As Aventuras de Rin Casaco Marrom escrita por Sem Nome


Capítulo 9
Capítulo 9


Notas iniciais do capítulo

Capítulo 09 :D
Desculpe se tiver muitos erros. É que eu tive uns probleminhas na hora de postar...



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Capítulo 09

Aquele com a pena de morte.



– Tem certeza de que você não faz ideia de onde esse rapaz está? – Meiko recostou-se em no tronco da árvore.

Ele, eu sei onde está – Rin foi para o lado de Meiko – Já o calabouço fétido onde ele estava, essa é outra história.

Depois de sair da cidade não mais amaldiçoada, Rin e Meiko jogaram suas coisas debaixo da primeira árvore (viva) que viram na estrada, e dormiram no chão, mesmo que o sol ainda não houvesse se posto. Sentiram bastante frio, e a menina tomou uma nota mental para comprar cobertores quanto tivesse chance.

Agora, o café da manhã consistia nas maçãs azedas que a árvore oferecia.

– Talvez possamos perguntar para alguém – opinou Rin.

– Quantos especialistas em calabouços você conhece? – a morena perguntou.

– Muito engraçado – Rin já havia se acostumado com a natureza sarcástica da companheira.

– Estou falando sério – Meiko esclareceu – Quero dizer, você viajou tanto que eu pensei que conhecesse todo o tipo de gente. Rin, você conhece uma chimpanzé falante que come ratos, deve ter falado com alguém que entenda do assunto.

Rin vasculhou em sua mente, em busca de alguém que mensionara ter algum interesse por calabouços ou cadeias. Não encontrou ninguém, naturalmente. Porém, lembrou-se, sem motivo aparente, de um homem chamado Dell que entendia de charutos e que não era a pessoa mais agradável do mundo. Ele ocupara o assento próximo do de Rin numa viagem de trêm.

– O que me faz lembrar – a moça interrompeu seus pensamentos quando percebeu que ela não estava chegando à lugar algum –, onde estão seus pais?

Rin deu mais uma mordida na maçã, mastigando devagar, só para ter uma desculpa para não responder mais rápido.

– Eu não sei – respondeu finalmente –, cresci no orfanato da Aldeia de Menta. Me acharam no leito de um rio.

– Ah – Meiko sentiu-se mal por tocar no assunto – Sinto muito.

– Não precisa sentir muito. Gostava do pessoal de lá, tantos dos cuidadores quanto das outras crianças – garantiu – Eles até deram uma festa de despedida quando eu decidi que iria começar minhas viagens. Quantos anos eu tinha? Onze, doze? Nem me lembro mais. Tinha bolo de laranja. Eu me lembro que uma das moças do orfanado (e olha que ela batia na gente quando nos comportávamos mal) chorou a festa inteira, e me deu essa bússola – Rin mostrou o objeto ainda em perfeito estado – Eu gostava de lá.

– Então por que foi embora? – perguntou a outra.

Rin deu de ombros.

– Eu fiquei farta de sempre estar rodeada das mesmas paredes, do mesmo teto, das mesmas janelas... E como ninguém me adotava...

– Jura? – Meiko estranhou – Normalmente as pessoas dariam qualquer coisa por uma criança loura de olhos azuis.

– Eu nunca disse que era comportada quando criança – Rin riu, sem humor – Pregava peças nos adultos que visitavam.

Meiko soltou um pouco de ar pela boca, numa tentativa de risada e um silêncio se instalou, mas não um silêncio desconfortável. Simplismente um silêncio. Rin passava as pontas dos dedos na ponta da lança, enquanto Meiko terminava sua maçã, tomando todo o tempo do mundo.

– Bem – disse a moça, limpando a sujeira das roupas e pondo-se de pé –, não vamos resolver nada ficando sentadas aqui.

– Mas para onde vamos? – a morena a ajudou a levantar.

– Vamos, pelo o menos, nos afastar da Cidade da Tempestade – pediu – Sinto que podemos levar flechadas a qualquer momento, só de estar perto deste lugar.

Rin concordou, e logo estavam de volta à estradinha com campos de vacas malhadas. A menina não queria admitir, mas estava desanimada. Não fazia ideia de onde a fera (rapaz) estava. Podia estar em qualquer lugar do mundo!

– Talvez possamos procurar em lugares com grandes prisões – cavou um dos bolsos do casaco, só para distrair-se e, para sua surpresa, achou um yo-yo azul.

