Passado Perdido escrita por Leonardo Alves


Capítulo 1
Thomas A. Felix




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O sol já estava há poucas horas de completar sua caminhada pelo céu e os ventos de inverno açoitavam meu rosto enquanto eu descia do velho ônibus azul que circulava pela cidade.

— Mas será que nem mesmo quando você marca de nos encontrarmos você consegue chegar na hora certa!?

— Não enche. — respondi com um sorriso cínico. Aquele era Erick, um verdadeiro chato, mas meu amigo. Nos conhecíamos desde o ensino médio e entramos ano passado na mesma universidade para estudar história, nossa paixão em comum. O problema é que ele tinha a mania de se estressar só porque me atraso uma hora ou duas de vez em quando... Dá para acreditar!?

— Então... Aonde vamos?

— Lembra da pesquisa de campo que temos de fazer para o Sr. Mandrac? — fui falando enquanto caminhávamos pela calçada, minha voz carregada de animação. — Eu já sei aonde podemos encontrar pessoas para entrevistar. Procurei um pouco nos registros da prefeitura e achei sobre um prédio que consta como um dos mais antigos da cidade toda. Bom, lá diz que o dono dele faliu num tempo de crise e que ele ficou meio que abandonados, mas com sorte achamos um morador antigo lá.

Erick não parecia estar gostando muito da ideia, mas continuou andando mesmo assim. Depois de mais alguns minutos chegamos ao velho prédio e paramos em frente a entrada. Ele possuía apenas quatro andares e estava mais acabado do que eu havia imaginado: rachaduras, pintura desgastada e janelas com madeiras tapando o buraco de vidros quebrados compunham a aparência da estrutura decadente.

— Você não acha mesmo que eu vou entrar ai, né? Os únicos moradores que você vai encontrar são ratazanas do tamanho de cachorros e centenas de baratas. — ouvi a voz irônica do meu amigo do meu amigo covarde começar a dizer.

— Como sempre, medroso. Por que mesmo que eu continuo andando com você?

— Talvez porque eu seja seu único amigo?

— Não enche. — respondi rindo. Verdade seja dita, eu não era o tipo de pessoa que atraia muitas amizades. Somente os estranhos como Erick. Estranhos como eu. - Bom, se você não vai, eu vou sozinho. A história está esperando para ser descoberta. — proferi heroicamente e então entrei no edifício.

— Só não venha esperar que eu vá te salvar quando um drogado te arrastar pra dentro do apartamento dele... — o ouvi resmungar lá de fora, mas sem dar muita atenção.

A parte de dentro do prédio não devia em nada à sua aparência do lado de fora. Eu estava num pequeno salão fracamente iluminado apenas pela luz que entrava por algumas janelas. O cômodo possuía uma porta, uma parede cheia de caixinhas de metal onde deviam ser guardadas as correspondências e uma escada que supus levar para os apartamentos nos andares de cima.

Umas letras vermelhas, pichadas em uma das paredes, me chamou a atenção. Com um pouco de esforço consegui ler o que dizia: “Acorda, desgraçado”. Por que alguém escreveria uma coisa daquelas? Li mais algumas vezes até que finalmente dei de ombros e comecei a subir para os outros andares.

O piso de madeira rangia sob meus pés enquanto eu batia de porta em porta sem receber nenhuma resposta. O silêncio naquele local era algo tão sufocante quanto o cheiro de mofo que estava por toda parte. Somente quando eu já estava prestes a desistir é que algo diferente aconteceu: ao toque da minha mão a porta de um dos apartamentos deslizou, abrindo alguns centímetros e me permitindo ver o que algum dia deve ter sido uma cozinha, mas que agora era um amontoado de pó e móveis quebrados.

A quem eu estava querendo enganar? Só de entrar naquele prédio já dava para notar que não havia ninguém morando lá. O jeito seria descer e admitir que Erick tinha razão. Mas não ainda. Algo dentro de mim estava me impelindo a entrar naquele apartamento. Normalmente, quando eu sentia algo assim as coisas não terminavam muito bem, mas não era algo que eu conseguisse ignorar facilmente.

Engoli em seco e entrei. A cozinha dava em um pequeno corredor com três portas: uma à esquerda, que levava a um banheiro sujo; uma mais a frente, que estava trancada; e uma à direita, com um pequeno quarto que entrei para olhar melhor. Seria apenas mais um cômodo velho e empoeirado para mim, como todo o resto daquele lugar, mas algumas páginas embaixo de cama de solteiro chamou minha atenção.

Precisei usar a luz do meu celular para conseguir enxergar as letras naquela escuridão e então meu sangue gelou com o que li na primeira folha: “Diário de Thomas A. Felix”. Aquele era o meu nome. Quais eram as chances de eu encontrar um diário de alguém que tem o mesmo nome que eu!? Com as mãos tremendo levemente virei a folha e comecei a ler as outras páginas. Um grande nó começou a se formar em meu estômago enquanto meus olhos percorriam aquelas palavras.




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