Jogos Vorazes: O Despertar escrita por FernandaC


Capítulo 3
Verdades


Notas iniciais do capítulo

Divirtam-se!! 8D



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Por favor, que não sejam os pacificadores, quer dizer, os seguranças do distrito levando-o embora. Que ele esteja apenas tendo um sonho, um sonho muito ruim! Por favor, por favor.

No andar debaixo avisto meu arco. Bem, se ele está em apuros ou não, prefiro não descobrir na hora. Do meu canteiro consigo ver Haymitch analisando a casa do Peeta pela sua janela, ele se espanta ao me ver e balança a cabeça negativamente. Aquele gesto me intriga, contudo nada me conterá neste momento. Raras foram as vezes em que visitei o Peeta, entretanto, se tratando da Aldeia dos Vitoriosos, todas as residências têm a arquitetura igual. Abro da porta do seu quarto com mais força do que pretendia, libertando-o não dos seguranças, mas do próprio pesadelo.

Caído no chão de tanto se debater, Peeta me encara alarmado demais. Percebo suas pupilas dilatadas e sua expressão... Muito estranho, pensei que os remédios estivessem ajudando-o. Ele continua me olhando sem acreditar no que vê. Ponho meu arco e aljava aos meus pés e lentamente me aproximo dele. Não posso deixá-lo naquele estado, ele precisa de mim. Em meu primeiro passo em sua direção, pude associar seu semblante com o das minhas presas fisgadas na floresta. Puro terror. Quanto mais eu me aproximo, mais ele se espreme contra a lateral da cama.

– Por favor, não me machuque... - Peeta diz baixinho, pegando-me totalmente desprevenida. Com certeza não era isso que eu esperava. Um sorriso, alívio...? Talvez.

– Peeta... Que? Eu jamais faria algo que pudesse te... - Então eu me silencio, pois dizer que eu jamais o machucaria não seria bem uma verdade.

– Vai embora! Por favor... Vai embora! Por que você fez isso? Por que Katniss? - Ele diz, só que dessa vez gritando, inesperadamente fora de si. Levo dez segundos para tirar os olhos daquela cena e muito confusa, pego minhas coisas, mas antes de dar o fora dali, o mais depressa possível, vejo-o com as mãos no rosto e suas unhas fincadas na pele ainda sensível.

Como sempre, em situações como está eu corro para a floresta. O único lugar que consegue me acalmar de verdade. Eu não esperava encontrar o Peeta naquele estado. Realmente acreditei que ele estava tomando os remédios como o dr. Aurelius havia dito, contudo ignorei completamente o fato de que algo não estava normal. A questão é: o que o perturba?

No interior da floresta percebo que esta é a primeira vez que volto aqui depois da guerra. Mesmo na pior das hipóteses, no pior dos momentos, este lugar sempre será meu santuário. Caminho sem rumo, inspirando lentamente, prestando atenção nos movimentos ao redor, tentando controlar minhas emoções, meus pensamentos, minhas especulações.

Meus pés me trouxeram, curiosamente, até à minha pedra de encontro com Gale. Sento-me no mesmo local e contemplo o sol. Observo o tom laranjado, lembrando que esse não é o tom favorito do Peeta...

– Ótimo jeito de começar o dia. Parabéns Katniss, você tem um incrível poder destrutivo sobre as pessoas, principalmente sobre o Peeta! - Digo para mim mesma com rancor.

Eu posso fazer o que for, mas nunca conseguirei mantê-lo a salvo, pois eu sou o seu maior inimigo, toda a sua dor, eu sou o seu monstro. A bestante criada pela Capital. Teria sido muito melhor se eu tivesse engolido aquelas amoras cadeado. Enxugo uma lágrima e olho para o lado e vejo a ironia encarando-me plantada a cinco metros de distância. Essas, definitivamente, são as mesmas que o Peeta colheu na primeira edição dos Jogos Vorazes. Eu poderia engoli-las e a morte não demoraria a chegar. Neste momento, seria muito bem-vinda, visto o estado deplorável da minha vida... Contudo, infelizmente, não posso fazer isso. Eu mereço sofrer e morrer seria fácil demais, bom demais. O que o dr. Aurelius diria sobre esse meu pensamento suicida? Muito provavelmente eu seria mandada diretamente para a Capital, por medida de segurança pessoal. Bem, como eu nunca converso com alguém sobre assuntos dessa natureza, na verdade, eu raramente converso com alguém, então ele nunca saberá. Além do mais, tenho minha mãe, não poderia fazer isso com ela. E tem Haymitch, que de um jeito muito torpe, acabou sendo parte da minha família. Tenho que manter um olho nele, bem mais do que ele em mim. Quanto ao Peeta, o melhor que eu posso fazer é me afastar, o máximo possível. Só assim ele estará seguro, visto que desde o principio, eu fui o perigo. Agora sofro as consequências.

