Mantendo O Equilíbrio - Finale escrita por Alexis terminando a história


Capítulo 157
Capítulo 156


Notas iniciais do capítulo

EU DEVIA ESTAR ESTUDANDO!
Mas escolhi abrir o arquivo e revisar CAPÍTULOS e descansar a alma com essa galerinha. Tava merecendo, assim como vocês!

PRINCIPALMENTE SE TRATANDO DESSE CAPÍTULO MARA QUE NÃO TENHO PALAVRAS E FICARÁ PARA SEMPRE NO MEU CORAÇÃO AAAAAAAA

Bora?



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/453816/chapter/157

Eu não sabia que estava TÃO ansiosa por este Natal até que me vi na vontade de fazer xixi de novo. Porque fui ao banheiro antes de sair de casa. Bebi muita água também, o que me lembrou por alto da Fláv... De alguém que conheço.

Vez que teria que andar um bocado na casa do seu Júlio, pedi encarecidamente pro Murilo me deixar na porta do banheiro, se não daria meia-noite e eu ainda estaria a caminho nesse passo lento meu. Meu mano fez cara de quem não devia atender meu pedido, mas pensou melhor e me carregou. Surpresa mesmo foi vê-lo no corredor me esperando pra voltar à sala, já que eu prometi não abusar do seu transporte e sim praticar mais o simples andar.

“Só não quero que você perca nada” foi o que me respondeu.

Ao chegar ao início do corredor, vemos como nossa família já está toda entrosada aos Garra e Muniz. Papai e vovô conversam com seu Júlio, vovó com Filipe, e mamãe, com aquele seu sorrisinho, já sei que tá costurando tramoias com minha sogra. Todos ao redor da mesa decorada, aproveitando algum petisco.

Assim que meu irmão me coloca ao chão, não deixo de comentar:

— A gente conseguiu, mano.

— A gente quem? Quem ficou na cozinha o dia todo fui eu. Quem arrumou a mesa também.

É claro que o sacana vai ficar ditando os créditos dele. Se duvidar, vai falar isso até o ano que vem. Mas não quero implicar, não agora.

— Tô falando do meu... “sonho”.

Faço aspas e tudo.

— De juntar a família toda. Ainda falta a Aline, a Lia, eu sei, mas... Você vê? Conseguimos algo extraordinário.

Ambos olhamos para a cena diante de nós, de como estavam todos juntos e se divertindo e conversando e sendo este um bom dia. Com essa, meu irmão me abraça de lado.

— É, conseguimos sim.

E logo depois complementa:

— O Renato e o Sávio só vão vir mais tarde.

— Melhor ainda.

— Melhor ainda pra ti, porque os safados se safaram.

Se safaram de um dia de trabalho, é o que ele quer dizer. A intimação era de arrumar a casa (que já estava pré-arrumada), a mesa da ceia e a ceia propriamente. E as sobremesas. Seu Júlio botou todos os homens pra trabalhar. Na verdade, Filipe só pediu ajuda porque não teria mão suficiente para fazer tudo, e o vô-sogro intimidou seus netos.

Só ainda não descobri porque tiraram a Iara de cena. Tem “mato nesse cachorro”, alguém diria.

Antes que possa me encaminhar por essa lembrança, ouço uns gritinhos animados vindo de um dos quartos ao fundo do corredor. Olho para trás de instantâneo, para saber o que dona Iara já estava aprontando.

— O que foi isso?

A criatura? Só ri. Ele sabe de alguma coisa!

— Acho que é a Iara descobrindo o presente do Vini.

— E qual é o presente do Vini?

— Uma coisa bem legal.

— Que é...?

— Que é diferente.

— Aff, eu vou lá, já que tu não quer entregar nada.

Me solto dele para ajeitar minha posição e seguir para os quartos, mas Murilo me impede. O que ele responde, me surpreende, pois até um tempo atrás era ele quem queria espiar os outros.

— Não vai não, deixa eles terem o momento deles. Logo logo eles chegam aí e você vai descobrir.

— Acho bom, seu coisa.

Em poucos segundos depois, Iara irrompe o corredor e passa por nós com um sorriso do tamanho do mundo. Assim que puxa uma CÂMERA PROFISSIONAL e nos pede para fazer uma pose, me empolgo junto de saber desse presente.

Nem dá tempo de eu perguntar, pois, de tão animada que está, Iara anuncia pro Filipe dali mesmo:

— PAI, ADIVINHA O QUE O VINÍCIUS ME DEU!