– Não sei – Meiko murmurou – Nas prisões, eles cortam os cabelos e fazem a barba dos detentos. Pelo o que você me descreveu, esse garoto não está em uma cadeia qualquer. Cuja localização, provavelmente, é desconhecida.

Rin suspirou, derrotada. Brincava com o yo-yo, mas só o truque básico, pois não sabia os mais complicados. O ir e voltar constante do brinquedo, somado aos mugidos das vacas, a deixava sonolenta.

Mas antes de dar seu primeiro bocejo, Meiko a empurrou com força. Aterrissou com a morena logo ao lado, e nem precisou perguntar o motivo do empurrão. Bem no lugar onde estava a poucos segundos atrás, a terra se corroía, formando uma mancha escura e feia que se espalhava lentamente. Uma coisa como aquela só podia ter sido feita com ácido.

Olhou para cima, temerosa. Mais uma criatura, dessa vez era uma espécie de cobra voadora, sem olhos, cuja boca redonda e aberta, cheia de dentes de agulha, ocupava toda a cabeça. Era possível ver as veias de suas asas marrons graças ao sol.

No chão, também havia alguém que Rin não achava que seria um amigo. Uma figura de capa preta, usando uma máscara branca e simples, com buracos para os olhos, narinas e boca.

A cobra voadora, com um sinal do encapado, aterrisou pesadamente um pouco atrás dele, dezenas de pequenas patinhas brotaram de seu abdômem para sustentar seu peso no chão.

Meiko desembaiou suas espadas, enquanto Rin preparou a lança, apesar de não achar que seria de muita utilidade. Afinal, ela não sabia usar a arma direito (só teve sorte com os fantasmas porque eles não achavam que haveria uma arma que pudesse ferí-los, obtendo, assim, o elemento surpresa), mas o monstro e a figura de capa não precisavam saber disso.

Em resposta, o encapado tirou da bainha duas facas com lâminas retorcidas. O silêncio reinou, ninguém ousando fazer nada além de respirar.

Meiko segurava o cabo das espadas com tanta força que seus dedos ficaram brancos. Não atacaria até que o oponente o fizesse, tampouco atearia fogo nas espadas antes de a batalha realmente começar.

As espadas de seu adversário eram curtas e provavelmente difíceis de manejar. Ou ele era um tolo, ou muito bom espadachim. Era sempre bom estar preparada para a segunda opção, mesmo que desejasse que a primeira fosse a certa.

E quando ele, impaciente, deu um passo a frente, ela soube que a batalha havia começado.

Meiko saltou para frente, deixando Rin para trás. A menina decidiu que ficaria de olho no monstro, que continuava parado no chão, caso ele tentasse interferir na luta. Se isso acontecesse, porém, ela não sabia o que faria, além de avisar Meiko.

Eu criarei um plano de última hora, decidiu.

As espadas se chocavam com tanta violência que Rin pensou que a qualquer minuto uma das lâminas quebraria. Ela achou que aquele fosse só mais um inimigo comum, como aqueles monstros de olhos pálidos. Por isso ficou tão surpresa e apavorada quando percebeu que Meiko estava perdendo.

Ela estava tendo dificuldades até em bloquear os golpes do encapado. Tentava se afastar sempre que possível, mas ele vencia as distâncias rápidamente, sem dar-lhe tempo nem de respirar. Nem as espadas em chamas eram o bastante para mantê-lo afastado.

A figura, aproveitando uma falha na defesa de sua oponente, deu-lhe uma joelhada no estômago e, usando o cabo de uma das espadas, golpeou sua testa, abrindo um corte profundo.

Meiko cambaleou, tonta. Escutou Rin gritar seu nome, mas não deu importância à isso. Tinha que sobreviver àquela batalha, não podia morrer agora. Mas foi muito fácil para o encapado lhe desarmar e derrubar, em seu estado funerável. Sangue escorria do machucado em sua testa, caindo em seus olhos, nublando sua visão.

Rin estava desesperada. E agora? Não seria páreo para o inimigo, mesmo se, por um milagre, aprendesse a usar a lança em segundos. Procurou no chão algo que pudesse ajudar. Se não agisse rápido, Meiko morreria!

A cabeça da moça latejava, ela estava entre a consciência e o desmaio, sem sentir seu corpo. Seria a coisa mais fácil do mundo matá-la.

