Quanto Tudo Começou A Mudar. escrita por Lina Pond


Capítulo 1
Querida Emma.


Notas iniciais do capítulo

Bom, não tem muito o que falar nas notas no primeiro capítulo. Talvez, seja o que Deus quiser?



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Há uma coisa que eu acho engraçada sobre o amor. Ele te dopa. Pior do que qualquer droga. Te deixa tão louca e feliz, que tudo que você quer é que aquela sensação dure para sempre. Eu nunca havia me apaixonado. Não até aquela terça-feira. Na verdade, tudo começou em uma sexta-feira.

***

– Mas eu preciso de companhia. – Mari estava sentada no sofá da minha casa, com as pernas estendidas sobre a mesa de centro. Passei por ela, dando um tapa em suas pernas e a fazendo tomar postura.

– Você precisa de alguém para segurar seu cabelo quando você estiver de porre. E eu não vou fazer isso de novo. Não, não, nananinanão!

– Você fala como se eu fosse uma péssima melhor amiga.

– Você é! – rebati.

– Só porque você quer ser solteira para sempre, vivendo com 42 gatos quando sua mãe te chutar dessa casa, não quer dizer que eu queira começar o nosso último ano da escola sem namorado.

– Você já teve alguns namorados.

– Nenhum dava certo. Todos eles eram uma droga.

– Ou talvez o problema fosse você.

– Olha... – Mari estava em pé agora, com sua blusa que mostrava boa parte da sua barriga – Eu li a clausula de melhor amiga e você não está sendo uma boa.

– Eu não vou Mariana – sentei do seu lado no sofá, tirando a almofada que estava no seu colo – Eu não gosto dessas porcarias de festas em que um monte de gente que eu não conheço fica passando a mão em mim.

– Você não é tão sexy para as pessoas ficarem passando a mão em você, mas admiro seu amor próprio.

– Te odeio – respondi enquanto ligava a televisão,

– Emma, eu te imploro.

Os olhos de cachorrinho dela me convenceram. Ela sempre fazia isso. E no fim da festa eu sempre tinha que arrasta-la até minha casa e cuidar da ressaca dela.

– Eu te amo – ela disse enquanto eu acenava com a cabeça e tentava me livrar do abraço dela.

– Mas você não vai sumir. Nem vai beber tanto.

– Prometo – ela disse levantando as mãos para provar que não estava cruzando os dedos escondida.


***

Os cabelos de Mariana eram ruivos, longos e brilhantes. Ela tinha um rosto de boneca, mas normalmente usava roupas três números menores do que os dela.

Ela estava penteando seus cabelos enquanto eu comia sorvete.

– Você precisa se arrumar para essa festa, vai ter um monte de gente nova.

– Hm – disse enquanto sentia meus dentes doerem com algo tão gelado – Sorvete de morango devia ser a oitava maravilha do mundo.

– Depois você reclama que não entra nas suas roupas Emma.

– Eu nunca reclamei disso – menti.

Mariana me puxou para fora da cama e enfiou um dos seus vestidos em mim. A festa de hoje era em um circo e estava tão frio que resolvi colocar uma legging por baixo. Até porque o comprimento do vestido dela era tão pequeno, que eu não podia me imaginar usando aquilo de outra forma. Alias isso era a única coisa que eu vencia da Mari. A altura. Não que isso fosse bom, a não ser que você seja ótimo no vôlei ou tenha corpo para ser uma supermodelo. Não sou nada disso.

Ela puxou meus cabelos cacheados e castanhos para trás, fazendo um rabo de cavalo cheio. Passou tanto brilho em mim que acabei tirando tudo enquanto esfregava minha mão nos meus olhos irritados.

– Você pode parar, por favor? – Disse, irritada – Eu não quero chamar a atenção de ninguém. Eu iria de pijama se não corresse o risco de amanhã sair naquele blog estúpido.

– Ei, eu tenho uma coluna no blog estúpido.

– Provavelmente você faria minha matéria – eu disse, mostrando a língua.

Ela levou mais meia hora para deixar os cabelos ruivos enrolados o suficiente. Entramos na sua caminhonete velha, que ela havia ganhado do avô. Tinha cheiro de naftalina e cerveja barata. Eu odiava.

– Eu te odeio – ela disse enquanto dava partida no carro laranja.

– O que? – respondi, chocada.

