- Ah, que fofo!- exclamou Tônia apertando as bochechas de Fernando. – Então agora finalmente vai começar o shounen-ai?

  Fernando não respondeu, somente tirou as mãos dela de sua bochecha, numa mistura de raiva e vergonha. Desde que admitira para Rick, ele meio que desenvolveu o costume de se envergonhar sempre que tocavam no assunto.

   - Ei, espera. – chamou ela apertando o passo, quando viu que Fernando começou a andar mais rápido pra escola. – Alguém já se declarou? Vocês estão namorando agora? 

  - Ninguém se declarou. – respondeu de má vontade – E nem vamos.

  - Ué, porque? Pensei que agora estava tudo certo.

  - As coisas não são assim tão fáceis. –resmungou virando o rosto pro outro lado. Porque ela tinha tanto que insistir em lhe fazer essas perguntas olhando-o na cara?

  - Claro que são! – exclamou – Olha só pra mim e pro Rick. Nós ficamos, curtimos um ao outro e namoramos desde então.

  - Você são exceção. – retrucou.

  - Sejam uma exceção também, você não gosta dele? - Fernando não respondeu, somente continuou andando. – Hein?

   - Tônia, dá um tempo pra ele. – pediu Rick, pondo a mão sobre o ombro da namorada e a puxando pra mais perto de si, fazendo-a parar de andar. Fernando por outro lado continuou, deixando-os rapidamente pra trás.

  Rick estava certo, Fernando precisava pensar e considerar o que fazer agora, uma vez que não lhe foi permitido com trabalho e todas as outras obrigações que ainda lhe cabiam. Com passos firmes e rápidos ele chegou à escola e foi direto pra sua classe, uma vez que o portão já estava aberto. 

   Concentrou-se o máximo que podia nas aulas, falando muito pouco com os amigos. No intervalo foi pra biblioteca e lá ficou, sentado em uma mesa, com a cabeça apoiada sobre os braços. Embora Rick tenha ficado com ele, não conseguia fazer uma conversa evoluir.

    - Eu não entendo porque você tá assim agora. – disse Rick – Se você gostou, mas não a ponto de dizer que ama ele, então porque tá com essa cara de quem levou um fora?

   - Eu não estou com cara de quem levou um fora. – resmungou Fernando olhando sério pro amigo.

   - Está sim. – retrucou  – Até agora você não me falou como que foi a conversa entre vocês.

    Ele não disse nada, nem se quer continuou a olhar pra ele, voltou a deitar sua cabeça sobre os braços cruzados, escondendo o rosto. Aquilo não deveria incomodar, mas o fato de Rafael ter pedido desculpas, o deixou de certa forma magoado, triste. E ele sabia o que aquilo significava. Quando gostava da Taio e soube que ela começara a namorar, no ano passado, ele se sentira da mesma forma, mesmo que um tanto pior do que agora.

    Então é isso, pensou, estou gostando do Rafael.  Mas o que deveria fazer agora? Ir na porta dele e se declarar como fez  da outra vez? Era bem capaz de ser Taio a atender. Ou então, como ele andava numa maré de azar, era bem provável que Vitor atendesse. Riu consigo mesmo de sua própria ironia. 

   O sinal tocou e ele e Rick , que ainda estava lá, e que havia passado o tempo folheando alguns gibis, saíram de lá, voltando a sala de aula.

   - Esse tempo é louco. – disse Rick na hora da saída. – Semana passada estava um calor de rachar mamona e agora está um frio de trincar os dentes.  – e olhando pra Tônia, que andava abraçado,  disse com um sorriso malicioso – Ei, que tal a gente se esquentar mutuamente no meu quarto esta noite ?

   - Pervertido! – acusou ela rindo, dando um tapa no peito dele. 

  - Eu? – perguntou ofendido -  È você que está pensando besteira, eu estava me referindo ao calor natural que dois corpos passam um para o outro quando estão abraçados. 

  - Aham, sei, finge que é verdade e eu que acredito.  – e olhou pra Fernando quando disse – Você ouviu isso? Ele acha que me engana.

   Mas ele não estava prestando atenção, concentrava-se em ir pra casa, só queria dormir e sair o mais rápido daquele frio. Viera só de camiseta, acreditando que não esfriaria muito e agora sofria com as consequências.

  Um pouco mais atrás deles, Taio e Rafael também saiam da escola. Quando ela viu Fernando percebeu que Rafael também o viu.

  - O que aconteceu entre vocês dois? – ela perguntou - Ultimamente você não me conta mais nada.

  - Não aconteceu nada Taio.

   - Então porque não estão mais se falando?

   - Quem disse que não estamos mais nos falando? – perguntou franzindo um pouco o cenho.

   - Ninguém, só estou perguntando.  – ela disse dando de ombros – Mas vocês não estão não é mesmo? Se não você não teria feito essa cara só por causa de uma pergunta.

   Ele suspirou, ninguém melhor pra conhecer e interpretar suas ações do que Taio. Era o mesmo com ele no caso dela. 

