A Rainha Branca escrita por luanafrotah_


Capítulo 7
Capítulo 6




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Capítulo 6

 

         Levantou de repente. Estava escuro, era noite ainda. Olhou no relógio de pulso: três e meia da manhã. Foi até a janela e a fechou, às cortinas também. Deitou novamente, mas não conseguia dormir.

         Então ouviu a voz novamente. Voltara falando as mesmas coisas que sempre dizia. E com ela veio a culpa, a culpa torturante. Sim, fora tudo sua culpa, se não as tivesse chamado para lá, para a sua casa, no topo do seu prédio, se não tivesse dado aquela idéia ridícula de brincar com os demônios. “Caçadoras de demônios”... Mas que nome mais idiota!

         Saiu do quarto e caminhou lentamente até a varanda. Olhava fixamente para a rua lá embaixo. Sentia uma força estranha, um calafrio percorreu sua espinha. De repente aquilo passou a ser uma opção. Talvez, se fosse capaz de fazer passar toda aquela culpa, e a voz... A voz lhe falava... Aquela era a única maneira.

         Não!

         Recuou bruscamente. E então lembrou deles, aqueles dois disseram para não ouvir, disseram que a voz mentia. Resista! Não importa o que aconteça não escute a voz, ela mente, não faça o que ela quer! Foi isso que eles disseram. Mas... Aquilo parecia impossível. Ela era insistente, chegava de mansinho, sussurrando... E o pior é que ela está certa, em todos os sentidos, terrivelmente certa.

         Pôs as mãos sobre as orelhas e fechou os olhos com a mesma força que gostaria de usar para fechar a mente. Caiu de joelhos, entrou em desespero, estava suando frio. Sentiu-se fraca, mas deve ter sido por não ter comido na o dia todo. Não queria ouvir, mas o que ouvir era incontestavelmente verdade.

         E então veio outra opção. Foi até a cozinha, encarou uma gaveta, era ali, naquele momento, ou então nunca mais. Abriu a gaveta onde estavam guardados os talheres. Estava na hora de fazer essa voz sumir e de ir se desculpar com a amiga pessoalmente.

 

***

 

         -Mara! Mara, acorde! – a voz de Michael chamava delicadamente

         -Mas o que é que foi? Hoje é domingo, sabia? Devia ser pecado acordar cedo no domingo – Resmungou Mara sem abrir os olhos, antes de se virar e voltar a dormir.

         -Mara, por favor... É serio... Nós a perdemos! Você ouviu?

         -Não... Não perdemos nada – sussurrou ela – a única coisa que eu estou perdendo é o tempo que eu tenho pra dormir...

         -Você quer acordar? Estou tentando falar sobre um assunto sério aqui! – Declarou Michael puxando bruscamente o travesseiro sob a cabeça da garota.

         -Tá, ta bom, acordei! – Falou ela sentando lentamente na cama – E você acabou de descobrir como me deixar de mau-humor. Agora fala logo, o que foi que aconteceu?

         -Você lembra daquela garota com quem você e Ricardo conversaram ontem? Camila?

         Mara respondeu alguma coisa positiva enquanto ia até o banheiro.

         -Ela morreu ontem à noite. Suicídio.

         -Eu sempre soube que isso ia acontecer, ela estava muito vulnerável Michael ouviu a garota responder do banheiro – Agora temos outro problema: vamos ter que começar tudo de novo.

         -Na verdade... Acho que o problema é um pouco maior que isso – o anjo escolhia as palavras com cuidado – acontece que... Segundo informações passadas a mim, foi o Ricardo que disse isso.

         Ela engasgou. Sua cabeça apareceu na porta do banheiro, os olhos arregalados e ainda com a escova de dentes na boca.

         -Mas como? Como foi que ele ficou sabendo disso?!

         -De repente ele acordou, no meio da noite, e declarou que ela estava morta. E ela estava – Depois de alguns segundos em silêncio, apenas observando as reações da garota, Michael finalmente perguntou – o que vai fazer sobre isso?