Com essa, ela sai costurando até a mesa para mostrar a Filipe e a todos o seu presente. Vê-la assim me deixa muito mais feliz. Parece uma criança... no Natal. A criança que não pôde ser por muito tempo, com os familiares certos que não teve.

Outra vez, antes que eu possa comentar algo, Murilo sai atrás, segue ela para pegar seus créditos. De pé ali no corredor, só aprecio a vista de todas aquelas interações.

— Fui eu que instalei o mural, viu!

O quê que eu disse?

Quando já ia perguntar que mural é esse, Vinícius chega ao meu lado e diz, todo malicioso:

— Sua vez.

— Minha vez de quê? Já ganhei presente, viu!

Capcioso, ele sussurra ao meu ouvido:

— Sua vez de gritar meu nome.

— Vinícius!

E não é que grito mesmo?

E assim, astuto, aproveitando a distração de todos, ele me sequestra. Quer dizer, passa os braços por minhas pernas e me leva para a primeira porta que estava aberta. Ao me colocar de pé escorada à parede do quarto de seu pai, ele nem liga a luz, só puxa meus braços ao alto de seu pescoço e me tasca um beijão. Assim, do nada, como eu ontem.

Acontece que ontem a casa tava vazia. Agora a casa tá mais do que cheia. Por isso protesto outra vez – aos risos bobos, claro.

— Vini!

Ao mínimo segundo que ele se desgruda de mim, diz:

— Você está linda.

— Tu não tá nem me vendo.

— É porque você é maravilhosa.

Impressão minha ou ele está... animado demais? Sim, está, noto quando as coisas esquentam muito rápido e o sinto de maneira mais voraz. Quero muito entrar nessa, mas temos três famílias inteiras na sala a nossa espera. Mas não nego que me deixo levar um pouco por seus beijos. Até que, ao longe, ouço alguém me chamar. Iara.

Envolvida pelo perfume do namorado e toda sua animosidade, mal consigo retrucar a esse seu bombardeio, ainda mais que ele pouco quer liberar minha boca.

— Segura... esse... pensamento... Vini. Depois a gente... volta.

— Me deixa viver esse pensamento por mais um minuto.

Sorrio ao passo que abraça meus lábios novamente.

— Diz isso para sua irmã.

Só assim ele para, se volta para a porta e grita a todos:

— ELA JÁ VAI. Pronto, tá dito.

Ontem estava eu toda vergonhosa e ainda mais por sonhos ardentes. E não é que parece que estamos fugindo dos olhares da nossa família, como naquele primeiro sonho? Dessa vez não me sinto de todo embaraçada, só divertida. Ainda mais porque Iara chega próximo da porta entreaberta e diz:

— Dois minutos e já venho arrancar vocês daí! Tô com fome!

A comicidade é o que nos separa, para minha surpresa. Buscando o fôlego, Vinícius encosta sua testa na minha e declara, ainda sacana.

— E há... dois minutos... ela tava.... me agradecendo.

Satisfeita de sentir sua respiração e sua queixa, anuncio:

— Bem-vindo aos dramas de irmãos.

Vinicius sorri meu sorriso preferido junto de mim, colados novamente em outro beijo impulsivo e dedicado, mas sou obrigada a protestar, porque estava tirando meu batom e me despenteando inteira. Era fácil pra ele, que era só puxar o cabelo para um lado depois do ninho que ali fiz. Teria eu que dar uma passagem no banheiro de novo.

— Vini, minha maquiagem.

Consigo alcançar o interruptor e ligar a luz, que nos atinge de cheio. Mas não amaina o atrevimento do outro, que só diz, piscando pra mim:

— Não seja por isso, amor. Sei onde pegar na mesa da minha irmãzinha.

Às vezes o Vinícius me derrete com a mais simples expressão e ele nem percebe. Com essa, esqueço até que tem uma ceia nos esperando. Um Natal. Pessoas.

Então Iara retorna:

— Vocês querem mesmo que o Murilo venha aqui?

Isso sim faz a gente se soltar NA HORA.

~;~

Faz bem pouco tempo que descobri, através de Iara, a paixão de Filipe por cozinhar. Aliás, quando houve a reconciliação com Vinícius, isso o despertou mais para a própria vida e seus gostos. Não sei bem como ele “excluiu” uma coisa tão importante para si e por tanto tempo, mas saber que estava revivendo um grande prazer era uma notícia muito boa. Iara mesmo comentava vez e outra de algo que seu pai preparava, antes até da mudança para a casa do seu Júlio. Vinícius também soltava uma coisa e outra. Mas até então não tinha tido a experiência de provar de sua comida. Quer dizer, não conscientemente. Porque Filipe aprontou MUITO antes.

