Estou acordando lentamente, abro meus olhos para tentar enxergar o que está em minha frente, um vulto. É meu irmão, Miguel, está olhando fixamente para mim com seus olhos castanhos escuros e seu cabelo liso voa no ar toda vez que o vento bate em nossa janela, ele está com vontade de dizer algo ou apenas querendo chorar em meus braços como fez ontem. Claro, como ele não estaria nervoso, Presidente Snow anunciara o Segundo Massacre Quaternário semanas atrás falando que seria o dobro de tributos, nossas chances dobraram e hoje já é a colheita.

Abraço ele bem forte para que ele se sinta protegido, não vou deixar que nada aconteça com ele, não será a Capital que irá tirar ele de mim, ele é meu irmão. Nossa mãe, Laura, entra no quarto e vê que Miguel está muito abalado por causa da colheita, nossa mãe, aquela que nos deu a vida não poderá fazer nada para impedir caso sejamos escolhidos na colheita.

Eu não estou preocupado, já fui a colheita 4 vezes, a mulher estranha da Capital fala umas bobagens, passa o filme enviado da Capital e depois põe suas mãos nas bolas gigantes com vários nomes e puxa um nome, mais uma vida se encerrando a partir daquele momento. O Distrito 12 nunca teve nenhum participante que ganhou os Jogos, os carreiristas, tributos que treinam toda sua vida para participar estão em boa forma, às chances de um tributo de outro distrito ganhar é mínima, ainda mais no nosso distrito que é o mais pobre.

Depois de alguns minutos Miguel se recompõe e foi se arrumar para a colheita. Estou indo para casa de Alice, minha namorada, que também deve estar igual meu irmão ou talvez até mais nervosa. Lembro do ano passado que ela estava muito nervosa e quase desmaiou na praça.

Queria meu pai aqui, Carlos, não lembro muito dele, pois eu tinha apenas 8 anos quando ele morreu e Miguel tinha apenas 4. Moreno, alto, engraçado, minha mãe e meu pai se conheceram no Prego, um mercado negro do Distrito 12. Meu pai trabalhava nas minas do Distrito 12 e minha mãe vendia mercadorias no Prego. Mas não quero lembrar dele, morreu por causa do álcool, uma dor lenta, cada copo era um dia a menos em sua vida. Muitas das minhas lembranças dele são envolvidas com raiva, ele brigava com todos enquanto estava bêbado e eu odiava isso.

Estou indo para a casa de Alice que mora logo na esquina, enquanto estou caminhando vejo as mães chorando com seus filhos, todos se arrumando com as roupas da colheita, uma blusa azul, calça cinza e sapatos marrons. Quando estou quase chegando à casa da Alice alguém pula em minhas costas, vejo seus cabelos loiros voando pelo ar devido à velocidade que ela correu. Só quero aproveitar este momento.

– Oi, amor - cumprimenta Alice. Não quero falar nada, apenas beijo seus lábios. Sentamos na pequena escada que tem em frente de sua casa, ela está com a cabeça em meus ombros, ela deve estar longe, seu olhar vaga sobre o Distrito 12.

Ouço o sinal. É hora de ir para a colheita.

– Alice me espere aqui que irei buscar Miguel para irmos juntos a colheita - digo.

– Tudo bem, estou te esperando - responde ela.

Corro para minha casa, percebo logo que Miguel está nervoso pelas batidas que ele está dando no chão com seu pé. Pego a mão dele e caminhamos até a casa de Alice para irmos juntos a colheita.

Chegamos à praça, todos já estão se organizando. Falo para Miguel o que ele deve fazer, observo ele ir fazer a inscrição e ir para uma das filas que está em frente ao palco enorme onde irá ter o sorteio, se é que posso falar assim, não quero ganhar esse sorteio de jeito nenhum.

Abraço Alice forte, e dou meus últimos beijos nela.

– Vamos se inscrever logo - diz ela.

– E que a sorte esteja sempre a seu favor - digo rindo.

Caminhamos para fila e esperamos silenciosamente. Vai começar, ela está indo para outra fila. Tento procurar Miguel, mas não consigo enxergar ele em nenhum lugar. Uma mulher com o cabelo azul, sim é ela, Pount. Todo ano é ela que faz a colheita, esse ano ela mudou a cor do cabelo de novo. Ela entra no palco e começa a fazer seu discurso. Estou nervoso porque não acho meu irmão, não estou prestando atenção em que Pount está falando, só quero achar ele! Está na hora do sorteio e Pount começa a agir:

– Primeiro as damas! E vai até a bola com os nomes das garotas. Ela se aproxima da bola, põe sua mão lá dentro e roda sua mão sem parar até puxar duas tirinhas de papeis. Então ela grita:

– Maysilee Donner e Carly Jey.

O silêncio toma conta de todos, as duas se encaminham para o palco. As famílias das duas tentam fazer algo, mas os pacificadores nunca deixam. Estou feliz por Alice, que não fora escolhida. Nenhum voluntário começo a pensar se Miguel for sorteado, eu me oferecia por ele?

Começo a tentar identificar quem eram essas meninas. Reconheço Maysilee do Prego, já a vi algumas vezes indo com sua mãe fazer trocas lá e Carly nunca tinha visto antes.

Pount acomoda as duas garotas no canto esquerdo do palco e vai em direção a bola dos meninos. Estou rindo e esperando ouvir o nome dos próximos mortos.

Pount puxa apenas uma tirinha de papel e fala o nome do próximo morto:

– Lucas Kulock.

Não sou eu, não é Miguel. Não me importo. O garoto ao chegar no palco desaba e começa a chorar. Quero dar várias gargalhadas da cara dele. Pount tenta acalmar o garoto e fala ao microfone:

– Porque tanto desespero? Na viagem para Capital tem várias coisas legais, você poderá aproveitar tudo, mesmo que seja só por alguns minutos. Ela da um sorriso. - Vamos terminar logo isso porque já estou suando e minha maquiagem vai borrar. Ela segue em direção a bola dos garotos e tira uma tirinha de papel que estava lá no fundo. Penso comigo, qual será o próximo tributo do Distrito 12 que irá morrer no banho de sangue?

– Haymitch Abernathy - grita Pount.