O Corvo Negro escrita por V M Gonsalez


Capítulo 3
Capítulo 2 - Uma pena em Sangue


Notas iniciais do capítulo

Demorou, mas chegou... Espero que gostem MUAHAHA =w=



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Já havia se passado uma semana desde que Johnson começara a trabalhar para a “Investigações Mandregas”. Nada de novo tinha acontecido durante este tempo, fora o enjoo de Hulton, que vomitou em toda a sua mesa.

Johnson e Merlim estavam em sua mesa de forma típica. Merlim jogava baralho no computador enquanto Johnson rabiscava qualquer coisa que viesse em sua cabeça num pequeno bloco de anotações. Desta vez, ele estava escrevendo uma pequena poesia sobre seu tédio. No entanto, ele parou no meio do 3º verso.

Afinal, não é toda hora que o telefone da secretária toca.

Para a surpresa de todos os presentes, o som estridente da campainha toca e uma mulher meio sonolenta e surpresa chamada Sandra atende o telefone. Conversa alguns momentos com o desconhecido do outro lado e depois desliga, indo em direção da sala do chefe.

O clima na sala principal era pesado, um olhava para o outro, com uma mistura de empolgação e decepção. Todos ali gostavam quando havia um caso, mas absolutamente ninguém mais aguentava ir atrás de outro gato desaparecido.

Sandra saiu da sala de Nelson e foi seguida pelos olhares atentos dos detetives, mas seu rosto parecia desapontado. Alguns minutos depois, Nelson saiu da sala com um arquivo em mãos, observando a sala. Por fim, disse para todos:

– Bem... Temos um caso. A Sra. Ramares precisa saber se seu marido mantem um caso com uma outra mulher. – sua voz estava desanimada, pois, mais do que todos, ele estava desapontado

Os detetives se entreolharam, querendo descobrir quem levaria o fardo. Ninguém queria ir, já haviam feito aquilo centenas de vezes. Para a surpresa de todas, uma mão corpulenta foi erguida e uma voz grave se impôs sobre o clima pesado.

– Eu e o novato vamos... Para ele entender como fazemos as coisas aqui – disse Merlim firme, obviamente sem consultar Johnson.

Johnson, até então, estava parado olhando para seu bloco sem fazer nada. Queria pegar o caso para mostrar seu valor aos colegas, mas tinha medo de parecer abusado. Apesar da surpresa pelo pronunciamento de Merlim, ele se sentiu feliz por não ter de fazer isso sozinho.

Nelson parecia tão feliz quanto Johnson e não deixou isso escondido mostrando um belo sorriso. Convidou os dois para entrarem na sua sala, enquanto os demais voltavam para suas vidas monótonas.

– Bem, como sabem, a Sra. Ramares está suspeitando de seu marido. Eles são casados a cerca de 15 anos, mas de uns tempos para cara ela anda suspeitando dos constantes atrasos de seu marido, das desculpas esfarrapadas entre outras coisas.

Johnson parou para analisar a situação. O comportamento do marido era realmente estranho, mas ele ainda podia estar fazendo algum tipo de programa noturno inocente como... Pilates? No entanto, seus pensamentos foram cortados novamente por Merlim, que disse entediado:

– Ok, ok... Onde a Sra. Ramares mora afinal? Quero acabar logo com isso.

Mandregas entregou um envelope contendo todas as informações que disponham do caso para Merlim, além de algumas folhas limpas, para serem preenchidas durante a investigação. Ambos os detetives levantaram da cadeira e saíram da sala, depois atravessaram a pequena sala principal e saíram da “central”. Johnson olhava para Merlim e o envelope em sua mão e, embora não quisesse admitir, estava animado com o trabalho.