  - Eu o beijei. – disse baixo no ouvido dela. E assistiu sua reação. Primeiro ficou surpresa e depois abriu um largo sorriso. 

  - Quem diria que isso realmente poderia acontecer. 

  - Como " realmente"?

   Ela deu de ombros novamente. Os dois deram mais alguns passos até ela decidir perguntar.

  - Por quê?

  - Porque o que? 

  - Porque você fez isso? Você está começando a gostar...

  -Não sei. – cortou ele um pouco rude – Eu fiz aquilo... Por impulso.

  - Você? Por impulso?  – duvidou ela – Você não é uma pessoa impulsiva. Mas desde que tudo isso começou você vem agindo diferente. – e fez uma pausa pra pensar no assunto – Eu me lembro de quando eu namorei outros caras, você sempre agia como um irmão ciumento e possessivo.  E agora, mesmo sabendo de tudo isso, você agiu tranquilamente, deixando ele se aproximar de mim e não aprontando nada pra cima dele.

  Ele não disse nada, ficou escutando. Tinha que admitir que ela tenha razão. Lembrava-se de um cara que  queria namorá-la no ano passado. Ele havia dado um susto tão grande  nele, fazendo acreditar que ele era barra pesada e que  deveria pensar duas vezes antes de se meter com sua irmã. 

  Mas quando soube de Fernando, ele não sabia por que, só não teve vontade de fazer qualquer coisa desse tipo. Deixou as coisas rolarem. Perguntou-se se já havia se interessado por ele naquele momento.

   - Eu me lembro... – e Taio ria agora – De quando você soube que eu não era mais BV. Você foi atrás do menino que tinha ficado e deu um "acelera" nele.- e continuou a rir.

   Rafael riu também, porque ele se lembrava claramente disso. Ele e Vitor tinham chamado o garoto que estava no meio dos amigos jogando bola pra conversar. Os dois cruzaram os braços e agiram como malandros pra cima dele. Falando gíria e tudo mais. O garoto que era quatros anos mais novo e  menor naturalmente sentiu-se intimidado. Mas não posso de uma leve pressão psicológica, depois deixaram ele ir dizendo " E que não chegue mais perto da minha irmã, se não o bagui vai ficar louco!"

  Riu mais ainda,desacreditado de si mesmo. Como podia ter feito tudo isso? Ah, sim, seu pai sempre dizia que ele tinha que proteger sua irmã dos garotos, porque ela um dia seria freira. Quando ouvira isso tinha doze anos, e Taio era muito pequena, naquela época não sabia bem o que isso significa, mas hoje tudo parece engraçado, embora tenha desenvolvido uma superproteção em relação a ela.

- Mas então com Fernando foi diferente - falou com um meio sorriso- Você ouvia o que eu falava dele, o deixava se aproximar de mim e até concordou de sairmos os três. Mesmo que eu ainda não soubesse que ele estava interessado em mim. – agora ela virou-se para o irmão. Já estavam fora da escola e ela o parou no meio da rua e disse séria olhando-o nos olhos – Você gosta dele?

  Rafael fechou os olhos e pensou antes de responder. Considerando tudo que havia acontecido até agora e disse:

- Sim, eu acho que estou gostando dele. – sua voz saiu baixa, mais Taio conseguiu ouvir. Ela lhe direcionou um sorriso terno e lhe de um abraço.

- Ah, Rafa. – ela disse o apertando -  Eu torço, sinceramente, do fundo do meu coração pra que tudo de certo.

- Eu também quanto a você e Vitor.- disse ele. Os dois ficaram abraçados por mais alguns segundos até ele dizer – Acho que já está bom, pirralha.  

   Taio se afastou e os dois continuaram a andar silenciosamente. Mas para Rafael estava longe de ser silencioso. Seus pensamentos mais do que nunca estavam inquietos, pensando em Fernando.

   - Ah, olha quem está ali. 

   E ele procurou e o achou. Fernando andando com os amigos de volta pra casa. Quando o olhou, dessa vez foi diferente. Ele tinha conhecimento dos seus sentimentos e não pode evitar sentir uma certa agitação ao vê-lo mesmo que de longe. Apertou o passou e o alcançou antes que entrasse no condomínio. O segurou pelo braço e viu o olhar de surpresa que ele lhe lançou. Foi só então que ele percebeu. Que pela primeira vez não tinha o que dizer pra ele.

   - A- Aconteceu alguma coisa? – perguntou Fernando, e ele afrouxou o aperto no braço do menor. – Você está com uma cara estranha.

   -Eu... Nada. – e o largou entrando no condomínio e seguindo rapidamente na direção do seu prédio.

   Fernando ficou olhando-o se afastar, confuso. Enquanto Taio se aproximou e o cumprimentou rapidamente seguindo na mesma direção que o irmão fora. Ao entrar no prédio o encontrou sentado nas escadas, com as mãos espalmadas sobre o rosto. Ela se sentou ao seu lado e levou a mão ao seu ombro, apertando-o em uma demonstração muda de apoio. Ele continuou daquela forma por mais alguns minutos, antes de chamá-la para entrarem no apartamento.