Stranger escrita por Okay


Capítulo 45
Chuva.


Notas iniciais do capítulo

Beijos & Boa leitura! ♕
Capítulo revisado e reescrito 13/11/2020



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Capítulo 45 — Chuva.

Segunda-feira, dia 15 de julho de 2013. 

Lucas esfregou os olhos, sentando-se no sofá, não acreditando que o dia já tinha clareado. Ouviu o barulho não só do chuveiro vindo de um dos banheiros, como também da chuva lá fora. Olhou para o chão por um instante, se sentindo atordoado, com as conversas do dia anterior vindo à sua mente.

Procurou o celular no bolso e viu que tinha dormido por nove horas, sem sequer ter acordado de madrugada, se sentindo totalmente descansado. Agora sentado, observou seu par de tênis largados ao chão, os calçando. 

Ficou de pé e pensou em ir embora, mas não saberia a impressão que aquilo passaria, não queria parecer grosseiro quando o dia anterior tinha sido tão agradável. Pensou por um segundo, decidindo esperar, indo ao banheiro livre para lavar o rosto e se arrumar, achando uma escova de dentes lacrada com o nome do hotel, usando-a. Passou as mãos umedecidas pelos cabelos, ajeitando-os, estava bem mais apresentável agora, voltando para a sala. 

Ainda ouvindo o chuveiro no outro banheiro, se aproximou da varanda para esperá-lo, abrindo a porta para poder sentir o cheiro da chuva. Um vento mais gelado tocou seu rosto, fazendo-o sorrir, não costumava gostar de climas chuvosos, mas aquele era um dia especial. Olhou para a água lavando tudo lá fora, deixando a visão da praia prejudicada.

— Você bem que disse que sempre chovia nos seus aniversários. — Marcus falou, chamando sua atenção. 

Lucas virou-se com pressa, vendo-o com uma roupa diferente da do dia anterior, agradecendo mentalmente por ele ter se trocado no banheiro. 

— Você lembrou… — O loiro voltou a olhar para a chuva. 

— Eu não esqueceria do seu aniversário. — Aproximou-se um pouco mais, ficando ao lado dele na porta de vidro. 

— Não isso, mas do que eu te contei… já faz muito tempo. — Lucas falou, se referindo ao fato de que sempre chovia em suas comemorações. 

— Parabéns. — Marcus falou, recebendo um olhar tímido dele em resposta. 

— Eu já vou indo, tá? 

— Sério? Fica mais um pouco.

— Nesse ritmo eu só saio daqui no meu aniversário do ano que vem. — O loiro brincou, fazendo-o rir baixinho. 

— Mas eu já pedi o café… — Persistiu. — Eu chamei o serviço de quarto enquanto você estava dormindo, acho que já devem estar chegando, come só alguma coisa, aí depois você vai. 

— Ah. — Lucas olhou para baixo. — A sua conta deve estar uma fortuna só com seus gastos comigo aqui. 

— Besteira. — Sorriu carinhosamente. — Você dormiu bem? 

— Até demais. — Assumiu. 

— Que bom… 

— E como você tá? Tá sentindo alguma coisa hoje?

— Meu nariz não está mais escorrendo e a garganta também melhorou. Acho que amanhã já vou estar bem. 

— Mas não deixa de tomar remédio hoje. — Afirmou. — E antes que diga qualquer coisa. Não, não vou estar aqui pra te lembrar de tomar, nem adianta insistir.

— Como você sabia que eu ia falar isso? — Divertiu-se, rindo com ele. 

Ouviram as batidas na porta, sendo o café da manhã que esperavam. A mesa foi arrumada, tirando as louças do dia anterior e foram servidos de suco, frutas, café, pães e queijos. 

— Quem vai comer tudo isso? — Lucas falou, após ver o rapaz da entrega sair. 

— Eu só não sabia o que você queria. — Marcus falou, roubando um pedaço de kiwi. 

— Podia ter me acordado pra perguntar… 

— Mas se fosse assim, eu já sabia que você preferiria ir embora. — Exibiu uma expressão astuta. — Foi tudo arquitetado desde o começo. 

