parentes e amigos fizessem seus discursos.

Peeta foi o primeiro a caminhar até o frente e segurei a mão de mamãe, que tinha os olhos vermelhos de choro.

Eu conheci o Gale no serviço militar. Nós nos alistamos na mesma época e fomos chamados pelo mesmo grupo. Nós treinamos juntos, ficamos no mesmo alojamento e nos sentamos juntos nas poltronas dos aviões. Não foi difícil virarmos amigos. – Ele sorriu triste. – Gale era um irmão pra mim, e nós fizemos um acordo na última vez que atuamos juntos: Ele prometeu que cuidaria da minha família se algo de ruim me acontecesse, e eu lhe prometi o mesmo.

Ele nos olhou, e então continuou.

Eu não fui pai, não tive esposa e minha família não existia. Meses depois, na única missão que participei sozinho, eu sofri um ataque e perdi a minha perna. Ele dirigiu até o outro lado do país na semana do próprio casamente, apenas para me ver e se certificar que eu estava bem. Eu nunca pude retribuir tudo isso.

Peeta respirou fundo e secou os olhos.

Anos atrás, eu mal pude acreditar quando o reencontrei. Nossa amizade continuou, e sua família me acolheu, assim como ele. – Ele soluçou. – Eu também fui chamado há alguns meses, mas o serviço descobriu sobre minha perna e fui dispensado pelo resto da vida. Eu não pude salvá-lo, mas cumprirei a minha promessa, como sei que ele cumpriria se estivesse no meu lugar.

Todos aplaudiram suavemente.

A essa altura, meus tiques haviam começado a chamar atenção, e metade da tenda estava incomodada. Não era minha culpa, eu estava nervoso, emocionado e sentia falta do meu pai. Como eles queriam que eu me mantivesse em silêncio durante algo tão grande?

Vovó e meus tios também falaram, assim como Finnick e um ou dois amigos, até que chegou a vez de mamãe.

Gale e eu nos conhecemos quando eu tinha 18 anos. Havia acabado de me mudar para fazer faculdade e ele era garçom quando não estava treinando para os bombeiros ou em alguma missão militar. Ele era metido, sabichão e extremamente agitado. – Ela riu. – Eu ainda consigo ouvir suas explicações sobre porque o céu é azul ou porque o mar é frio de dia e quente à noite.

Abaixei a cabeça, secando o rosto novamente.

Ela continuou contando, mesmo que eu não estivesse consciente o bastante para prestar atenção. Eu conhecia a história dos dois. Era linda.

Quando ela terminou, eu soube que era a minha vez. Eu era o último.

O pastor não disse meu nome ou o que eu era dele, e apenas me acompanhou com os olhos enquanto eu caminhava.

Eu sou Peter Everdeen Hawthorne, e tenho 14 anos. Sou o único filho de Gale Hawthorne e Katniss Everdeen. Eu conheci Katniss e Gale quando tinha oito anos. – A maioria dos presentes trocou olhares confusos. – Eles estavam viajando de férias e visitaram minha cidade, no estado de Nova Jersey. Eu vivia num orfanato estadual, tinha 9 anos e nunca havia sido adotado. Os barulhos que vocês ouviram durante todo o funeral, são a manifestação de um tipo de distúrbio que eu tenho desde que nasci. Eu tenho síndrome de Tourette.

Olhei para mamãe e ela mexeu a cabeça em aprovação.

Eu sempre achei que nunca seria adotado. Ninguém gosta de um garoto que late como um cachorro. Eles me observaram por um tempo, e foram o primeiro casal que realmente demonstrou interesse em mim. Eles perguntaram meu nome, minha idade, de onde vim, e nunca se importaram com os tiques. Eu nunca tive uma família. Desde que eu me lembro, vaguei de orfanato em orfanato, não tinha muitos amigos... Quando eles me adotaram, foi incrível. Eu via aquela casa grande e ficava imaginando “Eles vão me largar, vão se cansar de mim.”. E então você se prepara pra isso.

O silêncio era palpável enquanto eu falava.

Eu passei seis meses... – Respirei fundo. – Eu passei seis meses esperando que isso acontecesse. Eu nunca falei com eles, mas eu morria de medo que eles finalmente se cansassem de mim e me largassem em qualquer lugar. Então eu percebi que eles realmente me amavam. Quer dizer. Eles me amavam. Eu nunca havia sido amado.

Quando olhei na direção de mamãe, Peeta estava abraçando-a pelos ombros.

Eu realmente os amo, mesmo que ele... – Pigarreei. – Mesmo que ele não esteja aqui. Não mais. Ele fez muito por mim. Não importa o que digam, ele é meu pai. – Afirmei. – Pois ele cuidou de mim. Ele cuidou de mim e me deu todo o amor que eu precisava, e ainda mais. Eu nunca irei esquecê-lo.

Tia Johanna e Bella foram as primeiras a aplaudir, seguidos dos Odair, Peeta, mamãe e todos os outros.

Saímos de lá silenciosamente, e logo tio Finnick, tio Rory, Tio Vicky e eu estávamos carregando o caixão negro.

Quando chegamos ao lugar certo, eles fizeram o resto do processo. Havia bandeiras, e então veio o TAPS. Eu acho que eles estavam descendo o caixão, mas eu não vi. Estava ocupado demais abraçando mamãe.

Eles me entregaram a bandeira e, no fim, todos nós fomos a uma recepção qualquer que o serviço tinha organizado. Mamãe estava sentada com minha avó e meus tios quando ouvi um chamado.

– Peter?

Me virei na direção.

– Olá. Eu não sei se você se lembra de nós, mas nós...

– São do corpo de bombeiros.

Eles confirmaram.

– Cato, Thresh, Gloss e... – Tentei me lembrar. – Brutus.

Eles confirmaram.

– Nós sentimos muito pelo seu pai. – Thresh continuou. – Viemos prestar as condolências.

Confirmei e, um a um, eles apertaram minhas mãos, murmurando “meus pêsames”.

Eles cumprimentaram toda a minha família, e então outras pessoas apareceram. Alguns colegas da escola, um pessoal do trabalho da minha mãe, ex-colegas de escola... Alguns outros eu não havia visto nem nos anuários. Todos lamentavam muito, me cumprimentavam e murmuravam “Meus pêsames”.

Essa era uma frase que eu ouviria muito daqui para frente.

Meus pêsames.

Continua...


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Notas finais do capítulo

~Capítulo revisado em 27/01/2015~



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