         Mara não falou mais nada. Acabou de escovar os dentes, tomou banho e se vestiu sem pressa nenhuma. De repente não estava mais com raiva por ter acordado cedo no domingo e tampouco estava decepcionada pelo fato de Camila ter se suicidado. Estava indiferente em relação a tudo, menos ao fato de Ricardo estar sempre a par de tudo o que acontece naquele caso de alguma maneira inexplicável.

         Como seria possível que ele, um mero recém-chegado, que mal sabia como funcionavam as coisas naquele novo mundo que lhe aparecera, que nem sabia como se defender ainda, conseguisse aquelas informações? Como ele sempre sabia exatamente aonde ir, quando ir e o que fazer?

         Olhou-se longamente no espelho enquanto enxugava os cabelos e riu de si mesma. Parece que esses dois anos em que estivera sozinha em meio aos anjos a deixaram um pouco egoísta, tinha que admitir.Mas isso não mudava o fato de que realmente estava curiosa sobre a fonte de informações do amigo. Quando saiu do banheiro, Michael não estava mais no quarto. Decerto deve ter ido conversar com outros em busca de mais informações. 

         Abriu a porta do quarto bem devagar, para não fazer o mínimo ruído, e saiu dando passos leves. O vento assobiava enquanto tentava atravessar as vidraças da sala junto com os raios de sol. Foi silenciosamente até o quarto da mãe, a porta estava fechada. Encostou o ouvido à porta e tentou ouvir algum barulho no interior do aposento. Nada. Estava receosa de encontrar a mãe acordada, sabia que ela estaria com raiva, pois apesar de ter saído da casa de Blank antes do anoitecer, não chegou em casa tão cedo assim. O que aconteceu foi que, quando retornaram à cidade, ela e Ricardo foram jantar em uma lanchonete qualquer e depois os dois voltaram para a casa onde a mãe de Ricardo havia vivido, conversaram sobre muitas coisas e quando se deu conta, já era tarde, muito tarde. Ao chegar em casa foi para o quarto sem dar satisfações à mãe, que a esperava acordada.

         Não ouvindo nada, julgou que a mãe estava dormindo, então seguiu pelo resto do corredor em direção à cozinha. Mal pôs o primeiro pé na sala, ouviu o barulho de uma TV ligada, em um volume muito baixo. Deu meia volta.

         -Eu sei que você está aí, não adianta fugir! – era a voz da mãe vinda da cozinha. Não soava muito simpática.

         Mara encostou-se à parede e deixou escapar um longo suspiro. Contou até dez mentalmente e foi até a cozinha. A mãe estava tão feliz quanto a frase que pronunciara há pouco. Entrou e sentou-se em um lugar da mesa que ficava entre a mãe e a televisão. Serviu-se de café.

         -Pronto, estou aqui. E agora?

         -Você não me disse ainda onde estava ontem – questionou a mulher desligando a televisão.

         -Eu saí – respondeu Mara num tom de indiferença enquanto pegava uma torrada – com um amigo.

         -Quer dizer que você encontrou outra pessoa como você pra sair por aí nas festinhas dos seus amiguinhos?

         -Não são festinhas! Não fale do que não sabe. E eu pensei que você tivesse gostado dele.

         -E eu tinha mesmo, até perceber que ele era igualzinho a você e que não ia te fazer parar.          Mas o que eu penso sobre ele não interessa mais, já que você vai matá-lo, assim como matou seu pai.

         Mara soltou a torrada que estava comendo e afastou a xícara de café de si. De repente não estava mais com fome.

         -Não precisa ficar me lembrando disso o tempo todo.

         -Como não? Não preciso te lembrar que você está caminhando para a própria morte?

         -Tem mesmo que aumentar ainda mais a minha culpa? – perguntou Mara já chorando.

         -Ah, claro... Isso mais que tudo, já que você não se preocupa com a sua própria vida. Mas você não vai morrer tão cedo, não é mesmo? Já que você tem seu... Anjinho... Pra te salvar. Será mesmo – disse com malícia na voz – que é só isso que vocês fazem? Hm? Só a luta?

         -Do quê... Você está falando? – Os olhos da garota estavam agora muito vermelhos, mas não era por causa do choro, era só raiva.