— Você é o pior. — O loiro esboçou uma expressão falsa de surpresa, servindo-se de café. 

Ficaram em silêncio enquanto colocavam em seus pratos o que comeriam, até Lucas observar a feição pensativa que Marcus esboçava, ouvindo-o dizer:

— Eu estou feliz… é bom estar aqui, sabe? Tomando café da manhã com você, no seu aniversário. Pra ajudar tá esse clima gostoso lá fora. 

Lucas sorriu envergonhado, sem saber o que responder, apenas trocando um olhar rápido com ele, também percebendo que ele tinha se constrangido, reparando que as bochechas dele pareciam rosadas. 

Mudaram de assunto, falando dos poucos planos que o loiro tinha para o aniversário, que envolviam passar a tarde com os amigos e comer um bolo recheado. E quando começaram a falar do clima, já sabiam que era sinal de que ou os assuntos estavam acabando, ou estavam envergonhados demais para serem criativos. 

Lucas terminou de comer, dando a última golada no café da sua xícara, se levantando e o agradecendo pela hospitalidade. Marcus se agitou, ficando de pé também, visivelmente triste, não queria que aquela hora chegasse, chamando a atenção dele ao dizer:

— Eu tenho um presente pra você. 

— Tem? — O loiro se surpreendeu, curioso. 

— Espera, vou pegar. — Caminhou até o armário e encontrou uma caixa que procurava dentro de uma das gavetas, logo voltando. — Na verdade, eu não comprei pro seu aniversário, mas sim, pra sua formatura. Eu sei que pode parecer bobagem, porque a gente nem tava se falando na época, mas… Tá aqui. 

Lucas pegou a caixinha comprida na mão, abrindo-a e vendo uma corrente dourada com um pingente, exibindo o símbolo do jornalismo que reconheceu na mesma hora: uma pena de escrever sobre uma folha com a palavra “LEX” estampada, o que significava “lei” em latim. 

— É lindo… — Admirou-se, tocando o colar. — Eu adorei. 

— Que bom. — Sorriu envergonhado, contente ao ver o sorriso sincero no rosto dele. — Quer que eu coloque em você? 

— Por favor. — Pediu, ficando de costas. 

Marcus pegou a corrente, aproximando-se dele para passar o colar em sua frente, tentando encaixar o lado oposto no fecho com suas mãos ligeiramente trêmulas por estar tão perto daquela nuca que tanto queria encher de beijos. Seu coração não se continha, tendo que se afastar dele ao terminar, mesmo que contra sua vontade. 

— Obrigado pelo presente, combinou com o anel que ganhei do Al e da Rach. — Mostrou a mão, exibindo a joia dourada em seu dedo. 

— Combinou mesmo. — Fez uma pausa, pensativo. — Eu também queria te falar uma coisa.

— O quê? — Lucas indagou, curioso, vendo-o parecer receoso. 

— Quando eu te conheci, eu tinha vinte e quatro anos, a idade que você tá completando hoje. Isso me faz pensar em muita coisa… Chegou o dia que eu mais quis, desde então, o dia em que eu finalmente te vi totalmente realizado, sabendo o que quer e, principalmente, bem.  Eu vejo todas as coisas que você faz e fico admirado, porque eu sei que eu não seria capaz de fazer o mesmo… olha só pra gente, você me perdoou, não da boca pra fora, mas de verdade, dá pra ver. Você não olha mais pra mim com mágoa e nem raiva, nós estamos conversando, você cuidou de mim, me aturou ontem o dia todinho, quem mais faria isso? Você tá me ensinando muita coisa, Lucas, principalmente como me tornar um ser humano melhor e espero continuar aprendendo. Quero ter um bom coração como o seu um dia e ser, pelo menos, metade do homem que você é hoje. — Revelou, olhando profundamente nos olhos azuis que tanto amava. — Eu tenho muito orgulho de você, não só eu, como tenho certeza que o Al e a Rachel também, você merece, mais do que qualquer um, ser feliz. Eu só queria te agradecer por ter me deixado fazer parte da sua vida de novo... Feliz aniversário. 

