Dilema Platônico escrita por Metal_Will


Capítulo 14
Capítulo 14 - Abismo




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/35573/chapter/14

Capítulo 14 - Abismo

    Miguel se aproxima lentamente da mesa. Na metade do caminho, pensou em desistir. "Não, ela está lendo...vou ser inconveniente". Mas, por sorte ou destino, Danieli desvia o olhar do livro bem na hora que Miguel pensava em dar meia-volta. Ela acena para o rapaz e ele corresponde ao cumprimento meio receoso. Tudo bem, talvez não seja tão inconveniente se aproximar.
    - Bom dia - cumprimenta Danieli
    - Bom dia - responde Miguel, feliz por pelo menos conseguir conversar com ela sem gaguejar
    - Chegou cedo hoje - observa a mocinha
    - Pois é. O galo cantou mais cedo.
    - É bom chegar mais cedo de vez em quando. Eu posso ler meu livro, por exemplo
    Miguel observa a capa. "O Crime do Padre Amaro". Pelo que lembrava, aquilo não era leitura para nenhum trabalho de Português, seria? Bem, Miguel não era muito ligado a clássicos da literatura portuguesa, mas, ao que parecia, Danieli parecia muito interessada naquele livro. Aquela sensação de inferioridade estava voltando
    - Hmm...então você gosta de ler? - pergunta Miguel, sentando-se no banco lentamente. Ao menos, tinha uma mesa entre os bancos: ele não teria coragem de se sentar do lado dela.
    - Gosto sim. Conhecer Literatura é importante para quem quer ser ator
    - Entendo
    - Adoro esses clássicos. Mas também gosto de livros atuais. Por exemplo, Stephen King é muito bom
    - Hmmm
    No caso, Miguel não podia opinar muito. Não gostava muito de Literatura. Se tivesse que ler, escolheria livros mais técnicos. O abismo que o separava de Danieli parecia ser cada vez maior.
    Olhando a pasta da garota sobre a mesa, Miguel percebe algumas partituras ou algo parecido. É verdade. Lembrou-se de ter ouvido em algum momento que ela tocava piano. Mas, é claro, que seriam melhor fingir que não sabia
    - Partituras? Você toca algum instrumento? - pergunta Miguel apontando para as folhas na pasta
    - Sim. Piano -  responde a garota simpaticamente
    - Sério? Então além de atriz você é pianista?
    - Haha. Pois é. Só toco piano por hobby, mas faz tempo que eu não pratico. Preciso voltar a tocar, mas isso só depois das provas.
    - Puxa, legal
    - Sempre gostei de música clássica, apesar de não entender muita coisa.
    Mas com certeza ela deveria entender mais do que ele.
    - E você? Prefere que tipo de música? - pergunta Danieli
    - Bem, sempre gostei mais de rock mesmo - responde Miguel com um certo receio
    - Você não tem muita cara de roqueiro - diz ela rindo
    - Você acha?
    - Você parece gostar mais de pop internacional
    - Não, não muito
    - Parece. Bem, além de clássica, também gosto de jazz.
    - Jazz? Legal. Não manjo muito, mas é um bom estilo.
    Danieli sorri.
    A conversa dá uma pausa. Danieli volta a ler um parágrafo do livro. Jazz? Isso era bem a cara dela. O abismo entre os dois aumentava mais alguns metros. Esses poucos minutos de conversa seriam suficientes para Miguel perceber que os gostos dos dois eram completamente distintos. "Isso não vai dar certo", pensa o rapaz, "De longe parecia, mas...ela não tem nada a ver comigo. Nada". Isso era um lado da balança. Do outro lado, Miguel não conseguia tirá-la da cabeça. A presença dela era relaxante. De perto, conseguia prestar mais atenção aos detalhes avermelhados do cabelo dela. Aquela boca suave, que balbuciava algumas palavras do livro, aqueles olhos cor-de-jabuticaba. Era uma garota bonita, sem dúvida. Mas não era apenas a beleza dela que atraía Miguel. Tinha algo mais. Talvez algum magnetismo? Deveria acreditar na história de que os opostos se atraem? Pelo menos não eram tão opostos assim...mas suas personalidades eram diferentes, totalmente diferentes. O que fazer?
    - Desculpa, queria terminar aquele parágrafo. E sua prima não veio com você? - pergunta Danieli, retomando a conversa após ler brevemente naquela pausa.
    - Veio. Ela foi conversar com uma menina da equipe de handebol.
    Danieli olha para o horizonte do pátio e vê Camila batendo papo com uma menina
    - Sério? Ela vai entrar para o handebol?
    - Provavelmente, ela adora esse esporte.
    - Legal! É bom fazer alguma atividade extracurricular, a gente estuda tanto, né?
    Miguel concorda com a cabeça.
    - Você faz alguma atividade extracurricular, Miguel? - pergunta Daniel colocando o marcador de páginas e fechando o livro.
    - Hmm, não. Nenhuma
    - Haha. Mas você acabou de concordar que é bom fazer alguma coisa fora da aula, não é?
