Arco-íris escrita por TaediBear


Capítulo 1
Parte Um . E o mundo torna-se cinza


Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem :3
Boa leitura!



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“Alegre-se, seque seus olhos marejados e diga-me quando chover. Vou misturar aquele arco-íris acima de você e atirá-lo em suas veias, porque parecem faltar cores em seu coração, e nós deveríamos saber que cresceríamos mais cedo ou mais tarde, porque gastamos todo nosso tempo livre sozinhos”.

Rainbow veins, Owl City.

Já cheguei a ver as cores uma vez, quando era mais novo. Não me lembro de muita coisa antes de ter quatro anos – provavelmente por ser novo demais -, mas até os dez, eu via todas as cores do mundo. Vagamente, a lembrança de um amarelo vivo invade minha mente. Ou aquele vermelho escarlate que vi em um carro. Se pudesse escolher uma, diria que minha cor favorita é azul. Aquele azul escuro e brilhante da pedra preciosa da pulseira da minha mãe.

Lembro-me de ver um mundo colorido, de um arco-íris no céu, de nuvens brancas sobre uma tela azul-clara, das folhas verdes da árvore no parque, do marrom de seu tronco, do tom areia do chão, do rosa do vestido de uma menina e de meu macacão laranja.

Mas, quando completei onze anos, o mundo já não parecia o mesmo. Via minha família cair aos pedaços de alguma forma, por algum motivo incrivelmente banal. Meus professores pareciam velhos carrancudos, que não sorriam e brigavam a todo instante conosco.  As crianças da minha turma eram todas sorridentes e brincalhonas; tentei ser amigo delas, mas ninguém queria conversar comigo. Ouvia frases cruéis delas, todos os dias.

“Não quero ser amigo de alguém cujos pais brigam o tempo todo”.

“Você é chato, Teito”.

“Vamos embora, não quero ficar perto dele”.

Crianças podem ser más quando o querem, e eu sabia perfeitamente disso. Aquele ano fora terrivelmente solitário para mim. Não tinha amigos, meus pais estavam se divorciando, meus professores não gostavam de mim. Meu mundo desmoronava a uma velocidade inimaginável.

Se meu presente era daquela forma, do adiantava alimentar sonhos para o futuro?

Não criei expectativas. Não criei esperanças. Não criei um mundo para onde pudesse escapar. Fiquei naquele mesmo lugar, parado, sem reagir. As pessoas à minha volta transmitiam sensações ruins, que invadiam meu corpo, deixavam-me entorpecido, sem força para seguir em frente.

Não segui em frente. Não tentei consertar nada. O mundo já estava acabado, desmoronado, em ruínas. O que eu poderia fazer?

Empurrei tudo para frente, sem me importar em destacar-me em qualquer coisa, em estudar demasiadamente para ganhar a maior nota, em conseguir amigos entre aquelas crianças. Segui minha vida, isolado do mundo ao meu redor.

Talvez, assim, eu tenha me isolado das cores também. Em pouco tempo, olhava-me no espelho e não via o verde vivo dos meus olhos, ou o castanho-escuro do meu cabelo. Não via o azul daquele céu iluminado, nem o vinho dos uniformes escolares. Não via o amarelo da casa ao lado da minha, nem o vermelho das rosas no caminho.

O mundo transformava-se em puros tons de cinza.

As nuvens cobriam a tela azul, nublando-a, deixando-a acinzentada em um aviso eterno de chuva, que nunca cairia. Os prédios coloridos do condomínio, ao lado do qual eu passava todos os dias, eram cinza-escuro, cinza-claro e cinza puro. Não havia qualquer traço daquele amarelo, daquele verde, daquele roxo e, principalmente, daquele azul.

Cinza. Puramente cinza.

Meu coração já não se emocionava como antes. Nenhuma emoção forte o invadia, acelerava-o, fazia o sangue correr mais rápido por minhas veias. Ele batia monotonamente, prestes a parar a qualquer momento. Eu sentia o mundo girar sob meus pés tão lento quanto lhe era possível. Vivi minha vida sem nada para mudá-la, sem nada novo, sem nada que pudesse me distrair e me fazer sorrir.

Não me lembrava de como era sorrir.

