Lucia atravessou os longos corredores do Palácio em busca da sala de Gael onde esperava encontrar com Caspian e tomar uma conversa amigável com o mesmo. No caminho, pouco antes de descer as escadas que a conduziriam á sala, Lucia encontrou com Gael que lhe sorriu enquanto limpava as mãos em um avental branco pendurado diante do corpo e perguntava a rainha de modo formal:

- Como vai majestade? –disse curvando a cabeça rapidamente depois voltando a olhar nos olhos de Lucia.

- Muito bem Gael, obrigada. Estou procurando Caspian você o viu? –perguntou a moça tentando não demonstrar toda sua ansiedade.

- Sim, estava agora mesmo tratando de seu ferimento. Ainda preciso de algumas ervas que estão em falta em meu estoque particular e por isso devo ir até a horta do nosso campo para recolher algumas, majestade... Mas Caspian está em minha sala aguardando.

- Ah, obrigada Gael, eu devo ir vê-lo.

- À vontade majestade! –Gael sorriu mais uma vez e curvou-se logo passando pelos degraus e subindo os mesmos deixando que Lucia passasse.

Assim que Gael cruzou o corredor seguinte, Lucia respirou profundamente se encheu de coragem e segurou as saias de seu vestido logo descendo os degraus e se dirigindo até tal sala onde esperava encontrar o provável rei Caspian X. Lucia se aproximou da entrada do cômodo com os olhos azuis atentos enquanto seus passos lentos e cautelosos a conduziam para o lado de dentro da sala. A rainha adentrou ao cômodo sem pressa, com um sorriso singelo quase imperceptível na face, e procurou por seu hospede. Ela não se manifestou enquanto se aproximava de uma mesa larga colada á parede, coberta por vidros e frascos coloridos que continham as ervas e os remédios de Gael, e apenas permaneceu em silencio enquanto seus dedos deslizavam sobre a madeira.

- Está me procurando majestade? –disse o moreno que se encontrava no outro lado da sala, próximo à janela.

- Caspian! –ela sorriu e ergueu a face naquela direção encontrando um homem despido da cintura para cima.

Os olhos de Lucia repousaram inevitavelmente sobre o peito nu do moreno, e seus lábios abriram parcialmente ficando imediatamente secos, enquanto ela se esquecia de respirar. Lucia não estava muito acostumada a ver o corpo de um homem naquela situação, na maioria das vezes em que teria sido exposta a tal visão, fora sempre ao ver algum soldado muito ferido e geralmente não era algo agradável de ver, além do mais os homens do Palácio eram rudes e tinha uma aparência um pouco rústica e grosseira de guerreiros forjados no calor da batalha, raramente eram belos e os poucos que alcançavam tal padrão, nunca chamaram atenção da rainha, até mesmo por sua posição inferior que exigia certo respeito entre as partes. Mas Caspian já possuía total atenção de Lucia sem fazer esforço algum, e ver a pele dele exposta daquela maneira, sua caixa torácica bem delineada, o abdômen parelho, e bem formado com pequenos sinais espalhados pela pele clara de quem pouco tomava sol, os minúsculos fios de cabelo que formavam uma linha arriscada abaixo do umbigo por onde os olhos de Lucia desceram quase que por instinto antes que ela se virasse totalmente corada e se manifestasse de maneira tensa:

- Caspian, por que está com metade do corpo descoberto? –dizia ela levando as mãos à beirada da mesa e procurando alguns frascos para examinar enquanto disfarçava seu nervosismo.

- Gael me pediu que retirasse para cobrir o ferimento com curativo. –se explicou ao perceber a tensão da moça. – Eu não esperava que você viesse até aqui...

- Pode se cobrir, por favor? –disse a morena respirando profundamente.

- Me desculpe! –ele disse enquanto procurava a camisa, e percebeu que a mesma estava a dois passos de onde Lucia estava.

Caspian se aproximou em passos leves enquanto fitava a camisa branca e sorria discretamente notando a timidez de Lucia. Ela por sua vez tomou um pequeno frasco amarelo queimado em mãos enquanto tentava segurar a aceleração dos seus batimentos cardíacos em frequência normal, evitando que sua face permanecesse por mais tempo com aquela coloração avermelhada que se apossava dela sempre a rainha se via em situações constrangedoras. Ao notar que Caspian estava a poucos passos de si, Lucia desviou o olhar rapidamente na direção e o viu de costas vestindo sua camisa, e novamente sua face foi tomada por um calor infernal. Os olhos curiosos da rainha passearam pelo contorno da espinha do moreno e desceram rumo ao traseiro do mesmo quase que sem querer, até que esse se virasse já com a camisa vestida e a encarasse com um sorriso divertido.

- De onde eu venho as moças não costumam ficar tão coradas diante de um homem sem camisa! –disse achando bastante meiga a reação de Lucia.

- Eu não creio que seja adequado, uma moça ter tal visão a menos que seja de seu esposo. –disse ela ainda sem graça com os pensamentos que se apossavam de sua cabecinha. – Imagino também que as únicas moças que se aproximam do que você está acostumado na sua terra, se encontram no bosque de Trinity. –dessa vez o tom foi ríspido.

- Na verdade elas não costumam ser tão audaciosas! –ele riu. – Com algumas exceções!

Lucia encarou o moreno fazendo cara de paisagem mostrando seu total desinteressante em permanecer naquele assunto, o que deixou Caspian sem graça e então o fez mudar de assunto.

- Bom, você não disse por que estava a minha procura.

- Eu só queria saber como estava seu ferimento. –disse passando por ele e andando até a janela.

- Vou sobreviver! –ele sorriu ao se virar enquanto procurava sentir o cheiro doce da rainha que pairava no ar.

