Violentada escrita por C W Elliot


Capítulo 11
A filha favorita


Notas iniciais do capítulo

Nem sempre as pessoas são o que esperamos. Ás vezes, uma mágoa pode ser grande demais, grande até para acabar com a compaixão ou com a bondade de alguém.



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Já vi São Paulo muitas vezes pela televisão, e já a achava que era muito grande, mas pessoalmente, a cidade era muito, muito grande mesmo. O ônibus chegou na cidade bem no comecinho na noite, onde eu pude ver o espetáculo das luzes da capital paulista se acendendo para a jornada noturna. A cidade que nunca dorme. Tudo era terrivelmente grande. Os prédios, crescendo sinuosos no horizonte, eram muito altos, o que me fez pensar como seria a vista de um daqueles prédios, agora entendo por que eram chamados de arranha-céus. Eles pareciam estar literalmente arranhando o céu, apesar disso ser impossível. São Paulo é meio que impossível. Eu não imaginava como tantos carros podiam caber em uma rua só. Eu me sentia uma caipira. Mas tudo era tão extasiante, tão incrível, que nem mesmo o engarrafamento gigante me chateava ou me deixava entendiada. Cada rua, cada esquina, cada lugar era uma nova possibilidade de admirar São Paulo. Eu com certeza ia amar morar ali. A ponto de ônibus onde o ônibus para era bem distante, então eu pude aproveitar bem a cidade. Mas, quando lembrei de tudo o que vinha pela frente, e tudo o que tinha passado, o brilho quase desapareceu de meus olhos.

Logo após desembarcar do ônibus, tomei um táxi com destino a casa da minha irmã. Segundo o endereço que encontrei no meio das coisas do meu pai que eu guardava. O prédio em que ela morava ficava ali no bairro da Luz. Edifício Nova Roma. Apto 20. 5º andar. O motorista dirigia velozmente pelas ruas de São Paulo, driblando os outros carros e entrando na faixa de ônibus, seria mentira eu dizer que não fiquei com medo de acontecer algum acidente. Ele me deixou bem em frente ao prédio, e lhe paguei, não ficou muito barato, afinal era São Paulo, os lugares não ficavam colados uns nos outros. Fui até a portaria:
– Com licença, poderia me indicar se a Ana Luisa mora no....
– Aham, mora, pode subir lá, o elevador tá quebrado, vai pelas escadas. Obrigado.
O homem que estava lá nem se deu o trabalho de olhar para mim ou ao menos escutar minha pergunta, estava muito ocupado vendo o caderno de esportes do jornal e falando no telefone, com o que pareceu ser sua namorada... ou seu cachorro.
Subi as escadas. Não foi nenhum um pouco fácil. Parecia que tinha um prédio na escada, não uma escada no prédio. Quando finalmente cheguei em frente ao apartamento, já estava cansada e ofegante. E lá estava eu. São Paulo. Bairro da Luz. Edifício Nova Roma. Apto 20. 5 º andar. Estava paralisada para tocar a campainha. Será que eu não devia ter ligando antes? Será que ela iria me querer ali?