         -Ah... Isso eu não sei, quem tem que dizer é você – Falou a mulher levantando e andando lentamente em volta da mesa – Primeiro você sai por aí suspirando por um fantasma... Não, um anjo! Então, depois, vocês vão juntos para todos os cantos e agora você passa a noite fora – ela parou em pé atrás de Mara e pôs as mãos sobre os ombros dela – Será... – Falou baixinho, de uma maneira sugestiva, ao ouvido da garota -... Que eu não posso esperar um neto que tenha sido gerado por providência divina ou que nasça com um par de asas?

         -CALA A BOCA!

         Quando Mara se deu conta estava de pé, a cadeira em que estivera sentada se encontrava caída no chão e havia dado uma bofetada na mãe. A mulher olhava para ela atônita, com os olhos esbugalhados. Mas Mara não fez nada, simplesmente olhava. Sentia as lágrimas quentes escorrerem pelo seu rosto, o ódio, ainda não conseguia acreditar que sua própria mãe podia pensar tudo aquilo deles.

         Recuou a passos curtos, sem tirar os olhos da mãe e balançava negativamente a cabeça repetindo para si mesma que era impossível... Uma relação daquela era inconcebível. Por mais que quisesse, por mais que desejasse a própria condição deles impediria.

         Abriu a porta dos fundos do apartamento, saiu do prédio e ganhou as ruas desertas da cidade, correndo sem rumo. De longe, lá de cima, Michael a acompanhava com um olhar triste. Sabia exatamente o que ela estava pensando.

 

***

 

         Ricardo abriu os olhos. Olhou para o relógio, dez horas. Cedo ainda. Sentou e encontrou os olhos esbranquiçados de Natã olhando para ele.

         -Será que pode conversar agora? – perguntou o anjo muito sério.

         -Não – respondeu mal-humorado – Não vou poder conversar sobre isso nunca.

         Levantou e trocou de roupa, evitando sempre os olhares e as perguntas do anjo. Nem ele mesmo sabia direito como chegava àquelas informações ou como elas chegavam a ele, o que quer que fosse. Ou melhor... Até sabia, mas ninguém acreditaria nele se ele dissesse como chegava até aqueles locais.

         Mas não queria falar sobre isso, e não ia falar, estava decidido. Queria ficar sozinho e refletir sobre os últimos acontecimentos, sobre as mudanças que sua vida sofrera desde o dia em que conhecera Mara. Vestiu uma jaqueta jeans, pegou a sua arma e saiu.

         Àquela hora, o movimento estava começando a aparecer nas grandes avenidas da cidade. A moto de Ricardo não estava nesse meio, o garoto andava a pé, com as mãos nos bolsos e um olhar distraído. Sem se dar conta, seus pés o levaram exatamente à velha casa de sua mãe.

         Pegou a chave, mas quando chegou mais perto da porta percebeu que não ia ser necessário, alguém já estivera ali e a porta estava arrombada, e de uma maneira nem um pouco sutil. O trinco fora arrancado, ao que parece, a golpes e estava jogado no chão. A porta entreaberta balançava um pouco com o vento, batendo na soleira de vez em quando.

         Pôs uma mão na porta e começou a empurrá-la lentamente, a outra mão sob a jaqueta preparada para sacar a arma a qualquer instante. O que Ricardo conseguiu ver no interior da casa, com a pouca luz que a porta deixava invadir eram as formas de alguém encostado à parede.

         Escancarou a porta e entrou. Quando seus olhos se acostumaram a pouca luz, viu que a pessoa junto da parede era Mara. Ela estava com os braços cruzados e o olhar fixo nele. Ao lado dela estava o fantasma que vivia lá. Ao primeiro sinal do garoto, o fantasma desapareceu na parede atrás dele.

         -Você arrombou a porta da minha casa?

         -Claro que não, respondeu ela descruzando os braços – Devem ter sido aqueles seus “amigos” vândalos. Ou... – fez um gesto para que ele se aproximasse mais e continuou em um tom mais baixo – Vai ver que foi o nosso visitante misterioso.

         -Quem? – perguntou um Ricardo confuso.

