Thalia engoliu em seco. Jamais esperaria uma resposta como aquela, mas ele estava certo, ela tinha pedido por aquilo.

– Continue.

Nico trincou os dentes, não imaginou que ela iria querer continuar. Como Thalia Grace era forte! Além de linda e calma e inteligente e com olhos certeiros, Nico nunca conhecera uma mulher mais espetacular. Espetacularmente perfeita e que provavelmente ficaria apenas nas lembranças quando tudo acabasse, ele conhecia bem sua vida e imaginava a dela muito bem, não existia a possibilidade de tentar alguma coisa.

– Eu tenho um amigo, o Tenente Jackson, da polícia. Nós crescemos juntos e fomos para o segundo grau juntos, e o pior, nos apaixonamos pela mesma garota, Annabeth Chase. Só que eu levei a melhor e fiquei com ela.

              Quando nos formamos ela foi fazer jornalismo e Percy e eu entramos para a polícia. Meu pai morreu quando eu tinha vinte, tinha acabado de pedir Annie em casamento. Eu bebi e fui pra cadeia, quase bati, Percy pagou minha fiança e eu decidi que ia continuar o trabalho dele.

– Como o seu pai morreu?

– Tuberculose, jeito estúpido pra um assassino morrer.

– E o que o meu pai tem a ver com tudo isso?

– Calma que eu chego lá. – respirou fundo – Ninguém além de Minos sabia que meu velho estava morto, então, quando eu fui casar, Percy perguntou por que meu pai não vinha. Ele sabia quem era meu pai, só não sabia que eu tinha assumido o lugar dele.

– Percy, Hades está morto.

– Eu ainda ouço notícias dele, Nico, tem certeza disso?

– Eu o enterrei.

– Então...?

– Estou no lugar dele.

Percy não tinha palavras, tudo o que ele conseguiu fazer foi puxar a arma e me colocar na mira.

– Você não vai me matar.

– Não, porque você é o meu melhor amigo e pior que isso, você é o noivo da minha melhor amiga!

– O que você quer, cara?

– Conta pra ela.

– ‘Ta maluco, eu nunca vou contar e ela nunca vai ficar sabendo. – eu ameacei apontando minha arma pra ele. – Você sabe que eu tenho coragem de atirar.

– Não faz isso com ela, Nico, ela te ama e é uma boa garota, ela não merece ser enganada!

Eu abaixei a arma, não queria dar o braço a torcer, mas Percy estava certo, o que eu estava fazendo com a mulher que eu amava não era prova de amor. Eu escondia dela o maior segredo da minha vida, na verdade os dois maiores, tanto eu quanto meu pai sermos Hades do Olimpo.

               Desisti de casar três horas antes da cerimônia, pedi ao Percy pra consertar tudo. Ela ficou arrasada, eu não dei nem a possibilidade de ela reagir, sumi no mapa e continuei meu trabalho. Minha irmã Hazel foi registrar ocorrência de desaparecimento, quando fiquei sabendo contei tudo a ela e ela entrou na polícia também, pra ficar de olho e tentar me ajudar.

– Nico, na sua casa, eu ouvi você murmurar umas coisas sobre padre, foi do seu casamento?

– Não. Eu me afastei, mas três meses depois fiquei sabendo que a Annabeth estava grávida, eu avisei ao Minos e resolvi largar tudo, ia voltar pra ela, quando cheguei Percy disse que ela estava desaparecida. Zeus tinha pegado ela, já era tarde demais quando consegui encontrá-la, não estava morta, mas sangrava muito, nem tive tempo de pensar em matá-lo, dei um tiro na perna dele e saí correndo com ela. – os olhos dele marejaram.

– Quando eu encontrei meu pai ele estava com a perna sangrando.