    - Sim, mas não necessariamente alguma atividade extracurricular específica. Acho que usando seu tempo livre com o que você gosta já está valendo, não é?
    - É. É verdade
    Nova pausa.
    - E o que você gosta de fazer nas horas vagas, Miguel? - pergunta a mocinha
    - Bem, sempre gostei de jogos de computador, videogames, essas coisas
    Milésimos de segundo após acabar essa frase, Miguel sentiu que o abismo ia aumentar de novo.
    - Hmm. Bem, você tem cara de gostar de jogos. Pessoalmente, eu não manjo nada disso
    Dito e feito. O que fazer? Os gostos dela não combinavam com os dele. E o pior: por que os gostos dela pareciam tão superiores aos dele? Conversando com Dani, Miguel se sentia inferior e infantil. Mas eram coisas que ele gostava! Qual era o problema? Na verdade, nenhum. Danieli não reprovou os gostos de Miguel em nenhum momento. Mas Miguel sentia que ela era muito superior! Seria uma relação Eduardo e Mônica, se fosse pensar naquela música do Legião Urbana! Só que ao mesmo tempo em que via a dificuldade do relacionamento, se sentia cada vez mais atraído por ela. Era algo inexplicável. A presença de Danieli mexia com o rapaz de forma misteriosa. Era um sentimento, no mínimo, esquisito. Querer e não querer ao mesmo tempo. Isso era possível
    - Olha, é a Paula, não é? - Danieli percebe a amiga vindo
    Bem, agora a moça não estava mais sozinha. A ideia de ficar ali junto com essa Paula, não agradava muito Miguel. Mas ntambém não seria de bom tom sair da conversa só porque ela chegou.
    - Oi, Paula. Bom dia
    - Bom dia - diz a mocinha de óculos sorrindo - Miguel, tudo bom?
    - Tudo bem - responde Miguel com um leve sorriso.
    - E aí? Muito cansada? - pergunta Danieli
    - Um pouquinho...ontem tive que ajudar na papelaria. Acabei nem terminando a lição de Matemática. - responde Paula
    É verdade. Em alguma aula do ano anterior (ao contrário de Danieli, Paula já estudava na Brilho da Estrela antes) ela havia comentado que seus pais administravam uma papelaria. Parecia ser uma garota esforçada. Seus óculos eram grandes e tinha um cabelo não muito comprido e liso. Não era bonita, mas também não era feia.
    - É esse exercício aqui - diz Paula, já retirando os papeis da pasta
    - Hmm..deixa eu ver?
    Miguel observa o que estava acontecendo. Ele reconhece o problema que Paula levantou. Já tinha visto a resolução e sabia que tinha uma sacada difícil de lembrar. Será que Danieli pensou do mesmo jeito?
    - Ah, sim. Esse é rápido, mas demora para descobrir o jeito. Você faz assim, ó.
    O rapaz se impressiona de novo. Não era um problema muito fácil. Então, além de toda aquela disposição para leitura, Danieli também era boa em ciências exatas. Não que Miguel tivesse dificuldade em Matemática, mas o fato é que Danieli parecia ser boa em tudo. O que mais faltava descobrir sobre ela? A cada minuto, ela parecia cada vez mais perfeita e superior.
    Eis que toca o sinal. Sem mais tempo para conversa.
    - Que bom! Deu tempo de terminar! - Paula exclama feliz
    - Né? Então, vamos subir? - pergunta Danieli olhando para Miguel
    - Vão na frente, ainda vou ao banheiro
    - Haha. Tudo bem. Vê se não chega atrasado - aponta Dani
    - Pode deixar
    As duas sobem na frente. Paula não resiste em fazer um comentário
    - Que milagre, o Miguel falando com alguém...
    - Por que? Ele não falava com as pessoas? - pergunta a ruivinha
    - Bem, desde que eu estudo na mesma sala que ele, só o vejo falando com o Leandro
    - Sério? Mas ele conversa com a Camila também
    - É que ela é prima dele, né?
    - Não sei. De qualquer jeito, se ele quiser conversar, podemos estar dispostas a ouvir, né? A gente também é meio panelinha
    - Ah, sei lá. É que nossa sala tem tanta gente metida...
    - Não sei...eu vim pra cá esse ano, não conheço muito bem o pessoal daqui, mas esse Miguel não parece ser má pessoa
    - Bem, não tenho nada contra ele. Mas ele é esquisito
    - Esquisito? Não, nem achei tanto.
    - Hmm..sei lá
    - Paula! Você precisa parar de só ver o lado negativo das pessoas! - bronqueia Danieli
    - Pode ser...mas as pessoas dão razão, né? - diz Paula em um tom sério. Será que ela passou por alguma situação difícil?
    - Bom, deixa pra lá. A Sandra ia faltar hoje, né?
    - É. Eu liguei para ela ontem e parece que ela pegou um resfriado
    - Que chato
    As duas entram na sala. Enquanto arrumava suas coisas, Danieli pensava algumas coisas. "Esquisito, é? Pode ser...mas acho que ele é mais sozinho do que esquisito..."


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Dilema Platônico" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.