Premonição 6: Inferno escrita por Lerd


Capítulo 2
Garoto Perdido


Notas iniciais do capítulo

Capítulo 2 postado gente! o Nele, o acidente. Espero que gostem e comentem! :D
E ah! Sim, o nome do capítulo vem da história do Peter Pan, vocês entenderão o porquê XD



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René pulava de uma cama para a outra no quarto de hotel.

— Para. — Hank pediu. — Você tá bagunçando tudo.

O ruivo ignorou. Continuou pulando e respondeu:

— E pra que nós estamos pagando o serviço de quarto?

— Você não está pagando nada. Não sei se você esqueceu, mas a gente não tem dinheiro pra esse hotel. Quem tá pagando tudo é o Seu Vladmir.

— Tanto faz. — René resmungou, não querendo dar o braço a torcer.

Mas logo se cansou. E então relutantemente se sentou na cama, esperando que essa atitude não fosse vista pelo amigo como um sinal de fraqueza, como se ele estivesse fazendo a vontade de Hank.

— É hoje que você vai encontrar com aquele cara da internet pra vender aquela tal figurinha rara de beisebol? — Hank perguntou.

— É sim. — René respondeu ainda ofegante. — O nome do cara é Aaron. Ele é bem baixinho.

— Como você sabe? Você só conhece ele online. Vocês se encontraram num fórum de fãs de beisebol, não?

René concordou:

— Foi isso mesmo. Mas ele me avisou que era baixinho, daí ficaria mais fácil de eu achar ele.

Hank então entendeu a situação. Desligou a TV que passava um noticiário qualquer e foi até a sacada do quarto. Lá embaixo a vista era belíssima: havia uma piscina gigantesca, com diversas cadeiras de sol ao redor delas. Mais adiante havia a praia, com o mar a perder de vista. Os dois estavam instalados no décimo terceiro andar, então todas as pessoas no térreo pareciam formigas. O dia estava claro e ensolarado, e havia muitas atividades acontecendo por todo o resort.

— Vamos descer. — René decidiu-se, de repente.

— Não. — Hank falou. — O Vladmir pediu pra gente esperar, ele quer conversar conosco.

René mostrou a língua e saiu, batendo a porta. Criança, Hank pensou, mas não disse.

O quarto de Jill ficava ao lado do quarto deles, e o ruivo bateu na porta com certa delicadeza que não lhe era peculiar. A garota atendeu na segunda batida.

— Que... Surpresa. — Ela disse, sorrindo, e deixou que o namorado entrasse.

O quarto de Jill era exatamente igual o dele e de Hank, com a diferença que ao invés de duas camas de solteiro, havia uma cama de casal. Além disso, o quarto dela estava muito mais desorganizado: havia roupas espalhadas por todos os lados, secador de cabelo e toalhas em todos os cantos. E depois dizem que meninos é que fazem esse tipo de coisa. Tsc, tsc.

— Deixa eu te mostrar a roupa que vou usar hoje quando formos visitar as ruínas. — Jill disse, entusiasmada. Algumas vezes René se cansava da namorada e das suas frivolidades. Ela parecia ser muito fútil, e raramente se importava com coisas que realmente valiam a pena. Em geral seu mundo era restrito a roupas, maquiagem e comédias românticas, e isso frustrava René. Como se eu fosse um exemplo a ser seguido, o rapaz pensou amargamente.

Verdade fosse dita, ele mesmo estava bastante aquém do ideal de um namorado. As críticas mais comuns à sua personalidade davam conta de que René era muito infantil e imaturo. A primeira parte podia ser verdade: ele realmente não tinha muita vontade de crescer. Mas imaturo jamais. René tinha plena consciência de suas atitudes infantis, e se as fazia, fazia com total consciência.

— Essa está bonita. — René respondeu, para a primeira peça de roupa que a namorada lhe mostrou. Jill olhou para ele sem entender muita coisa, e o rapaz continuou: — Sério, essa está linda. Você fica maravilhosa nela.

E sorriu largamente, esperando que aquela mentira lhe livrasse da chateação.


x-x-x-x-x

Vladmir dirigia o jipe calmamente, a caminho das ruínas maias de Tulum. Hank estava ao seu lado, enquanto Jill e René estavam sentados atrás. O dia estava ensolarado, e só René não usava nada na cabeça. Vladmir tinha seu chapéu de cowboy, Jill usava um chapéu de sol, e Hank estava com uma viseira branca que o ruivo achava muito feia.