Lucas sentiu seu peito se aquecer ao vê-lo com os olhos brilhantes, vendo-o tímido por ter falado aquelas palavras. Ignorou o espaço que os separava, abraçando-o por impulso, sentindo as mãos dele também irem com pressa às suas costas. 

— Você me marcou pra sempre. — Marcus sussurrou, em meio ao abraço, com muita vontade de lhe falar o quanto o amava, mas se segurando. 

O loiro tentou não se afetar com aquelas últimas palavras, não só aquelas, como também todo o discurso meigo que ele havia feito antes. Não sabia se era por estar sensível ou se aquela situação realmente estava lhe afetando. Continuou abraçado com ele, pensando que não era a primeira vez que sua cabeça parecia rodar com tanta confusão de sentimentos.

Desde a noite anterior estava agitado e perturbado, tentando entender o porquê que não conseguia se despedir, não conseguia apenas ir embora e acabava sempre ficando mais. Agora não era diferente, estava prestes a ir embora, mesmo com algo em seu peito gritando para que ficasse e conversassem mais, só um pouco mais. 

Lucas ouviu os batimentos de Marcus, fazendo com que quisesse envolvê-lo com ainda mais força, sem querer se afastar. Não fazia ideia do que ele estava pensando, mas notou que o mais alto também não o soltava, com uma mão afagando seus cabelos com ternura e com a outra, alisando suas costas. 

Sua respiração estava pesada, não era como se quisesse chorar, mas estava emocionado e ao mesmo tempo, culpado, sem conseguir explicar direito o que sentia. Não tinha coragem para tirar suas mãos dele, deslizando fracamente seu corpo para trás, quase sem forças, deixando suas mãos apoiadas nos ombros dele. Tudo o que viu foi a expressão apaixonada de Marcus lhe encarando de perto, feliz com o gesto. 

O loiro ainda parecia não estar raciocinando direito, sem querer se distanciar. Encarou-o por alguns segundos e não pensou muito, no ímpeto do momento, ficou na ponta dos pés, puxando-o para um beijo rápido, tocando os lábios dele com os seus por poucos segundos. Lucas desceu os calcanhares, se afastando do que tinha sido um selinho tímido e impensado. 

Marcus não conseguiu reagir no primeiro minuto, seu fôlego tinha sido completamente tomado e estava atônito, encarando a incerteza se formar no rosto do loiro. Ele desviava o olhar do seu, parecendo pensar no que dizer, sem achar as palavras certas. 

— Acho melhor conferir a minha temperatura… devo estar delirando de febre. — Marcus quebrou o gelo, roubando uma risada discreta dele. 

— Eu tenho que ir. — Lucas falou baixinho, agora olhando para baixo. 

— Tudo bem. — Aceitou, percebendo que ele estava constrangido demais para falar do que aconteceu. — Eu te acompanho até a porta. 

Foi uma caminhada curta e esquisita, com cada um pensando em uma coisa diferente até chegarem à entrada. 

— Obrigado de novo por ter cuidado de mim. — Marcus afirmou, ao vê-lo já do lado de fora.

— Não foi nada demais… — O loiro fitou-o por alguns segundos antes de desviar o olhar. — E valeu pelo presente. 

— Também não foi nada. — Sorriu, vendo-o encarar o chão antes de subir a cabeça e deparar-se com os olhos dele. — Até depois. 

— Até… 

Lucas abriu outro sorriso envergonhado, saindo sem mais nada para comentar. Marcus apenas queria manter aquela expressão tímida dele vívida em sua cabeça, ele estaria voltando a sentir algo ou apenas tinha sido um impulso do momento? Não o conhecia bem o suficiente para saber aquela resposta. 

Rachel corria com pressa pelo corredor após receber a mensagem do amigo, indo ver o que ele precisava. Desacompanhada de Alberto, assim como ele havia pedido.

— Cadê meu aniversariante mais lindo?! — Ela bateu na porta e esperou. 

— Oi, Rach. 

— Luke, o que foi?! — Rachel perguntou angustiada, vendo o amigo abrir a porta com os olhos vermelhos e escorrendo. 

Ela entrou e o loiro encostou a porta, indo para a cama, abraçando um travesseiro, choramingando ao dizer:

— É o Mark. 