         -Hoje eu briguei com a minha mãe e fui dar uma volta. Sem querer eu vim para aqui, então eu vi que a porta estava daquele jeito. Eu entrei e comecei a conversas com ele, o espírito daquele senhor que morava aqui e que você sempre vê. Bom, eu estava conversando com ele e ele me disse que ontem à noite alguém veio aqui.

         Ricardo continuou olhando para ela, ainda confuso, enquanto Mara continuava sem se importar.

         -Alguém entrou aqui, e não saiu ainda. Está lá no quarto que era da sua mãe até agora.

         O garoto gastou alguns minutos olhando para o topo da escada. Sempre soube que aquela área da cidade era propícia a isso, ser um lugar para bêbados e vagabundos, mas sempre teve o cuidado de garantir que a sua casa não se transformasse em um albergue. Não ia admitir que um bêbado qualquer invadisse sua casa agora. Subiu os três primeiros degraus da escada.

         -Não!

         Mara segurava seu ombro. E não precisou dizer mais nada, o simples olhar dela pedia, exigia que ele não fosse até lá.

         -Mas...

         -Não faça isso – pediu Mara novamente – você não sabe o que tem lá em cima.

         -É só um bêbado qualquer – Ricardo começou a falar – ele não...

         Ricardo começou, mas não terminou, um barulho o fez parar de falar. Uma porta rangia no andar de cima. Os dois ficaram estáticos enquanto ouvia a porta ranger e, para eles, parece que se passou uma eternidade até que a casa voltasse a imergir em silêncio novamente. Um silêncio que também não durou muito, interrompido pelo som de passos. Passada que se arrastavam lentamente, como se estivesse tendo dificuldade para caminhar, e ficaram cada vez mais lentas até que finalmente pararam.

         Então, quem quer que estivesse no andar de cima começou a correr, ganhou as escadas e saltou, passando sobre as cabeças de Mara e Ricardo antes de atingir o chão, junto com o som de algo se quebrando. Era um homem. Ele levantou e pôs-se a examinar a perna.

         -É... Este corpo está horrível mesmo. Preciso trocar rápido.

         -Cara... Você sabe o que é banho? – Ricardo fez uma careta – você ta fedendo. Mesmo.  

         O homem ficou de frente para eles. O rosto estava flácido, e aquilo realmente o deixava com uma péssima aparência. A pele pesava e puxava a feições faciais para baixo, as sobrancelhas estavam muito caídas, os espaços abaixo dos olhos pareciam dois buracos e a boca era repuxada para baixo. O resto do corpo estava do mesmo jeito, como se tudo pesasse muito.

         Ricardo, instintivamente, pegou a mão de Mara, que ainda estava em seu ombro, puxou-a e fez a garota subir alguns degraus ficando, assim, na frente dela. Inclinou um pouco a cabeça para trás e perguntou:

         -O que é ele?

         -Ele está possuído. Seu corpo já está morto, a única coisa que o controla é o demônio dentro dele. Esse homem deve estar morto há algum tempo, já, vê? Quando os demônios possuem um corpo, eles não têm como conservar, já que está morto. A carne já está apodrecendo, mesmo se ele tentar fazer alguma coisa com a gente, não vai conseguir muito. Ele deve estar planejando alguma coisa pra se arriscar a nos atacar com o corpo fraco assim.

         -Não vai conseguir nada, por que eu vou estourar os miolos que ele ainda tem!       -Hmmm... Será que vai mesmo? – perguntou o demônio com desdém – Teria coragem de matar um homem?

         Ricardo estava imóvel, com a arma apontada para aquele homem estranho, morto. Se tivesse uma mira boa atiraria logo uma bala no meio da testa dele, pois era exatamente isso que aquela coisa estava pedindo. Ouvia a respiração tensa de Mara atrás de si.

         O demônio riu.

         -Viu? Como eu disse, você não tem coragem de matar um homem. Nem mesmo um como eu, que já está morto.

         -Ora, seu... – sem pensar duas vezes, Ricardo puxou o gatilho.

         Com um grito Mara empurrou o braço dele fazendo a bala desviar do curso planejado e se alojar em uma parede. Ele a encarou atônito, ela não falou nada e voltou a encarar o demônio.

         -Mas olha só... Que garotinha mais esperta que nós temos aqui, não é mesmo? – falou avançando alguns passos ao mesmo tempo em que Mara recuava e subia mais três degraus da escada.

