A Garota Que Sugava Almas. escrita por Jubs


Capítulo 1
1. O Pequeno Bosque


Notas iniciais do capítulo

Capítulo editado em: 101213

Boa Leitura.



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1. O Pequeno Bosque.

Era uma tarde de verão ensolarada. As ruas da cidade onde eu morava estavam cheias como sempre. Lojas exibiam seus grandes anúncios florescentes indicando as promoções do dia, crianças e adolescentes retornando de suas escolas, velhinhas fofocavam sentadas nos bancos das praças públicas, todos viviam suas vidas e eu caminhava lentamente para minha casa ao voltar da minha escola.

Conforme ia me aproximando, um som alto semelhante a zumbidos ecoava em meus ouvidos. A princípio, achei que fossem apenas alguns mosquitos, que eram muito comuns apesar de vivermos na cidade grande. Mas, pensando bem, seriam necessários centenas deles para produzir o barulho em volume tão elevado.

Assim que entrei em minha casa, pude ver que o que tinha lá na verdade não era nada do que eu estava imaginando.

Não se tratava uma nuvem de mosquitos. Mas sim de moscas. Eu estava começando a ficar assustada. Não era nem um pouco comum ver insetos dentro de minha casa, já que minha mãe prezava tanto pela higiene.

A nuvem negra de insetos se desfez assim que cheguei mais perto.

Meu coração começou a bater mais rápido ao ver aquela cena. Um nó se formou em minha garganta. Meu estômago embrulhou. Senti meus joelhos ficaram bambos. Não encontrava forças para dar mais um passo a frente.

Pensei estar louca.

No chão de minha sala tinha um corpo jogado. A maior parte dos ossos estava praticamente triturada. Os olhos foram arrancados. Ainda tinha vestígios de sangue que saiam pela boca e narina, e o abdômen estava totalmente aberto a ponto de poder ver seus órgãos mergulhados no sangue que borbulhava. O cheiro de ferrugem que o corpo exalava fazia meus olhos arderem. Havia vestígios do corpo de minha mãe nos quatro cantos da sala.

Aquilo podia ser apenas mais uma cena traumatizante. Mas não.

Aquele corpo era o da minha mãe.

Meu coração apertou na hora em que me dei conta: Aquilo não era apenas um pesadelo.

Lágrimas queriam descer pelos meus olhos, mas o pavor que estava me dominando quase por completo as impedia de cair olhos a baixo. O medo tomou conta de mim.

Fazia exatamente dois meses desde que essa cena terrível aconteceu. E eu me lembro com todos os detalhes. Eu havia presenciado o resultado de um crime perfeito.

O sol refletia pela janela de meu quarto. Espreguicei-me em minha cama enquanto bocejava, não deveria passar do meio dia. Hoje seria o meu último dia em minha casa o que me causava um fio de tristeza. Mesmo não querendo aceitar, aquele lugar significava pelo menos um pouco para mim e não estava totalmente preparada psicologicamente para as tantas mudanças que estavam acontecendo.

Sabia era necessário nos mudarmos para uma casa menor para meu pai se restabelecer financeiramente já que ele gastou muito dinheiro para tratar de negócios relacionados a morte de minha mãe como funeral, detetives, policias... E ainda teve que ser obrigado a se demitir de seu emprego que era em tempo integral para cuidar de meu irmão e eu, já que agora a dona Meggie não estava entre nós, e mesmo sabendo disso tudo, eu estava com raiva por ter que abandonar tudo que tínhamos construído aqui, eu tinha uma vida nessa cidade e parecia que meu pai queria destrui-la.

— Doroth! — meu pai estava do lado de fora da nossa antiga casa, pelas suas feições pude perceber que ele estava sofrendo muito com tudo isso, mesmo que não quisesse assumir, ele estava farto de tudo aquilo. Ele não era o único. – Se apresse querida, vamos partir daqui a algumas poucas horas.

— Já estou indo, pai — gritei de meu quarto enquanto pegava alguma peça de roupa dentro de uma mala que já estava arrumada para a mudança. — Estou me levantando agora, tenha um pouco de paciência!

Enquanto saía de dentro de casa, pude notar pela primeira vez desde que minha mãe morreu o quanto o jardim estava sem vida. As violetas e as rosas que sempre davam vida para a entrada de nossa casa estavam murchos e em um tom de marrom escuro. As árvores, que já eram poucas, estavam com menos de uma dúzia de folhas e com uma aparência horrível.

Engoli seco e segui em frente para dentro do carro puxando minhas malas pesadas com dificuldade, ao ver aquela eu cena me senti mal, não por tristeza ou pena, acho que na verdade estava com um pouco de ódio até, reparei que minha mãe levou junto com ela toda a vida que ainda restava na nossa família. Maldita hora que ela foi morrer.

