Daniel encostou a cabeça no vidro, entediado, observando os pingos de chuva escorrerem pela janela. O fone de ouvido no volume máximo o impossibilitava de ouvir as coisas que seu pai tagarelava no banco da frente. A única coisa que ele sabia - e que lhe importava - é que eles estavam no caminho para o aeroporto, para buscar Melanie que estava chegando no voo das seis. Exatamente dali dez minutos.

Era cedo, mas o céu estava coberto por uma nuvem tão escura que parecia quase noite. Daniel sentia falta do sol, mas estava acostumado com o clima frio e úmido que assolava sua cidade desde que se conhecia por gente.

Talvez Melanie trouxesse um pouco de felicidade para ele. Para todos eles.

Melanie era irmã gêmea de Amber. Elas eram praticamente iguais fisicamente, a não ser pelos olhos negros de Melanie que eram incrivelmente doces, ao contrários dos azuis de Amber, que esbanjavam desejo e ambição. 

Depois do falecimentos dos pais, Melanie conseguiu uma vaga numa escola importante na Inglaterra, e Amber permaneceu na cidade. Mas as coisas mudaram, três anos já haviam se passado desde que Melanie se mudou e nesse período de tempo Amber se envolveu com Evan. O que foi uma surpresa para todos. Já que o garoto não era o mais popular da escola, o que fugia completamente do padrão de escolha da garota. E o que mais surpreendeu nessa história toda, foi o final.

Um final trágico.

Que marcou á vida de todos que conheciam a garota.

Ela havia sido encontrada enforcada em uma árvore do campus, depois de ter sido ferida gravemente por várias facadas em seu peito. Evan foi quem encontrou o corpo e acabara se tornando o principal culpado de crime. Mas nada foi provado.

Boa parte da cidade havia se esquecido do crime cruel que envolveu a família Campbell há menos de uma semana. Mas não Daniel.

Para ele não havia dúvidas que Evan era o verdadeiro culpado. Ele estava lá, o corpo possuía suas digitais, porém a polícia se contentou a dizer que as digitais estavam presentes na garota, porque ele havia retirado o corpo da árvore. Coisa que Dan não engolia.

E agora, com a volta de Melanie, quem lhe daria certeza de que Evan não a mataria também? Afinal, elas eram idênticas.

Daniel não se permitiria cometer o mesmo erro duas vezes. Ele não perderia mais ninguém.

O carro finalmente parou, em uma vaga próxima da saída, Daniel retirou os fones depressa dos ouvidos, e pulou do carro. Seu pai fez o mesmo, apertando o alarme e andando em direção ao filho, que o esperava. Daniel olhou para a frente, procurando Melanie nos diversos rostos que passavam pela porta. Seu pai deu mais alguns passos, o que o forçou a acompanhá-lo. 

Eles passaram pela porta, a voz que escapou dos auto-falantes fez com que seu coração desse um salto.

Finalmente!

Pela porta da frente, Melanie passou carregando uma mochila nas costas, os olhos negros confusos procurando por algum rosto conhecido.

Ela não podia acreditar! Estava finalmente de volta a Bolton. Queria do fundo de seu coração que fosse por uma boa causa.Queria passar pela porta e ver o rosto irônico de Amber, entendiado por estar ali, perdendo seu tempo quando poderia estar no shopping, comprando alguma roupa cara com a herança de seus pais.

Sorriu triste.

Ah, Amber.

Não conseguia acreditar que Amber estava morta. Não conseguia simplesmente aceitar. Porque ela? Uma garota com um futuro inteiro pela frente, tão cheia de vida.

Suspirou.

Talvez se estivesse permanecido na cidade, nada disso tivesse acontecido. Deveria proteger sua irmã, que se fazia de forte, mas era uma alma tão fraca!

Ela espantou esses pensamentos de sua cabeça quando avistou Daniel e seu tio John. Tinha tanto tempo que não os via!

Se aproximou deles, forçando um sorriso o máximo que seu maxilar permitia e sossegou seu coração quando Daniel encurtou a distância e a puxou para um abraço apertado e confortante. Melanie fungou em seu peito, escondendo seu rosto na camisa cinza do rapaz, enquanto deixava que as lágrimas, antes pressas em seu peito, escorressem pelos seus olhos e aliviassem sua alma.

John suspirou atrás dos dois. Odiava ver sua querida Melanie daquele jeito. Odiava ter sido ele á lhe das a noticia que mudara sua vida completamente.

Melanie se afastou de Daniel, que afagou seu braço antes de soltá-la, e partiu em direção ao seu tio, deixando que o velho conhecido afagasse suas costas enquanto consolava sua dor. 

Dor.

Era tudo que ela conseguia sentir naquele momento. Como poderia voltar para a casa de seu tio, quando cada canto da mesma, lembrava sua irmã? Ela não sobreviveria aquilo. Não queria sobreviver aquilo.

Queria encostar sua cabeça no travesseiro e permanecer lá pelo resto de sua vida. John parecia ler seus pensamentos. Pelo menos uma parte deles. Suspirou e afastou a sobrinha, falando calmamente.

- Vamos para casa.

Daniel assentiu, pegando a mochila das costas da prima e colocado nas suas. Melanie não discutiu, apenas assentiu e seguiu em passos incertos para fora do aeroporto, seguindo em direção ao carro, que a levaria de volta para casa.

De volta para todas as lembranças.