Laila escrita por Solidão


Capítulo 16
XV


Notas iniciais do capítulo

Gente, então, me desculpem MESMO por ter sumido. Andei sobrecarregado de coisas para fazer, sem tempo nem de entrar no PC para postar coisas novas ou escrever.

Espero que me perdoem. Mas, daqui pra frente, vai ficar difícil de postar novos capitulos com frequência. Eu AINDA postarei, não vou desistir de Laila, mas só estou avisando que ficará complicado :)

Aqui vai o novo capitulo e novamente me desculpem :(



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E chegou o grande dia da peça. Laila estava nervosa, claro, mas não pela encenação ou pela falta de cenário que tinha. Estava com embrulhos no estômago só de imaginar beijar Thiago na frente de toda aquela gente.

Estava todo o Ensino Médio assistindo. Todos eles encarando os atores como abutres encaram a carniça.

Os outros atores aparentavam estar superficialmente tranquilos, como lagoas rasas. Riam, trocavam piadas sobre os figurinos – maltrapilhos, aliás – e contavam histórias sobre o final de semana em Búzios.

Como era o caso de Thiago.

O garoto estava apoiado num encosto de uma das cadeiras negras e quebradas do auditório. Os braços cruzados, os olhos sorridentes e a boca espalhando aos quatro ventos suas histórias do final de semana. Não parecia nem um pouco preocupado com a peça, aliás, parecia que não estava nem aí para o que poderia acontecer com a nota do grupo caso a apresentação não fosse meramente decente.

O que, com certeza, não seria.

Laila sentiu um ódio tremendo e uma vontade absurda de ir até lá e sacudir todos aqueles ‘atores’ pelos ombros, exclamando que ela precisava de nota para passar direto em português e que ela se importava, e muito!, em passar direto.

Mas não fez nada disso, simplesmente respirou e sentou em seu lugar, com o papel das falas na mão. Era sempre bom dar uma revisada nas cenas antes da grande apresentação.

Luna surgiu ao seu lado.

-Essa professora não chega nunca! – reclamou.

Laila abandonou a revisão de falas e virou-se para a amiga. Deu de ombros.

-Espero que ela demore bastante. Melhor, espero que ela cancele a peça – deu um sorriso fraco – Nossa apresentação vai ser uma merda, Luna.

A garota encarou Laila e lançou aquele sorriso encantador de sempre.

-É, eu sei – riu – Mas pelo menos a gente pode apresentar logo isso e esperar pelo próximo trabalho do ano – ela olhou ao redor – Espero que não seja uma peça.

-Espero que a gente não faça mais com aqueles garotos idiotas – Laila sussurrou. Luna gargalhou do comentário e concordou com um aceno da cabeça.

Acho que será interessante comentar, pelo menos brevemente, sobre as vestimentas do pessoal. Ok, não será muito interessante, pois esta não é uma apresentação de Hollywood ou dos palcos de São Paulo patrocinados pelo Santander, mas sim uma apresentação de escola, feita nas coxas, em cima da hora, com atores tão ruins quanto lagartixas e professoras magricelas e estressadas.

Mas, ainda assim, vou comentar sobre a vestimenta.

O protagonista, Thiago, usava uma blusa que pegara emprestada do pai, algo velho e surrado, mais parecido com um pano de chão (na verdade, era mais provável que aquilo fosse um pano de chão do que uma camisa). A calça do colégio e tênis pretos, coisas que eram completamente contraditórias com o personagem e a peça, que se passava no Nordeste, ou Bahia, ou Rio de Janeiro (ninguém do grupo se importou muito bem com esse fato, na realidade).

Laila usava um vestido branco, que ia uns centímetros depois do joelho, com alças finas e partes feitas de renda. Achou o trapo jogado em seu armário e decidiu que seria a melhor coisa que conseguiria para fazer a personagem em meio milhão de anos. Resolveu deixar o cabelo solto, mesmo que preferisse mil vezes os fiapos presos num rabo de cavalo, ou numa trança.

Já Luna conseguia ficar esplêndida metida naquelas roupas velhas e sem graça. Como a garota interpretava um tipo exótico de beata (vulgo: Uma beata que se arrependera de ser beata), estava metida num vestido que ia até as canelas, um xale negro e o cabelo arrumado de um jeito para parecer decente. Ou até mesmo feio.

Ela nunca conseguiria isso.

O restante não é importante. Resume-se que todos estavam metidos em roupas velhas que encontraram em seus armários, blusas descosturadas, calças do colégio, ‘saiotas’ bregas e sapatilhas ou meias brancas. Nada interessante, nada bonito, nada decente.

Aquela peça seria realmente uma furada. E a nota de Laila nãos seria nada agradável de se ver.

Mas, vamos confessar, que no fundo Laila não estava muito preocupada com a peça. Sim, ela precisava de nota para passar e sim, ela definitivamente odiava fazer um péssimo trabalho de escola, mas o que mais lhe ocupava a cabeça eram dois assuntos importantíssimos: A peça de Abelardo e Luna.

Aquela história doida do sonho ainda importunava os pensamentos da garota de quando em vez. Não gostava de ficar lembrando como se sentira durante o sonho, ou como gostou absurdamente do beijo que a amiga lhe deu, e nem mesmo de como parecia que Luna queria beijá-la na sexta-feira anterior, antes da aula de meditação.