–Pois é, eu liguei pro Percy pra ele ir ao hospital tomar conta dela e eu voltei pra matar Zeus, ele estava conversando com alguém, provavelmente você. Eu ia matá-la também, explodir tudo, mas desisti, ia causar muito tumulto. Coloquei uma bomba no carro dele. Foi mal sair do esconderijo que ele explodiu, não te vi mais e fui embora.

            Percy me ligou chorando dizendo que Annabeth tinha perdido o bebê. Eu não me aguentava de agonia. Fui embora pra Itália e abandonei Hades do Olimpo, fiquei um tempo só quieto, sem nada pra fazer, quando fui ao padre ele mandou eu me entregar pra polícia, eu já estava meio cansado do tédio, enlouqueci e resolvi voltar.

            Acho que voltei pior que antes, sabe? Faço mais bem feito agora, sou mais frio que antes. Eu vivia na correria de perseguir alguém, agora eu posso manter a calma até o momento certo de puxar o gatilho, aí o autocontrole foge, tudo queima por dentro, é muita adrenalina, não é medo, é emoção, virou minha vida, assim como era a do meu pai. Eu sou Hades do Olimpo, só vou perder isso quando morrer.

– Não pensa em deixar isso como legado?

– Talvez, é difícil arranjar tempo pra ter um filho na minha condição, não acha?

Os dois riram.

Nico estava aliviado, ela estava certa, era melhor colocar tudo pra fora. Sentiu que eles eram mais cúmplices do que nunca fora com Minos, ela era mais integrada no mundo que ele vivia, uma ex-agente! A cada minuto percebia que ela era ainda mais perfeita.

Thalia estava leve, relaxada, finalmente descobrira como e por que o carro do seu pai explodira aquela noite. Um motivo nobre, como seu pai pudera, uma mulher grávida! E pelo jeito que Nico falava ele ainda a amava, um amor impossível. Thalia ainda era mulher, mesmo que sua vida a fizesse esquecer que ainda sentia doçura na vida. No mínimo uma história bonita, no máximo um desfecho dramático. Ainda sonhava com o dia que teria alguém pra dividir uma história bonita ou um desfecho dramático, quem sabe os dois?

O comunicador de Nico tocou distraindo os dois.

– O que é, Minos?

– Lady Aphrodite na linha dois, é a sua espiã da DISK.

– Pede pra ela esperar e ligar a vídeo chamada, diz que a chefe dela está aqui.

Ele pegou o notebook e colocou na mesa sentando ao lado de Thalia.

– Silena Beauregard, apresentando-se como Lady Aphrodite. – a garota de cabelos negros e olhos azuis olhou para a tela e arregalou os olhos ao ver a antiga chefe. – Thalia?

– Presente. – ela sorriu – Você é a espiã da divisão? Não acredito.

– Entrei depois que você saiu, resolvi sabotar a Reyna, nunca gostei dela. – ela olhou para Nico. – Você realmente é Hades do Olimpo?

– Dúvidas? Não vejo motivo. – ele reclamou.

– Achei que fosse mais velho – deu de ombros. Thalia e Nico se entreolharam. – Tudo bem, sua missão?

– Preciso de alguém que esteja no topo da lista da Divisão.

– Thalia Grace.

– Essa é a prioridade da Reyna, Silena, precisamos da prioridade da DISK. – Thalia corrigiu.

– Piper McLean, foi uma criança perturbada na escola por ter ascendência cherokee, já tinha tendências psicóticas. Há três meses iniciou uma série de assassinatos denominados Caso Rainha da Beleza. Ela desfigura mulheres antes de assassiná-las e com o sangue delas escreve ‘rainha da beleza’.

– Que horror. – Nico protestou.

As mulheres fixaram o olhar nele não acreditando que ele tinha dito aquilo, como um mercenário do tipo dele poderia julgar um assassino.

– Algum problema com as senhoritas?

– Não, senhor. – Silena respondeu automaticamente não pretendendo estender o assunto. – Mais alguma coisa?

– Onde pararam as investigações com ela? – Thalia perguntou.

– Tivemos uma denúncia de que a viram em Manhattan.

