O pequeno tordo Rue escrita por Isabela Furiato


Capítulo 2
Capítulo 2 - O que devemos fazer?


Notas iniciais do capítulo

Thresh e Rue formarão um vínculo de amizade. Ambos sabem o que está por vir, mas isso, essa amizade, fica em seus corações e ninguém poderá arrancar de seus peitos.



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Estávamos observando o Distrito 11 ir embora. Nosso mentor estava caminhando pelo trem, usando botas grossas de couro, jaqueta marrom claro e cabelos para trás. Sua pele era um tanto morena e tinha lábios grossos. Ele sentou-se à nossa frente e nos encarou.

– Parabéns. - disse. - Meu nome é Dwub.

Thresh rolou os olhos e sequer olhou para o mentor. Eu o observei com olhos semicerrados.

– Eu estou nisso há mais de 20 anos, nesse pesadelo de ver meus tributos prontos morrerem na arena. - conta Dwub.

– Você não sabe o que é pesadelo, Dwub. - diz Thresh baixo e ameaçador.

– Ah, sei. Fui vencedor dos Jogos, Thresh. Tive que aniquilar os oponentes com facadas. Eu vi sangue, eu senti pesadas nuvens negras formando-se ao meu redor. Eu sei o que é um pesadelo. - responde o mentor, sombrio. - E vai ser um pior se vocês não me ouvirem. Arranjem patrocinadores. Sejam carismáticos. Sejam um show.

Eu fiquei escutando. Parece que estou ali há muito, muito tempo. Quando Dwub nos dispensou, estávamos chegando na Capital. Fomos levados do trem até um quarto especial. Me separaram de Thresh e nesse momento comecei a tremer.

O quarto era todo branco, havia uma cama de metal e espelhos. Três pessoas da Capital, estranhas e vestidas igual a Milla, vieram mexer na minha aparência. Uma mulher começou a separar os cachos de meu cabelo, um homem baixo começou a fazer minhas unhas, outra mulher começou a me medir. Eles eram rápidos e práticos. Nenhum olhava em meus olhos, era como se eu fosse um manequim humano.

Coisas assustadoras se passaram na minha mente. Estavam me produzindo para a morte. Pude ouvir os berros de comemoração das pessoas da Capital do lado de fora. Elas gritavam tanto...

Em um piscar de olhos, eu estava deitada na cama de metal, com uma luz forte acima de mim, esperando o estilista. Fiquei com medo do que ele iria me transformar. Minutos depois ouvi uma porta automática se abrir e entrar um ser engraçado. Peruca bufante, pele esverdeada, roupa preta colada e sapatilhas brancas. O homem alto sentou-se ao meu lado, me examinando.

– Pequenina como disseram.

Olhei para ele.

– Me chame de Lis. Fiz um vestido bonito para você. - disse e pegou um vestido azul claro embrulhado em um saco plástico.

– É bonito. - eu disse.

Lis me olhou e deu um sorriso fraco. Desenterrou o vestido impecável e me vestiu. Olhei-me no enorme espelho com uma roupa angelical. Um arco nos meus volumosos cachos tinham em suas laterais desenhos de trigo. Na minha cintura, uma fita branca com um símbolo de uma folha dourada no meio. As manguinhas do vestido eram redondas nos ombros, as saias eram baixas e pesadas. Lis calçou as sapatilhas pretas nos meus pés com meias brancas.

– Vamos para o Desfile, pequenina. - notei em seu tom de voz uma pitada de tristeza e pena.

Concordei com a cabeça e fomos.

Que lugar enorme!, pensei. As carruagens dos tributos formavam uma fila para o Desfile. A cabine do presidente Snow estava bem à minha frente. Subi na minha carruagem quase caindo para trás. Então, com um solavanco os cavalos começaram a trotar. Thresh estava ao meu lado, rígido e os punhos novamente fechados, como na Colheita. Ele olhava para a frente. Eu senti seu ódio e sua dor.

– Rue? - disse ele quase inaudível.

– O que? - respondo.

– Somos amigos, certo?

– Somos amigos. - digo.

Ele olha para mim e sorri. O momento foi rápido pois estávamos chegando na presença de Snow. Eu olhei a platéia enlouquecida nas arquibancadas. Ela estava gritando para a carruagem atrás de nós. O 12.