Dizem que faz muito bem ao corpo sorrir. Mas eu era cinza, completamente cinza. Sorrir ou não sorrir não fazia qualquer diferença para mim. Eu continuaria sem cor alguma, apenas vendo o mundo ao meu redor mover-se devagar. Eu não queria, também, que minha face possuísse um sorriso falso. Pelo menos sincero, eu queria continuar a ser.

Quando comecei o colegial, entrou um aluno novo na minha sala. Ele foi a primeira cor que surgiu à minha frente durante aquela minha vida. Seu nome era Mikage, e ele parecia brilhar. Seu cabelo era puramente alourado e seus olhos, acastanhados. Ele emanava cores, ainda que de maneira fraca, porque seu coração batia alegremente em seu peito.

Mikage era feliz e transmitia felicidade. Era contagiante. Mas não para mim. Eu não era contaminado por aquela alegria eterna. Era eternamente o menino cinza, que via cinza, que vivia em tons de cinza. Ele tornou-se meu melhor amigo e tentava, sempre, me animar com seu sorriso, com seu jeito, com suas cores. Mas eu não ficava animado.

Eu não me deixava ser animado.

Havia algo dentro de mim que impedia a felicidade de alcançar meu coração, como se não quisesse que eu fosse infectado pela doença chamada alegria. Deixei-o ser assim. Deixei que aquela parte do meu corpo – meu coração – continuasse intacta.

Do que adiantava voltar a ver todas as cores para, mais uma vez, ter todos os meus sonhos destruídos?

Para que alimentar esperanças?

Preferia aquele mundo sem cor, sem vida, monótono. Era mais fácil viver nele, não aspirar a nada e esperar para ver o que o mundo jogaria em minha direção. Às vezes, eu desejava que esse algo fosse um carro. Às vezes, eu imaginava que a morte não era tão terrível para uma pessoa como eu.

Mas eu queria uma morte acidental, não proposital.

Um dia, Mikage entrou na sala com um sorriso enorme, daqueles que eu não conseguia me imaginar dando. Mirei-o curioso, e ele se jogou na cadeira à minha frente, as pernas abertas, aqueles olhos castanhos voltados para mim.

- Sabe quem está vindo passar a semana de recesso na cidade? – ele indagou.

Balancei a cabeça em uma negativa, e o sorriso de Mikage pareceu alargar-se, como se ele esperasse por essa minha resposta. Disse, então, que era uma surpresa e virou-se para o quadro, deixando-me atrás atônito. Ele viera me dizer que a pessoa que vinha para a cidade era uma surpresa; que coisa! Era uma novidade e tanto (às vezes eu era sarcástico na minha mente).

No domingo, Mikage apareceu na porta da casa da minha mãe – onde eu passava os fins de semana -, chamando-me para ir ao cinema com ele. Aquele era o primeiro dia da semana de recesso, quando não precisaríamos fazer nada o dia inteiro. Concordei, apesar de minha vontade de ver um filme cinza estar lá embaixo.

Mikage me puxou pela mão, arrastando-me pelas ruas da cidade. Então, percebi que o caminho que ele seguia era diferente daquele que levava ao cinema. Franzi as sobrancelhas.

- O que está fazendo, Mikage? – questionei. – Aonde vamos?

- Teito – ele começou e soltou minha mão, virando-se, então, em minha direção -, quero que conheça Hakuren, meu primo.

Voltei meus olhos para a direção em que Mikage apontava. Vi cabelos alourados, compridos, presos em um rabo-de-cavalo, olhos violeta que conseguiam me impressionar como quaisquer outros não conseguiam, uma pele quase translúcida. Pisquei algumas vezes.  Não era como Mikage; o garoto atrás dele brilhava tão forte que me ofuscava a visão. Talvez fosse algo em seu sorriso, ou em sua vida que o fizesse ser tão colorido e radiante.

Não, certamente não era. Ele não tinha nada de impressionante em sua vida ou em seu sorriso, então me desfiz daquela ideia.

Hakuren brilhava porque era um anjo. Um anjo salvador. Uma criatura pura, feita unicamente de amor. Ele fez, pela primeira vez em muito tempo, meu coração falhar uma batida e martelar em meu peito anormalmente.

O mundo, naquele instante, pareceu mover-se a uma velocidade normal, sob meus pés.


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Notas finais do capítulo

Eu postei os dois capítulos juntos, mas o que acha de deixar um comentário em cada um deles? *-*
Espero que tenham gostado,
Takoyaki.



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