O último vídeo de Amy, era o mais demorado. Pra mim, parecia o mais triste, mas ao final dele, percebi o quão ela era feliz e por um monto acreditei que ela não soubesse, ao certo, pelo o que estava passando.

“Não vejo a hora de morrer, mamãe.” – Disse Amy desenhando.

Nesse trecho do vídeo, Amy estava em sua cama e desenhava um céu cheio de anjos, e no anjo vestido de rosa, ela escrevera seu nome.

“Eles conversam comigo a noite, sabia?” – Amy comentou.

“Conversam o que?” – Mary perguntou, ela quem filmava dessa vez.

“Que eu vou me sentir melhor lá com eles.” –Ela disse, ainda desenhando.

“Tenho certeza que sim...” –Disse Mary.

“Quero que me levem logo. Deve ser legal cuidar da senhora lá de cima.” –Disse Amy, sorrindo para Mary.

O sorriso de Amy não tinha dois dentes na frente, possuía a chamada “Janelinha”, o que tornava seu sorriso especial e fofo. Mary, após esse comentário de Amy, nada respondera. Logo após isso, o vídeo é cortado para outro dia. O vídeo começara com Amy abraçando Mary, enquanto uma enfermeira filmava.

“Tchau para vocês!” – Disse Amy acenando para a câmera.

Era notório o quão debilitada estava Amy. Com enormes olheiras e cada vez mais magra. O vídeo acabara ali e a tv começara a chiar. Pude notar, que ainda havia mais uma fita, ao contrário do que eu imaginava. Haviam onze fitas, então. Me levantei e tirei a fita do VHS e coloquei a última. Imediatamente, Mary se levantou e foi para a cozinha. A observei partir, sem nada entender. Ainda agachada, pude perceber o vídeo começar.

“Bom, começaríamos o vídeo com a Amy, mas...” – Mary prendia o choro. –“Ela foi encontrar os seus amiguinhos anjinhos nesya manhã...” – E começou a chorar.

O vídeo tremera um pouco, seu marido filmara e logo desligou. Engoli seco e pude sentir meus olhos começarem a arder e encher de lágrima. O vídeo continuara e eu respirei fundo. Agora, quem filmara era Mary, e imagens do quarto de Amy, ainda arrumado da maneira que ela havia deixado. Uma cartinha estava na cama, Mary filmou e estava escrito “De Amy, para bonecas”. Ela tinha uma adoração por suas bonecas, as quais Mary agora guarda no porão.

Após terminar os vídeos, desliguei tudo e fui até a cozinha. Mary estava sentada a mesa, tomando um chá. Me sentei ao seu lado.

“Você leu o que havia na carta?” –Perguntei.

“Que carta?” – Ela perguntou.

“Para as bonecas de Amy.” –Respondi.

“Não, apenas coloquei na mesma caixa que as bonecas.” –Ela disse e em seguida dera um gole no chá.

“Deveria ler.” –Eu disse.

“São para as bonecas.” –Disse Mary.

“Mas as bonecas não sabem ler, sabem ouvir...” –Eu disse.

Mary me olhou, como quem quisesse dizer que, o que eu havia falado, fazia algum sentido. Um longo silêncio se estendera por dez minutos, não queria pressionar Mary a nada e nem tocar novamente no assunto. A esperei quebrar o silêncio.

“Leria comigo?” – Ela perguntou, quase sussurrando.

“Mas é claro.” –Eu respondi.

Ela se levantou e a segui. Fomos até a escada do porão, de baixo da escada que levava para o segundo andar. Mary desceu na frente e foi até um canto, onde tinha um monte de caixa empilhada, todas com o nome “Amy” e algo mais. Ela pegou a “Bonecas da Amy”. Colocou a caixa no chão e se sentou ao lado.

“Quer ler aqui mesmo ou no quarto dela?” –Perguntei.

“Aqui está bom, todas as outras coisas dela estão aqui.” –Ela disse.

Ela abriu a caixa e a carta era a primeira coisa a ser vista. Várias bonecas estavam abaixo, pude contar quatro, mas era notório que haviam mais. Mary pegou a carta e ficou olhando para ela.

Depois de cinco minutos, ela abriu a carta, sem esforço algum, a cola já não fazia mais efeito.

“Olá, minhas meninas, estou fraca e estou indo para o hospital, o tio Sheldon vai cuidar de mim, ele vai me ajudar a ir bem encontrar os anjinhos.  Vocês me fizeram sorrir por muito tempo, fizeram tudo o que eu quis, e agora vocês podem ir embora, se quiserem. Os anjinhos que conversam comigo a noite, não podem levar vocês, porque vocês são de plástico, desculpa. Os anjinhos disseram também que, onde eu vou morar, posso ver vocês, mas queria que viessem comigo, me desculpem de novo. A mamãe deve ler essa carta para vocês algum dia, porque eu não ensinei vocês a lê. Se lembram que eu lia para vocês antes de dormir? Sentirei saudades, mas espero que a Ledetta aprenda a ler e leia para vocês. Só levarei a Hearther comigo, porque é a mais antiga dentre vocês, só me deixaram levar uma, mas logo Heart volta para vocês, prometo. Bom, não tenho muito tempo mais, mamãe me espera lá embaixo. Amei e ainda amo todas vocês, minhas bonecas, minhas filhas. Ah, cuidem da minha mãe.

Abraço especial para as gêmeas Ledetta e Antoiniette, Mariana, Juliana,

Theodora, Ella, Paige, Anna & Liza.

Amy Sophie Lane. Xx”

Pude notar uma lágrima escorrer pelo rosto de Mary, era a primeira vez que eu a via chorar e isso me partia o coração. Não sei ela, mas eu fiquei feliz ao ler essa carta. Mary dobrou a carta da maneira que ela pegou e me entregou.

“Obrigada por me motivar a ler essa carta.” –Ela disse limpando a lágrima do rosto.

“Fiquei feliz por presenciar isso, de verdade.” –Eu disse abrindo a carta.

Mary se levantou, beijou a minha cabeça e subiu as escadas. Reli a carta e pude notar uma linda escrita, sua letra mostrara que era uma criança, mas suas palavras me mostravam uma adulta. Ao contrário do que pensei, Amy deixara de ser criança e teve que amadurecer muito rápido, ela sabia sim o que se passava e sabia que morreria, mas em outras palavras. O papel de carta, parecia uma folha de diário, rosa claro com rosas em vinho. Era uma folha normalmente usada por meninas mais velhas, tipo eu agora. Me sentia, cada vez mais, parte de Mary, e Amy me deixava feliz, por incrível que pareça.