Desceram as escadas até a saída do prédio onde ficava o escritório. Saíram por uma porta gradeada, que dava para uma das muitas ruas de Chicago e, parado quase em frente à porta, estava o carro de Merlim, sujo e empoeirado, mas funcionando. Um velho Mercedes Benz que herdara de seu pai, com a carroceria amarelada e o teto preto. Depois de entrarem, Merlim ascendeu um cigarro sob os protestos do jovem detetive:

– Precisa mesmo fumar aqui? – perguntou tapando o nariz

– O carro é meu, garoto, fique feliz de não ir no teto – e com aquilo a discussão sessouLevaram 20 minutos de viagem até o endereço que Mandregas fornecera, pois havia pego o transito no trajeto. Mal-humorado, Merlim tocou a campainha da luxuosa casa da família Ramares. Era uma casa grande, formada por vários bucos. Havia grandes janelas na parte da frente, que davam visão da escada de madeira do lado de dentro. A fachada da casa era branca, em contraste com as janelas, que tinham bordas pretas e com a porta, pintada em vermelho vivo.

Um pequeno quintal, nada mais que algumas plantas pequenas e uma árvore, formavam um espaço de “boas vindas” a quem vinha de fora e enfeitavam a entrada. Depois de alguns minutos, uma mulher loira, de aparentemente 30 ou 40 anos, com longos cachos e vestido vermelho atendeu a porta. Parecia ocupada, pois olhava a todo momento para dentro de casa, gritando para alguém lá de dentro. Seus olhos eram castanhos e seu rosto parecia ter passado por algumas cirurgias plásticas para “rejuvenescimento”, todas falhas, aparentemente.

– Vocês devem ser os detetives – disse ela animada – Vamos, entrem, entrem, mas apague esse cigarro, não permito cigarros na minha casa, fazem mal às crianças.

Merlim lançou um olhar de ódio para a mulher, que aparentemente não percebeu, mas jogou o cigarro no chão e pisou no mesmo, afinal, era clientes como ela que mantinham seu salário em dia.

Ambos entraram na casa e viram que a mulher falava com outra, que parecia ser a faxineira do local. A Sra. Ramares – ou Cláudia, como preferia ser chamada – levou-os até uma sala espaçosa, onde havia dois sofás de couro, um de frente para o outro, separados por uma mesa de centro de vidro com pés de madeira, onde ficava uma fruteira e alguns controles remotos. Uma grande televisão ficava na parece oposta, de lado aos sofás. As cores predominantes no ambiente eram o branco, o preto e o vermelho, o que assustou um pouco Johnson.

– Bem, essa suspeita começou alguns meses atrás, quando ele disse que eu o “aborreço demais” – começou Cláudia, olhando a mesa de centro com um ar triste – Então comecei a prestar mais atenção nele... E comecei a perceber que demorava demais para voltar do trabalho... O celular dava sempre ocupado, não queria me mostrar as mensagens e ligações... Comecei a achar que ele podia estar me traindo.

“Começou a achar?” pensou irônico Johnson, estava quase falando algumas coisas para saber mais, mas Merlim o cortou novamente naquele dia:

– Tem alguma ideia de quem possa ser? Alguém do trabalho? Alguma amiga sua? A empregada?

Cláudia riu quando Merlim mencionou a faxineira e disse, sem tirar o sorriso do rosto – A Lara? Nunca. Quem iria querer uma velha como ela? – soltou um risinho quando terminou a frase, esperando que os detetives rissem junto, mas estes permaneceram sérios.

Como que por obra do acaso, a tal de Lara entrou na sala logo após a pronúncia de sua patroa, trazendo cafés e alguns biscoitos. Olhou meio torto para a Cláudia, mas não disse nada, e foi embora por um corredor que levava até a cozinha. Pouco a vontade, a senhora elegante pegou um biscoito, para disfarçar o erro que cometera.

– Bem, eu tenho uma ideia sim... Uma sujeitinha do trabalho dele, a nova secretária... Começou a alguns meses, assim como minhas suspeitas. Aqui – ela retirou um papel de uma pequena bolsa que tinha guardado em algum lugar do sofá – Este é o endereço do trabalho dele. Por favor, façam alguma coisa.

