Aqueles olhos examinavam por completo meu corpo, e eu estava estática, perturbada, perdida dentro daqueles olhos verdes.

Os olhos avaliaram minhas pernas fazendo-as ficar tremulas, passou para minhas coxas, se eu não me segurasse- me algo cairia, examinou cada parte, me fazendo ter arrepios e calafrios, apenas com aqueles olhos.

Sem tocar-me, sem dizer nada, apenas com aqueles olhos verdes ele tinha controle sobre meu corpo, minha mente tentava se manter sóbria, mas aqueles olhos intensos eram como álcool, viciante e algo que não faz bem.

Eu estava submissa aos comandos dele, isso não podia negar, mas que eu vou lutar pela minha sanidade e orgulho, vou lutar até o fim.

Ele sorriu ao ver que ainda tem controle sobre mim. Aqueles olhos haviam terminado de examinar meu rosto e pararam nos meus olhos, aqueles olhos verdes presos aos meus, era como hipnose. Aqueles olhos diziam calmamente “ minha garota” como se eu fosse uma cachorrinha e estivesse me comportando.

Eu estava extasiada dentro daqueles olhos verdes que sugavam minhas esperanças aos poucos, eu sentia calafrios, e era como se eu estivesse me afogando e algo estivesse me puxando mais para o fundo.

Eu estava a ponto de cair de joelhos no chão, eu tinha que fugir daqueles olhos presos aos meus.

– Bom dia alunos, todos sentados agora por favor.- disse o professor adentrando a sala, arrancando a conexão mantida com aqueles olhos.

Sentei-me na última cadeira ao lado da janela, onde eu poderia olhar para o dia nubloso que se formava lá fora.

– Sou professor Faraize para aqueles que não me conhecem, seu professor de história...- ele repetiu o repertório de todo o professor no primeiro dia de aula, e então ele começou com uma revisão da matéria passada ano passado, e então eu parei de prestar atenção, meus pensamentos voltavam a todo momento a aqueles olhos verdes.

Como eu pude me apegar a aqueles olhos? Todo o seu contorno um pouco puxado, contornando de um verde mais forte e então ficavam claros, era lindo, isso não podia negar.

E pensar que ele já fora um rapaz  magricela, desengonçada que tinha apenas a mim como amiga, mas depois de ir morar com seu pai... Ele mudou, e eu me apaixonei mais ainda.

Ah sim, olhei para fora e pingos sutis caírem do céu, as nuvens escondendo os raios de Sol, aquele dia chuvoso, pincelava mais a pintura negra e melancólica de minha mente.

–Senhorita Anne, creio que lá fora esteja mais interessante do que minha aula, não é mesmo?- disse o Professor Faraize, olhando-me repreensivo.

Murmurei um “desculpe”, por mais que eu me esforçasse para voltar minha mente para a aula meus pensamentos sempre voltavam, a ele.

Kentin, por que você teve que jogar fora assim a nossa flor, então depois volta e me traz flores de plástico?

As aulas se passaram até que chegasse o intervalo.

Eu sempre era a primeira a sair da sala, por medo de ter que encara-lo, eu não conseguiria, estou completamente perdida, não consigo focar em nada, eu apenas estava completamente perdida, sem saber como achar o caminho de volta para a realidade.

Eu fiz o máximo para que ninguém me notasse, principalmente Kentin . Se eu encontrasse Leisha, ou ela me faria me sentir melhor ou me faria sentir-me muito pior, era melhor não arriscar, eu segui a sala de artes, e quando entrei dei de cara com Viollet, ela estava recolhendo suas coisas.

Ela me viu e corou, então terminou de pegar suas coisas e passou por mim de cabeça baixa.

Entrei na sala e vi seu caderno de desenhos em cima da mesa, eu não resisti em vê-los, e haviam vários desenhos de pessoas conhecidas, e então eu vi um desenho meu, e eu estava sentada nas escadas da escola com um rapaz ao meu lado... Kentin novamente... Com um sorriso  nos lábios e estava com uma bolacha recheada em mãos, era um desenho lindo e muito bem feito, Viollet gostava de ver as pessoas pelos seus desenhos, fazia mais sentido do que falar com elas diretamente, temos isso em comum, eu prefiro o meu mundo, onde eu posso ser feliz, do que o no qual vivemos.

Peguei uma folha nova, tintas, pinceis de diferentes tamanhos e espessura, e um avental para não sujar a roupa, peguei na bolsa uma bandana vermelha e coloquei no cabelo.

Então comecei com leves pincelados em vermelho vivo, eu apenas deixava fluir os sentimentos, e as pinceladas iam se tornando algo uniforme, algumas gotas de tinta respingavam no avental e no meu rosto. Eu troquei o a cor do pincel para um azul fosco, e usando um pincel mais fino contornava algumas formas que se tornaram olhos sem vida e perdidos.

Eu não pretendia voltar para a aula tão cedo, não queria sair dali, eu poderia passar o dia pitando que eu não me arrependeria, para mim era como meditar, era um alivio.

Mas por mais prazeroso que seja, eu sabia no fundo no fundo que eu teria de enfrenta-lo, mais cedo ou mais tarde.

Troquei novamente a cor do pincel para um bege, bem fraco, e um pincel de espessura mais grossa, e então um rosto se formou, para aquele fundo vermelho vivo, e olhos sem foco.

E no fim lábios e bochechas rosadas, a pintura ficara desfocada, sendo um pouco difícil distinguir oque é, mas ficara lindo.

Fiz alguns retoques, como sobrancelhas, cabelos e etc, e ainda por fim coloquei mais alguns pequenos detalhes, como rosas azuis fortes. E também alguns outros detalhes para o fundo, como outras cores, e assim deixando um pouco velho e antigo o desenho.

–Ficou lindo.- Estremeci ao ouvir sua voz, me fazendo arrepiar por completo, fiquei sem palavras, não tinha coragem para me virar.

A chuva leve e sutil que começara a um tempo atrás, se intensificara de modo assustador, uma chuva ruim, uma chuva, um rio de lágrimas, eu estava sufocada, e era como se aquela chuva desabasse sobre mim.

Ele se aproximou e encostou o nariz no meu pescoço.

–Senti saudade desse cheiro, baunilha...

Eu fiquei completamente arrepiada, estava com medo, e muito frio, estava assustada, e com medo do que aconteceria as seguir.

A chuva ruim, caia, sem cessar, era como se aquela chuva ruim caísse sobre nossas cabeças, o teto não existia, estávamos expostos as lágrimas de nosso passado doloroso, estávamos molhados, encharcados pelo orgulho, e pelo medo, estávamos infectados com nossos venenos. Estávamos presos as correntes que nos acorrentávamos juntos. Era assustador.

A nossa flor morreu, mas ele trouxe novas e irá cuidar delas, até elas também morrerem, eu quero joga-las longe, quero sumir com ele da minha vida, mas nossas correntes, me puxam de volta.

Eu me virei e dei de cara com aqueles olhos verdes, aqueles lindos olhos verdes, que estavam sugando tudo dentro de mim, toda minha sanidade.

Ele se aproximou sem tirar os olhos dos meus.

–Seus olhos Anne, são os mais hipnotizantes, são os mais belos, são seus olhos, e você é minha garota, esses olhos sempre serão meus.- disse ele selando nossos lábios sem eu poder reagir, fugir, gritar ou protestar. Eu estava presa a aquela chuva ruim que me fazia lembrar, de tudo que eu sempre tentei esquecer.

Ele me trouxe flores novas, mas dessa vez, não deixaria joga-las fora.