Entre elogios e conversas na mesa, ele confessa que tem um tempo que invadia a cozinha da casa para preparar o almoço de domingo junto de dona Fanny. O de sábado também, mas eu só apareço aos domingos. Seu plano era testar e praticar alguns pratos. Com a ajuda de dona Fanny, ele foi resgatando esse seu lado mais culinário e com um bom suporte especializado por parte dela. O desafio final era a ceia natalina, um compromisso e tanto, ainda mais depois dos últimos dias e arranjos.

Vinícius se ofereceu pra ajudar na empreitada e até seu Júlio, que não entende nada de fazer comida. Logo Murilo foi escalado. Iara estava nos planos até que o irmão escolheu o presente dela e precisou de todo um tempo para concluir, assim fez com que tivesse que ficar fora da casa. Cuidar dos convidados foi só uma desculpa – e uma que foi muito bem aproveitada por ela.

E, caramba, eles fizeram muita coisa. Natal pede, né? Geralmente ficou tão absorvida pela própria confraternização que nem observo tanto os preparativos, senão a zona e o estresse. Aqui me pego mais curiosa a respeito, talvez porque não esperava ter vindo de quem veio.

Repleta de opções para rechear o prato, a mesa cheirava bem gostoso desde nossa entrada na casa. Não à toa Iara estava pressionando a gente para ir logo comer. Além do clássico peru de Natal, haviam duas lasanhas, arroz temperado, salpicão, farofa e outros acompanhamentos mais. Senti um pouco de falta da torta da minha mãe, mas vê-la tão radiante naquele espaço supriu bem esse pedacinho de casa e conforto. Até mesmo ver o Murilo se empanturrando como se nunca tivesse visto comida.

Porém, gostoso mesmo era ver e estar presente nesse evento excepcional por completo. Tem tanta coisa que passa por nossa percepção sem a devida apreciação. Como vovô antecipando as vontades de vovó e capturando porções para deixar mais próximo dela, ou a mania de papai de ficar deslizando o dedo na base de seu copo por conta da água que condensa lá, ou ainda mamãe perguntando se está do agrado de todos, mesmo ela não tendo preparado ou organizado. Coisas que a gente não sabe que faz falta no dia a dia ou em dias tão importantes.

A sobremesa quase ninguém conseguiu tocar de tanto que todo mundo estava lotado. Mas estava cedo, tínhamos muito para aproveitar. As conversas então, não paravam um segundo, sempre muito agitadas, com muitas risadas e histórias. Não deixava de participar e nem de observar como essa noite inesperada se desenrolava bem. Parecia que tudo estava encaixado.

Até nossas roupas. Como diz o ditado, se tivéssemos combinado, não teria dado (tão) certo. Os homens estavam todos de camisas escuras, sendo cinza bem forte, como vovô, marrom bem denso, como papai, ou anil, como Filipe e seu Júlio. Filipe era o único de blazer, uma peça marrom também escura, que ainda o destacava. Já Murilo e Vinícius “destoavam” com suas camisas pretas, sendo a peste de camisa de botões e o namorado de uma camisa polo.

As mulheres, por outro lado, acertaram em muitas e muitas lantejoulas e brilhos. Para essa noite, escolhi um vestido prata, desses com uma golinha pescoço e caimento mais solto, com uns frufrus na barra, algo planejava vestir na virada de ano, conforme o antigo plano. Foi o mais leve que encontrei para a ocasião e para a necessidade de me mover diante das dificuldades. Em sincronia, mamãe veio com um também da cor prata, apesar de o seu ser mais chegado para o cinza intenso, e o meu para o branco.

Vovó estava a pura noite de estrelas com um vestido preto de mangas longas, quase bufantes. Djane, em estilo similar, vestia um desses de mangas assimétricas, toda ousada com um ombro de fora. Já Iara estava de com um vestido preto de botões e cinto, de mangas longas e transparentes, como uma digna executiva chique e sexy.