— Seu Vlad, eu posso perguntar uma coisa pro senhor? — René disse, de repente.

O velho riu e olhou para René pelo espelho.

— Pode sim.

Vladmir era bastante simpático, e René o via praticamente como seu avô. Ele conhecia o velho desde que Dawn o adotara, há mais de quatorze anos, e os dois eram bastante próximos um do outro.

— Por que o senhor gosta tanto dessas ruínas? Quero dizer... O senhor vem sempre aqui. Isso nos últimos dois... Anos. — René terminou sua frase percebendo que acabara de entrar em um território delicado.

— Eu acho que você já percebeu o motivo enquanto falava, não? — E René não respondeu, tímido. — Mas é isso mesmo que você está pensando. O motivo de eu viajar tanto para aqui nos últimos dois anos, é Edna.

— Edna é quem? A sua mulher? — Jill perguntou. René meneou a cabeça positivamente, respondendo pelo velho.

— Sim, era minha adorada esposa. Ela faleceu há dois anos, durante um assalto a um banco. Nós nos conhecemos aqui, em Quintana Roo. Ela era uma guia turística, e eu estava na minha viagem de formatura... — E então Vladmir pareceu remoer lembranças. — Eu venho aqui para... Não sei, talvez ficar mais próximo dela.

René já imaginava tudo aquilo. Hank parecia estar consternado com a história, e Jill estava a ponto de chorar. Que mulherzinha...

— Bom, mudemos de assunto. Chega de falar de coisas ruins! — Vladmir declarou. — Quando começa esse famoso festival de cinema que nós viemos ver?

René achou graça de Vladmir se incluir no grupo.

— Daqui dois dias. Vai ser da hora! — O ruivo respondeu.

Vladmir concordou, rindo. Um vento forte então bateu, e o chapéu de Jill voou para longe.

— Oh! — Ela exclamou. — Nós não podemos parar para pegá-lo?

O ruivo piscou. Quando abriu os olhos e virou-se na direção da namorada, ela ainda estava com o chapéu. Mas então um vento bateu e a garota o perdeu. René já sabia o que ela diria antes mesmo de ela dizer.

— Oh...

— Nós não podemos parar para pegá-lo? — René repetiu, sentindo-se estranho. Jill olhou para ele confusa, e Hank deu risada.

— Nossa, você gosta daquele chapéu mais do que a Jill... — E riu alto.

Isso está errado, René pensou. O que foi que aconteceu? Eu vi o chapéu sair voando antes de ele sair? Não. Devia ser só a dor de cabeça causada pelo sol escaldante. Ela era o suficiente para deixar qualquer pessoa meio confusa. Vai dar tudo certo, a mamãe me disse. Tudo vai ficar bem...

x-x-x-x-x

Pam e Brody andavam por todos os lados das ruínas de Tulum, observando cada detalhe. A mulher usava um vestido preto florido, bem como um escandaloso chapéu de sol com uma violeta presa a ele. O filho estava com uma camisa polo branca e um par de calções cinza.

— Olha, mãe... — Brody começou, apontando para uma marca na parede de pedra, mas então um homem passou rapidamente por ele, esbarrando no rapaz e o derrubando no chão com força.

— Ei! — Pam exclamou.

— Não olha por onde anda, babaca? — Brody reclamou.

O homem virou-se. Ele estava ao lado de uma mulher muito elegante, que usava um vestido branco que ia até os seus pés. Os dois viram quando o homem ficou vermelho de fúria, mas então a mulher elegante tocou o seu braço e o acalmou:

— Vamos, Marsellus. Você está nervoso.

O tal Marsellus olhou uma última vez para Pam e a mulher sentiu que morreria ali mesmo. Ele tem o mal no olhar. Meu Deus, eu nunca vi olhos como estes. E uma onda de eletricidade percorreu o corpo da mulher. Quando o homem afastou-se, ela sentiu como se a paz tivesse voltado para o seu mundo.

— Você está bem, filho?

Brody concordou meneando a cabeça e retirando a poeira de sua roupa.


x-x-x-x-x

— É aqui. — Vladmir apontou, quando eles chegaram as tais ruínas. Eles entraram no lugar no mesmo instante. Lá dentro estava mais fresco e o sol não os atingia.