Oh, sim, ela ainda pensava muito naquela sexta-feira. E como pensava. A cada segundo aquela cena voltava a sua mente e não deixava Laila lembrar se na cena 3 da peça ela deveria esbofetear Renato ou se ela deveria discutir com Serena.

(Acredito que se Renato continuasse a blasfemar sobre sua nota de matemática, ela preferiria mil vezes esbofeteá-lo).

Acredite se quiser, caro leitor, mas essa cena percorria mais os caminhos de seus neurônios do que o assunto “Abelardo e sua peça fenomenal” ou então “Abelardo e sua nova amiguinha idiota do nono ano”. Ou algo do gênero.

Aliás, justamente naquele segundo, ela estava pensando na cena de sexta-feira. Enquanto os olhos, vidrados, estavam fixos no palco de madeira do auditório da escola, a cena ia e vinha em sua mente e ela se fazia a mesma pergunta: “Será?”. E sua consciência respondia rápida e agressivamente: “É claro que não, estúpida!”.

Enquanto que seu inconsciente dizia que ela só saberia se, ora essa, perguntasse ou testasse. Mas testar como? Espera. Testar o quê?

Laila não conseguia parar de formular perguntas sobre aquela cena, como se estivesse vendo tudo em slides, numa tela de computador, e a cada segundo fizesse anotações mentais diferentes, num bloquinho de anotações do Windows ou power point. Ela anotava cada expressão facial de Luna, como ela sorrira, como ela se inclinou para Laila, como ela segurou sua bochecha com a mão e sorriu. E como ela pareceu levemente decepcionada quando ouviram, ao mesmo tempo, Serena subindo as rampas da escola para se unir às amigas.

Ela não conseguia parar de formular cenas, pergunta e hipóteses.

Santo Deus, sua cabeça ia estourar!

Por um breve segundo, eu realmente achei que ela fosse me beijar, mas... Ela não é disso, ou é? Ela não parece que gosta de... Disso.

“E você também não!!!”, berrava a consciência em seu ouvido, “É só a sua imaginação, sua maluca, você não gosta dessas coisas. Ou vai me dizer que é igual à Juliana? Hein?”.

Laila desviou o olhar gradativamente para Juliana, usando uma batina de vigário que conseguira emprestado de um parente qualquer, revisando o texto, sentada no palco de um modo... Estranho, digamos assim, e com os cabelos confortavelmente presos num rabo de cavalo malfeito.

A garota se imaginou como Juliana. Engoliu em seco.

Não, não sou como ela. Eu não gosto dessas coisas...

Ao seu lado, Luna tocou seu ombro.

-Laila, eu vou no banheiro, você quer ir comigo?

Automaticamente, ela deu de ombros. Seu cérebro havia colocado suas atitudes e falas em modo de ‘piloto-automático’, para que sua mente pudesse vagar livremente pelo país dos pensamentos insanos e completamente birutas que ela tinha.

Voltou a pensar em Luna e sua mão quente.

Não era possível. Ela refez, novamente, todos os movimentos e falas da amiga na sexta-feira.

Luna sentou-se. Luna sorriu, se bem que ela vivia sorrindo, então... Luna falou com Laila sobre Thiago. Luna virou-se para Laila, o rosto quase colado ao dela, as pontas dos narizes quase se tocando. Luna sorriu, novamente, e acariciou o rosto de Laila, exatamente como fizera no sonho. Luna e Laila se encararam por meros segundos. A voz de Serena surgiu na cena, atrapalhando tudo. Luna pareceu decepcionada, angustiada, nervosa e Laila não pôde deixar de pensar que a amiga queria beijá-la.

Engoliu em seco. Deus, tudo aquilo parecia muito claro para uma parte de Laila e também parecia muito obscuro.

Luna poderia ter agido daquele modo apenas por ser amiga de Laila, ora essa, ela queria transmitir seu carinho de amiga para a outra e isso aconteceu por meio de uma carícia na bochecha.

Enquanto que, por outro lado... A amiga nunca tocava nossa protagonista daquela forma, com aquela expressão. Sim, elas se abraçavam de vez em quando e ficavam bem próximas também, mas nunca daquele jeito. Nunca com aquelas expressões. A garota parecia decepcionada ao ouvir a voz de Serena! Decepcionada! O que ela queria que Laila pensasse?!

Estou ficando maluca, isso sim, a garota concluiu.

-Laila! – Luna gritou pela enésima vez – Eu estou te chamando há mil anos, ficou surda de repente?

Laila piscou algumas vezes e evitou olhar nos olhos da amiga.

-O que houve?

-Vai começar a peça, a professora acabou de chegar – ela disse.

Só então Laila notou que as duas já estavam de volta ao auditório, com as luzes levemente apagadas, e a professora as encarando. Laila estava em cima do palco, atrás das cortinas.

Meu Deus, acho que tenho algum tipo de amnésia.

-Podemos começar? – a voz da professora ecoou nas paredes de madeira.

-Sim – Laila soltou.

No segundo seguinte, reparou que Luna a encarava do mesmo modo que na sexta-feira. Os olhos fixos, a boca parada num sorriso de Monalisa, os braços cruzados e uma expressão... Que Laila não conseguia definir.

As cortinas se abriram. Começou a peça.


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