Nico revirou os olhos.

– De volta a custódia do tenente Perseus Jackson, que droga.

– Obrigado, Silena.

– Não há de que.

Minos reassumiu a linha.

– Nicolas, pra onde agora?

– Vou reunir o que puder aqui com os Zhang e vou partir atrás de Piper McLean.

– Posso puxar as coordenadas dela.

– Fica comigo no comunicador, verifica se ela está na minha lista.

Nico começou a recolher todos os equipamentos que precisaria, colocando tudo dentro da mochila. Thalia simplesmente ficou sentada olhando-o rodar pelo porão inteiro, não iria se meter, sabia que ele iria precisar de sua ajuda há qualquer momento.

– Vai ficar parada, garota?

– Você precisa de mim.

– Acho que não, mas seria bom ajudar.

– Eu sou a profissional em caçar serial killers.

– Eu sou o profissional em caçar pessoas.

– Serial Killers não são exatamente pessoas. – ela levantou e pegou uma arma qualquer sobre a mesa, engatilhando em seguida. – Eu estou no comando agora.

.:x:.

Jason estava inconsolável, sentado no sofá com os cotovelos apoiados nos joelhos e a cabeça entre as mãos. Reyna lhe contara a atual situação de sua irmã. Ajudara Zeus a fugir – ela agora sabia que Zeus era seu pai, mas achava que Thalia deveria tê-lo entregado – e estava mancomunada com Hades do Olimpo.

– Reyna, você tem certeza de tudo isso?

– Claro, Jason, eu não falaria se não fosse sério, é somente por isso que quero pegá-la.

– E você disse que queria pegá-la e não matá-la, eu ouvi tiros quando estava com ela no telefone. Você me pediu para ligar só pra localizá-la.

– Você foi de acordo.

– Não achei que fosse atirar! – ele gritou se levantando. – Ela ainda é minha irmã, droga. Minha única família.

– Sinto muito, Jason, ela é uma criminosa.

– Srt. Reyna, poderia nos ajudar? – Octavian chegou a porta.

– Com licença, Jason.

Ela saiu com Octavian.

Jason ia ficar simplesmente quieto, esperando Reyna voltar, estava arrependido de ter entregado sua irmã, Reyna poderia tê-la matado, se, é claro, Thalia não fosse tão inteligente – ou mais – que a namorada dele. Mas, algo inesperado aconteceu, ele ouviu um barulho estranho, como um gemido, vindo da antessala ao lado. Correu e abriu a porta se surpreendendo ao ver uma garota morena amarrada e amordaçada em uma cadeira. Tirou a mordaça dela.

– Quem é você?

– Eu sou Hazel Levesque, e eu sou a irmã do homem que está com sua irmã. – ele não disse nada. – Eu ouvi tudo o que você estava falando com aquela garota, eu sou da polícia, você entende o que ela está fazendo? Sequestrando uma PM por puro capricho pra pegar uma ex-agente. Eu reconheci na voz dela, está com inveja da sua irmã, isso é birra de criança, ela está colocando em uma escala infinitamente maior.

– Será que Reyna faria isso? – perguntou mais para si que para a garota a sua frente.

– Preciso da sua ajuda, para salvar nossos irmãos, se ela os encontrar, estarão mortos. E eu não posso deixar que o Nico morra porque eu não o ajudei, por favor!

– A Thalia nunca mais vai querer olhar na minha cara.

– É uma ótima maneira de se redimir, ou ao menos começar.

Ele olhou para os lados, nervoso. Se ajudasse Hazel Levesque jamais teria chances com Reyna, e ele realmente gostava dela. Em compensação, família era em primeiro lugar, aprendeu isso desde sempre com a irmã, mesmo que o pai fosse um desconhecido e a mãe fosse uma beberrona, ele sempre teve Thalia.

– Melhor que nada. – ele disse desamarrando Hazel. – A propósito, sou Jason Grace.