Jaxon, o meu irmãozinho mais novo, já estava dentro do carro, ele estava em um sono pesado e não se mexeu nem quando meu pai ligou o carro e seguiu o caminho para nossa nova casa.

O caminho parecia não ter fim, vi através do vidro do carro o momento em que saímos da cidade grande e entrarmos em uma estrada de barro onde passavam tranquilamente gados e até mesmos cachorros. Aquela situação não era nem um pouco normal, e por mais que eu estivesse insatisfeita tive que admitir a mim mesma que aquilo era até engraçado.

Ri comigo mesma em uma gargalhada baixa e abafada.

Algumas poucas pessoas passavam nas ruas da minha nova cidade. A população parecia ser formada apenas de senhoras a beira da morte e de pombos. Morar nesse lugar seria um pesadelo pior do que os que costumo ter com a morte da mamãe.

— Doroth? — meu irmão cutucava meu braço com cara de quem acabou de acordar. — Estou com muito medo.

— Jaxon, não tem o porquê de você ter medo — aumentei um pouco o tom de minha voz — Já estamos chegando na casa nova, pode voltar a dormir, querido.

— Mas o monstro que pegou a nossa mamãe está aqui — tinha lágrimas em seus olhinhos negros enquanto ele falava. — Não quero que ele pegue você também.

— Não existem monstros — argumentei pausadamente, voltando a cobrir Jaxon com sua manta azul. — Foi só um pesadelo, não se preocupe, nenhum monstro é mais forte que a super Doroth!

Como se pode ver, meu irmão foi quem acabou sendo mais afetado pela morte da mamãe, mesmo que meu pai não queira aceitar, era visível que toda essa situação acabou gerando ao pequeno Jaxon algum tipo de transtorno psicológico grave, sempre ele diz que tem um monstro querendo me pegar ou que estamos sendo observados.

É demais para qualquer criança de cinco anos voltar da creche e receber a notícia de sua irmã e seu pai de que nunca mais veria a sua mãe.

Avistei pelo vidro do carro uma casa que se parecia com uma cabana de inverno. Feita de madeira do teto ao chão, uma chaminé que não parecia ser usada há anos ficava bem no canto do telhado que já era bastante antigo a ponto de vir na minha cabeça a idéia de que havia centenas de goteiras perdidas pela casa.

O que podia ser chamado de o jardim da casa estava com um gramado verde-musgo do qual já havia passado da hora de aparar, alguns poucos girassóis que queria eu saber como conseguiram sobreviver naquele local sem nenhum cuidado e duas árvores pequenas que ficavam bem perto da porta de entrada. A casa era melhor do que eu imaginava, só precisava de uma boa limpeza e o dobro de cuidados.

— Todos acordando, que chegamos na casa nova! — meu pai cantou as palavras parando o carro em frente á casa. — Todos animados?

— Alguém parece animado em viver nesse lugarzinho de merda? — murmurei para mim mesma com a intenção de que meu pai não escutasse o que eu havia falado, mas pelo seu rosto de desapontamento pude notar que minha missão não foi bem-sucedida.

— Tente mostrar que se importa, Doroth — meu pai me segurou pelo braço assim que saí do carro. — Não está sendo fácil para mim nem para seu irmão, você não é a única que está sendo afetada por isso, poupe-nos da sua rebeldia adolescente pelo menos por hoje!

— Me solta — falei em tom baixo como se o desafiasse, me soltando de meu pai que não me segurava com força significativa. — E eu não estou afetada por isso, desejo do fundo do meu coração, que você, a mamãe e todo mundo se dane.

Meu pai apenas me olhou como se sentisse raiva, ele nunca foi realmente bruto era apenas coisa momentânea, mas, mesmo assim, eu estava babando de ódio, nunca fui o tipo de pessoa que levava desaforo nas costas, por esse motivo desde que eu era criança meus pais raramente me chamavam a atenção.

Peguei minhas bolsas que estavam na mala do carro e fui andando para dentro da casa, só de pensar que teria que arrumar todas aquelas roupas já me dava um enorme cansaço.

Para minha surpresa, a casa já estava toda mobiliada, a parede da sala era toda coberta por um papel de parede xadrez verde com marrom e tinha alguns quadros pintados com flores e rostos de pessoas que não lembrava de conhecer, mas que provavelmente seriam de minha família, já que a casa era dos avós de meu pai. No centro da sala tinha uma luminária grande e dois sofás empoeirados, porém elegantes e havia uma escada que dava para os quartos e banheiros.

