Podiam chama-la de bruxa, de monstro, do que quisessem, mas enquanto subia aqueles degraus cinzentos e gelados que levavam até a entrada da torre de gelo deixou uma lágrima, única e quente desenhar seus traços.

Não era por ter batido em Merlin, já havia feito coisa muito pior a ele, também não era por causa das pessoas em volta que caíram na gargalhada, não, pelo contrário, aqueles risos lhe fizeram bem, levantou seu ego, o verdadeiro motivo daquela lagrima solitária fora um sentimento pior, algo que precisou e precisaria aprender a não sentir mais.

A magoa e a decepção era algo reservado aos que tinham um coração e isso, segundo os outros, já havia virado gelo antes mesmo de chegar aquele inferno congelado, mas ainda havia alguma coisa, bem fundo, um resquício de esperança.

Agora Merlin estava ali, sendo carregado por mercenários, o rosto em um vermelho tão vivo que parecia arder como fogo, aquela marca era seu maior orgulho, orgulho que ele lhe tirou há vários anos.

Ela deu ordens para que ele fosse posto preso no lugar mais abaixo do castelo, porém acima da pedreira.

Morgana subiu para seu quarto, na tentativa de esquecer o passado, algo que já havia feito anos antes, mas que por algum motivo, voltava a ela como pontas de gelo perfurando sua pele até chegar em lugares remotos dentro dela, ela sabia que o único culpado era Merlin, sempre seria ele.

Ela sabia que já devia esperar por algo assim, afinal sempre acontecia algo inexplicável em Camelot, e Merlin já a havia traído uma vez, mas a dor fazia o fato parecer recente.

Agora, deitada em sua suposta cama, lembrava claramente, ela estava desesperada naquele dia, seus sonhos pioravam cada vez mais e coisas aconteciam quando acordava assustada, precisava de ajuda e foi atrás da única
pessoa em quem poderia confiar : Gaius.

Antes tivesse esperado, tivesse guardado seu segredo para si, mas não. Gaius não estava em seus aposentos, fora recebida pelo seu  ajudante do médico e servo de seu irmão, que agora repousava em suas masmorras, Merlin sempre fora um menino simpático os dois compartilhavam segredos e ela já havia convencido seu irmão a salva-lo.

- Gaius esta? – ela não se preocupou em bater, seus pés já denunciavam sua chegada.

- No momento não, deve voltar logo – falou, meio preocupado.

- Preciso falar com ele, onde está? – sua cabeça não estava lá, precisava muito de conforto e Gaius era o único que havia a protegido desde que chegará aquele castelo.

- Foi ver o rei. O que há de errado? – ele parecia preocupado e por mais que não gostasse de vê-lo daquele jeito, ainda hesitava, até que ele falou aquelas palavras, malditas que apenas serviu para engana-la. – Pode confiar em mim Morgana, sabe que pode – ela repetiu as palavras ainda frescas em sua mente.

Ela confessou a ele tudo o que passava em sua mente, e ele apenas disse  - Gostaria de poder dizer algo.

- Mentiroso – gritou com toda sua raiva, um vaso quebrou do outro lado da sala e Aithusa saiu assustada – Não o que temer querida, descanse – Morgana afagou as escamas de sua cabeça e o dragão deitou sua enorme cabeça em seu colchão improvisado.

Mais tarde veio os druidas, ela pensou que ele estava
ajudando ela, na época era uma doce lembrança, mas agora era apenas uma lembrança da sua fraqueza, mas foi apenas uma questão de tempo, Merlin jamais se preocupou com ela, ele a matou, como poderia confiar de novo.

Ela estava tão absorta em seus pensamentos que não notou quando adormeceu.

                                ~~x~~

Merlin sentia que os braços cairiam a qualquer momento, agora se lembrava como Morgana gostava de tratar seus convidados, seu rosto ardia com o tapa que levará horas antes, esperava que Morgana voltasse pela manhã.

Sabia que a bruxa não iria mata-lo, ela tinha outros planos, ele havia visto em seus olhos, ela queria algo com ele, em seus olhos havia uma mistura de tristeza e surpresa, mas fora apenas mais rápido que um raio e Merlin não pode ter certeza, mas se ela quisesse mata-lo ela não mandaria um bando de mercenários, ela mesma iria atrás dele, do jeito que estava sanguinária desde que deixou Camelot.

 E mesmo assim, talvez ela houvesse conseguido outro Fomorroh, talvez ela viria tortura-lo ao amanhecer para depois tentar repetir seu plano falho.

Não, Morgana era esperta demais para isso, era outra coisa, ele deveria esperar, era o único jeito de saber o que ela tramava.

“pode confiar em mim, Morgana”, não havia nada do que mais se arrependia, agora isso lhe afetava, ela havia se tornado um monstro e boa parte disso era culpa dele, se ele tivesse contado. Ela podia confiar nele, mas ele esqueceu-se de confiar nela.

Agora olhando para a parede cinzenta a a sua frente, sua única paisagem, reconsiderava se o dragão havia sido um bom conselheiro, havia perdido tanto e ganho tão pouco, havia perdido amigos, havia perdido Freya e Morgana, só não sabia qual havia sido sua maior perda.

                                ~~x~~

Morgana acordou com o rosto inchado e vermelho, quando adormeceu mais cedo as lágrimas rolaram sem piedade, Aithusa dormiu ao lado dela.

Morgana rolou para fora da cama e se olhou no espelho em frente a sua cama, era terrível ver sua forma, os cabelos desgrenhados e sem brilho, a pele pálida e opaca, não pode conter a tristeza, mas havia coisas a fazer antes de recuperar o que fora um dia, e precisava dar o primeiro passo, ajudar Aithusa.

Para isso precisava que Merlin trabalhasse consigo, mas algo a incomodava, algo que ainda não estava bem claro, Emrys, havia a pequena suspeita em sua mente, mas a certeza não estava em lugar algum.

Morgana desceu as escadarias até as masmorras, apenas para vê-lo a sua mercê, acorrentado e enjaulado, o grande Merlin, servo e assistente de médico, apoiando a cabeça no antebraço, dormindo como um anjo.

A imagem quase comoveu Morgana, quase, um tapa estalou do outro lado do rosto do rapaz que acordou atordoado.

- Dia quente não Merlin? – perguntou olhando com frieza para ele – Esqueci-me de trazer o balda de água fria para matar-lhe o calor.

- Não gaste seu refresco comigo Morgana, estou acostumado a temperaturas elevadas e você?

Um sorriso passou por seus lábios, ela havia se esquecido de como Merlin era espirituoso.