Love, Rock and Girls escrita por Nina Spim


Capítulo 2
Chapter Two


Notas iniciais do capítulo

Olá, gente! A fanfic está me empolgando tanto que já escrevi mais dois capítulos, yay! Espero que gostem desse! Beijos! P.S.: relevem os erros.



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III – American Nights

Estou rindo de algo que Puck está nos contando. Algo envolvendo um senhor bêbado e uma cabra. Ou talvez sobre um sabre de luz. Não sei, não consigo me lembrar do começo da conversa, porque estou bêbada. A van está ziguezagueando as ruas ainda movimentadas de NY, as luzes da cidade batem em meu rosto e fazem meus olhos doerem e há um odor forte de vodca no ar. Quando olho para o lado, uma menina de cabelos escuros está observando o borrão que passa diante de seus olhos através do vidro empoeirado; é a Rachel, a aniversariante. Acho que está entediada, ou enjoada, ou infeliz.

Cutuco-a de leve. Por estar um pouco bêbada, não sei se a machuco ou não com meu gesto. Ela me olha e então sorri. Ela é como um bebê panda. Ai, meu Deus. Não consigo evitar pensar isso! Um bebê panda! A aniversariante é um bebê panda! Bebê panda! Uma pandinha meticulosa e meio retraída. Eu e os meninos, perto dela, somos ursos pardos. Talvez ela ache que nós, de alguma forma, podemos devorá-la a qualquer momento. Ou oferecer cigarros a ela. Mas ela é tão bonitinha!

Rio mais um pouco, mesmo contra a vontade. Não sei por quê. Apenas quero continuar a fingir ser alegre. Não que eu não seja, e não que a quantidade que ingeri de bebida alcóolica não enfatize este fato, mas quero que Rachel não se sinta intimidada. Pessoas que riem e se divertem não são capazes de ocasionar nenhum dano moral, verbal ou físico em alguém tão pequeno quanto essa garota meio assustada. É, é isso. A garota Hobbit está assustada. Coitadinha! Preciso rir um pouco mais para demonstrar que não ofereço perigo a ela; não vou machucá-la. Não seria capaz de tocar num bebê panda senão para ficar com ele no colo pelo resto da noite e afagá-lo. Não é certo maltratar um bebê panda. Especialmente um tão amorzinho quanto Rachel Berry.

“Quer ouvir uma história engraçada?”, eu sussurro a ela. O espaço é apertado entre nós, pois estamos dividindo o chão da van com os instrumentos musicais do show. Ela não está fedendo a cigarro, ou à bebida; sua pele ainda resguarda um pouco de seu perfume. Gosto desse modo quase infantil que ela parece a mim. Como a menina do interior pela primeira vez na Big Apple, uma caipira desengonçada com trancinhas e fita no cabelo. Rachel assente. “Sabe o nome da nossa banda?”, pergunto rindo. Não é realmente hilário, mas não consigo refrear esse instinto; rir é tão bom, queria que ela risse comigo, essa completa desconhecida que aceitou aproveitar o restante da noite com alguém tão errada como eu. Tenho certeza de que ela pensa que sou uma vagabunda, que transo por aí com qualquer um. Todo mundo que conheço tem essa primeira impressão de mim. Não me incomodo que isso ocorra; muita gente não sabe que consegui uma bolsa na NYU para conseguir pensar outra coisa de mim, além do fato de que me visto como uma prostituta. Além do mais, não sou de compartilhar esse fato. Certamente, diriam que eu dormi com o coordenador da universidade, ou algo assim. Mas tudo bem. Tudo bem mesmo, porque não devo satisfações da minha vida a ninguém. “Foxwood?”, ela pergunta. “Como o cassino?”, pergunta de novo. “A sua banda tem esse nome por causa de um cassino?”.