         -Ei, fedido! O assunto é comigo, não mude de assunto! Mara sai de perto. Não sei por que você não me deixou atirar nele antes, mas agora você não vai me impedir. Esse desgraçado tem que morrer! – disse Ricardo voltando a apontar a pistola na direção do demônio, que riu e se aproximou mais.

         -NÂO! – Mara se posicionou entre os dois.

         -Mara, eu já falei, saia da minha frente – Mas ela não se moveu. E Ricardo só repetiu o nome dela mais uma vez antes que ela lhe desse um tapa.

         -Você é a pessoa mais idiota que eu já vi na minha vida!

         -Mesmo? – Perguntou levando a mão ao rosto, massageando o local aonde a garota havia batido – Você não deve ter visto muitas pessoas na sua vida, então.

         -Você me tira do sério, sabia?! Será que não dá pra entender que o que ele quer é exatamente que você atire nele? – ele a encarou com o olhar cheio de dúvidas. Ela bateu na própria testa e revirou os olhos antes de continuar – Sim, claro... Ai, meu Deus... Como foi que eu imaginei que você fosse entender isso? Presta bem atenção que eu só vou falar uma vez: Nós estamos na sua casa! Se você atirar nele, o demônio vai embora, volta pro inferno, e o morto fica aqui. Então vamos ter um cadáver na SUA casa com o tiro de uma arma que TAMBÉM é sua! Tá bom assim pra você?

         -Êpa! Espera um pouco, ninguém sabe nem que isso existe!

         -Mas vão descobrir. E de quem você acha que vai ser a culpa? Acha mesmo que a polícia acredita em fantasmas?

         Deixou a pistola cair. Não havia pensado nessa possibilidade. Se chamasse a polícia certamente seria preso e se matasse o demônio não saberia o que fazer com o corpo, o que significava que estava desarmado, qualquer coisa que tentasse fazer o incriminaria.

         -Pois muito bem – falou o garoto cruzando os braços – você está certa. Então diga: o que faremos agora?

         -Sinceramente eu não sei – ela respondeu cruzando os braços também.

         -Ah, mas que ótimo! Você não--- MARA!!

         Os dois se distraíram tanto discutindo que esqueceram totalmente que não estavam sozinhos. Só lembraram-se da presença do demônio quando este acertou Mara com uma tábua solta do chão. Ela caiu a alguns centímetros do local onde estava com uma horrenda dor nas costas. Ricardo tentou ajudá-la, mas ao desviar da tábua, que o demônio atirara em sua direção logo em seguida, perdeu o equilíbrio e caiu, o que deu ao demônio tempo suficiente para atacar Mara.

         -Garotinha esperta... Mas agora que descobriu minhas intenções sabe que não pode fazer nada comigo e que eu posso fazer o que eu quiser com você – ele falou quase cantando – agora vejamos... – Mara sentia uma das mãos dele firme em seu pescoço, a suspendendo do chão – você é muito famosa sabia? A humana estúpida que trabalha ao lado dos anjos... Essa cidade nunca mais foi a mesma depois que você apareceu, os demônios estão com medo de andar por aí, você não acha isso um absurdo? Imagine só, alguns pensam que você é a rainha branca! Mas que ofensa, não? – perguntou enquanto a atirava na parede mais próxima – todo mundo sabe que você não chega aos pés dela!

         Mara estava no chão, imóvel e calada. Apoiada sobre os braços e com a cabeça baixa, ainda tentando recuperar todo o oxigênio que fora privada de respirar. A falta de ar lhe deixara fraca tanto no corpo quanto na mente e não lhe ocorria nada para fugir daquela situação.

         Sentiu uma mão em seu braço e, em seguida, um puxão violento. Ergueu a cabeça e deparou-se com um sorriso escancarado, a outra mão do homem segurava uma faca. De onde raios ele tirou uma faca? Bom, isso era o de menos, por que agora a faca se aproximava perigosamente de seu pescoço.

         Então veio um tiro. Passou a centímetros do braço de Mara e atingiu a parede. A água contida na bala respingou em seu braço, e, pelos gritos vindos do demônio, parece que também o atingira. E ele soltou Mara que foi, praticamente rastejando, até Ricardo.