Respiro profundamente três vezes clareando minha mente, lembrando de Prim, do meu pai, da minha antiga vida caçando por entre essas árvores. Por mais que eu saiba que minha irmã odiaria ver-me desse jeito, eu não consigo sair dessa depressão, dessa obscuridade que me empurra para o fundo, atormentando minha sanidade. Entretanto, preciso me esforçar, por ela, pela minha Prim. Eu tenho que fazer isso, tomar alguma atitude, mas primeiro tenho que limpar minha lucidez. Então está decidido. O resto da minha manhã será caçando, colhendo algumas frutas e ervas, o que eu qualifico serem atividades promissoras para o meu tratamento anti-depressivo. Hoje, será o marco do início da minha nova rotina, das atitudes.

É fim de tarde quando chego em casa, deixo as coisas na dispensa e tomo um banho. Resolvo visitar o Haymitch, esse é um dos ofícios que eu listei mentalmente enquanto caçava: "cuidar do Haymitch". Logo, tenho que checar se o estoque de água ardente está acabando. Antes de sair, dou uma espiada para a rua, verificando se nenhum outro vizinho, além do que eu pretendo visitar, está à vista. Campo limpo. Ando depressa com a cabeça baixa e entro na casa sem me incomodar em bater na porta. Depois do impacto inicial do péssimo odor e lixo, avisto Haymitch sentado no sofá, passando os canais na televisão. O que leva a crer que ele está no status de racionamento alcoólico.

– Ei... Hum... Como vai? - Pergunto sem jeito. Ele me olha dos pés a cabeça estranhando tudo em mim. Acho que ele não esperava ver-me tão cedo. Então, o sr. Irritante emite seu usual muxoxo e volta sua atenção para os canais.

Sento-me na beirada do braço do sofá e ficamos em silêncio por uns instantes. Começo a impacientar-me, com o quê exatamente, não faço a mínima ideia. Mas o que eu esperava que acontecesse? Eu me recuso a confessar que esperava encontrá-lo aqui. Olho de esguelha para meu antigo mentor, que até agora não falou nada, nenhuma piada. Sem sarcasmos... Isso não é o normal dele. Essa reação só pode ser por conta do baixo teor alcoólico. Huumm... Interessante, acho que eu o prefiro assim. Vou até a dispensa e confirmo minhas suspeitas, há apenas três garrafas de água ardente. Bem provável que ele esteja em uma espécie de abstinência. Cinco horas sem ingerir álcool é considerado abstinência, em se tratando de Haymitch.

Outro pensamento me ocorre. Não é normal ele ficar unicamente com três garrafas e a ração dos gansos está acabando. Volto até a sala.

– Haymitch, quando o trem chega com suas mercadorias? - Questiono, enquanto ele se remexe irritado.

– Hoje de manhã, mas graças a você, docinho, ele voltou com as minhas coisas! - Ele diz com raiva contida.

– Por causa de mim?! Por que? - Haymitch estala a língua com desdém, como se eu devesse saber por qual maldição ele perdeu o trem.

– Você tinha mesmo que ir acordar o outro perturbado com um arco e flecha nas mãos? E logo você?! Não podia ignorá-lo como você costuma fazer? Realmente, acho que você gosta de maltratar aquele pobre rapaz. Qual o seu problema? Ainda culpando a depressão? Faça um favor a si mesma, queridinha, pare de choramingar e tome alguma atitude nessa sua vida medíocre! Agora, eu estou nesta situação graças a você! O trem só volta em dois dias, DOIS DIAS! - Haymitch disse, cuspindo-se no processo, o ódio saltando pelas suas órbitas.

É... Eu me enganei, ele é melhor bêbado. Poderia avançar com minhas unhas na cara desse imbecil, mas suas palavras conseguiram me atingir de um modo que só ele consegue fazer. E pensar que passei aqui para ajudar esse idiota. Infelizmente, por mais cruel que seja a sua declaração, é tudo verdade. E ele sabe que eu sei disso. O que eu não quis assumir, o que eu não consegui fazer e dizer é a minha total falta de atitude, minha covardia. Encaramo-nos amargamente, e mesmo sem emitir uma palavra, eu pude perceber o sacrifício que é para ele ficar neste lugar. Minha condenação o levou junto.