Quando nos apercebemos todos, os homens de nossas vidas ora admiravam, ora ficavam no pé um do outro quando algum deles se atrevia a falar das nossas escolhas. Como Vinícius ao mencionar pro Murilo que a mãe estava com um estilo diferente, mais livre, só que pelo modo com que falou soou como se estivesse se queixando, e o meu mano disse que estava ótimo, nada demais. Mas quando se tratou do look da Iara, os dois se juntaram pra falar que estava um pouco audacioso e curto, ao que seu Júlio foi interferir a conversinha deles, que eram eles que estavam implicando com a neta linda dele. E que poderiam ficar sem sobremesa se continuassem.

Apenas amo como o vô-sogro pode ser amoroso e ameaçador na dose perfeita.

Novamente atenta, ouço certa conversa entre os dois irmãozinhos no canto da sala quando levanto para ir deixar meu pratinho de sobremesa na mesa:

— Eu vou matar ele!

— Vai nada.

Iara faz pouco caso e eu rio mais quando Vini repete, com um resmungo muito do sacana, de braços cruzados e lindo:

— Eu vou, eu vou matar ele.

Me meto na conversa porque sim. A curiosidade fala mais alto.

— Quem nós vamos matar?

Nem digo que Iara estava o puro deleite com aquilo. Principalmente quando revela, nada modesta, de quem se tratava a conversa:

— O seu chefe.

— Por que a gente vai matar o Thiago?

Esse aqui ouviu falar sobre o caso dos documentos que tiveram alteração e ouviu também da minha discussão com o Thiago.

— Ah. Mas se for pra matar alguém, não teria que ser o Sér... Ninguém.

Consigo perceber um sinal da cunhadinha pra não falar o nome do maldito, mas o Vinícius ainda captura informações e cerra os olhos pra mim, todo intrigado.

— Então você sabe de coisas, né?

— Eu sei que não é pra matar o Thi. Ele se desculpou.

— Sei. E quando que vocês iam me cont...

Nessa hora seu Júlio se levanta do sofá e reúne a atenção das conversas paralelas, dando fim a elas quando diz “meus caros convidados” em toda sua autoridade e presença. Iara foi salva pelo gongo do vô, mas sei que alguma hora ela iria compartilhar aquilo com o irmãozinho dela.

Assim espero, na verdade, porque não quero ter revelar suas histórias do trabalho. Isso também faz parte do resgate que é a relação deles. Uma construção bonita.

— Gostaria que todos se reunissem aqui perto da televisão, porque chegou a hora.

— A hora dos presentes?

Murilo se mostra mais animado com essa. Quando bateu no sofá após o jantar, parecia ter perdido as forças. Agora estava realmente uma criança esperando por mais presentes, vez que já ganhou os da nossa família. Mas era provável também que era só sua vontade de espiar os presentes dos outros, pois, apesar de algumas pessoas já terem trocado presentes antes da ceia – e antes de vir pra festa de Natal – ainda havia alguns abaixo da árvore imensa.

— Não. A hora de revelar o que vocês aprontaram hoje. Fiz uns slides para todos com as fotos que tirei.

— MEU. DEUS. QUERO!

Sim, essa fui eu. Uma Iara se alvoraça junto, com um toque de fofurinha a mais.

— Já disse o quanto amo o senhor, vovô? Porque AMO. Muito!

Ela passa por mim e pelo Vinícius pra chegar até o seu Júlio e depositar nele um beijo e abraço apertado. É claro que Murilo protesta, seguido do namorado.

— O senhor disse que era para o seu acervo pessoal!

— É, vovô, ninguém combinou isso não.

— E precisava combinar? E sim, é do meu acervo pessoal, que quero dividir com todos. O Murilo tá desde cedo cobrando os créditos dele, então nada mais que justo mostrar, não?

— Acho justo também.

Essa é a resposta do sogrinho, que dá um sorriso bem malandro. Tem coisa aí nessas fotos e eu quero – PRECISO – ver. Me arrasto com cuidado até a parte de trás do sofá, onde o Murilo está sentado, e tento convencer ele enquanto o Vinícius quer ver o material antes dessa divulgação. Sabe-se lá por que estão assim reclamando ou tentando impedir, mas fazem isso de um jeitinho tão cômico que é difícil levar a sério mesmo.

Alcanço a criaturinha e assim que estou melhor posicionada, puxo sua cabeça para mim com cuidado, de modo que meio que me olha de cabeça pra baixo, vez que seu pescoço dobra no encosto do móvel.

— Deixa, Mu. Faz parte dessa coisa incrível que fizemos. Que você fez.

Mamãe ao lado, complementa com a cartada final:

— É, olha só a carinha da Iara! Acho que nunca a vi tão vibrante!