– Ah, muito prazer.

Calor do momento, uma situação tão complicada, quase que Hazel esqueceu seus bons modos, quase. Ela ainda era ou não uma Ghostking como Nico? Nem que fosse no sangue, com toda sua pose e postura. Apertou com força a mão do loiro de olhos azuis e disse com toda a certeza do mundo.

– Não podemos passar por dentro, vamos sair pelo telhado.

– O que?!

Jason não era homem para aquilo, enquanto Thalia formava a DISK Jason decidiu trabalhar na loja de games, faturava bem e tinha paz, nada de exagerado.

– Venha.

Hazel o puxou para a sala de Reyna e de lá partiram para a sacada. O bom é que em New York ninguém costuma andar olhando para cima, porque Hazel não se importou com nada, subiu na mureta da sacada, escalou as grades da janela e passou para a mureta do andar seguinte. Jason ficou em dúvida se deveria acompanhá-la, fechou a porta da antissala e resolveu que deveria. Seguiu os movimentos da garota com cautela, não que tivesse medo de altura – não tinha – simplesmente porque não é qualquer um que trabalha numa loja de games que pode sair escalando prédio enormes de investigação seguindo uma policial que quer ajudar um mercenário de assassinatos.

O pior foi chegar ao telhado completamente ofegante e Hazel dizer que iriam descer pelas escadas de emergências.

– E pra que subimos?

– Não poderíamos sair pela porta da frente simplesmente, poderíamos?

– Hum...

Não complementou. Não tinha complemento, na verdade, Jason não poderia discutir sobre nenhuma decisão de Hazel, mas ele, no mínimo, pode ficar um pouquinho irritado.

Os dois desceram correndo, mas quando passavam de volta no andar do escritório de Reyna, Hazel os fez parar ao perceber certo objeto pela janela.

– O elmo!

– O que tem?

– Preciso dele. Precisaria do caderno também, mas a essa altura ela já fez uma cópia. O elmo é único.

– Como vamos pegá-lo?

– Não sei.

Jason suspirou antes da ideia mais suicida da sua vida.

– Eu vou pegar.

– Não, você é um civil, nem deveria ter te envolvido nessa.

– Sem essa.

– O meu dever com a sociedade é proteger pessoas como você.

Ele ergueu uma sobrancelha.

– Só que não. Eu pego, fim de papo.

Jason foi pela saída de emergência mesmo, mas foi discreto.

– Octavian, Reyna pediu o elmo de Hades do Olimpo.

– Pediu? Ah, Jason, ela está enlouquecendo a gente, peça que pegue leve, sim?

– Claro, foi fazê-la relaxar.

Octavian riu, entregou o elmo e nem reparou que Jason foi caminhando pro lado oposto ao da sala da chefe.

Quando Jason encontrou Hazel, estava suando frio, pânico de ser pego. Mas ela também não estava muito bem, temendo por ele. Ela pegou o celular e bipou o comunicador do irmão.

– Nico?

– Hazel! Você está bem? Reyna disse que estava com você.

– Estava, mas Jason me ajudou.

– Quem é Jason?

– Irmão de Thalia.

– ‘Tá maluca, ele nos delatou.

– Mas se arrependeu. Onde vocês estão?

– Vamos voltar para New York, pegamos uma presa perfeita para o plano.

– Que plano? Ah, não, eu não quero saber. Reyna está com seu caderno.

– Eu sei, disse que se eu não entregar Thalia, vai colocá-lo em um jornal amanhã de manhã.

– Estamos pior que eu imaginava.

– Juro que se eu cair eu não levo você. O único problema é que eu não posso sair por aí enlouquecendo sem meu elmo.

– Não é problema, isso eu recuperei.

– Ah, Hazel, nem papai era tão bem amparado quanto eu, tio Minos é inútil perto de você!

– Apresse-se, vou esperar novas ordens.

– Nova ordem: Encontre Percy Jackson, quero falar com ele.