René admirou a construção por breves segundos, e então já ficou entediado. Ele não gostava muito de visitar lugares turísticos. Era sempre a mesma chateação. O rapaz preferia a aventura, e aquelas ruínas pareciam não oferecer aventura alguma. É um monte velho de pedra, ele pensou.

— O Aaron vai chegar daqui a quinze minutos, para comprar a carta. — René confirmou, olhando no seu relógio. — Vocês podem andar por aí, eu fico aqui esperando.

Vladmir e Jill concordaram com o rapaz e saíram. Hank então arregalou os olhos. Discretamente cutucou René e apontou para uma mulher loira há vários metros de distância.

— Me diz que você também está reconhecendo ela.

René começou a reparar na loira, esforçando-se para lembrar-se de quem ela era. Eu não a conheço, pensou. Hank então lhe deu um tapa no braço e apontou para a bunda da mulher. Quando o ruivo pôs os olhos naquela parte da garota, reconheceu-a no mesmo instante. Perguntou:

— Aquela é a Cherry? A Cherry Fox? — E, cochichando: — A atriz pornô?

O amigo confirmou com a cabeça, e riu.

— Cara, será que pega mal eu ir pedir um autógrafo?

O ruivo ignorou-o. E então começou a observar tudo ao seu redor. Viu uma mulher com duas crianças gêmeas num carrinho de bebê. Viu um casal brigando, e viu quando a mulher desse casal jogou uma garrafa de água no rosto do marido. Viu uma senhora velhinha cair e ser amparada por uma adolescente. Viu também uma garota ruiva tatuada com um sagui de estimação de verdade no ombro. Por último viu uma belíssima moça morena entrando nas ruínas com uma bicicleta. A moça estava com uma câmera no pescoço e olhava para todos os lados. René observou a camiseta dela, parecia ser parte de um uniforme, como se a garota fizesse parte de algum time de vôlei ou algo assim. Na camiseta estava escrito, atrás: “Chrissie”. É uma gata, René pensou distraído. E então viu Aaron.

O homem era realmente baixinho. Ele deveria ter no máximo um metro e cinquenta, exagerando. Além disso, era muito branco. Era talvez a pessoa mais branca que René havia visto em toda a sua vida. O homenzinho usava uma camisa xadrez bordô, e estava com óculos de sol. Quando ele o tirou, o ruivo pôde avaliá-lo por inteiro. Aaron tinha as maiores orelhas que René já havia visto em toda a sua vida, e havia um brinco de brilhante discreto em cada uma delas. Além disso, ele tinha o nariz grande e a boca pequena. Só se salvava o seu belo par de olhos azuis e o seu topete louro platinado. De resto, era bastante feio. Ele parece um oompa loompa.

— Você é o Peter? Peter Pan? — Aaron perguntou, ao se aproximar.

— Eu mesmo. — René confirmou. Peter Pan era o apelido que o ruivo usava online. Ele gostava do personagem porque achava que combinava muito com a sua própria personalidade. Eu sou um garoto perdido.

E então, antes que ele pudesse trocar mais qualquer palavra com Aaron, as ruínas começaram a ruir. E, como toda reação em cadeia, as coisas começaram de maneira lenta e silenciosa. A primeira coisa que René ouviu foi barulho de pedras rachando, um som delicado e fraco, um estalido. E então sentiu a poeira subindo e deixando todo o local meio enevoado. O resto aconteceu em questão de segundos.

Vladmir estava mais ao longe, analisando umas escritas nas paredes, e não percebeu o desastre que havia se iniciado. Ao lado dele estava uma mulher de vestido preto florido. René gritou ao perceber o pedaço de pedra que iria cair do teto, mas o velho não ouviu. Ele estava muito longe.

— Vlad!

E então Vladmir foi brutalmente esmagado pela pedra, ao lado da mulher de vestido preto. Os dois tornaram-se uma massa disforme e nojenta. René virou o rosto e vomitou.

O pânico tomou conta das pessoas com uma rapidez incrível. Todos começaram a sair, enquanto o lugar começava a desmoronar. René conseguiu ver Jill correndo junto de um grupo de pessoas e conseguindo escapar. Ainda bem. Quando Aaron tentou fazer o mesmo, junto de um novo grupo de pessoas, uma enorme viga de pedra caiu. Ao lado dele estava a garota morena da bicicleta, Chrissie, e René viu ambos serem esmagados. A cabeça da morena foi decapitada exatamente na altura do pescoço, e rolou por alguns metros, quicando uma vez. Várias pessoas gritaram.