Mas estou muito enfurecida com ele, comigo, com absolutamente tudo para agradecê-lo e culpar a sua abstinência por esta reação. Viro as costas e vou embora. Antes de ir, eu paro no hall de entrada.

– Minha primeira atitude era com você, seu retardado de merda. Mas, pelo visto, você não merece; sua sina é o abandono. - Bato a porta da casa com força, a raiva pulsando em minhas veias.

Pelo menos eu consegui recuperar um pouco da minha dignidade, não me permitindo ser totalmente humilhada. O ar do início da noite está denso, o inverno está chegando. Escuto meu telefone tocar ainda do jardim da casa, entro correndo e sem fechar a porta. Mamãe deve estar super preocupada comigo, já que eu não passei o dia no sofá para atender seus telefonemas. Antes de pegar o aparelho, respiro fundo confinando meus sentimentos.

– Alô. - Eu digo, mas ninguém responde. - Alôôô... Mãe, a senhora está me ouvindo? Alô!

– Olá Catnip... Quanto tempo? - Meu Deus. Não pode ser... Pode passar o tempo que for, mas aquela voz é inesquecível. Estou muda, absorvendo a surpresa. - Katniss, responda por favor... Eu, eu estou muito preoc... Eu pensei muito antes...

Definitivamente, é notável o esforço que ele fez para fazer aquela ligação. Nossos desentendimentos, minha acusação, sua raiva. Ele é muito orgulhoso para ter tomado essa atitude, e ainda assim me ligou. Está preocupado comigo. E eu? Sim, com certeza eu estou preocupada com ele, muito.

– Bem, já que você não quer conversar, eu entendo. Eu só queria... Enfim, até mais Catnip.

– GALE!! Não desliga. Eu só fiquei muito surpresa com essa ligação. Nossa, eu não esperava mesmo. - Digo genuinamente.

– Oh! Katniss... Katniss... Fico feliz que esteja falando comigo.

– Onde você está?

– Longe, muito longe do 12, mas penso em você todos os dias. Como está se sentindo?

– Ainda respirando... Minha pele parou de pinicar. Acho que vou continuar tomando apenas esse remédio...

– Haha... Sabia que você não ia cumprir o que o dr. Aurelius recomendou. Sempre agindo da forma que quer. Essa é a Srta. Everdeen. - É incrível escutar sua risada. Pela primeira vez me senti como se estivéssemos na floresta novamente, como nos velhos tempos e acho que ele sentiu o mesmo. - Sinto sua falta, Katniss... Todo instante fico me perguntando, como você está, se está se recuperando, se está conseguindo seguir com a vida e ser feliz.

– Eu estou... - Engraçado que apesar dos pesares eu não consigo mentir para ele e, mesmo que tentasse, ele saberia. Curiosamente, eu não quero mentir. Ele foi meu confidente por tanto tempo, que seria um insulto à nossa história fazer isso. - Muito mal. Acordei de um pesadelo terrível, escutei o Peeta gritando da casa dele e tentei ajudar, mas só piorei as coisas, ele me odeia... Então corri para a floresta e passei o resto do dia lá, pensando nas situações. Tentando recuperar-me da dor, reorganizar minha vida. Fui visitar o Haymitch e ele só faltou dizer que eu sou o motivo de sofrimento de todos, o que não deixa de ser verdade. O problema é que eu estou destinada a morrer aqui, neste buraco, em que as pessoas são incompreensíveis e... Arrrgh... Sinto muito a sua falta Gale e estou muito contente que tenha me ligado. Mas tenho que ir, por favor não ligue de novo, não quero lhe machucar também.

Desligo o telefone escutando várias objeções. Se tratando de Gale, é lógico que ele vai ligar novamente, então eu retiro o telefone da tomada. Enxugo o rosto, sentindo-me mais miserável do que antes. Apesar de ter gostado de conversar com meu antigo parceiro e finalmente ter desabafado algumas coisas, eu não me sinto melhor, nem um pouco. É como se proferir todos esses sentimentos para ele não fosse correto.

Queria saber quando esse dia vai terminar... Levanto-me para fechar a porta da casa que deixei aberta ao entrar. O problema é que a porta não está mais aberta e uma prímula jaz no piso com um bilhete.

"Sinto muito".


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Notas finais do capítulo

Gostaram?! xD
Por favor, sintam-se a vontade para opinar ou criticar ou sei la! Expressem-se!
Próxima postagem em cinco dias.

Beijos, Fernanda.