Com essa, Murilo ajeita sua cabeça e declara, em tom mais alto:

— Tá bom.

Já Vinícius, exclama:

— Tá traindo o movimento, cara?!

Só que a maneira com que o namorado se volta pro Murilo e como responde é tão engraçada que não tem como geral não rir. E ficar na expectativa quando meu irmão retruca de volta:

— É melhor que saibam logo.

Seu Júlio, como bom coordenador da bagaça, repassa os slides para Iara e logo as peripécias começam a ser narradas. Sim, pelo vô-sogro.

— Era pra ser uma manhã de muito trabalho, com todos fazendo sua parte, para prepararmos uma grande ceia de Natal. Mas não contávamos com duas pessoinhas fazendo algazarra no meio disso. Os meliantes? Murilo Lins e Vinícius Garra.

Ao ouvir o meu sobrenome, caminho por trás do sofá para chegar até papai e fazer um carinho nele, que entende meu propósito. Faltou o Camargo dele, assim como o Menezes de Djane. Não que ela se importe. Papai também me puxa pelo pulso, o não machucado, para que eu pudesse dar a volta no sofá e sentar junto dele, que também queria saber o que aqueles dois tinham aprontado.

Na tela da televisão, vemos uma foto do namorado tirando “par ou ímpar” com o Murilo para saber quem iria ficar com o avental azul, que estava no alto de uma cadeira. Na seguinte, estão os dois de avental laranja preparando alguns temperos na bancada, enquanto o sogrinho estava de costas, com o avental azul, mexendo em algo no fogão. Em outra, o Murilo posicionou o avental como uma capa de super-herói e, outra, com ele tendo que ajustar outra vez.

— Como vocês podem ver, parecia tudo indo em seus conformes. Nessa próxima já temos nossos garotos estudando a receita, comportados. E aqui discutindo sobre alguma quantidade, já não tão comportados. E nessa, como se pode ver, estavam fazendo algazarra com ovos e farinha.

Seu Júlio malandrão vai descrevendo as cenas, que ficam tão mais engraçadas do que as próprias fotos. A cara do meu irmão possesso e todo melecado de clara de ovo misturado com farinha é impagável. Ao fundo, aparece Vinícius tentando se limpar. Só quero dizer para Iara que ter sido expulsa de casa foi livramento, mas aí vovó interpela a criatura ao se aproximar dele e falar:

— Murilo, chega aqui perto da vó.

Bem inocente, meu irmão se estica da ponta do sofá até a outra ponta, onde ela está, e recebe um puxão de orelha.

— Aiiii, vó!

— Isso são modos de se comportar na casa alheia? E calado, nada de resmungos!

Com um bico, Murilo só aponta pro Vinícius como se dissesse quem tinha sido o autor da confusão ou ao menos quem tinha começado. Vini tenta tirar a dele da reta só levantando os braços, sem acusar e sem se defender. Seu Júlio só passa para próxima.

— Nessa, estão limpando a própria sujeira. E nessa aqui, foi preciso recorrer ao kit de emergência, porque estavam brincando com facas.

Agora o Vinícius se manifesta:

— Foi o Murilo que apareceu do nada quando eu tava com a faca na mão. Não tive culpa. Vovô é testemunha.

Iara retruca, enquanto mamãe quer cuidar de seu menino e seu menino quer acusar nossa avó.

— Vovô foi testemunha de muita coisa, pelo que tô vendo.

— Awn, meu bebê tá ferido.

— Viu, vó, e a senhora aí me machucando. E olha que nem denunciei nada.

De braços cruzados e agora muito risonho de quem sabe de coisas a mais, Vinícius diz algo que cala meu irmão na hora.

— Por que será, né, Murilo?

— E aqui estão almoçando cada um no “canto do pensamento”.

Filipe explica que do jeito que estava, era melhor os deixarem separados e pensando a respeito dos seus feitos. Meu sogro, que era o único que trabalhava na cozinha praticamente, nem reclamou, só exerceu sua autoridade.

Vô-sogro retomou os slides.

— Antes de voltarem ao serviço, tinham um outro acordo para realizar. Aqui temos meu neto tentando escutar vozes pelas paredes.

Rimos todos vendo Vinícius com a lateral do rosto colada em uma das paredes do quarto de Iara. Outra vez o namorado se justifica:

— Estava tentando descobrir se tinha alguma tubulação passando pelo quarto, pra não furar a parede no lugar errado. Vovô que não queria me mostrar a planta da casa ou me falar dos canos.