As ruínas estavam definitivamente bloqueadas. A escuridão tomou conta do lugar, e antes que pudesse perceber, René tinha se perdido de Hank. Só os gritos eram audíveis, misturados com a respiração pesada e o desespero latente. Nós vamos morrer... Maldito monte de pedras! Maldito!

— Hank! Hank!

René virava-se de um lado para o outro, procurando algum sinal de luz que deixasse algo visível. Foi dessa maneira que o rapaz acabou vendo Cherry. A garota estava parada bem em um lugar por onde entrava uma fresta de luz de um pedaço de pedra que havia caído. Seria poético se não fosse trágico. É como se houvesse um holofote iluminando-a. Ela estava assustada, com a maquiagem borrada de tanto chorar. René apiedou-se e correu na direção dela, mas antes que ele pudesse fazer qualquer coisa, sentiu um tremor. Oh, não, um terremoto. É só o que faltava. O ruivo caiu no chão com brutalidade, e, ao olhar para Cherry, percebeu que ela havia caído com o pescoço exatamente na direção de uma pedra pontuda, perfurando grotescamente o seu pescoço. Algum sangue escorreu, e a luz do sol refletiu na poça rubra, enquanto alguma poeira subia. Se René fosse mórbido o suficiente, poderia ter achado aquela uma belíssima morte.

— Está caindo na encosta! — Alguém gritou, e René não soube dizer quem fora. — As ruínas estão caindo.

E então outro tremor foi ouvido, e de repente viu-se um clarão. Aquilo machucou os olhos do ruivo, que já havia se acostumado com a escuridão. Uma das paredes das ruínas, a que ficava na encosta, havia cedido, e levou diversas pessoas consigo. René conseguiu observar a mulher ruiva tatuada com o sagui, um rapaz loiro de boné, e um negro com dreadlock nos cabelos. Todos eles foram arrastados junto com as pedras que rolaram encosta abaixo, e foi claramente audível o barulho de pedra se chocando contra carne e ossos. A cabeça de René doía mais do que nunca.

Toda a estrutura voltou a tremer. E então René encontrou Hank. Ele estava segurando o braço de um rapaz que estava caindo através do buraco que fora aberto e por onde a ruiva tatuada e os outros foram.

— Me ajuda! — O rapaz gritava. Ele usava uma camisa polo branca e calções cinza.

René rapidamente começou a puxar o outro braço do rapaz. Quando ele estava de volta em um lugar seguro, o ruivo olhou instintivamente para trás, e viu que todo o lugar iria desmoronar de vez. As pedras caíam freneticamente, e pessoas eram esmagadas sem dó. Ele viu quando uma mulher loira elegante e um homem loiro com olhos maldosos foram engolidos por um pedaço gigantesco de pedra. Os dois acabaram se tornando uma mesma massa retorcida, sem ser possível identificar quem era quem. O braço da mulher foi decepado e caiu ao lado dos três rapazes, com um anel de diamante em um dos dedos brilhando com a luz do sol.

— Nós precisamos descer a encosta. — O rapaz que Hank salvara disse. — Nós podemos descer pelas pedras que caíram.

Os outros dois concordaram. Qualquer plano era melhor do que ficar ali para morrer. Oh, Deus, me ajude. A mamãe falou que tudo ia dar certo, que ia ficar tudo bem. Ela não mentiria para mim. Por favor...

O rapaz foi na frente. Hank ia no meio, e René estava trás. Além deles havia poucas pessoas vivas, a maioria machucada ou agonizando. Quando os três chegaram à beirada da encosta, René sentiu uma vertigem. O lugar era absurdamente alto, e a única maneira de descer era ir “escorregando” pelas pedras que haviam deslizado. Qualquer deslize seria fatal.

— Isso é suicídio. — Hank reclamou.

— Se a gente ficar vamos morrer do mesmo jeito. — O rapaz disse, e começou a descer.

Um forte tremor foi sentido, e então o rapaz escorregou para a morte. René o viu caindo em queda livre, batendo os braços, e então viu quando seu corpo se chocou com as pedras muitos metros abaixo. Hank também não teve sorte, e caiu ao lado do rapaz. Mas, ao contrário do outro, ele estava vivo.