Merlim pegou o papel, olhou, e guardou no bolso da calça, indiferente. Depois de alguns goles de café e mais alguns detalhes sobre o comportamento do Sr. Ramares – Beto, como dissera a esposa – deixaram a residência para irem ao trabalho do investigado.

Sr. Ramares tinha uma posição de destaque em uma importante distribuidora local. Sua carreira ia a todo vapor e, recentemente, havia conseguido sua própria sala e uma secretária particular.

Ao chegarem ao local, não foram muito bem recebidos e, como não tinham distintivos, tiveram de convencer a atendente de que eram investigadores particulares. Depois deste imprevisto, foram ao 3º andar do prédio, onde ficava a sala de Beto. O prédio em si tinha 6 andares e tinha a parte da frente espelhada. A sala que procuravam ficava na parte detrás e tinha apenas algumas janelas para ventilar o local.

A sala ficava no fim de um longo corredor e na frente da porta, um balcão circular de madeira se colocava, com uma jovem atrás. Johnson achou a jovem atraente, bem mais do que Cláudia. Parecia ser alguns anos mais jovem, mas não muitos, no entanto, ela tinha uma beleza jovial verdadeira, diferente da artificial Sra. Ramares. Tinha a pele morena e cabelos escuros como a noite, seus olhos eram cor de avelã e seu rosto era arredondado.

“Ele sabe escolher” pensou Johnson, com um leve sorriso no rosto. Ficaram observando a porta, sensíveis a qualquer movimento. Sabiam que logo Beto sairia para o almoço e que Cristina – a secretária – iria junto. Tinham conseguido essas informações com o pessoal da limpeza e alguns colegas, que não viram problemas em contar algumas histórias para dois estranhos vestidos de ternos beges e gravatas vermelhas. Merlim não gostava do garoto novo estar tão parecido com ele e estava decidido a comprar um paletó novo no dia seguinte.

Quando eram por volta das 13h daquele fatídico dia, a porta se abriu e um sujeito baixo, com uma camisa branca, gravata vermelha e paletó marrom saiu pela porta. Ele tinha um grande nariz, como notou Johnson e seu cabelo era encaracolado, castanho, com alguns fios brancos precoces. Ele sorriu um sorriso amarelado e chamou a secretária, que ficou feliz em acompanhá-lo pelo corredor. Johnson fingia mexer no celular e Merlim olhava para um quadro pendurado na parede, onde havia alguns panfletos presos, enquanto os dois passaram. Tal medida pareceu desnecessária, pois não pareceram notar a presença dos dois.

Os detetives seguiram o casal alguns metros atrás, mas eles não pareciam preocupados com a discrição. Cristina andava abraçada ao braço de Beto e este deitava sua cabeça levemente na dela. Pareciam realmente um casal de namorados e não amantes e Johnson se perguntou se realmente não eram...

O casal entrou no carro de Beto e se dirigiu para um restaurante nas redondezas. Merlim foi logo atrás e pediu uma mesa para os dois também, próximo à mesa dos perseguidos.

– Leve seu celular garoto – disse Merlim – Não é boa ideia levar minha câmera – terminou apontando para uma câmera antiga que ficava no banco de trás. Johnson arregalou os olhos, pois não havia notado a câmera, ou qualquer um dos muitos aparelhos de investigação que Merlim carregava em seu carro.

O restaurante não era ruim, era um estabelecimento médio, com cerca de 50 mesas, variando de 2 a 6 lugares, com toalhas vermelhas sobre brancas. Johnson e Merlim sentaram-se em uma mesa de 4 lugares, ao lado da grande janela do estabelecimento, que dava vista para a rua. Beto e Cristina sentaram-se algumas mesas a frente, em uma mesa de dois lugares, ao lado do pequeno jardim que ficava no centro do restaurante, de modo que apenas Cristina podia ver os dois e Beto estava de costas para eles.