Caio na risada, agora a tentação é grande demais para não cedê-la. Rio sem fingimento, agora. Essa garota é engraçada. “Não! Por causa da fazenda Foxwood, de A Revolução dos Bichos!”, eu digo em meio aos meus risos. Não sei parar mais. Sou tomada por uma onda ridícula de felicidade genuína. Não sei se é porque a garota nova parece estar indecisa quanto à sua reação, ou porque bebi demais. Agora percebo que esse nome é ridículo. Por que, diabos, eu disse ‘Foxwood’ na hora da nossa primeira apresentação no circuito de bandas independentes?! Acho que tinha sido porque há certa sonoridade na palavra. Pois o nome de uma fazenda fictícia não aparece toda hora na mente das pessoas, por favor. Eu deveria estar um pouco bêbada quando me recordei de A Revolução dos Bichos, certamente. Não que eu seja bêbada sempre. Não sou nem estou bêbada todas as noites. Apenas bebo em confraternizações: shows, encerramento de festivais do circuito ‘de garagem’ e reunião com os meninos. Tudo bem, quase toda reunião termina com uma garrafa de vinho, ou sidra, mas nem sempre eu fico rindo feito uma louca como agora. Não fico bêbada tão facilmente, também; é necessário que eu sorva uma garrafa inteira sozinha de bebida para começar a me alegrar e mais uma para ficar completamente descontrolada como agora. Devo ter bebido demais na festa dessa garota, a Rachel. A garota Hobbit. Por que ela tem esse apelido idiota?

“Poético”, Rachel comenta. Ela não está rindo, está estampando uma expressão desconfortável. Espero não vomitar em cima dela. Por favor, não me faça vomitar em cima da garota Hobbit. “É estúpido!”, acabo proferindo. É estúpido pra caramba. Ai, meu Deus. Odeio esse nome, Foxwood. Precisamos de outro. Como nunca me dei conta disso? Por que nunca ninguém nos falou que nosso nome soa como uma fábrica de sabão no meio de Iowa? “Não é”, ela balança a cabeça. Esquadrinho minha boca e meus olhos. “É, sim”, refuto mais uma vez. “Não é”, ela repete o gesto. Ela sabe que é. Ela está mentindo. “É, sim!”, digo mais uma vez, rindo um pouco mais. “Ok, é um pouco”, Rachel solta uma risadinha mínima, meio trancada, e desvia os olhos de meu cabelo. Ela olha o tempo inteiro para ele. “Eu falei”, rio mais. Não consigo parar. Nosso nome é ridículo, hahaha!

Aos poucos, Rachel se solta. Ri comigo, desembestada, sem pudor, alegre. Quero que ela fique assim a noite inteira, não quero que ela ache que sou uma vagabunda que não sabe se divertir, ou acolher meninas certinhas como ela. Eu já fui uma dessas garotas, sei como é difícil se desagarrar ao coerente, a tudo que não é exagerado. Mas que se dane agora, eu sou uma vagabunda. Rachel olha para mim, para meu cabelo, para meu rosto com uma curiosidade infantil, como se estivesse diante de um mundo completamente novo. Ela espia meu cabelo bem mais que o resto, não sei se aprova ou não ele. Bem, ao menos não tenho pirciengs na sobrancelha, ou algo assim. Ela me considera uma vagabunda, sei disso pelo seu olhar. É especulativo por detrás de toda essa curiosidade.

Mas que se dane.

Estou bêbada demais para discutir sobre isso.

Prefiro rir um pouco mais. Não será uma garota Hobbit que acabará com a minha noite, que está apenas começando. Estou elétrica, meio exagerada e extrovertida em demasiado. Não me importo com o que estou dizendo, ou fazendo. Apenas quero desfrutar algumas horas ao lado dessa garota meio certinha demais. Caramba, Rachel é tão certinha! Do tipo que cora e ri quando eu lhe pergunto se o cara grandão com quem passou boa parte da noite no bar é seu namorado. Ele é grande, tipo grande demais pra ela. É um tanto ridículo. “Ele é meu amigo”, Rachel responde, ainda corada. Ela deve estar rubra demais, porque mesmo com a iluminação precária advinda dos postes de luz consigo enxergar seu rosto com precisão. Ela parece estar prestes a entrar em combustão instantânea. Rachel é meio ridícula. Não dá pra acreditar que alguém como ela não se deixou seduzir por alguém. Ou que mesmo tenha seduzido alguém. Alguém deve gostar de tipos como ela, tenho certeza. Os caras que suportam qualquer menina apenas para dizer que está pegando alguém apresentável aos padrões estúpidos da sociedade. Não que Rachel pareça fútil, de modo algum; apenas transparece aquele tipo de gênio difícil de lidar, mas que, por baixo de todas as camadas de indiferença e de crítica, há características incríveis. Aposto que com mais uma ou duas horas em sua companhia descobrirei que é mais obcecada por frases icônicas do tipo ‘Que a sorte esteja sempre ao seu favor’ do que qualquer fã alucinado por aí, ou que tem o box completo dos filmes do Charles Chaplin. E daí, sabe como é, vai ser impossível repeli-la, porque o mundo e eu precisamos de pessoas assim conosco. Pessoas com quem podemos ser loucos sem vergonha. Talvez, Rachel seja tão louca quanto eu mesma. Seria incrível conhecer essa Rachel que ela guarda tão no íntimo. Talvez eu e ela façamos algum tipo de loucura antes que o primeiro raio de sol chegue às nossas vistas. Ora, por que não? Somos meninas e somos livres!