– Eu te odeio. Olha pra esse seu cabelo. Os cachos perfeitos que você não precisa nem pentear para parecer que você ficou horas se arrumando para sair na capa da Vogue – comecei a rir. – É sério. Eu odeio meu cabelo.

– Você odeia coisas demais – eu disse arrancando os saltos que ela tinha me obrigado a colocar.

Mariana e eu nos conhecíamos desde a pré-escola. Ela veio da cidade grande e foi um choque de cultura uma menina de quatro anos que tinha um closet até para sua Barbie, se mudar para uma cidade que não tem nem Starbucks (agora nós temos!). Ela mora na maior mansão de Long Live, anda com cachorros na bolsa e usa salto até para ir até o jardim. Como se a genética não fosse boa o suficiente, ela era perfeita. Até abrir a boca. Ela nunca perdeu o sotaque e como todo mundo é meio caipira na nossa cidade, ela se tornou piada no parquinho. Eu cuidei dela e assim nos tornamos amigas. Não sei quando ela se tornou essa alcoólatra, vadia que fica com qualquer um, mesmo sem saber o nome deles. Mas eu não tenho coragem de abandona-la.

A festa era no centro da cidade. Era até estranho que o prefeito tenha permitido uma festa cheia de bebida e sexo em plena sexta-feira, no circo da cidade. A frente da grande lona colorida estava lotada de pessoas com pequenos copinhos laranja. Elas corriam de um lado para o outro e Mari deu um gritinho agudo quando viu aquilo.

– Melhor noite ever!

– Sai do carro, eu estaciono.

Mariana pulou para fora enquanto eu me esforçava para mudar de banco.

– Mantenha o celular ligado – gritei enquanto ela se afastava.

Dei a volta no quarteirão e encontrei uma rua que os vândalos ainda não tinham tomado. Puxei meu exemplar de Sherlock Holmes de debaixo do banco, onde eu tinha escondido na manhã anterior, e acendi a luz do carro. Fiquei lendo pelo que provavelmente foram horas. Algumas pessoas passavam gritando pela rua, mas nada que me incomodasse. Eu estava tão empolgada com o capítulo vinte e cinco que levei um susto quando vi algo bater na caminhonete da Mariana. Um carro tinha acabado de passar raspando. Ele freou bruscamente e eu acho que nunca me senti tão brava na vida.

– Você só pode estar brincando comigo! – gritei, ainda com meu livro na mão.

Dois rapazes saíram do carro. Um completamente bêbado e sem camisa saiu do lado do motorista. O outro mais contido saiu do lado do passageiro. Senti certo receio quando vi que estava completamente sozinha na rua com dois rapazes fora de si. Mas Sherlock estava comigo. Eu ia ficar bem.

– Qual seu problema? Você nem consegue ficar de pé. Olha o que você fez com a caminhonete.

Ele se aproximava a passos lentos. O amigo correu em sua direção e o segurou.

– Ah Meu Deus – eu estava tão brava – Quer dizer que você deixa o moribundo bêbado dirigir enquanto você que está muito melhor que ele, vai de madame no banco do passageiro? E se tivesse uma criança nessa rua? Você também seria culpado pela morte dela.

Eu estava gritando agora.

– Meu Deus, calma! – o garoto seguiu para perto dos meus faróis ligados. Ele tinha cabelos cor de mel, meio enrolados e um pouco compridos. Seus olhos eram verdes e ele não estava nem um pouco bêbado, disso eu tinha certeza. – Eu só não sei dirigir.

Tentei me controlar, mas foi mais forte que eu. Comecei a rir tão alto, que notei o quanto ele ficou vermelho. Eu não me lembrava quando tinha sido a última vez que ri daquele jeito.

– Quantos anos você tem? – perguntei, ignorando o moribundo agarrado em seus braços.

– O suficiente. Se você fosse tão boa motorista assim, tinha estacionado em um lugar longe dessa baderna.

– Você não sabe por que eu estou aqui. Eu só quero saber quem vai pagar pelo concerto da maldita caminhonete. Olha os arranhões.

Ele se aproximou, ainda com o amigo pendurado em si. Tirou a carteira e finalmente olhou para mim. Ele era realmente bonito. Não bonito “uau quero namorar com você”, mas bonito do tipo “eu com certeza teria um pôster seu pendurado no meu quarto”. Agora eu pareço uma tiete louca.