— Me admira você achar que sei onde estão os canos, meu filho.

Eu não sei mais o que era melhor nessa confusão toda, se era Murilo mortificado, não querendo olhar as fotos e não podendo retrucar mais, se era o Vini e suas justificativas, as imagens me dando as impressões imaginativas mais incríveis ou o seu Júlio e suas respostinhas malvadas. E, claro, suas descrições extraordinárias de complemento.

— Aqui... É, aqui tive que censurar. Murilo estava de olho na gaveta de calcinhas da minha neta.

A bomba, ela vem sem aviso e com imagens embaçadas. Mas dava pra ver que tinha alguém de pé segurando uma das gavetas do cômodo do quarto de Iara e pela coloração da camiseta roxa de meu irmão, deu pra identificar ele.

Com essa, veio uma sucessão de O QUÊ junto da Iara quase engasgando depois de cuspir vinho tinto no tapete BRANCO e um tapão de mamãe na coxa do meu mano. Eu nem sei reagir, senão levar as duas mãos ao rosto. Tava explicado a resistência da criatura. O Vinícius deve ter resistido por ter machucado meu irmão com a faca.

Eu realmente não tenho PALAVRAS pra isso.

— Ai, mãe! Tô machucado, poxa!

— Sua vó tá certa. Isso são modos?

Ela acerta mais um tapa na perna dele, que se lamuria.

— Foi sem querer! Eu tava procurando um adaptador de tomada pra furadeira. O Vini tava demorando muito.

— Pede desculpas agora! Anda, levanta!

Com a cara no chão, Murilo obedece. Se levanta e se aproxima de Iara, que ainda tá recuperando o fôlego. Pelo menos Filipe ou seu Júlio não brigaram com ela pela cusparada de vinho no tapete.

— Desculpa, Iarinha. Não vi direito. Não deu tempo.

— E você ainda queria ver?!

— Não! Vocês estão interpretando tudo errado.

Murilo se volta para o centro da sala, onde estava o cabeça da tramoia. Eu já admirava seu Júlio de outros carnavais, mas agora ele se superou. Totalmente dos meus!

Com as mãos juntas ao rosto em sinal de prece, Murilo pede misericórdia:

— Seu Júlio, explica direito!

— Só estou expondo fatos. Vamos para a próxima. Aqui temos o mural pronto já.

Murilo tenta limpar a barra dele, demonstrando empolgação e recobrando seus créditos mais uma vez, o que faz meu namorado cobrar os seus também:

— Viu, fui eu que instalei!

— Porque eu tava te dando as coordenadas, né, Murilo.

— Isso não desmente o que fiz.

Mas o que faz geral rir risos nervosos é o comentário baixo de Iara:

— Ainda não acredito que o Murilo viu minhas calcinhas.

— Caramba, eu não vi! Só pareceu que eu vi. Seu Júlio tá de prova, ele ficou tirando foto e me distraiu. E ainda bem. Passa logo pra próxima!

O vô-sogro sorri, novamente maldoso, mas atende o pedido desesperado.

— Para o serviço seguinte, os deixamos separados. Murilo foi organizar a mesa, Vinícius a bancada. Tentamos mais uma vez juntá-los para auxiliar nosso chef, mas parece que não era pra ser. Não ainda.

As fotos de Filipe de braços na cintura na porta da cozinha vigiando um e outro era de uma graça que nem sei dizer.

— Ficaram de lavar toda a louça. Só assim, para o próximo serviço, fizemos eles darem o passo de paz. Ou melhor, selar a paz e cumprir com o propósito do dia. Deram as mãos. E trocaram farpas.

Como lutadores de boxe ou algo do tipo, aparecia uma foto das duas pestes com os rostos quase colados, enfrentando-se, enquanto apertavam as mãos.

— Deram um abraço ao final. Não deu para captar essa. Mas terminaram de preparar os acompanhamentos e as sobremesas.

— Eu disse que tinha feito a sobremesa!

— Logo depois, foram salvar as sobremesas por uma borboleta ter entrado na cozinha.

Vinícius novamente joga uma justificativa:

— Porque alguém deixou a janela aberta.

Quando eu achava que não podia melhorar, melhorava. Eu precisava MUITO dessa foto do Vinícius com a vassoura na mão, olhando pro teto, com o Murilo meio abaixado. Eu já ia levantar a mão pra pedir cópia dessas fotos, mas me detenho a tempo. Era melhor pegar em segredo. Não para ameaçar. Pelo contrário, como disse seu Júlio, era para meu acervo pessoal.