— O que ele fez?! — Perguntou com pressa. — Ele fez alguma coisa pra você no noivado? Porque eu juro que eu vou lá falar umas poucas e boas pra esse cara!

— Eu beijei ele. — Fungou, encarando-a. 

— Espera… O quê? — Ela desmanchou a expressão irritada que carregava. — Ele não te forçou não, né?

— Não. Eu que quis. 

— Agora não tô entendendo mais nada. — Rachel franziu o cenho, sentando-se ao lado dele na cama. — O que que aconteceu, hein? Eu fico fora por um dia e você já sai beijando esse homem que você xingava toda semana? 

— Eu sei… — Murmurou, choramingando. — Eu não sei porque fiz isso, eu só… 

— Me conta direito, do começo. — Ela se ajeitou ao lado dele, encostando-se na cabeceira. 

Lucas explicou que ficou sem ver Marcus desde a manhã de terça e só tornou a vê-lo no sábado, tudo estava indo bem e depois do noivado, aconteceu o que aconteceu, conseguiu finalmente ser capaz de perdoar ele. 

— Eu não consigo imaginar ele soluçando de tanto chorar como você falou… — Rachel impressionou-se. 

— Eu também não imaginava que isso seria possível. — O loiro respirou fundo, se acalmando. — Tudo o que eu mais queria, era ver ele se humilhando, sofrendo… rastejando, sabe? E aí, aconteceu o contrário, a gente tomou coragem pra conversar de verdade, falamos tudo o que veio em mente e mais um pouco. Foi revelador, esclarecedor… 

— E intenso, pelo visto. — Ela completou, vendo o amigo fazer uma pausa para suspirar. 

— Eu senti tanta honestidade, que eu… que eu só queria abraçar ele e dizer que estava tudo bem. E foi assim. — Encarou a amiga antes de limpar uma lágrima discreta. 

— E aí, pelo o que eu entendi, vocês combinaram de se ver ontem. — Rachel continuou o assunto, vendo-o se ajeitar na cama, também apoiando as costas na cabeceira. 

Lucas voltou a falar sobre o dia anterior, onde falou da mudança de planos após ver que ele estava com febre, fazendo-o companhia depois de o convencer a tomar os remédios. Contou sobre os assuntos que nunca pensou ser possível que conversariam, finalizando:

— Foi muito importante, tava tudo sob controle, tava indo tudo bem…

— Teve alguma coisa que contribuiu para que você ficasse assim, todo mexido?

— Teve tantas… — Reclamou, fungando. — Ele dá aqueles sorrisinhos sacanas dele, mas ao mesmo tempo respeita o meu espaço e fala as coisas certas e na hora certa. Ele entra na minha cabeça e me faz ficar pensando em coisas que eu não queria pensar…

— Como o quê?

— Como… — Fez uma pausa para respirar fundo. — Como… se a gente ainda pudesse ficar junto algum dia. 

— E você acha que isso pode acontecer?

— Não! — Exclamou, voltando a morder o lábio inferior nervosamente. — Não tem como isso acontecer, Rach… Ele me fez muito mal, ele… ele pegou todas as migalhas de esperança que eu tinha de ter uma vida feliz e jogou tudo no lixo. Ele me destruiu, ele…

Rachel percebeu que ele tentava controlar um possível choro, controlando a respiração, tentando normalizar a própria voz. 

— Mesmo com tudo o que ele fez… — Murmurou. — Eu não sei porque eu ainda me deixo levar, eu não sei porque eu fico tão atrapalhado perto dele e… Eu não queria me sentir tão sem rumo, eu queria poder ter uma certeza e ele não pode me dar essa certeza, Rachel. Eu preciso de alguém que possa ficar comigo de verdade, que não vai me abandonar. 

Rachel percebeu que agora o assunto mudava de rumo, não estavam mais falando dos acontecimentos, mas ela nada disse, esperando que ele conduzisse sozinho, o rumo daquela conversa. 