         -Parece que finalmente você teve uma boa idéia! Como conseguiu pensar nisso? – perguntou ela sentando no primeiro degrau da escada.

         -Mas que droga – resmungou Ricardo visivelmente irritado – eu errei. – em seguida olhou para ela – você tá legal?

         -Minhas costas doem... E o pescoço dói um pouco também, mas... Tá tudo legal, eu acho. O que a gente vai fazer agora? Eu não sei fazer exorcismos.

         -Agora vocês dois saem daqui. Nós assumimos agora.

         E então luz. Em um segundo os dois garotos já estava do lado de fora da casa, enquanto Natã e Michael assumiam a batalha com o demônio. Mara sentou na calçada e Ricardo encostou-se ao muro da casa.

         -Eu ouvi direito ou você disse que errou aquele tiro? – Ela perguntou encarando o chão.

         -Você ouviu perfeitamente. Eu errei. Eu queria ter acertado no meio das fuças daquele infeliz! – Ricardo deu um soco no ar.

         -Você é louco? O que pretendia fazer depois? Você sabe que ia acabar sendo preso.

         -Não me importo com isso.

         -Você não ia conseguir fazer muita coisa estando na cadeia.

         -Nem você ia conseguir estando morta – ele sentou ao lado dela – eu não podia deixar ele te matar! Eu... Eu não queria que você morresse...

         -Ricardo? – ela pôs a mão no ombro do rapaz.

         -Quê?

         -Quantas vezes mais será que eu vou ter que te dizer obrigada?

         -Não precisa agradecer se não quiser – respondeu colocando a mão sobre a dela. Os dois se olharam por algum tempo. Ricardo abriu a boca para falar qualquer coisa, mas a fechou sem fizer nada.

         Então o ambiente ficou iluminado novamente. Mara rapidamente levantou e encarou os dois anjos com um olhar ansioso e preocupado. Ricardo permaneceu sentado, apenas virou a cabeça e inclinou o corpo um pouco para encará-los.

         Natã foi até ele e deixou cair no chão as duas balar que haviam sido usadas.

         -Você tem que se livrar disso – declarou o anjo – já que você vai chamar a polícia, é melhor fazer o possível para não ser incriminado.

         Ricardo engasgou.

         -Polícia?! Mas vocês não deram um jeito nele?

         -Eles derrotaram o demônio, mas ainda tem um corpo lá dentro e nós temos que fazer alguma coisa em relação a isso.

         -Mas por que a polícia? A gente não pode simplesmente se livrar dele? Enterrar, jogar no rio... Sei lá, qualquer coisa! Qualquer coisa que não envolva a polícia.

         -Não podemos. Deve ter alguém procurando por ele... Não é justo simplesmente “nos livrarmos” dele. Agora presta atenção que eu só vou falar uma vez: eu vou embora agora e você vai ligar pra polícia e inventar alguma coisa. Tente não se incriminar!

         -Ah, claro... Vá embora e me deixe aqui sozinho! Uma pessoa a menos pra ser suspeita de um crime... – falou ele num tom irônico.

         -Pode parar por aí! – declarou Mara já com raiva – já deu uma boa olhada em mim? Já viu o meu estado? O que quer que eu diga à polícia, que um morto tentou me matar?! Olha... Essa casa é sua, portanto você resolve – concluiu dando meia volta e começando a andar – Se vira com os caras. Eu sei que você consegue.

 

***

 

         Mara estava inquieta. Deitou no sofá e tentou dormir um pouco, mas desistiu depois de méis hora se ao menos fechar os olhos. Foi até a janela, observou um pouco o trêfego lá em baixo e depois olhou para o relógio e viu que já eram oito da noite. Começou a andar pela casa. Da sala para o quarto; do quarto para a sala; da sala para a varanda; da varanda para a cozinha...