O maior quarto foi o que mais me chamou a atenção, o papel de parede azul bebê combinava perfeitamente com o criado-mudo e a cama de casal grande coberta por uma cortina semelhante aquelas dos contos de fadas, um tapete de pelos e agora de ácaros também que um dia já foi branco cobria metade do quarto e uma janela grande dava vista a entrada de um bosque que ficava atrás da casa. Respirei fundo ao colocar a cabeça para fora da janela e joguei as malas de roupas em um canto do quarto.

Levei um leve susto ao olhar em meu relógio de pulso e ver que já se passavam das cinco horas da tarde, a viajem havia sido bem longa e eu estava exausta.

Deitei sobre a cama que levantou poeira assim que joguei meu peso, algo me dizia que no dia seguinte a minha sinusite atacaria, fechei meus olhos sem se importar muito com a poeira.

Abri meus olhos, lentamente, ainda sonolenta já que não consegui dormir por nem vinte minutos na roupa de cama imunda. Assim que os abri por completo o lanche que havia comido quase voltou de meu estômago.

Acalmei-me ao ver que olhinhos que me encaravam sem piscar por nenhum microssegundo era apenas um gatinho preto me observando sentado em cima de minha barriga.

Dei um sorriso amarelo para o bichano que era muito gordinho, levando em conta o fato de que não parecia ter uma “família” para lhe alimentar. Pude perceber o quanto ele era lindo, seus olhos cor de mel eram favorecidos pelo seu pelo negro como carvão e seus dentinhos eram brancos como neve.

— Oh, meu Deus — falei sorrindo como uma criança para o bichano e me sentando trazendo o novamente para meu colo. — Você me assustou, não faça mais isso.

Ele me olhava assustado, ou talvez curioso enquanto eu acariciava sua cabeça e suas orelhas se mexiam se maneira engraçada, mas ainda sim meigamente.

Peguei em uma de minhas mochilas um pacote de biscoitos para mim mesma comer e também oferecer alguns pedacinhos ao bichano que parecia para mim, estar faminto, já que nessa casa não me parecia haver comida. Ao contrário do que eu pensei, ele negou minha oferta de alimento.

Desci para a sala novamente, com o gato em meus braços. Meu pai carregava dezenas de caixas e nem percebeu o fato de eu está saindo da casa e Jaxon dormia no sofá da sala. Que belo pai eu tenho, hein.

Queria procurar o bosque que eu vi pela janela de meu quarto, mas não parecia que a entrada do mesmo era tão perto de minha casa, já que não conseguia avistar a olho nu. Caminhei para trás da casa com bastante velocidade e não demorou muito até eu ver uma cerca de arame farpado que batia mais ou menos na minha nos meus quadris.

Não seria a coisa mais fácil do mundo pular aquela cerca sem conseguir um corte sequer.

Coloquei meu pé em uma parte da cerca me apoiando com uma mão na parte mais alta e a outra segurando o gordo bichano, e assim fui até chegar o topo e dar um pequeno salto, ao conseguir chegar o outro lado da cerca pude ver o quanto minha mão estava sensível pela cor mais rosada que o normal. Ignorei esse fato e segui bosque adentro.

Passando-se aproximadamente cinco minutos de caminhada pude avistar muitas árvores compridas com folhas verdes, amarelas e algumas até puxando para um tom de marrom claro. O chão era coberto por folhas, galos e alguns troncos ocos que faziam um barulho alto quando eram pisoteados.

Havia centenas de espécies de plantas baixas e flores que eram mais que lindas, pensei em pegar uma flor para por no canto de meu cabelo, mas meu gato não parava de se remexer em meus braços enquanto eu tentava capturar a magnífica planta, então eu simplesmente achei melhor deixar para a próxima antes que meu braço ficasse arranhado por completo.

Ao chegar em uma parte do bosque em que não havia muitas folhas secas pelo chão resolvi deitar-me com a cabeça apoiada em um dos vários troncos ocos que havia pelo chão. Respirei o ar puro fornecido pelas árvores e me senti mais leve do que nunca. Fechei meus olhos enquanto apreciava o ar do ambiente e felizmente não havia sons de animais nem pássaros que são as coisinhas mais irritantes do mundo.

Um vento frio passou pela minha nuca me arrepiando, se não estivesse tão exausta, afirmaria com todas as minhas forças que alguém assoprou sobre meu pescoço.

Adormeci com meu bichano em minhas mãos por algumas horas e assim que me levantei fui o mais rápido possível de volta para casa, mesmo querendo ficar para todo sempre ali, deitada, respirando aquele ar puro algo me dizia que amanhã seria um longo dia e eu devia me preparar para o tal.




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Notas finais do capítulo

Críticas, elogios, enfim digam o que acharam. Beijos da Juh *3*



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