— O pior de tudo é que… eu recebi uma carta dele. — Lucas falou baixinho. — Daquela época que eu estava esperando por ele e que ainda tinha esperança de que ele ia me buscar… Ele guardou essa carta por anos, porque nunca teve a oportunidade de entregar antes. Eu queria que você a lesse. 

— Claro! Cadê ela? 

— Tá aqui. — Pegou a folha dobrada ao lado do abajur, entregando-a. 

Rachel fez uma pausa para passar os olhos pelo papel, observando a caligrafia pequena e charmosa. Parecia ter tanto amor envolvido ali, que sentiu seu coração acelerar, como se tivesse sido endereçada a ela, derretendo-se com aquela prova de amor. 

— Luke, isso é… 

— Eu sei. — Murmurou. 

— Como você se sentiu quando leu isso?

— Péssimo. — Encolheu as pernas, abraçando os joelhos. — Eu me senti indefeso, me lembrei de como era estar lá, botando a esperança em um homem que eu sequer conhecia. Eu só sei que todas aquelas lembranças pegaram pesado comigo e até hoje me pego pensando em algumas coisas daquela época, eu gostava tanto dele… mas tanto.

— E ele te amava. — Devolveu a carta. — Aposto que ainda ama. 

— Não fala isso… — Pegou a folha, passando os olhos na mensagem ao final do texto. 

— Desculpa, Lu. — Rachel empurrou os sapatos com os próprios pés, agora sentando-se melhor na cama. — O que tá se passando na sua cabeça agora?

— Eu gostei de ter cuidado dele, sabe? Fiquei o dia todo me preocupando, vendo se ele estava melhor, enquanto isso a gente conversava. Falamos de todas as maiores dúvidas que eu tinha, acho que não restou nada pra perguntar, pra ser sincero... Conversar com ele é tão bom, Rach. — Assumiu, exibindo uma expressão dolorosa de felicidade. — Mas tem um lado meu que fica gritando pra eu não me empolgar demais, pra baixar a bola, pra me afastar… Eu não quero ouvir esse lado, mas eu sei que é o certo. 

— E como você sabe que esse lado é o certo?

— Porque é ele que mantém meus pés no chão, é esse lado que vai me impedir de sofrer, de ser abandonado lá na frente… Eu não quero cometer os mesmos erros que antes, Rach. 

— Ei, Luke. Eu te conheço bem, você é o tipo de pessoa que aprende com os próprios erros logo de cara. Você amadureceu, não é mais ingênuo.

— Exatamente! Se eu fui capaz de amadurecer, então por que caralhos eu inventei de beijar ele?! 

— Me conta como foi isso, vai. Você disse que cochilou lá. E aí? O que aconteceu?

— Foi depois de ele me dar esse colar. — Mostrou. — A gente tomou café da manhã no quarto e quando eu estava indo embora, ele disse que tinha um presente, então ele entregou o colar. Foi depois disso que… Rach, você devia ter ouvido o discurso que ele fez… 

Ela olhou para o pescoço dele, percebendo que ele não usava a outra corrente com a aliança, ficando curiosa com o fato, observando o que ele tinha para falar. 

— Ele me olhava que nem um cachorrinho perdido encontrando o dono, me dizendo o quanto me admirava e me agradecendo por ter cuidado dele. Eu acho que foi só a emoção do momento, não sei, mas eu… Nossa! Ele conseguiu me abalar todinho por dentro. Eu só sei que ele disse tudo o que eu queria que ele dissesse, tudo. — Reforçou, sincero com o que falava. — E eu abracei ele com tanta força que, sei lá, como se tivesse esse lado meu que ainda estava morrendo de saudade dele, eu não sei dizer… Foi uma vontade súbita, eu tava tão confuso e… Meu Deus! Por que ele é tão cheiroso? Não é justo, sabe?! Eu fiquei ali no abraço e quando percebi, eu já estava beijando ele. Claro que foi rápido, mas também não foi curtinho, foi um selinho meio demorado… A gente só fingiu que isso não aconteceu e aí eu fui embora. 

— Meu Deus… — A amiga levantou as sobrancelhas, vendo toda a expressão confusa que o amigo carregava. — Eu consigo imaginar a sua cabeça dando um monte de voltas agora. 