— Fica firme aí, eu estou descendo! — René gritou.

Mas Hank não respondeu, apenas gritou um gemido de dor de cortar o coração. O ruivo observou com mais clareza, e viu que um osso da perna do amigo havia sido exposto, e ele não conseguia se mexer. E então as pedras começaram a deslizar, e o mágico foi engolido por elas. René queria gritar, chorar, espernear. Mas não podia. Não havia nada que ele pudesse fazer. Hank estava morto, como todos os outros.

Resignado, sentou no chão, sem importar-se onde. Fechou os olhos. Lágrimas correram por seu rosto, e então ele sentiu o vento contra sua face. Abriu os olhos e percebeu que estava em queda livre, voando como um pássaro. O cheiro de maresia inundou o seu nariz, e o rapaz sentiu-se em paz. Aquela era a melhor sensação de todo o mundo. Voar...

E então subitamente seu corpo chocou-se com as pedras cinzentas, e René não sentiu mais nada, enquanto sua carne era dilacerada e ele era feito em pedaços.

Piscou.

— Me diz que você também está reconhecendo ela. — Hank disse, com os olhos arregalados.

Subitamente René estava de volta. As ruínas estavam intactas, e o amigo lhe apontava uma garota loira há alguns metros.

— Você está bem? René?

Mas o ruivo não estava em condições de responder. Vai acontecer. As ruínas... Vai tudo desmoronar. Eu preciso...

— Nós precisamos sair daqui... — Ele murmurou. — Vai tudo desmoronar, essas ruínas vão cair.

— René, para de brincar. — Hank retaliou.

O rapaz não deu bola para o amigo. Subiu em cima de uma pedra e começou a gritar para que todos ouvissem:

— Me ouçam todos, eu tenho um aviso sério para dar. Eu não sou um maluco. Eu não preciso que vocês acreditem em mim, eu preciso apenas que vocês façam o que eu estou pedindo. Saiam daqui. Vocês precisam sair daqui, esse lugar vai desmoronar. Eu vi! Eu vi no meu pensamento, eu...

E então subitamente estava no chão. Um homem estava em cima dele, e lhe deu um soco certeiro no queixo. René arfou, quase engolindo um de seus dentes que caíra. Ao lado deles estava uma mulher de vestido branco que tentava puxar o agressor, gritando:

— Para, Marsellus, você está matando o garoto!

René não conseguia pensar em nada, nem mesmo na dor que deveria estar sentindo. Eu preciso sair daqui, eu preciso. Ele então viu a garota da bicicleta, Chrissie, e Aaron ao lado dela. Ele correu até os dois, livrando-se de Marsellus, e puxou a bicicleta das mãos da garota.

— Tira a Jill e o Vlad daqui! — René gritou para Hank. E virando-se para Marsellus, que estava irado procurando ele: — E você vá tomar no cu! — E saiu pedalando.

Não olhou para trás para ver quem o seguia. Hank estava assustado, e não conseguia entender a reação do amigo. Tentou procurar Jill ou Vladmir, mas os dois já haviam desaparecido, correndo atrás de René. Ele viu também a garota da bicicleta e Aaron seguirem o rapaz. Por último ele viu o homem que havia atacado René e a mulher elegante de vestido branco saindo.

E então viu Cherry, ao longe, desamparada e assustada, sem entender nada do que estava acontecendo. Seu coração bateu mais forte e ele correu na direção dela. Se eu pensar muito eu não faço. Se eu olhar pra trás estou perdido. E então antes que a garota pudesse ao menos notar a sua presença, ele pegou-a no colo e saiu correndo para fora. A tal Cherry lhe dava socos no peito, mas ele quase não sentia. Deus, se René estiver mentindo isso vai ficar estranho.

Hank e a garota saíram no exato momento em que uma mulher de vestido preto e um rapaz de camisa polo branca saíam. O mágico jurou ter ouvido um barulho estranho, como se fosse o grito de um mico ou um sagui ou algo assim, mas não deu bola. Todos seguiram René, que pedalava de maneira mais lenta do que poderia.

— Minha bicicleta, seu maluco! — Chrissie exclamou completamente suada pela corrida.

— Você me sequestrou! Seu filho da puta! — Cherry berrou no ouvido de Hank.

