– Você sabe que não vai ser fácil daqui pra frente não é? – Ela perguntou com preocupação aparente, e por incrível que pareça, o sorriso de Gabriel não se abalou.

– E que graça teria se fosse de outra forma? – Ele disse e como um sinal de acordo selado, ele depositou nos lábios de Juliana, um cálido beijo. E ela sorriu.

As duas semanas seguintes passaram como um raio de sol, que a gente sente que esteve por ali, mas nunca vê quando ele nos toca.

A recuperação de Juliana se deu de forma normal. Cuidados constantes e rosas na cabeceira todos os dias. Havia rosas de João Marcos, rosas de Lucas, rosas de Miguel, e rosas até de seu pai. Rosas vindas da escola, e até tulipas, como pedido de desculpas.

– Tem certeza de que esse cartão está certo Gabriel? – Juliana perguntou ao rapaz que segurava junto com seu habitual buque de copos de leite, um buque bem feito de belíssimas tulipas.

– Está insinuando que eu não sei ler direito? – Gabriel perguntou se passando por ofendido, e Juliana fez careta para ele. – É exatamente o que eu te falei. A Angélica deixou esse buquê na recepção mais cedo.

– Leia o bilhete outra vez. – Ela pediu e ele revirou os olhos antes de obedecer.

“Aprendi da maneira mais difícil que as palavras têm poder. E, infelizmente, as más atitudes geram conseqüências. Acho que esse tempo todo levei minhas ‘brincadeiras’ a sério de mais e esqueci de notar que você era só, assim como eu, uma garota comum. Eu sei também que palavras não justificam erros, e desculpas não fazem o tempo votar atrás, mas espero poder usar das minhas simples palavras para pedir que me perdoe. Por tudo.”

– Quantas pessoas foram necessárias para obrigar a Angel a escrever isso para mim? - Juliana perguntou e Gabriel se sentou ao lado dela na cama antes de responder baixinho.

– Algo me diz que o alvo de interesse dela agora mudou. – Vendo a expressão de desentendimento de Juliana, ele continuou. – Parece que o Miguel não pegou nada leve com ela quando eles se encontraram na semana passada lá na escola. E bem, não é novidade o interesse da Angel no pirralho. Mas ele não parece se importar muito.

– A Angélica gosta do seu irmão? – Juliana quis confirmar o que tinha ouvido e Gabriel apenas sorriu.

– Eu desconfio que ela não goste nem de si mesma, mas parece que o Miguel consegue fazer ela querer se colocar no trilhos. – Gabriel falou e Juliana ainda parecia um tanto quando desconfortável com a notícia. – Assim como você fez comigo.

– Você nunca precisou de mim Gabriel, eu é que estava precisando de você. – Juliana disse e antes que Gabriel respondesse, aporta voltou a se abrir e revelou um sorridente Miguel, com uma pequena barra de chocolates em mãos.

– Eu não posso acreditar que vocês vão discutir isso tudo outra vez. – Ele falou e ambos direcionaram um olhar para ele.

– Nãos e incomodem comigo. Eu posso voltar por onde eu vim e levar comigo essa barra de chocolate que eu contrabandeei para você com tanto carinho. – Ele falou e Juliana esticou os braços na direção dele antes que ele fosse embora. Miguel sorri e com cuidado quase desnecessário se colocou sentado no pequeno espaço entro o irmão e a cunhada. A pequena barra de chocolates foi dividida em três pedaços, bastante desiguais, e devorada com avidez pelos três jovens. A porta se abriu uma vez mais. E agora não eles perceberam que em breve teriam um momento bastante importante.

Os pais de Gabriel, e os pais de Juliana passaram um após o outro pela porta do quarto, e em silencio se colocaram lado a lado.

– O médico disse que você terá alta amanhã, filha. – Joana disse e Juliana sorriu mesmo sabendo que aquele não era o motivo de todos estarem ali.

– Alguém tem que começar logo com isso. – Gabriel falou e os dois casais mais velhos pareceram soltar o ar em uníssono.

– Sabemos que sim. – Marieta começou a dizer, e logo a atenção de todos estava focada nela. – A direto enviou a nós um comunicado. Devemos ir até a escola na próxima semana para uma reunião.

– Recebemos uma carta para você, desejando melhoras e informando que, infelizmente, até que o caso... Digo, a situação que ocorreu, ou vem ocorrendo entre vocês dois seja esclarecida, você estará sob licença de suas funções na escola. – O pai de Juliana falou e segurar as lágrimas foi algo impossível para ela.

– Eu sabia que seria assim. Provavelmente, eles vão caçar minha licença. – Ela falou entre soluços contidos. – Vou perder o direito de lecionar.