         Parou na cozinha. Sentou. Ficou um bom tempo tamborilando com os dedos na mesa antes de começar a brincar com a toalha de renda que a cobria. Foi até a geladeira, abriu a porta, olhou, olhou e olhou... Pegou uma latinha de refrigerante. Não conseguiu abrir. Como assim não estava conseguindo? Era uma coisa tão simples, tão... Fácil! Sem paciência, atirou a latinha contra a parede; a lata amassou e estourou espalhando refrigerante no chão. Mara gritou um palavrão e voltou a andar pela casa feito um zumbi.

         As luzes estavam todas apagadas. A garota entrava e saía dos cômodos escuros procurando qualquer coisa que ainda não sabia o que era. Ao sair do quarto da mãe, viu uma luz tênue vinda da sala, finalmente alguma notícia! Correu até lá e viu Michael de braços cruzados. O sorriso morreu antes mesmo de nascer, parecia que as notícias não eram boas.

         -O que aconteceu? – perguntou Mara, já sem ter certeza de que queria ouvir a resposta.

         -Um imprevisto. Algo que deixamos passar.

         -Como assim vocês deixaram passar alguma coisa?! Vocês nunca deixam passar nada! Ah, meu Deus... – ela se deixou cair sentada no sofá – Mas e Ricardo? Ele está bem, não está? Quer dizer, não o prenderam...? Prenderam?

         -Mara... Ontem à noite, quando aquele possuído invadiu a casa, ele não era o único cadáver a entrar naquela casa.

         -Ah, não? E por que vocês não disseram nada? Vocês deixaram Ricardo sozinho com dois corpos e a polícia! – ela falou quase gritando – Isso é demais pra ele... Com vocês deixaram isso acontecer? Eu não... Não consigo acreditar...

         -Mara, me desculpe... – ele tentava acalmá-la – isso foi um erro nosso, do Natã e meu. Nós não imaginamos que isso pudesse acontecer. Eu nem sei por que não verificamos tudo antes, pensando melhor, foi um erro nosso. Mas agora não há mais nada a fazer além de esperar.

         -Claro que tem! Eu vou falar com ele, me leva até a casa dele!

         -Ele não está em casa.

         Mara parou com a mão na maçaneta da porta, já aberta. Virou-se, encarou Michael e perguntou apenas com o olhar. Queria saber onde Ricardo estava.

         -Na delegacia. Não é fácil assim liberar alguém que, supostamente, encontrou dois corpos na própria casa, principalmente se um deles é um corpo que está sendo procurado há dias.

         A porta se fechou com violência.

         -Quem era aquele morto que atacou a gente?

         -Ele? Eu não sei... Talvez alguém fraco e pobre de espírito, o típico perfil de um possuído.

         -Então... Por quê... Ele ainda... Está lá? – rosnou a garota segurando Michael pelas vestes.

         -Por causa – disse ele se desvencilhando das mãos de Mara – do outro corpo encontrado lá. O que a polícia encontrou quando estava revistando a casa – Michael a obrigou a sentar novamente no sofá – foi o corpo de Bruna, escondido em um dos cômodos da casa.

         O rosto dela perdeu a cor. Mas como? E por quê? Qual é o sentido de se roubar um corpo do cemitério e esconder justamente lá, na casa do Ricardo? Não pode ter sido uma simples coincidência... Aquele demônio parecia saber o que estava fazendo e, além de tudo, ele a reconhecera, sabia quem ela era. Mas ele não sabia quem era Ricardo e talvez nem soubesse que a casa era dele. Então por que lá?

         -Alguém está vindo. – Declarou Michael.

         Mara encarou o anjo e ela apontou a varanda. Ela correu até lá e olhou. A rua estava pouco movimentada e ninguém parecia estar chegando ao prédio. Então ela olhou pra cima, para o céu. Realmente alguém estava vindo. Depois de alguns segundos ela pôde reconhecer Natã. Ela tinha um leve pressentimento que aquilo significava mais coisas runs acontecendo.

         Antes mesmo de encostar os pés no piso escuro da varanda, Natã começara a falar.

         -Vocês têm que vir comigo, rápido!

         -Mas o que aconteceu? – Perguntou Mara.

         Natã Balançou a cabeça...

         -Se eu falasse, não iriam acreditar em mim...

 


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Notas finais do capítulo

Peguei o péssimo costume de postar as estórias sem revisar antes. =____=

Espero que gostem
beijos a todos



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