A foto da caça à borboleta foi a última, assim vô-sogro faz mesuras, ao que puxo palmas para sua apresentação, seguida por Filipe e então o restante das famílias. Iara ainda estava estarrecida pela história das calcinhas, coitada.

Ao se sentar no sofá novamente, Murilo resmunga:

— Só acho muito injusto que só eu e o Vini que temos fotos assim... indiscretas.

Andando pelo recinto, seu Júlio para de repente e seu olhar brilha no que parece ser uma nova ideia. Ou tramoia de Natal.

— Não é uma má ideia alargar meu acervo. Iara, você não tinha comprado uns adereços no outro dia?

— Comprei.

— O que acha de tirar umas fotos nossas com eles?

Isso enfim a renova, ainda mais que algo trabalha em seu pensamento. 

— Acho uma boa, vovô Júlio. E melhor ainda se fizermos com uma entrada musical!

 

~;~

 

Onde fui EU me meter? E logo com quem? Teria que cantar e dançar cheia dos frufrus – e não tô falando do meu vestido. Nem minha bota protetora conseguiu me safar dessa.

Minha cara não devia estar das melhores, pois Iara, que mexia na caixa de adereços no quarto com minha avó e minha mãe, dá com seu braço no meu:

— Relaxa, Lena. Na nossa vez eu pulo e danço e você só faz uns movimentos e uma pose, tá?

— Não sei, essa ideia de vocês...

— Não vou aceitar você não entrar na brincadeira. Nem pensar!

Quem eu imaginava que não ia entrar no agito, retruca:

— Se eu vou entrar, tu também vai, Milena!

— Mas vó!

— Ouça a voz da sabedoria.

— Isso, a voz da sabedoria.

Iara não perde tempo de usar minha avó pra me convencer também. Ainda resistente, sentada na ponta da cama de Filipe, lembro de uma coisinha que vovó falou tem um tempo. Tento usar a meu favor. Ou melhor, a sabedoria ao meu favor.

— Não era a senhora que dizia pra eu aproveitar o momento e não capturar o momento?

Vovó faz é provar um cinto de cristais verdes, enquanto mamãe adiciona nela anteninhas de ET, e ficam as duas observando suas poses perante o espelho grande, desses que dá pra ver dos pés à cabeça. O mesmo que horinhas atrás eu tive que retocar maquiagem e ajeitar o cabelo depois do efeito Vinícius colado em mim. Uma mudança e tanto em pouco tempo, principalmente no quesito animosidade.

— Regras têm suas exceções. E estão todos proibidos de gravar, só a Iarinha que vai tirar fotos, nossa fotógrafa. Além do mais, vai ser bom balançar o esqueleto.

Tá, com essa eu sorrio.

— Ai, vó.

— Ande, ande. O que acha desse chapéu aqui?

Apesar de estar aceitando aos poucos a ideia, implico:

— Tenho escolha?

— Tem sim. Azul ou amarelo?

E então Iara me faz uma pergunta que ela entende de outro jeito minha resposta. O fato de não querer ouvir nada da artista Pitty se devia a outra pessoa, algo que não era o momento ou o contexto de comentar.

— O que acha de Máscara da Pitty para nossa vez?

— Outra coisa.

— Cadê aquele espírito traquina e sacana que tanto amo, hein?

Com ela de mãos na cintura me encarando, eu também me pergunto seriamente sobre isso. Não é como se eu nunca tivesse tirado fotos com adereços em uma festa ou brincado com eles ou mesmo estimulado a zoeira. Esses últimos dias de montanha russa tem me deixado com umas interrogações assim, comigo às vezes não me sentindo eu mesma e com certa dificuldade de interagir, só desejando ficar quietinha. Acho que é o que machucados fazem com a gente. Tiram nosso prazer com as mais simples, bestas e belas coisas.

Mas é Natal, né? Festa de Natal e com encontros bem improváveis.

— Tá aqui se perguntando onde foram parar os jogos de tabuleiro e como foi que ele entrou na reta.

— Tá todo mundo na reta! Ou todo mundo ou ninguém. Os jogos de tabuleiro ficam pra amanhã, prometo. Mas agora já tenho umas músicas selecionadas. Acho que com esses adereços já dá. Vamos?