“Dã, eu não perguntei o que ele é seu”, digo com certo escárnio. “Sabe, mesmo que ele seja seu amigo, qual seria o problema de você querer transar com ele, ou algo assim?”.

Rachel olha para frente, para onde os meninos dividem o espaço do bando dianteiro; ela parece mortificada. Ah, droga! A velha Quinn dando as caras e fazendo com que as pessoas se sintam desconfortáveis! Parabéns, velha Quinn! Você conseguiu deixar a novata completamente sem jeito! “Eu não...”, ela abaixa a voz e sussurra no meio ouvido: “Eu não quero transar com ele. Ele é meu amigo, já disse. Você não pode querer fazer isso com um amigo”, Rachel continua um pouco aflita. Sua voz é doce e meio sexy baixa desse jeito, parece um ronronado. “Por que não?”, inquiri e sem me ater muito a qualquer ânsia de uma explicação vindo dela, falei: “Eu já transei muitas vezes com o Puck. Muitas mesmo. Sempre tentamos recapitular a conta depois de mais uma vez, mas nunca conseguimos”. Rachel está me olhando chocada. É, agora ela tem a certeza de que sou realmente uma vagabunda. Que engraçado, ela está com aquele tipo de expressão de repreensão que meus professores do ensino médio me lançavam sempre que eu interpelava suas explicações com comentários sarcásticos e indevidos. “Não tem nada de errado com isso, é apenas sexo. Não o amo, e nem ele me ama. Então para que criar tanta polêmica? Além do mais, somos mulheres do século XXI, transamos com quem bem entendermos! Você não?”, minhas palavras provocam ainda mais repreensão em seu semblante. “Ai, meu Deus, o quê?!”, desatei a rir e agarrei seu antebraço com força. “Não, não me diga que você nem nunca experimentou!”, exclamo na mesma hora. Então lanço-me para frente e meto a cabeça no vão entre as cabeças de Sam e Mike. “A ANIVERSARIANTE NUNCA TRANSOU, AI MEU DEUS. QUEM VAI SE DISPONIBILIZAR A FAZER ESSE GRANDE SACRIFÍCIO?”, minha voz está gritada e sarcástica e ecoa pela van. Os três começam a rir. “Não acredito!”, Sam diz, e faz um contorcionismo com o pescoço para poder encarar Rachel, que está quieta. “Garota Hobbit, você é virgem?”, ele pergunta. Ainda está rindo, mas de modo moderado. Sam é do tipo que faz imitações de todos os personagens de filmes de ação possíveis e que desfila de cuecas sem pudor algum diante da televisão de meu mini-loft enquanto tento pescar algum programa que não dê vontade de vomitar até o encerramento. Mas eu sabia que ele não estava tentando humilhar Rachel. Sam é o melhor aliado sentimental que já arranjei na vida. Escuta calado e depois apenas comenta o que for realmente pertinente, não é cheio de picuinhas nem chegado a grandes discursos. “Não! Mais ou menos...”, Rachel diz.