Os detetives pediram apenas alguns sucos e uma porção de batatas fritas, ao passo que o casal pediu uma refeição completa. O local estava bem vazio, mesmo sendo hora do almoço. Apenas umas 10 ou 15 mesas estavam ocupadas e os presentes falavam baixo. Johnson fingia mexer no celular, mas estava ajustando a câmera, de forma que pudesse tirar fotos nítidas da mesa que observavam sem que fosse notado. Merlim estava de costas para o casal, mas podia ter uma vaga visão da mesa através do reflexo no vidro.

– Isso vai acabar com a minha bateria – brincou Johnson

Merlim lançou-lhe um olhar repreendedor com uma das sobrancelhas levantadas e o jovem detetive abaixou a cabeça, sem graça. Beto e Cristina comiam alegremente sem desconfiar dos dois detetives a algumas mesas da sua. Eles riam um para o outro, seguravam as mãos, lançavam olhares carinhosos e davam leves selinhos de vez em quando. Johnson tirava fotos e gravava, mas por dentro se sentia um pouco mal. Beto parecia realmente feliz e Cristina também.

– Ei, Merlim... Será que estamos fazendo o certo mesmo? Eles parecem tão felizes...

Merlim olhou para o novato por alguns momentos, respirou fundo e respondeu, com um olhar perdido.

– Garoto, nem tudo que fazemos é certo... Vai ter que aprender isso um dia.

Johnson assentiu com a cabeça, meio desanimado e tirou mais uma foto. Já tinham várias fotos e alguns vídeos e o casal já pedira a conta. Havia sido um trabalho fácil afinal, apenas mais um trabalho como Merlim pensava, apenas mais um caso chato de traição, como todos pensavam.

Mas o Corvo Negro nunca deixa as coisas... “Chatas”.

O casal saiu seguido de Merlim e Johnson. Beto deixou Cristina no trabalho e, como tinha mais tempo de almoço que ela, resolveu dar mais uma saída. Os detetives seguiram o carro, sem entender direito para onde ele ia. Levaram cerca de 5 minutos da distribuidora para uma joalheria nas redondezas.

– O que esse maldito está fazendo? – indagou Merlim, estacionando o carro

Johnson ficou quieto, a simples visão de uma joalheria, com todos os seus anéis de noivado o faziam tremer por dentro. Ele se fechou em sua mente e não disse nada. Merlim, aparentemente sem perceber, começou:

– Bem, você pode...

– Não – cortou seco Johnson. Ele olhava para a calçada e tinha um olhar pesado – Eu não vou entrar na joalheria.

Merlim o observou por alguns segundos. O jovem detetive estava mais sério e tenso do que o habitual e parecia um tanto assustado, como se lembrasse de coisas que não deviam ser lembradas. Com um suspiro, Merlim desceu do carro e foi até a joalheria “Novo Diamante”.

O local era amplo, mas não grande. Prateleiras de vidro enchiam o local até onde não se podia ver mais e, balconistas com uniformes pretos atrás de balcões de vidro recebiam os clientes. Merlim, desnorteado com o brilho e a luz do local, achou que havia muitos zeros naquelas joias. Beto, aparentemente desligado do mundo ao seu redor, olhava com os olhos brilhantes para um anel de noivado com um grande cristal adornando-a.

– Gostou, senhor? - Perguntou o balconista, um homem de meia-idade com um grosso bigode

– É muito bonito... Quanto custa?

O balconista checou o preço na etiqueta e respondeu: - 4.000 o par, senhor.

Beto engoliu em seco o preço, mas continuou observando o anel, ponderando custo e beneficio. Merlim tentava ficar próximo ao seu alvo, e observava, sem muita atenção, um punhado de joias.

– Procurando algum presente senhor?