A figura puxou os cabelos da morena para deixar seu pescoço mais à mostra, e encostou a espada retorcida bem de leve na pele, mas foi o suficiente para fazer um corte longo e fino. Era só colocar um pouquinho mais de força, e então a menina do laço preto não teria ninguém para protegê-la. Seria, também, uma vingança. Vingança pelo o que aquela tola havia feito com seus cães de caça.

Mas a figura sentiu uma súbita dor atrás da cabeça. Virou-se, irritado, só para ver uma menina com um punhado de pedras na mão.

Você quer isto? – gritou, levantando o não livro bem alto, para todos verem. O aperto que o inimigo colocava no cabo da espada afroxou – Vem pegar!

Ninguém podia ver, mas o encapado tinha o maior sorriso do mundo no rosto. Soltou os cabelos de Meiko, deu-lhe um chute na lateral e andou em direção ao seu mais novo bichinho. A moça olhava para Rin, sem conseguir gritar para que ela não fizesse nenhuma bobagem.

Rin ficou dividida entre ir até Meiko, para checar se ela estava respirando, ou correr e achar um esconderijo. Acabou optando pela segunda opção, para ter alguma vantagem sobre o monstro voador.

Porque ela sabia que o primeiro tiro fora apenas um aviso.

Conseguia imaginar onde a cobra voadora estava, sua sombra era projetada até o chão, de modo que a menina não precisava ficar o tempo todo olhando para o alto.

Seria tolice continuar correndo em uma estrada aberta, por isso ela abriu caminho por entre as plantinhas do campo, que chegavam mais ou menos até sua cintura. Não precisou se preocupar com as vacas que pastavam, estas já haviam corrido de medo há muito tempo. Agachou-se, engatinhando lentamente.

Não escutou a coisa aterrisar, então deduziu que atacaria com seu ácido novamente. E, como se lesse sua mente, a cobra cuspiu mais uma bola corrosiva na direção do campo. Dessa vez, a área atingida foi muito mais extensa, e Rin teve que saltar para fora do caminho.

As plantas deixadas para trás definhavam e soltavam fumaça. Rin já havia desistido de se esconder, e começara a correr novamente, desviando por pouco do ácido. Tentou duas ou três vezes atirar pedras em seu perseguidor, mas, como o esperado, os projéteis não chegaram nem na metade do caminho. Suor frio escorria de seu rosto, mesmo que o tempo não estivesse quente.

Uma das bolas de ácido gigantes caiu logo à sua frente, e ela freou de última hora, parando a poucos centímetros do líquido mortal, apesar de ter se arrastado na terra, rasgando um pouco a meia calça e deixando uma pequena trilha de relva esmagada. Deu a volta na poça e voltou a correr. Percebeu uma certa constância nos tiros, havia um intervalo de mais ou menos meio minuto entre um e outro.

Percebeu, também, que tinha uma tendência a ser perseguida por algum tipo de monstro. Decidiu que, se sobrevivesse, pediria a Meiko para dar-lhe algumas aulas de auto defesa. Por hora, tinha que, de algum modo, matar ou despistar a fera.

Então uma ideia lhe veio a mente: onde há um rei, há guardas, e onde há guardas, há armas. A Cidade da Tempestade não estava longe, algumas casinhas já podiam ser vistas (e gritos de terror de seus moradores já podiam ser ouvidos).

Rin se sentiu mal por um momento. Ela atrairia um monstro voador até uma cidade cheia de gente inocente (gente grossa, porém, inocente). Mas depois pensou que, se morresse ali mesmo, o encapado poderia muito bem querer destruir a cidade para eliminar testemunhas ou, simplismente, por diversão.

Mudou seu curso, assim estava no meio da estrada. Só então foi perceber como era estranho uma cidade tão xenofóbica quanto aquela não ter portões que impedissem a entrada de estrangeiros.

Ela conseguia ver a ponta do castelo por entre os telhados das casas. E quando chegou de fato à área da cidade onde os estabelecimentos formavam ruelas ou becos, tentava se esconder entre eles para ganhar tempo e, se possível subir rapidamente em uma escada de incêndio, visando localizar o palácio real.

A fera dava rasantes periódicos próximo à cabeça da menina, tentando ferí-la com as pequenas garras de suas patinhas, mas não conseguindo nada além de um arranhão fino no braço, nem chegando a sangrar.