Vovó e mamãe vão na frente, não sem antes me beliscarem a orelha para injetar mais ânimo. Iara é ao menos decente de acompanhar meu passo, porém, só porque continua muito interessada na nossa apresentação. Com a caixa de adereços apoiada ao peito com uma mão, ela verifica mais opções de músicas no celular.

— Que tal London Bridge?

— Eu não vou rebolar na frente de todo mundo!

Se era pra me convencer a dançar, tinha que tentar melhor. Seu esforço, no entanto, era algo considerável. Ela mesma dá pra trás da sugestão ao ouvir um trechinho da música e torna a ver outras mais que lá tinha.

— Verdade, também não quero rebolar na frente do meu pai e... Ah, já sei! Mas primeiro vou ali saber a música dos meninos.

Volto para o sofá, onde Iara deixa a caixa de adereços com minha avó, que mostra alguns itens pro meu avô. Dessa vez não vamos amanhecer juntos e nem tomar um leite quente com biscoitos antes de ir pra cama. Nem poderia mesmo, porque o sono do vovô tem tido umas alterações e é melhor deixar que descanse. Isso também me diz que é hora de mudar algumas tradições. Algo que, pelo movimento da casa, vejo que já estamos mudando.

Outra vez me pego contemplando a interações de todos, cada um em uma pequena bolha de conversa e lembro novamente do que o Murilo havia me dito sobre se levantar depois de uma queda. Sobre ter em mente algo que se quer muito e só seguir em direção desse objetivo. A gente conseguiu mesmo e estou aqui acho que não sabendo lidar com esse amontoado de sensações. Foi tudo de uma hora para outra.

Devia estar aproveitando cada minuto, isso sim. Por que não estava?

A voz de meu irmão me faz voltar ao ambiente quando ele, próximo da mesa e às minhas costas, reclama:

— A gente já pagou mico, por que que vamos ter que dançar também?

— Ou dançam ou acabo com a festa pra vocês. Então, Locked Out Of Heaven tá bom?

Apesar de não tão animada de pagar um mico, admiro minha amiga de levar o plano do vô-sogro pra frente e, como mamãe citou mais cedo, era bom ver Iara viva assim. Ameaçadora também. Acho que meu espírito sacana revive nessa. Principalmente depois que ouço também o Vinícius pedir pra trocar.

— Não, não coloca essa não! Coloca... Coloca qual, Murilo?

— Tem My love do Justin Timberlake?

Me pergunto se o namorado não queria essa música do Bruno Mars em específico porque significava rebolar perante as famílias ou porque ele lembrou do que foi o casamento do enfermeiro bonito. Ou os dois. Que juntaram vários homens para dançar de modo improvisado, até o Murilo no meio. Inclusive, foi lá que tiramos nossas fotos com adereços e frufrus.

Acho que meu espírito traquina só não sabia o que esperar desta data marcante diante de tanta coisa que aconteceu. Acho também que pensar em viajar, no sentido de deslocamento mesmo, era uma maneira de fugir de algumas coisas e de pessoas. Significava me jogar em outras histórias, contextos, situações. Não é que não queria estar aqui, não queria era ficar aqui para lidar com algumas sensações que ora e outra me roubam os pensamentos, por mais que eu tente empurrá-los para baixo o máximo que consigo.

Acho que é isso, expectativas. Expectativas diferentes.

Tanto é que meu espírito também não esperava ouvir essa do seu Júlio, outro às minhas costas:

— Como é aquela música que tem uma batida repetida assim: tum-dum-dum-dum-dum-dum-tum, tum-dum-dum-dum-dum-dum-tum?

Pelo jeito, nossos avôs vão dançar White Stripes. Meu pai e Filipe pediram pela música de entrada da série Chuck que, pelas palavras de papai, “é a série com o nerd espião”. Como eu poderia negar uma bagaça boa dessas? Com atualização de tradições? Com todo mundo colaborando para uma noite divertida?

Quando Iara volta para pegar a caixa de adereços, recomeço:

— Então... Qual é a nossa música, afinal?

Isso faz seu sorriso ir de ponta a ponta e confesso que isso me deixa feliz.

— The Best Damn Thing, da Avril Lavigne.

De fato, combinava. Conosco, com o contexto, com a festa. A melhor BAGAÇA que poderíamos inventar para esta reunião épica.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

É TANTO OURO NUM CAPÍTULO SÓ QUE NÃO SEI LIDAR
mas vem aí mais um capítulo bombástico pra equilibrar HAHAHA



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Mantendo O Equilíbrio - Finale" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.