— No meio do caminho, no elevador mesmo, eu comecei a chorar, a chorar, e chorar. Eu não sei o que tá acontecendo comigo, Rach. — Franziu o cenho, tentando não se emocionar ao lembrar do que sentiu. — Eu não sei se eu tô feliz, se eu tô triste… eu tô confuso demais.

— Acho que você precisa tirar um tempinho pra refletir, é a melhor decisão. 

— Mas eu não consigo parar de pensar que eu posso ter dado esperanças pra ele. — O loiro reconheceu. — Ao mesmo tempo que se eu me retratar com ele, dizendo que foi só no calor do momento, sem emoção nenhuma, acho que eu vou estar mentindo também… Eu tô totalmente perdido.

— Talvez você esteja se sentindo mal porque foi por impulso... Eu até que consigo entender o motivo do beijo. — Rachel supôs, encarando-o. — Acho que eu faria a mesma coisa no seu lugar, pra ser sincera. 

— Sério? 

— De verdade, não acho que exista alguém tão coração de pedra pra resistir a tudo isso. Uma carta apaixonada do passado, um homem bonito, cheiroso, de dois metros de altura te pedindo perdão e se declarando… Olha, eu não sei nem como você não foi pra cama com ele, pra ser sincera. — Ela brincou, roubando um riso baixo dele. — A meu ver, você tem duas opções agora.

— Quais?

— Tirar um tempo, não ver mais ele… Assim você vai ver se é só fogo ou se sente mesmo a falta dele. — Ela sugeriu em primeiro lugar. 

— Cancún pode mesmo mexer com a gente. — Lucas pensou. — Eu até tive um sonho com ele… Você sabe, meio erótico. 

— Meu amor, Cancún pode ser afrodisíaca, mas não é milagrosa. — Ela rebateu, rindo. — Os problemas de vocês eram tão sérios que Cancún não seria a responsável por esse beijo.

— Tá, mas qual a outra opção, então?

— Enfrentar. — Ela revelou. — Se abrir com ele desses sentimentos que estão borbulhando aí dentro, deixar claro que tá morrendo de medo do que pode acontecer a partir de agora…

— Eu não sei… 

— Acho que sabe, sim. — Ela falou, seriamente. — Claro que não sei se é uma hora pertinente pra comentar isso, mas eu percebi que você não tá mais usando o colar do Gus e eu tenho certeza que você não tirou ele só porque ganhou outro. Tô errada? 

— Não…

— Como foi que tomou essa decisão de não usar mais?

— Eu tirei o colar do Gus na noite do noivado… Primeiro eu percebi que eu não estava mais me importando com a presença da corrente comigo, eu não estava mais apegado sentimentalmente com ela. — Se abriu, sorrindo timidamente. — E naquela mesma noite, eu perdoei o Marcus, depois de uma conversa super franca… então parecia um sinal. Quando ele foi embora, eu fiquei ali na praia, olhando pro horizonte, fiquei pensando na vida até o sol nascer, foi tão gratificante! Eu me sentia tão bem, que eu pensei que seria o momento certo pra me despedir da aliança. E então eu joguei ela no mar. 

— Jura? — Ela fez beicinho, emocionando-se. — Que coisa linda, Lu. 

— Só o anel, no caso. A corrente eu guardei. — Levantou-se, indo pegá-la sobre a escrivaninha do quarto. — Aqui, devolve pro Al, era dele. 

— Eu tenho certeza que ele não quer de volta, mas eu levo. — Ela sorriu, segurando a corrente. 

— De qualquer forma, eu não vou mais precisar. — Levou a mão ao peito, sentindo o presente que ganhou de Marcus. — Não que eu queria substituir, nem nada, mas eu amei esse meu colar novo.

— Ficou mesmo lindo em você, ele tem bom gosto. — Rachel abriu um sorriso sugestivo. — E então, já decidiu qual das duas opções vai seguir?

— Alberto? — Marcus abriu a porta de seu quarto, se assustando com a presença dele, vendo-o entrar sem ser convidado. — Tá tudo bem?

— Eu que devia perguntar isso. — O amigo começou, vendo-o encostar a porta. — Espera aí… você tá meio rouco, tá doente?