Infelizmente, Rin descobriu que o caminho mais rápido para a área nobre da cidade estava ocupado por uma feira que vendia todos os tipos de coisas. Cheia de gente, claro.

Enfiou-se por entre as barracas correndo. De inicio, as pessoas deveria ter pensado que se tratava de uma ladra ou coisa do tipo, mas quando avistaram o monstro voador, puseram-se a correr também, deixando para trás suas lojinhas e suas compras.

O monstro, não conseguindo encontrar seu alvo em meio a tantas outras pessoas, disparou em todas as direções. O chão de pedra ficou marcado pelo ácido, enquanto a madeira das lojas apodreceu e murchou.

Rin escutou um grito fino, estridente e inumano vindo do céu e ficou feliz em ver uma flecha atravessada na asa esquerda da cobra. Os guardas já estavam agindo. Quanto mais se aproximava da área nobre, mais guardas apareciam e mais flechas eram atiradas.

Quando chegou nos portões do castelo, a criatura não mais conseguia voar, e caiu no chão, fazendo o solo tremer. Os soldados investiram na fera com todas as armas que tinham; martelos, espadas, lanças, e Rin até pensou ter visto um civil com um rastelo na mão. Mais gritos puderam ser ouvidos, dessa vez mais altos, e Rin teve que tapar os ouvidos com os dedos para suportar o barulho.

Os guardas do palácio e da cidade só pararam de golpear o inimigo depois que sua cabeça virou uma confusão de carne moída, irreconhecível. Metade da população deveria estar rodeando a criatura morta, e a outra metade só não devia estar lá devido ao medo de o bicho acordar e atacar novamente.

Rin expeliu o ar, alíviada. Pelo o menos uma vez, escapara sem lesões graves no corpo. Foi na direção contrária do tumulto, já era hora de ir embora, tinha que encontrar Meiko e ver se estava tudo bem. Mas sentiu alguém puxar-lhe os braços e colocar umas argolas frias em seus pulsos. Algemas.

Virou-se, e deu de cara com um guarda de cabelos cheios de gel, com uma veia pulsando na testa. Engoliu em seco, encolhendo-se em seu casaco como uma tartaruga faria com seu casco. Estava acostumada com olhares raivosos de políciais, mas nunca, em toda sua vida, uma população inteira lançou-lhe o mesmo olhar.

E para onde a senhorita pensa que vai!? – ele meio que gritou, meio que falou, seu rosto ficando vermelho, assim como seus olhos ficaram cobertos com aquelas pequenas veias.

Rin queria que pelo o menos uma de suas mãos estivesse livre, para limpar o cuspe que caiu em seu rosto quando o homem falou.

– Ah... – tentou juntar as palavras.

– Por sua causa – ele recomeçou –, nossa amada cidade foi danificada, centenas de pessoas quase morreram e a população entrou em pânico! Você atraiu um monstro assassino até nossos domínios!

– Mas não foi minha culpa! – Rin defendeu-se – O homem de capa é o dono da criatura! Ele atacou a mim e a minha amiga!

– Que homem de capa!? – o guarda berrou de verdade dessa vez.

– O homem montado na criatura!

– Não tinha ninguém montado na maldita criatura!

Rin gelou. Não tinha ninguém? Ficou nas pontas dos pés, como se assim fosse ver o encapado no meio da multidão. Olhou em volta, mas só o que viu foram os estragos causados pelo bicho.

Sua respiração falhou por um momento. Dessa vez ela iria ser presa mesmo, nada de uma noite em uma cela por chamar um guarda de mula de três pernas porque ele não a deixou subir no ombro de uma estátua.

Engoliu em seco, esperando que o guarda voltasse a falar, mas ao invéz disso, ouviu uma voz conhecida.

– Mas o que está havendo aqui? – Meiko, com gaze enrolada na cabeça, e o rosto sujo de sangue seco, aproximou-se, com dificuldade. Ela carregava tanto sua própria mala quanto a da menina, e seu corpo doía. Olhava para Rin, confusa.

– Desculpe respondê-la com outra pergunta, senhorita – o homem a perguntou suavemente, apontando para a loura – Você a conhece?

– Sim, conheço – Meiko ignorou os avisos não verbais que Rin lhe lançara, pedindo para que ela negasse.

Antes mesmo de terminar a frase, uma algema foi posta em seu pulso direito, ao contrário de Rin, que teve ambos os braços algemados. Empurraram-na para perto da menina.