E então tudo ficou confuso. Todos gritavam uns com os outros, e René queria apenas sumir dali. Jill e Vladmir estavam ao lado dele, e o velho discutia furiosamente com Marsellus, enquanto a namorada parecia bater boca com a mulher elegante de vestido branco. Chrissie chacoalhou René com força, e então o rapaz despertou.

— Vai... Desmoronar.

Ele terminou a frase e começou a acontecer. Os tremores. O terremoto?

— Oh... Merda! — Aaron disse. — Mas que porra, Peter Pan?

René sentou-se no chão e começou a chorar. Jill sentou ao lado dele e o abraçou, enquanto os outros tinham as mais diversas reações.

Cherry já não mais batia em Hank. Ela acabou por abraçá-lo, nervosa e assustada. O mágico sentiu sua camiseta molhada com as lágrimas da mulher, e a abraçou mais forte. Isso é bom. A garota da bicicleta mantinha-se atônita. Antes que alguém pudesse dizer qualquer coisa, ele pegou sua bicicleta e pôs-se a pedalar para longe, ignorando todos os outros. Ela foi pedir ajuda. Nenhum celular tem sinal aqui, Hank logo percebeu.

Enquanto René chorava sentado no chão, uma mulher aproximou-se dele. O ruivo levantou a cabeça e pôs-se a observá-la. Ela tinha a idade de sua mãe, e ele reconheceu o vestido preto florido dela. Ela estava na minha visão. Ela, a Chrissie, a Cherry, o rapaz de camisa polo.

— Rapaz, qual o seu nome?

— René. — Ele respondeu, entre soluços.

— René. — A mulher repetiu. — Belíssimo nome.

Perto dali, Vladmir discutia com Marsellus:

— Você atacou uma criança! Isso é inadmissível!

— Ah, cala a boca, velho. O moleque pirou, ele assustou a minha mulher.

Helena tentou protestar contra as palavras do homem, mas não conseguiu, pois Vladmir continuou a falar:

— Foram palavras. Palavras são vento. Você deu um soco no queixo do rapaz. Ele perdeu um dente, por Deus! Não há desculpas para isso.

— Eu sinto muito pela atitude dele, senhor... — Helena começou, mas Marsellus tapou a boca dela rudemente, e disse:

— Eu não vou me desculpar por isso, velho. E se você tem algum problema comigo ou com o que eu fiz, faça algo. Chame a polícia, qualquer coisa assim, vamos. Do contrário vá para o inferno que é o seu lugar.

Pam apareceu no mesmo instante, e tocou o ombro de Vladmir, pronta para brigar com o outro homem. Pronta para defender o rapaz que acabara de conhecer, mas que salvara a sua vida. Pronta para defender... Adrian. Eu acreditei nele, e eu ainda acredito. Mas ela não teve tempo.

Um tremor foi ouvido, e uma das pedras voou na direção do grupo. Aaron percebeu exatamente o que iria acontecer. Ele correu na direção dos dois e conseguiu puxar Pam no exato último segundo. Já Vladmir não teve a mesma sorte.

A pedra caiu exatamente em cima do corpo dele, esmagando-o com brutalidade. Algum sangue respingou no rosto de Marsellus e Helena, e a mulher gritou. Jill viu a cena e também gritou o mais alto que pôde.

Enquanto Pam se levantava com a ajuda de Aaron, ela ouviu o som de sirenes ao fundo. A ajuda chegou. Tarde demais. Ninguém pode nos ajudar. Nós estamos na lista. Na lista da morte. Nós vamos morrer, cada um de nós. Eu estou na lista...

Mais uma vez.


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Notas finais do capítulo

Agora, as explicações:
Gente, o fato de Marsellus ter atacado René vai ser explicado no próximo capítulo. Não foi "do nada". É aqui tivemos basicamente só a visão de René (tanto é que ele descrevia as pessoas pelas características físicas/o que estavam usando, porque não as conhecia), então ficou parecendo que o Marsellus foi um "maluco". Mas teve uma razão por trás, uma razão que fará sentido, e mostrarei no capítulo 3 :D
E sim, eu sei que faltam vários personagens aparecerem. Mas se vocês repararem bem, vários deles já apareceram nesse capítulo, de maneira discreta. Na verdade acho que só uma personagem não deu as caras de forma nenhuma ainda...
Enfim, capítulo 3 em breve! Enjoy!