E mais uma vez estou eu passeio pelo Mundo Inferior, mas desta vez eu sou a guia, e Cato é o turista, mesmo que seja um passeio indesejável para mim.

É óbvio que Glimmer se ofereceu para mostrar o submundo a ele, e eu tenho minhas dúvidas sobre o real motivo. Quando Cato chegou, ela o recebeu com um abraço muito suspeito. "Não, não estou com ciúmes" eu tento me convencer. É que... Ela é a Glimmer, ele é Cato. Qualquer pessoa apoiaria os dois juntos, o badboy e a patricinha. Não gosto de mentir, eu posso dizer que fiquei muito feliz quando Cato recusou o tour de Glimmer. É, eu sinto ciúmes sim.

Mas sinceramente, eu preferiria que ele tivesse aceitado, porque agora Cato me segue como um filhote perdido, e nem minha carranca de carreirista, como Rue a chamava, espantava ele.

Com Cato me seguindo, eu resolvi dar uma volta pelo Hades, com a brilhante expectativa de que ele se perdesse pelo caminho, então corro pelo submundo, sem olhar para trás nenhuma única vez.

Depois de muito andar, eu me viro e vejo que Cato ainda está atrás de mim, então perco a paciência e grito:

–Oque você quer?!

Ele me olha assustado, seus olhos azuis parecem confusos, embora eu não saiba porque. Eu já havia usado aquele tom de voz com ele muitas vezes, na arena principalmente.

–Me desculpa Clove, mas eu estou perdido por aqui, se você não percebeu. Eu queria muito conhecer lugares por aqui.

Eu paro de andar, analisando oque ele acabara de dizer. Parecia uma indireta, mas nunca fui boa em reconhecer indiretas, então eu fingi que o entendi.

–Então porque você recusou o passeio com a Glimmer então?

Mais um olhar de Cato. Dessa vez foi difícil identificar a expressão dele. Algo entre abismado e chatiado, mas ele não respondeu minha pergunta.

–Ok Cato, vamos continuar.

E continuamos a andar, enquanto uma parte mínima do meu cérebro tentava decifrar a conversa anterior.

Nós chegamos ao Elíseo. Eu fico apenas observando, mas Cato está maravilhado, e acredito que está prestes a dançar. Eu não posso culpá-lo, o clima festivo dos campos é bastante contagiante.

–Procurando por mim?

Olho para o lado do portão, e vejo Leo, o garoto em chamas.

–Na verdade não. - eu respondo, enquanto o cumprimento com um aperto de mão. - Prazer, Clove.

–Leo. - ele me observa com os olhos, eu estava com a jaqueta que havia usado nos Jogos Vorazes, que estava um pouco aberta, dando a ele a visão de minha coleção de facas. Ele assovia. - Wow, de longe você não paarece tão cruel assim.

–Ah é? Mesmo de longe eu consegui perceber que você não devia ter permissão para mexer com fogo.

Leo ri, uma risada contagiante, como tudo nos Campos Elíseos, mas eu me limito a um sorrisinho debochado.

–Ei, mexer com fogo é um dos prazeres de ser filho de Hefesto.

–E dos estilistas do Distrito 12. -eu digo, quase sem pensar.

Nós dois rimos desta vez, até ouvirmos um pigarro vindo de atrás. Cato. O garoto estava tão quieto que eu tinha esquecido de sua presença ali.

–Acho melhor nós voltarmos para Aldeia dos Tributos, Clove...

–Sim Clove, é melhor vocês voltarem para a Aldeia -Leo diz em falsete.

Cato olhou para ele com raiva, muita raiva. Aquilo era uma evolução da carranca carreirista, era um olhar amendrotador, mas ao mesmo tempo, sem controle, afetado, quase mortífero, e se tratando de Cato, o olhar poderia realmente ser mortífero, embora não se possa matar de novo oque já está morto... eu acho. Ele começa a gritar:

–Quem você pensa que é cara?!

–Eu não sei. - Leo cria chamas em suas mãos, labaredas muito altas. - Mas pode vir quente que eu estou fervendo!

Leo provavelmente não pensou direito no que disse, porque ambos riram, mesmo sem perder a pose da batalha. Temendo que algo pudesse acontecer, eu resolvo me meter:

–Tem razão Cato -eu digo o puxando para longe.- Melhor nós voltarmos.

O caminho até a aldeia dos tributos é silencioso, mas dava para perceber que Cato ainda estava com raiva, apenas pela postura dele ao andar.

Quando chegamos ao prédio 74, eu perco novamente a paciência e o empurro contra a parede.

–Oque você estava pensando Cato? Acha que é o mais forte de tudo e de todos? Pois saiba que não é!

Ele me olha, e dá um sorriso.

–Sou mais forte que você Clove.

Em um rápido movimento, ele me empurra contra a parede, mas me mantendo lá, levemente erguida do chão.

–Me larga Cato!!

–Sim, mas se lembre que eu fiz aquilo porque gosto muito de você. - ele diz, encostando seu nariz, no meu.

Assim que ele me coloca no chão, eu o chuto, fazendo ele cair de joelhos.

–Quem é mais forte agora hein, Cato?

Então, ouço uma voz, ecoando em minha mente: "As vezes a força deve se curvar a sabedoria. A questão é, você tem sabedoria Clove?".