– Queridos cidadãos da Cidade da Tempestade! – um outro guarda, mais novo, chamou a atenção do público – Como punição para os crimes cometidos por essa menina, que nem mesmo cresceu ao nosso redor ou viveu nossa cultura, e que, deliberadamente, atraiu um demônio para perto de seus lares e para perto de suas famílias, eu sugiro a pena de morte!

Todos os cidadãos bateram palmas e gritaram vivas. Rin engasgou, e Meiko não teve uma reação diferente.

– Espere um pouco – a morena começou – Pena de morte? Não acham isso um exagero? Ninguém morreu, certo?

E para a companheira da bandida – o polícial continuou, olhando nos olhos de Meiko -, prisão perpétua, na nossa maior cadeia.

As pessoas voltaram a comemorar. Meiko e Rin olharam uma para a outra, desesperadas, olhos arregalados.

– Meiko! – chamou Rin, e quando ela se aproximou, voltou a falar – O não livro está no bolso interno grande! O da direita!

– O que? – a moça não sabia o que a outra queria.

– Pegue o não livro, Meiko – Rin implorou – Talvez eu não escape, mas você ainda tem chance! Tem a vida toda para tentar fugir!

– Rin... – havia muito tempo que Meiko não sentia tamanha vontade de chorar. Mesmo assim, obedeceu, e discretamente pôs o não livro em sua mala.

Os guardas, com todo o apoio da população e sem nem mesmo notar a morena colocar o objeto na mala, as puxaram na direção de carruagens diferentes. E elas desejaram boa sorte uma para outra pelo que poderia ser a última vez.




. . .




Rin acabou dormindo com o sacolejar da carruagem, mas era acordada constantemente pelos solavancos causados por buracos no caminho ou pedras maiores, então decidiu simplismente ficar acordada pelo resto da viagem. Além disso, estava algemada, e nenhuma posição era totalmente confortável.

Era possível disser que ainda era dia, pois havia uns poucos furinhos para respiração nas paredes de metal, e também por um quadradinho que se abria de vez em quando, na parede que separava a menina dos guardas dirigindo. Pelos seus cálculos, imaginou que o sol já estaria se pondo.

Já havia vasculhado cada centímetro da carruagem, em busca de uma saída ou de algo que a ajudasse a escapar, mas não achou nem um nem outro, e sua lança fora confiscada. Suspirou, só o que lhe servia de consolo era que talvez (talvez) Meiko conseguisse escapar e continuar a busca sozinha.

Chutou uma das paredes de metal. Maldição, se soubesse que isso aconteceria nunca teria botado nem um dedo do pé naquela cidade dos infernos!

Até que o balançar cessou, e alguém abriu as portas do compartimento em que a menina encontrava-se. A luz irritou seus olhos, mas o guarda nem esperou que ela se acostumasse à luminosidade, puxando-a rudemente pelo braço. Era aquele com a veia saltada na testa.

O clima estava mais quente, o que significava que haviam se afastado um bocado da cidade. O outro polícial, o que havia animado a multidão, levava a lança na mão.

– Você vai passar algumas hora em uma cela – informou –, nós estaremos preparando a execução.

Rin não respondeu nada, olhando para frente. Estava sendo empurrada na direção de uma grande construção de pedra preta. Não era muito alta, mas era imensa em questão de área. Era meio arredondada, percebeu. No topo, havia espaço para que políciais ficassem de vigília.

Por que o local de execução tinha que ser tão grande? Bastava uma casinha pequena para a corda da forca, machado ou guilhotina. Na verdade nem era necessário construção nenhuma para uma execução, ao ar livre era o ideal.

Tinha alguma coisa estranha.

Um portão foi aberto após o oficial identificar-se, e a menina continuou sendo arrastada por meio de largos corredores cheios de guardas. Os mesmos olhavam para ela como se a estivessem estudando.

– Eu aposto um dos meus melhores cavalos – ouviu de longe um deles falar com o outro – Ela dura cinco minutos. O cavalo é puro sangue, viu?

O outro riu.

– Cinco minutos?! – exclamou – Pois eu aposto minha poltrona de couro, aquela que você vive pedindo para comprar, que ela não dura nem dois!

Rin ignorou os comentários que obviamente diziam respeito à ela e observou o local ao seu redor. Não havia celas, só portas de madeira abertas com armários e roupas dos políciais. Então não era uma cadeia. Um centro de treinamento, talvez?