— Um pouco. Mas não muda de assunto, do que você tá falando, Al?

— Eu sei que hoje é aniversário do Lucas e a Rachel saiu agora pra ir conversar com o ele. Pelo o que entendi, ele pediu pra ela ir sozinha, então se eles não querem que eu esteja junto, é porque provavelmente estão falando mal de você… — Explicou. — O que você fez?

— Como assim o que eu fiz? — Riu com aquela constatação. — Eu não fiz nada. 

— Desembucha.

— Foi o Lucas que me beijou, você devia perguntar pra ele. 

— Ele o quê?! 

Marcus abriu um sorriso sacana e caminhou ao sofá, sendo seguido pelo amigo, que sentou-se ao seu lado, exclamando:

— Me conta logo! 

— Não precisa surtar ainda, não foi nada demais, foi só um selinho. 

— Não tô entendendo nada… 

Explicou com detalhes o que houve desde a noite do noivado, até o dia de ontem e a manhã do dia que estavam, finalizando ao falar do beijo. 

— Eu não acredito, não acredito mesmo.  — Alberto falou após o que ouviu. 

— Eu sei, eu também só acreditaria vendo e mesmo tendo visto, ainda não acredito. — Riu consigo mesmo. — Eu tô confuso, mas tranquilo, sabe? A gente nem tocou no assunto depois, ele parecia envergonhado e só foi embora, é isso. Não é como se eu estivesse ignorando essa situação, porque assumo que tô pensando que a gente pode voltar a ter alguma coisa, mas também não é como se eu estivesse planejando nosso casamento agora. Eu tô tentando manter meus pés no chão, no momento. A minha consciência tá limpa, porque eu não forcei ele a nada. 

— Mas foi um selinho, tipo selinho mesmo, ou foi um pouco mais?

— Foi selinho, coisa rápida. — Se aproximou do amigo no sofá, pegando em seu rosto e beijando sua bochecha com a mesma intensidade e duração do beijo que recebeu de Lucas. — Foi assim. 

— Não foi só um selinho… Demorou uns segundos, vai.

— Mas também não diz nada. — Ergueu os ombros. — É claro que foi o suficiente pra eu querer escalar as paredes do quarto, mas eu me segurei. Eu juro pra você que eu nunca tive tanto autocontrole nessa vida. 

— Eu imagino. — Riu com ele. — Meu Deus… Eu ainda não tô acreditando. 

— Nem eu. — Marcus afirmou, sorrindo como uma criança na manhã de natal. — Se ele estiver sentindo metade da felicidade que eu, nesse momento, já é o suficiente. Eu sei que ele não me ama como eu amo ele, mas eu espero que um dia ele possa voltar a ter algum sentimento por mim. 

— E você ainda duvida disso?

— Não é que eu duvide, mas… Eu sei como estão as coisas entre a gente, nós falamos de tanta coisa, mas ainda temos alguns impedimentos e... — Fez uma pausa para bufar. — Eu só queria que fosse mais fácil. 

— Eu acho que você deveria tentar ir atrás dele, sabe? Você já deu o espaço que ele precisava, agora por que não tenta conquistar ele de volta? Eu sei que aquilo do karaokê não deixou ele contente, mas agora é outra circunstância…

— Eu acho que isso de ir atrás dele é uma ideia incrivelmente burra, Alberto, me desculpa. 

— O quê? — Falou, fazendo uma careta. — Como assim?! Por quê?!

— Você sabe que eu faria qualquer coisa por ele, qualquer coisa mesmo. Mas a melhor escolha que eu posso fazer, é deixar ele tomar as próprias decisões. — Afirmou, encarando o chão. — Se for pra acontecer da gente ficar junto, eu quero ser o caminho que ele escolheu seguir. 

— Que profundo. — Deitou a cabeça ao ombro do amigo. — Eu entendo isso, mas você sabe como eu sou. Eu torço tanto pra vocês dois que eu só quero que fiquem juntos logo...

— Eu também queria isso, Al, mas não depende de mim, só dele… Porque se ele disser que sim, eu tô aqui, de braços abertos esperando. 