– Uau. - exclamo olhando para trás e Thresh faz o mesmo.

Uma carruagem preta e cavalos da mesma cor nos seguia. Os tributos do 12 estavam pegando fogo! Chamas lambiam suas costas e crepitavam a roupa negra. Eu achei incrível. Como faziam aquilo?

A menina com a trança enrolada atrás da cabeça segurava a mão do garoto loiro. Eles faziam sucesso, faziam a platéia aplaudir e a lançar rosas. Rosas.

Eu fiquei admirando a menina. A que eu vi na televisão do trem. Ela era aquela que se voluntariou para salvar sua irmã. Ela era aquela tributo corajosa e forte. Ela iria vencer os jogos, não por sua vontade de viver e aniquilar os outros, mas sua necessidade de salvar a vida de quem ama. Virei para frente. O que será que ela fará durante os dias na terrível arena?

Estremeci e segurei os soluços de um choro. O presidente Snow avançou em sua cabine e parou à frente de um microfone, quando as 12 carruagens pararam em frente ao lugar onde ele se encontrava.

– Bem vindos, bem vindos. Tributos, nós saudamos vocês por sua coragem e sacrifício. Bom Jogos Vorazes e que a sorte esteja sempre ao seu favor.

O lugar explodiu em aplausos e gritaria. A carruagem nos levou para fora daquele estádio. Eu encarava o nada. Meu espírito estava quase pulando para fora do meu corpo. Eu estava aceitando a possibilidade de uma morte iminente.

Nossos estilistas e mentor foram desmontar a mim e Thresh. Logo depois disso, fomos para nosso quarto abaixo da cobertura. Jantamos uma comida espetacular e depois eu me dirigi à sala de estar. Sentei-me apreciando a textura macia dos sofás e poltronas confortáveis. Coloquei as mãos no rosto e chorei. Chorei tudo que eu tinha guardado, todos os suspiros que eu segurei, todos os olhos ardentes da minha morte. Coloquei tudo para fora em lágrimas salgadas. Perdi mamãe e meus irmãos. O que faço?

Senti braços me abraçando. Thresh, meu amigo, ficou triste junto comigo. Ele disse coisas para me acalmar. Que ele me ajudaria a vencer os Jogos, mesmo que morresse. Que ele me protegeria de todas as armadilhas cruéis da arena, que eram mais letais que os próprios tributos.

– Até dos bestantes? - perguntei.

Ele hesitou um pouco.

– Os bestantes podem ser de todos os jeitos. Em geral quase todos são metade animais. Grandes ou pequenos. Eu não vou poder te proteger desses demônios. Você vai se proteger. No 11, subimos e descemos de árvores e pulamos como macaquinhos, não é?

– É. - sorri. - E você? Como faria?

– Usaria toda minha força, tudo que estivesse ao meu favor. Tudo para me manter vivo.

– E se conseguíssemos sobreviver? Eu e você? Só nós? Quem venceria? - eu perguntava rapidamente, tremendo.

– Rue, em momento algum de minha vida... Em situação pior que esta... Eu nunca mataria alguém como você. Uma criança do meu próprio distrito. Uma pessoa boa e inocente como você. - Thresh estava sério. - Você venceria os jogos. O que iria fazer? - Pergunta ele, sem perceber o impacto de suas palavras em mim.

– Eu fugiria, acho. O que mais fazer?

– Acho que eu acabaria comigo mesmo.

– Para eu ganhar. - eu seguro mais uma vez a dor das lágrimas.

– É claro! Não é justo uma criança morrer assim, Rue. Somos amigos. Lembra-se? - ele disse em voz grossa.

Eu concordei olhando para o tapete bonito no chão.

– Vamos dormir. Amanhã nós iremos ao Centro de Treinamento. Faça o seu melhor! - disse Thresh, levantando-se e indo ao seu quarto.

Eu me levantei e fui dormir também. O quarto era enorme. Me joguei na cama mole e me cobri, com esperança que os lençóis me protegessem dos pesadelos de minha cabeça e os reais...


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Notas finais do capítulo

Rue terá dificuldades na arena nos próximos capítulos.



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