- Fico feliz por isso! –ela sorriu sem que ele notasse e se prostrou diante da pequena janela.

- Se tratava de um dardo tranquilizante. –ele explicou fazendo com que Lucia se virasse para olhar em seus olhos. – Um espinho envenenado. Não do tipo que mata, só te deixa totalmente dormente.

- Como foi? –perguntou Lucia em um tom tranquilo e suave enquanto seus olhos brilhavam diante da luz que entrava pela janela.

- Bom, foi bem rápido na verdade. –disse dando alguns passos rumo à janela. – Depois que fui atingido eu senti uma dor forte no local, e depois não senti mais nada. –ele chegou mais perto de Lucia. – Só tive tempo de avisar Edmundo que não me sentia bem, e quando dei por mim estava com a cara no chão. –ele riu.

- E Edmundo o deixou lá, sozinho no meio daquelas moças? –ela disse erguendo ambas as sobrancelhas.

- É, acredito que ele tenha uma boa razão pra ter feito isso. –respondeu o moreno fazendo uma expressão descontente enquanto torcia o canto da boca.

- Fico feliz que ele tenha conseguido convencer Tricya a deixá-lo regressar ao Palácio. –e Lucia sorriu olhando nos olhos negros do rei.

- Caso eu não voltasse acha que sentiria a minha falta? –ele arriscou um flerte.

- Você foi um rei em Nárnia, e quando se é nomeado rei em Nárnia, você sempre será rei. Se Tricya o raptasse, meu dever como rainha seria declarar guerra contra seu povo pelo atrevimento em capturar o rei de Nárnia. –respondeu de maneira diplomática para evitar ficar corada novamente.

- Não foi isso que eu perguntei. –disse ele mantendo seus olhos compenetrados nos dela.

- Quer dizer fora os meus deveres como rainha? –ela questionou baixando parcialmente o rosto sem tirar os olhos do rosto do moreno.

- É. –ele confirmou em tom suave e grave.

- Talvez. –ela respondeu desviando o olhar e sorrindo singelamente. – Provavelmente eu sentiria falta do seu comportamento peculiar, e de suas perguntas inadequadas. –ela abriu um lindo sorriso enquanto olhava as externas do palácio.

- Perguntas inadequadas? –ele riu deixando um pouco de ar quente sair pela sua boca. – Como, por exemplo?

- As que você faz quando quer me deixar constrangida. –disse Lucia voltando a encarar o moreno.

- Eu te deixo constrangida majestade? –ele disse erguendo uma sobrancelha.

- O tempo todo. –disse ela desfazendo o sorriso meigo e ficando séria.

- Eu sinto muito por isso. –ele respondeu no mesmo tom anterior.

- Está se desculpando de novo, está pegando por habito. –ela moveu o canto dos lábios em um sorriso muito discreto.

- Eu nunca sei exatamente o que dizer quando to com você. Tenho medo de te ofender com os meus modos.

- Duvido que você seria capaz de alguma grosseria Caspian.

- Meus costumes são diferentes dos seus, Lucia. –dizia enquanto encarava a face da linda moça. – Na minha terra quando se deseja dizer algo a uma moça, você simplesmente diz, mas aqui eu acredito que se eu dissesse metade do que penso a seu respeito, Pedro me arrancaria a cabeça! –ele sorriu depois do comentário.

- Seus pensamentos sobre mim são tão ofensivos assim? –ela disse franzindo a testa e baixando o rosto.

- Não. –ele corrigiu. – Claro que não Lucia... –disse tocando o queixo da rainha e erguendo gentilmente seu rosto. – Eu só penso coisas boas a seu respeito, mas não tenho certeza se deveria partilhar disso com você. –disse segurando uma das mãos da moça entre as suas. – Não seria certo diante dos costumes de Nárnia, e eu não me perdoaria por ser desagradável com você...

As maçãs do rosto de Lucia se tornaram tão vermelhas e sua face inteira se aqueceu com aquele contato mais intimo, e com a proximidade perigosa que se estabeleceu entre eles que ela ficou sem palavras assim como ficou sem ação, apenas olhando nos lindos olhos do homem diante dela, percebendo que adorava tal proximidade, mesmo sendo ela uma rainha sabendo que não deveria se deixar envolver daquela maneira sem que os devidos arranjos fossem feitos para tais possibilidades. Ela ainda era uma rainha e deveria ser cortejada oficialmente como mandava os costumes de seu povo há séculos, e esta era a única razão que impedia que a proximidade entre ambos fossem quebrada naquele momento, já que Caspian era de fato um cavalheiro e não ousaria ultrapassar os limites, a menos que Lucia concordasse.

O silencio entre os dois foi quebrado quando Gael adentrou a sala trazendo consigo as tais ervas que teria saído para buscar anteriormente, e assim ambos se afastaram mais uma vez tentando disfarçar a cena anterior, mas sem notar que já havia sido flagrada por Gael.

- Bem, eu devo voltar aos meus afazeres. –disse Lucia dando alguns passos a frente e se afastando de Caspian.

- Á vontade majestade! –disse Gael olhando-a com um sorriso amigável.

- Nos vemos mais tarde no jantar Caspian. –disse ela evitando muito contato visual para não dar margem aos comentários de Gael.

- Até lá Lucia. –respondeu o moreno sentindo um vazio ao vê-la se afastar.

Lucia girou sobre seus saltos e se dirigiu a porta, enquanto Gael deixava suas ervas sobre a mesa de medicamentos e ficava de costas para a saída. Lucia tocou a curva da porta e lançou um breve olhar na direção de Caspian, que manteve seus olhos fixos nela antes que ela saísse de vez e ele a perdesse de vista. Gael trocou algumas palavras com o moreno, que simplesmente não lhe deu ouvidos e se virou a janela olhando para o campo verde a sua frente.