– Não, são para mim... – respondeu Merlim, sem olhar para o balconista, com o olhar fixo em Beto.

O balconista, mais jovem que o outro, o olhou com relutância, afinal Merlim estava na sessão feminina. Mas como seu trabalho era vender e não julgar, continuou, olhando meio torto para a figura do detetive a sua frente:

– Alguma preferencia?

– Qualquer coisa que fique bem – respondeu irritado. Merlim nunca pisara em uma joalheria. O seu anel de noivado fora herdado dos pais.

O balconista assentiu tenso e foi para dentro de uma porta atrás de si, onde ficava o estoque. A essa altura, Beto já decidira comprar o anel, mesmo que isso queimasse suas economias.

– Vai valer a pena – disse sorridente ao balconista, que fazia um esforço enorme para fingir interesse.

– Vai se casar de novo, senhor? – perguntou entediado o funcionário, com os olhos atentos presos no anel no dedo do cliente.

– S-sim, vou sim... É tradição sabe... Casar mais de uma vez... Er... – Beto mexia inquieto na aliança que esquecera de tirar, tentando pensar em algo que pudesse dizer, mas o balconista não demonstrou interesse no assunto.

Merlim o seguiu, sem esperar o próprio atendente voltar. Depois, entrando no carro, percebeu que Johnson ainda tinha a expressão fechada.

– Ele comprou um anel de noivado... Acho que vai largar a mulher para ficar com a amante – disse Merlim, arrancando com o carro e seguindo em direção da residência dos Ramares, afinal já tinham provas suficientes.

– Eu imaginei – respondeu seco Johnson

– O que foi, garoto? Teve o pedido de casamento recusado para ficar com tanta raiva de joalherias? – brincou o detetive veterano, mas logo se arrependeu, pois Johnson se afundou no banco e lhe lançou um olhar mortal

– Não – respondeu depois de uma longa e penosa pausa. Depois virou-se para a rua com a imagem de uma aliança ensanguentada na mente.

– Sabe, eu sou casado... Dois filhos adultos, moro com minha mulher. Você pode aparecer lá um dia, se quiser – ofereceu o gordo detetive, meio sem graça. Apesar de um tanto grosso, tinha o coração bondoso, que sentia-se mal pelo companheiro.

A medida que se afastavam da joalheria, Johnson voltou ao seu antigo humor, tanto que, ao chegarem na casa dos Ramares, ele já estava completamente bem. Não comentaram o ocorrido, ou as causas dele, por um bom tempo. Mas mal sabiam que aquele era o começo de uma grande amizade.

A Sra. Ramares veio atender a porta e parecia ainda mais artificial do que antes, se é que era possível. Surpreendeu-se ao ver os dois ali.

– Mas já? Achei que demoraria alguns dias...

– Em geral – começou Merlim, já começando a ficar irritado – Levam alguns dias. Mas seu marido e sua amante não parecem querer esconder de ninguém o adultério.

Ela engoliu em seco, pois aquilo tinha atingido seu orgulho. Pediu que ambos entrassem com um gesto de cabeça, em silêncio. Eles se sentaram no mesmo sofá de antes, mas dessa vez o clima era mais pesado. Johnson, lentamente mostrou as fotos e comentou o almoço que tiveram.

– Ele também comprou uma aliança. Não me surpreenderia se logo ele chegasse com um pedido de divórcio.

Cláudia, que havia ouvido a tudo calada, quando tomou conhecimento do último fato, cedeu. Começou a chorar, com as mãos no rosto, com vergonha dos detetives, com vergonha do marido, com vergonha da vida. Não entendia o que fizera para merecer isso, e já pensava no que fazer para o marido.

Johnson engoliu em seco. O tempo todo da investigação havia condenado aquela mulher, acreditando que ela não sentia nada real pelo marido, mas agora, vendo aquele choro, perguntou-se o quanto estava errado.