“Quando uma mulher diz que está grávida ela não está mais ou menos grávida”, Puck, sabiamente, observa. “Entendeu a parada?”, ele lança um olhar rápido para Rachel para perceber que ela realmente entendeu. Rachel assente. “Eu meio que tinha um namorado”, ela conta. “Ihhh, de novo essa história de que...”, Puck começa rindo. Desfiro um tapa em seu moicano. “Hey, Quinn! Você quer que o carro a amasse inteirinha depois de uma capotagem espetacular, sua idiota?!”, Puck berra, logo após meu tapa, pois perde um pouco a coordenação da direção. Ignoro-o. Quero saber do meio namorado de Rachel. Olho-a, inquisitiva. Ela pigarra e prossegue: “Eu era um pouco jovem, só tentamos algumas vezes”. Não quero rir mais. Posso visualizar Rachel adolescente em minha mente. Posso ratificar suas palavras, pois ela deve ter sido aquele tipo de menina adolescente toda preocupada com a virgindade, com o momento especial e com o romance desmedido. Rachel adolescente é ainda mais ridícula do que a que está ao meu lado. “Vocês nunca foram até o final?”, pergunto. “O que vocês fizeram?”, Puck quer saber descaradamente. “Puckerman, fique quieto!”, repreendo-o, porque isso é assunto de meninas. Se bem que Rachel parece tão enclausurada que é capaz de não confessar nem mesmo a mim. Mas tudo bem, porque apenas nos conhecemos há um pouco mais de três horas. “Certo. Então você é, tecnicamente, virgem”, Sam conclui. “Nunca conheci alguém com a sua idade ainda assim”, Puck pontua parecendo um pouco incrédulo ainda. “Quantos anos você acabou de fazer? Vinte e dois?”, ele inquire. “Não, vinte”, Rachel elucida. “Ainda não parece certo. Meninas de vinte anos estão por aí pela noite realizando qualquer tipo de fantasia masculina”, ele diz. “Não sou essas meninas”, Rachel fala e olha para mim de soslaio. É, olá. Sei que me acha uma vadia que sai transando com qualquer cara que aparece na minha frente. Que se dane. Não dou a mínima para a minha má reputação.

IV – Midnight Music

Cumprimento alguns punks de outras bandas. Posso enxergar alguns conhecidos, algumas tietes e alguns viciados em música ruim. Não estou verdadeiramente me importando com nenhum deles. Toda essa gente que está nessa boate decrépita tem duas intenções: a) beber até vomitar para esquecer-se dos problemas e b) ir pra cama com alguém. Música não está nem mesmo no leque de opções. Poucos estão vivamente interessados numa garota de cabelo cor de rosa. Porque todos pensam que meninas não fazem rock. São um bando de filhos da mãe que se incomodam com qualquer barulho mais alto que as próprias vozes. Eles são um lixo. Mas nós estamos aqui, então já era. Vamos tocar, porque é nosso dever.

Puck escreveu na parede do meu mini-loft com tinta vermelha algo que se tornou nosso lema:

Somos gênios da música e temos a obrigação de dividi-la com o mundo.

Não somos gênios da música, mas conquanto música ainda seja nosso maior amor é, sim, nossa obrigação espalhá-la por aí, pelas noites imundas, pelos pubs fedorentos, pelas pessoas mal-educadas. Porque música não pode ser transmitida em doses homeopáticas, tem de ser 24 horas por dia, alta e barulhenta. De vez em quando sentimental – mas não muito. Não sou uma menininha romântica, por Deus! Romance é coisa para pré-adolescentes iludidas por contos de fadas. Meu negócio é música. Eu me casei com a música: com minha guitarra, com meu microfone, com nossas melodias, com nossas letras. Eu sou música.

“Você fica no backstage”, Puck disse para Rachel, com as mãos em seus ombros, direcionando-a. “Qual vai ser a graça?”, ela perguntou. “A graça é que não vão vomitar em você, nem passar a mão na sua bunda, nem te amassarem feito um cupcake”, eu respondi na mesma hora, sem preocupação. “Bem, obrigada por evitarem a minha morte num lugar tão horrível”, Rachel devolve com humor, meio que rindo. É um riso mais relaxado que os outros. Aprecio isso. Parece convincente e conveniente. Retribuo com um sorriso e uma piscadela divertida. Ela desparece para um canto enquanto estalo os dedos ao mesmo tempo em que faço todo aquele exercício vocal pré-show. Não consigo parar de estalar os dedos. É uma mania irritante que tenho desde muito jovem. Certa vez li que fazer isso, ou balançar o pé alivia o estresse. Acho que a partir daí, meus dedos estão estalando a quase todo momento pré-show. Mas ninguém reclama, porque mesmo aqui atrás o som do estabelecimento está alto com seu falatório sexual habitual. Todos esses garotos com a pele perfurada por pinos e decorada com tatuagens imbecis estão caçando. Se deixasse Rachel lá embaixo, ela se tornaria uma presa fácil, ainda mais virgem. Ai, meu Deus. Não dá pra acreditar que a garota Hobbit é virgem. Ou tecnicamente virgem. Que diabos ela pensa da vida? Será que nunca recitaram a ela aquela frase que todos escutam em algum momento? “A vida é curta demais e você tem de aproveitá-la ao máximo”? Rachel tem que aprender a aproveitar a vida urgentemente.