— Isso é tão romântico, mas tão triste… — Alberto levantou a cabeça, encarando-o. — Eu só espero que dê tudo certo. 

— Eu também, Al. — Sorriu tristemente. 

Após Rachel ir embora, Lucas ficou sozinho por um tempo no quarto, estava tão atordoado que decidiu dar um descanso para sua cabeça. Tomou um banho e se arrumou para sair com os amigos, sabendo que, no fundo, não estava a fim daquilo, mas sentia que precisava se distrair. 

Deu uma volta com Alberto e Rachel, provaram pratos diferentes e comeu uma bela fatia de bolo recheado em comemoração. No fim da noite, não tinha se arrependido de sair, mas sentia falta da presença de alguém. 

 

Terça-feira, dia 16 de julho de 2013. 

Lucas acordou se sentindo cansado do dia anterior, sua mente estava exausta, ainda não tendo decidido o que faria em relação a Marcus. Precisava descobrir o mais rápido possível, ao mesmo tempo que sentia que não estava em plenas condições de fazer aquilo. 

Não era como se não quisesse ser honesto consigo mesmo, mas sentia o peso de que aquilo não só lhe afetaria — ou deixaria de afetar — para sempre, como também, atingiria outra pessoa. 

Toda vez que pensava na possibilidade de voltar à sua relação com Marcus, lembrava-se do dia da briga. Ele o encheu de esperanças, prometendo coisas maravilhosas, lembrava-se de que nunca tinha se sentido tão feliz antes, estava pronto para viver seu conto de fadas, mas Marcus virou o próprio vilão da história.

Só Lucas sabia como tinha sido doloroso ser apunhalado daquele jeito e não queria passar por aquilo de novo. Também não conseguiria fazer aquilo com Marcus, não gostaria de reatar para depois lhe abandonar e fazer ele sofrer como sofreu lá atrás. Só de pensar nessa possibilidade, sentia seu peito apertar. 

O loiro estava se sentindo tão inconsolável, que nem tomar o café da manhã com os amigos e almoçar com eles tinha sido alegre como costumava ser. Estava introspectivo e eles respeitavam isso, pois sabiam exatamente do que se tratava. 

Logo depois de comerem juntos, no momento em que Alberto se afastou, Rachel puxou o amigo pelo braço, o levando para um canto, dizendo:

— Ei, Luke… eu queria te falar uma coisa.

— O quê, Rach?

— Como eu não sei o que tá se passando na sua cabeça agora e não sei qual decisão você decidiu tomar, eu só queria te dizer uma coisa. — Ela fez uma pausa, vendo-o curioso. — Hoje a noite, às sete, marcamos nesse mesmo restaurante com o você-sabe-quem. Só pra você saber, caso queira vir. 

O loiro abriu um sorriso fraco, sem saber se agradecia ela por essa informação. Lucas apenas voltava ao quarto e se jogava na cama, olhando para o teto fixamente. Queria uma resposta que fosse fácil, queria que só se afastar pudesse livrá-lo daquela sensação ruim. Era péssimo sentir que tudo estava em suas mãos, eram duas decisões completamente opostas. 

Como já havia dado a hora, Marcus estava pronto para sair com os amigos. Tinha se arrumado um pouco mais, sabendo que talvez pudesse encontrar quem tanto queria ver desde o dia anterior. Se encontrou com eles em um dos restaurantes temáticos do hotel, cumprimentando apenas os dois, a terceira pessoa tão esperada não estava ali. 

Enquanto se encaminhavam à mesa, por não ter um recepcionista na entrada, Rachel comentou:

— Vamos escolher uma mesa com quatro lugares, eu chamei o Luke… Ainda não sei se ele vai vir, mas eu chamei. 

Foi o suficiente para que o coração de Marcus disparasse, sentando-se com eles. Agora não interessava mais os assuntos que estavam falando, sua atenção estava voltada à esperança de encontrar com ele naquela noite. E sempre que podia, olhava para a entrada do restaurante, torcendo para vê-lo passar por aquela porta.

 

 

 


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Notas finais do capítulo

Ele vem ou não vem?! O que vocês acham? ♕