E então foi jogada na única cela que vira até agora. Suas algemas foram retiradas e a porta, trancada. A pequena janela no alto da parede lançava uma luz cortada por barras.

Rin sentou-se em um banco fundido com a parede de tijolos e tirou do bolso o jackalope de pelúcia. Esfregou sua orelha direita com o polegar e o indicador, nervosa. Ela ainda não acreditava que morreria assim. E alguma coisa dentro dela, surpreendentemente tranquilizante, dizia que não era o fim. Que ela ainda estava muito longe do fim.

Se isso era bom ou ruim, o futuro iria dizer. Por hora decidiu dar ouvidos àquela parte calma dentro de si, e se pôs a brincar com o jackalope, como fazia quando era pequena (menor).

Nem se lembra por quanto tempo ficou mexendo as mãozinhas da pelúcia e forçando uma voz fina e baixa, para ninguém ouvir, poderiam ter sido minutos, horas ou dias. E tratou de escondê-la rapidamente quando escutou passos aproximando-se da cela. Se fosse para morrer, morreria com pelo o menos um pouco de dignidade

– Venha, está na hora – era o mesmo polícial que a levou até lá, o de cabelo encharcado de gel.

Ele não recolocou as algemas em seus pulsos, simplismente segurava seu braço com força, machucando e, provavelmente, deixando marcas.

– Sabe porquê as guilhotinas foram criadas? – perguntou, levando a menina até uma sala mal iluminada cheia de armas e escudos.

Ela negou com a cabeça. Escutava zumbidos de insetos atraídos pela luz lá em cima, no teto. As paredes eram de tijolos velhos, parecidos com os da cela. Uma janela grande e gradeada, que chegava até o chão, ajudava na iluminação.

– Foram criadas como um método menos cruel de execução – continuou o homem, de costas, vasculhando por entre facas e espadas – Com a forca, o sujeito sofria por vários minutos. E com o machado, o golpe podia não ser certeiro, e a vítima sentia mais dor.

Rin engoliu em seco, tinha certeza que estava tremendo.

– Mas nós não gostamos desses “métodos menos cruéis” – ele tirou a conhecida lança com ponta brilhante do meio de várias outras.

Por um momento a menina pensou que seria morta com sua própria arma, mas, ao invéz de lhe perfurar, o guarda lhe entregou a lança.

Nós temos um modo muito mais divertido de matar condenados – ele abriu a janela gradeada, girando uma manivela bem grande.

Não era uma janela, era uma passagem!

Quando Rin deu-se conta, foi empurrada em um grande campo redondo de areia, e milhares de pessoas estavam sentadas nas arquibancada, a mais ou menos quatro metros de elevação do chão. Talvez aquelas pessoas fossem da Cidade da Tempestade, ou talvez não. Não havia como descobrir. Só o que sabia era que um homem cercado de seguranças tinha um local privilégiado. Só podia ser o rei, com roupas caras e coroa na cabeça.

Olhou para trás, mas a passagem havia sido fechada novamente. Já sabia o que aconteceria; eles libertariam monstros e mais monstros, até que estivesse morta, como em uma batalha de gladiadores. Apertou o cabo da lança, mãos trêmulas e suadas.

Uma passagem, lá do outro lado do campo arenoso, semelhante àquela atrás de Rin começou a subir. Mesmo estando tão longe, ela escutou alguma coisa batendo nas grades, desesperada para sair. Parecia que o metal resistente iria ceder e quebrar, de tão forte que os golpes eram.

A menina prendeu a respiração, e quando o espaço foi o suficiente para a passagem, seu adversário apareceu, rolando pela areia, impaciente, sem esperar o portão abrir-se completamente.

Rin quase largou a lança quando o reconheceu. Era ele. Sem tirar nem por. Era ele! A fera!

Abriu a boca para falar, mas fechou logo em seguida. Tinha alguma coisa errada. Ele não parecia tão agressivo no sonho. Não parecia tão assustador no sonho. Pupilas retraídas, presas à mostra. Tinha alguma coisa muito errada com ele.

Em alguns poucos segundos ele já estava perigosamente perto dela, garras preparadas. O público gritou de emoção, abafando o grito de pavor da própria Rin.

Ela encontrara a fera.

Agora tinha que sobreviver à fera.


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Notas finais do capítulo

Errr... O Len é uma criatura muito amável, não acham?