– Vocês... Vocês poderiam me levar para o escritório dele? Para jogar na cara todas as evidências... Se eu for sozinha, acho que não consigo...

– Claro – respondeu Johnson, antes que Merlim se manifestasse – Iremos com a senhora.

Sob um olhar reprovador do ancião, os três entraram no carro sujo de Merlim e partiram em direção da distribuidora. O trânsito estava realmente infernal, o que os atrasou em quase uma hora.

Quando Merlim ia dar a volta para estacionar, um sujeito correu na frente do carro, não sendo atropelado por muito pouco. Ele apareceu aparentemente do nada e atravessou a rua como um raio. Johnson pode notar que ele se vestia todo de preto, mas não conseguiu mais detalhes. Ninguém pareceu se importar com o ser que quase fora atropelado, além de Merlim que xingava com toda sua raiva.

Um grande erro, sem dúvidas.

Os três entraram na empresa e passaram direto pelos corredores, sem dar muita atenção à recepcionista que pedia para se identificarem. Os que reconheceram a esposa de Beto logo viraram o rosto, admirando a pintura da parede, prevendo o que aconteceria.

Quando chegaram até o escritório do Sr. Ramares, Cláudia lançou um olhar mortal para a assistente, que os olhos para os papéis. Quando Merlim colocou a mão na maçaneta para abrir a porta, a assistente tentou protestar, mas foi repreendida pelo olhar gelado da Sra. Ramares.

A porta se abriu lentamente, com um ruído surdo. Mesmo os anos de experiencia de Merlim e Johnson, mesmo a raiva de Cláudia, nada, absolutamente nada, poderia tê-los preparado para o que veriam.

O escritório estava tingido de vermelho.

O local era pequeno, com paredes pintadas de um rosa fosco, que se misturavam com o marrom dos inúmeros trabalhos de madeira que se encontravam na sala. Prateleiras com livros enchiam o ambiente e no canto, ao lado de uma grande janela, ficava uma mesa de madeira maciça onde Beto trabalhava. Uma cadeira de couro confortável ficava atrás e outra, um pouco mais nova, ficava na frente. Quadros com paisagens deixavam o ambiente agradável e um cheiro agradável predominava no local.

Antes, claro, de ser tingido daquela maneira macabra.

As pares estavam manchadas com sangue, até mesmo o teto não escapara da arte macabra. O sangue escorria lentamente, criando fios vermelhos que brotavam aos olhos de quem estivesse disposto a olhar, como um rio abrindo um caminho doloroso por entre pedras e árvores. Alguns livros haviam caído das prateleiras e estavam agora manchados eternamente pelo sangue que recobria o chão em uma enorme poça.

O que chamou a atenção do velho detetive, no entanto, foi o corpo de Beto, parcialmente mutilado, pregado na parede com um machado na cabeça, de uma forma sádica. O vidro da janela estava quebrado, mas não havia muitos cacos na sala, indicando que havia sido quebrada de dentro para fora. Beto estava morto, não havia dúvidas quanto a isso. Seus braços e pernos haviam recebido violentos golpes de machado, mas não haviam sido completamente arrancados. Sua cabeça estava presa na parede por um machado que enfeitava sua testa, com um enorme corte, de onde o sangue brotava. Seus olhos ainda estavam abertos, com uma expressão de horror e medo. Era possível ver por onde as lágrimas abriram espaço em meio ao rio vermelho em seu rosto.

Cláudia soltou um grito do mais puro horror que se podia imaginar. Merlim deixou a boca cair, com os olhos fixos no machado. Johnson, no entanto, olhou perturbado para um detalhe que parecia despercebido aos demais. Um detalhe que não sairia de sua mente enquanto estivesse vivo. Um detalhe que mudou sua vida para todo o sempre.

Uma pena negra dançava em meio ao sangue.


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Notas finais do capítulo

Vou tentar postar com mais frequência, juro, só a criatividade ajudar e.e



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