Toquei a campainha. Um homem veio a porta. Alto, cabelos pretos, olhos azuis, barba por fazer, pijamas. Me olhou de cima a baixo, olhou para minhas malas e perguntou:
– Quem é você?
– É, com licença, mas é aqui que mora a Ana Luisa?
O homem assentiu lentamente, virou o rosto para dentro do apartamento e gritou:
– Ana, é pra você.
Uma voz feminina perguntou lá de dentro:
– Quem é?
O rapaz se virou para mim:
– Desculpe, como é mesmo seu nome?
– Meu nome é Sophia, Sophia Dandelion.
O homem me olhou com uma expressão esquisita, tipo "Que droga de nome é esse? Quem tem dentes-de-leão no nome?". Mas a mulher veio antes que ele pudesse assimilar meu nome.
Ela era exatamente como eu me lembrava. Cabelos castanhos cacheados, olhos cor de mel, pele branca, baixinha, como eu. Mandou que o homem voltasse para o quarto, para ver como estava, se eu ouvi direito, a Pietra.
– Você por aqui? O que quer? - A expressão no rosto dela, não parecia que estava muito feliz com a minha presença por ali. Isso fez meu corpo congelar.
– Eu estou indo para casa da vovó, e como lá em Town não tem aeroporto internacional, mas eu já comprei a passagem, tenho a autorização da minha mãe... - eu disse, tímida.
–... você pensou que poderia ficar aqui, enquanto espera seu voo... entendo - ela compreendeu a informação, mas pareceu também não ter gostado.
– Se não for incomodar, é claro, mas é só por esta noite - disse, na esperança de que ela entendesse.
– Eu gostaria muito de ajudar - o rosto dela dizia o contrário - mas não poso, não temos colchões extras aqui.
– Tudo bem, eu posso me virar no sofá mesmo, ou então no chão, com alguns travesseiros e cobert.... - eu não tinha onde ficar, eu tinha que tentar.
– Olha, querida, vamos ser francas. Não dá pra você ficar aqui. Eu não posso. Eu tenho meu marido e minha filha, realmente não dá. Papai está doente e...
– O que? Papai está doente? Como assim, ele não me avisou nada, ele não disse... - essa informação foi um choque pra mim. Como papai poderia estar doente e não me avisou nada... por que ele não me disse nada... eu não estava entendendo...
– Ele não te avisou? Me admira muito, a filha favorita dele, não sabe? - a expressão dela endureceu - Acho que ele não queria preocupar a filhinha dele, a amada Sophia, que um dia ainda vai dar muito orgulho para ele... Bem ele está doente, não está nenhum um pouco bem. E se você não sabe também, eu nunca tive uma relação muito fácil com ele. E quando ele deixou mamãe e eu, e depois apareceu me dizendo que eu teria uma irmã... foi muito ruim pra mim. Eu que estava acostumada a ter meu pai, ele de repente nos abandona para ficar com uma nova família, uma nova filhinha, uma princesinha, um bebê. Você deve imaginar o quando foi difícil pra mim. Você não deve imaginar, sempre teve ele do seu lado. Mas sentiu o mesmo que eu quando ele foi embora também.
– Mas, quando eu era pequena.... você brincou comigo... você foi muito legal, eu pensei que... – eu ainda estava sem reação.
– Você era uma criança, eu não podia te dizer isso. Mas agora você é quase uma moça, e tem que saber as verdades da vida. Eu era legal por que você era pequena. Mas agora, podemos agir como mulheres. Eu não posso ficar com a filhinha do meu pai aqui. Sempre que ele liga, pergunta se você deu notícias, não quer saber de mim ou da neta dele, só da Sophia, a queridinha. Tá na hora de você entender as coisas, garota.

Agora, eu começava a entender tudo, ela tinha... tinha ciúmes de mim. Agora que estou me tocando, eu nasci pouco depois dele ter deixado essa família, acho que ele deve ter se apaixonado por mamãe e ter separado da outra mulher. Mas não sabia que ela guardava tanta mágoa de mim, ele sempre fora legal quando nos encontramos. Eu não entendia por que ela agia assim.
– Olha, eu acho melhor você procurar um hotel, ou um albergue para passar a noite. Você provavelmente deve ter dinheiro extra, papai devia te dar uma boa pensão. Mas vou te dar um dinheiro pro táxi. Olha, eu queria muito, eu sinto muito. Mas não posso. Realmente, eu não consigo.
– Tudo bem, então. Não precisa dizer que sente que muito, eu sei que você não sente, irmã. - Eu queria chorar, eu queria correr dali o mais rápido possível. Era a mesma coisa dela ter me dado um tapa e ter me chutado dali, pelo menos teria doído menos. Eu não podia acreditar... e agora? Para onde eu ia? Eu me sentia horrível.
– Eu sinto muito mesmo - Ela pegou a carteira e me deu uma nota de cinquenta. Eu aceitei. Não queria aceitar, mas eu não tinha condições de ficar recusando dinheiro. Peguei minhas malas e saí, rápido. Escutei o som da porta se fechando nas minhas costas.

Quando desci as escadas, e saí do prédio. Eu me entreguei as lágrimas. Eu não tinha para onde ir, eu estava completamente perdida. Simplesmente, fui até o ponto mais próximo, e peguei um ônibus. Não queria saber para onde ia. Só queria sair dali.

O ônibus parou na Avenida Paulista. Em outro momento, eu deveria ficado maravilhado com aquele cenário. Era tudo tão movimentado, tão rápido. A avenida parecia estar viva, parecia respirar. E eu queria que ela me engolisse, que ela me tirasse dali. Eu não podia desistir agora, foi um golpe duro, mas eu não posso voltar. Centenas de pessoas passam por mim, me ignorando. É incrível como a falta de tempo torna as pessoas alheias umas as outras. Mas naquele momento, eu mesma não queria ser notada. Fiquei ali, perambulando pela Avenida, vendo outras pessoas passando rindo. Pais e filhos, namorados, maridos. Tudo tão feliz, e eu ali, chorando. Mas da alegria deles, não era possível ver minha tristeza. Encontrei uma pequena praça ali próxima a Avenida, com um banco bem oculto entre as árvores, me acomodei ali com as malas, chorando novamente. Minha primeira noite fora daquele inferno, e eu estava metida em outro. Mas, dormir numa praça,era melhor do que naquela casa, com ele lá. Fiquei observando o movimento dos carros, até que caí no sono.


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Notas finais do capítulo

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