Puck, quinze minutos depois, está sozinho no pequeno palco de tablado frágil. Diz algo para a plateia de desocupados. “Somos o Foxwood, musiquem-se”. Puck é ótimo em inventar novas palavras. Ele é ótimo nesse jogo de neologismos.

Ai, meu Deus! Esse nome continua péssimo! É como Sherwood. Poderia ser nome de motel. Não quero que minha banda seja associada a motéis com lençóis baratos e com paredes finas demais!

Ok, ok, ok. Inspirar e expirar. Três vezes. Cinco. Quinze.

Quando percebo já estou passando por Rachel. “Que a sorte esteja a seu favor”, ela me diz, que está sentada numa caixa de metal perto de algumas baquetas perdidas. Sorrio a ela e depois caio na risada. Eu disse que ela seria uma caixinha de surpresas. “Ela sempre está”, pisco. “Fique quietinha aqui me admirando, ouviu bem? Não ouse sair daqui, não quero perder uma hobbit”, digo e beijo sua bochecha. Rachel assente. “Não quero me perder de vocês, ficarei aqui”, ela diz. Pisco de novo e, sustentando um sorriso, ando até o palco. É a primeira vez que estou exibindo uma expressão que não se assemelha a uma carranca. Sam diz que eu tenho que sorrir de vez em quando e tirar um pouco da minha maquiagem pesada, mas eu apenas mando-o para o inferno. É estranho, porque sorrir em cima do palco me dá um tipo de poder que nunca experimentei. É bom, muito bom.

Quando canto a primeira estrofe da primeira canção do setlist percebo que quero sorrir mais. Saber que Rachel está há alguns metros de mim apreciando minha performance me dá vontade de gritar a letra da canção ao invés de cantá-la. Acelero na guitarra mais que os outros, e a música sai do compasso. Não me preocupo com isso, pois poucos estão realmente atentos a nós. Estou ansiosa, estou meio enlouquecida. Acho que é o efeito do álcool.

Cada banda tem o direito de ocupar o palco por meia hora, então nosso repertório é pequeno, embora muito variado. Escolhi canções que Rachel não ouviu em sua festa. Quero saber sua opinião sobre elas. Será que estou incrível? Ou ainda me vê como uma vagabunda qualquer? Quero estar fabulosa, quero que ela não saiba o que dizer e, em seguida, solte um palavrão para tentar expressar sua emoção. Rachel é meio represada, precisa extravasar a emoção. Um palavrão é ótimo. Tipo, puta que pariu. Pronto, você disse tudo com apenas três palavras. Palavras muito mais certeiras do que ‘Eu amo você’. Vê só? Palavrões vêm a calhar a qualquer momento.

Conto: doze pessoas nos aplaudem. O restante ou está transando nos banheiros, ou bêbado demais para qualquer coisa, ou desmotivado com a vida de merda que leva. Eu, por outro lado, levo uma vida ótima. Não é a vida que uma mãe imaginaria para sua filha única, mas e daí? Minha mãe tem uma vida ainda mais precária que a minha. Ao menos, eu sou feliz, ao contrário dela.

Estou um pouco suada, mas estou eufórica. Não sei se quero parar. Apenas paro, porque a próxima banda está nos expulsando com palavrões. Tentam me apalpar, mas Puck os repele com os punhos em prontidão. Eu não me incomodo.

Rachel não está mais sentada; vem ao meu encontro com um sorriso que me faz recomeçar com o gesto. O quê, eu vou ficar sorrindo à toa agora? Que droga é essa? Não importa, quero sorrir, porque Rachel está tão esfuziante quanto eu, percebo. Não está suada, mas está se sacudindo toda de cima pra baixo, pulando na minha frente como uma gnominha arteira. “Você é sensacional! Onde aprendeu essas coisas? Você teve aulas?”, ela dispara. Solto um berro, meio trôpega, meio arrebentando de felicidade. Em seguida, meus braços estão ao redor de Rachel, abraçando-a. Ela não me repele, mesmo que eu esteja fedendo a queijo suíço rançoso misturado com cerveja vencida. Não sei onde os garotos estão, não vejo ninguém além de Rachel e de seu sorriso que ilumina tudo.

E então me dou conta de que não estou sob o efeito do álcool. Tudo isso é Rachel que está provocando. Pura e simplesmente. A garota Hobbit. A aniversariante de 20 anos tecnicamente virgem. Rachel Berry.

E isso, mais do que tudo, é incrível. Absolutamente incrível.


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Notas finais do capítulo

Canções da banda The Runaways, caso queiram escutar xD Beijos!