– Eu não vou dizer que estávamos juntos. Não vou prestar queixa nenhuma contra você. – Gabriel falou segurando carinhosamente as mãos dela. – Eu te prometi que passaríamos juntos por isso, e eu vou cumprir com aminha palavra.

– Palavras não tem sentido contra provas Gabriel. – Ela disse alto e ele sorriu triste.

– Provas não fazem sentido, quando o envolvido principal nega qualquer tipo de envolvimento. – Ele falou e Julian levantou os olhos para encará-lo. – Meus pais não vão denunciar você meu amor. Em alguns meses eu vou ser maior de idade, e você não será mais minha professora. Nada pode dar errado.

– Todos sabem da verdade Gabriel. – Juliana disse e teve sua fala interrompida por Marieta.

– Eu não sabia, meu marido não sabia. Nenhum de nós sabia, até que as palavras saíram da boca de um de vocês.

– Eu fui precipitado. Estava com raiva, e acabei me desesperando. Dei com os pés pelas mãos e perdi o controle. Eu não devia ter falado aquilo. – Gabriel se lamentou enquanto a mãe o encarava, séria.

– Você está certo. Vocês dois agiram mal. Juliana devia ter me contado, e talvez se vocês dois tivessem confiado em nós, estaríamos melhor com tudo isso agora. – Joana falou e os demais assentiram. – Mas se dissermos que o envolvimento de vocês não começou na escola, os estragos serão mínimos. Vocês deram sinais claros desde o inicio de que poderiam desenvolver uma relação, nenhum de nós é estúpido.

– Eu mesmo os peguei juntos, uma ou duas vezes. – O pai de Juliana falou e os demais concordaram com ele.

– Se eu afirmar que conhecia o relacionamento do meu filho, com a garota Juliana, e optei por manter segredo para evitar constrangimentos na escola, eu me coloco como responsável por vocês. – Marieta voltou a se pronunciar e uma faísca de esperança brilhou nos olhos do jovem casal.

– Eu posso confirmar tudo isso para os alunos, para evitar fofocas sem sentido. – Miguel falou e ruborizou assim que viu todos olharem para ele.

– Eu não acho certo mentir. – Juliana falou e Joana sorriu ao se aproximar da filha.

– No fundo no fundo filha, todos nós sabíamos sobre vocês dois. Só não queríamos acreditar que nossos filhos não confiavam em nós para nos contar.

– Desculpa mamãe. Eu fiquei com medo. – Ela falou e a mulher assentiu, beijando carinhosamente o topo da cabeça da filha.

– Eu forcei a barra com ela. Ela não queria isso de forma alguma, mas bem... Acho que eu a convenci. – Gabriel falou mudando a cor da face para um vermelho escarlate. – Me desculpe por isso, senhor e senhora Bonfim, e desculpe por não contar antes para vocês, pai e mãe.

– Quem precisa de palavras quando se tem a garota desfilando de calcinha e coma sua camisa pela sala da nossa casa? – O pai dele disse despreocupado e diante do olhar desesperado do pai de Juliana ele deu um risinho sem graça. – Talvez, esse seja um assunto para agente conversar uma outra hora...

Juliana ruborizou e escondeu o rosto no peito de Gabriel, que sorriu embaraçado pela situação. Miguel tapou os ouvidos alegando que não tinha idade suficiente para ouvir tal tipo de coisa. A atitude do Sant’Anna mais novo fez todos os presentes sorrirem.

Não havia garantias de que essa proposta daria certo. No fundo, todos saberiam que algo de errado estava acontecendo. Mas quem pode definir o certo ou o errado quando se trata do amor? Juliana era uma garota, e Gabriel era um rapaz. Simples assim. E o amor os achou dignos de se tornarem seus hospedeiros. E quando a mor se faz hospede, o coração se torna mais receptivo a outros sentimentos bons.

A esperança, o carinho, o respeito, a fraternidade. Juntos, esses sentimentos moveram aqueles dois jovens a acreditar que no fim, tudo daria certo. Talvez não no fim, mas no meio mesmo. E aquele não era um fim, era um novo começo. Ou a continuação de uma difícil caminhada, que por mais densa que fosse, seria trilhada. Não mais por um, ou mesmo por dois. Agora seria uma caminha compartilhada. Por dois corações, que juntos se tornavam a cada dia mais fortes.

E que viessem as lutas, pois eles tinham a certeza de que “Quem anda sozinho, pode ir mais rápido, mas nem sempre vai mais longe”. E juntos, eles conquistariam a cada dia, um novo pedacinho da sua tão sonhada felicidade.