– Ok – ele disse me fitando – Qual é seu nome?

– Por quê? – perguntei brusca.

– Pra colocar no cheque. Ou você acha que eu te chamaria para sair?

Fiz uma cara feia e olhei para o chão.

– A caminhonete não é minha. Coloque o nome da minha melhor amiga, Mariana Delves.

– E qual é seu nome?

– Você não precisa saber meu nome.

Puxei o cheque da mão dele e me ajoelhei um pouco para ver o rosto do amigo dele.

– Você não vai sair daqui tão cedo – disse e em um reflexo deu um tapinha no seu ombro. Não era uma coisa que eu fazia normalmente. Contato humano? UGH!

Sai em direção a caminhonete. Girei a chave e quando estava saindo do lugar, encontrei os dois garotos ainda parados, onde eu os havia deixado.

Olhei para o menino consciente levantando as sobrancelhas.

– Ele não pode dirigir.

– Eu não sou Jesus – respondi, colocando a cabeça para dentro da caminhonete novamente.

Então ele soltou o amigo no meio da rua e veio na minha direção.

– E você vai passar por cima do pobre moribundo?

– Você só pode estar brincando.

– É só nos levar para casa. Levar ele pra casa. Depois eu volto com você. Deixamos o carro aqui mesmo e você pode ir embora com sua linda caminhonete.

– Não é minha caminhonete.

– Por favor.

Respirei fundo, brava por não saber dizer não. Tranquei a caminhonete e sai sem olhar para o garoto. Pelo canto do olho o vi levantar o amigo e o jogar no banco traseiro do carro. Ele se sentou ao meu lado. Girei a chave e fiquei tentando imaginar para que serviam tantas coisas. Quer dizer, eu não precisava nem usar a marcha. Eu fui reprovada três vezes na aula de direção por não saber usar a marcha E NOS CARROS NOVOS ELAS ERAM AUTOMÁTICAS. Era estranho não ter que mexer nada. Mais estranho ainda era ter entrado em um carro com dois estranhos. Um inconsciente e o outro assustadoramente bonito. QUAL ERA MEU PROBLEMA?

– Então – o garoto bonito e consciente estava falando comigo. Droga! – Não vai me dizer seu nome?

– Não falo enquanto estou dirigindo.

– Você me respondeu.

– Só falo o necessário – disse virando em uma esquina. O GPS era extremamente útil. Eu ia querer um quando tivesse um carro.

– Então... Sua caminhonete...

– Não é minha.

– É bem legal. Qual é a história dela?

– Minha melhor amiga mimada ganhou uma BMW. Eu sempre dirijo para ela. Inclusive é por isso que eu tirei minha carteira, já que não tenho um carro. Então, eu fui passar um final de semana na casa da minha avó e ela não conseguiu ficar longe de encrenca. Saiu, bebeu e bateu a BMW. Como castigo, ela ficou com a caminhonete velha do avô. Ela preferia a morte. Eu também. Era muito mais legal dirigir a BMW.

– Mas se você dirigia uma BMW, como está indo tão mal com o carro do Mark?

– Quem?

– O cara inconsciente ali atrás.

– Ah sim. Eu esqueci. Quer dizer, eu dirijo o carro do meu pai e ele é tão velho quanto à caminhonete. E a BMW era fácil, porque a única coisa que eu tinha que fazer era pisar no acelerador e girar o volante, mas fiquei mal acostumada. Ai quando tive que voltar para a caminhonete, tive que aprender tudo de novo. Foi uma droga.

– E isso era porque você não gostava de falar enquanto dirigia – ele disse sorrindo.

Acabei sorrindo também, mas de vergonha. Eu quase contei minha vida inteira pra um cara que eu sequer conhecia. Quando chegamos à casa do garoto, que era quase no bairro da Mariana, o cara bonito (que eu estava chamando de “cara bonito” por não ter coragem de perguntar seu nome), desceu do carro e o arrastou para fora. Uma mulher de hobbie atendeu a porta e o ajudou a entrar. Provavelmente eu devia devolver o carro, mas eu também precisava ir buscar Mariana, que a essa altura, devia estar jogada no jardim. O garoto bonito voltou, sem o Mark e se sentou ao meu lado novamente.

– Eles não querem o carro? – perguntei.

– O carro é meu – ele respondeu, sorrindo.


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