O resto da aula passou como um tormento para Tuana. Ela não conseguiu se concentrar em mais nada depois da briga que teve com Felipe. Ela ficava o tempo inteiro olhando pra ele, mas ele não retribuiu o olhar em momento algum. Isso foi uma tortura pra ela.

No fim da aula, Tuana queria muito falar com ele. Precisava. Ela queria pedir desculpas e tentar explicar a situação, mas nem mesmo sabia como. Ela viu Felipe pegar as coisas dele e sair da sala. Ela pegou as dela e foi saindo rápido também.

– Tchau pra você também, Tutu! – Brenda gritou atrás dela.

Tuana viu Felipe à frente dela com passos apressados. Ela andou mais rápido e passou diretamente por ele sem nem olhar para trás. Segurou-se para não virar e pedir desculpas ali mesmo. Tinha outro plano. Ela começou a correr e saiu da escola, rezando para conseguir ajeitar as coisas.

Felipe viu Tuana passar por ele no corredor. Ele ficou olhando. Queria chegar perto e abraçá-la, sentir o perfume dela. Mas não o fez. Na verdade, ele ficou com raiva por ela ter passado e nem ter se dado o trabalho de ao menos olhar pra ele. E para completar, ela começou a correr, como se estivesse fugindo dele. Com medo. A raiva que ainda estava acumulada em seu interior cresceu. E ele quase correu atrás dela. Mas não o fez.

Quando saiu da escola viu que Tuana não estava em vista. Felipe seguiu seu caminho para casa. Ele foi andando lentamente, não tinha pressa alguma de chegar. Num certo ponto, ele parou. A rua estava quieta e deserta. Nesse horário, por volta de 13h, era assim mesmo. De repente ele soltou a mochila no chão. Se alguém o visse ali daquele jeito, parado no meio da rua, sozinho, pensaria que ele era louco. Mas ele não conseguia mais andar. A cada passo, lembrava da briga que teve com Tuana na escola e depois de ela correndo. Ele a tinha assustado e sabia disso. Tinha chegado até a machucar o braço dela. Quase deixou que a raiva o possuísse por completo. E por quê? Por pura luxúria. Por orgulho. Por besteira. Mas por que ela não contava logo a todo mundo? Também não era nenhum sacrifício. As dúvidas começavam a rondar na cabeça dele, junto com raiva. Ele cerrou os punhos. Precisava extravasar sua raiva em alguma coisa. Chutar, bater, quebrar... Tinha um muro velho, todo rachado e feio ali bem perto dele. Ele nem pensou duas vezes, e chutou com toda a força que tinha. Ouviu um gritinho baixo em seguida e alguma coisa caindo. Assustou-se ao ver que era Tuana.

– Tuana. – Ele disse intrigado.

Tuana tinha se assustado com o chute dele e caiu sentada. Ela se levantou quando ele falou.

– Oi. – Foi só o que ela disse.

Felipe ficou olhando pra ela ainda sem entender o que ela fazia ali. Mas como ele ainda não estava com seu humor controlado, ele só pegou sua mochila e voltou a caminhar, deixando-a para trás.

Tuana tinha se escondido ali para esperar Felipe passar. Ela sabia que ele ia por ali pra ir para casa. Mas depois de muito tempo, como ele estava demorando, ela se levantou um pouco para olhar se o via chegando. Assustou-se ao ver que ele estava ali bem perto, só que parado no meio da rua. O viu cerrar os punhos. Ela se abaixou novamente. E seguida veio o chute no muro e ela se assustou, soltou um gritinho e caiu de bunda no chão. E claro, ele a viu ali e ela teve que aparecer naquele momento. Mas aí agora ele estava indo embora.

– Por favor, me escuta! – Tuana foi andando atrás dele. Felipe não parou. – Felipe, por favor, me deixa falar. – Ele parou e virou pra ela.

– Você tem o que falar agora? – Ele perguntou.

Tuana ficou mais nervosa quando ele virou pra ela. O rosto dele estava tenso.

– Eu... – Tuana começou. Felipe arqueou as sobrancelhas, do jeito que ele fazia quando eles costumavam “se odiar” na sala. Ela quase sorriu com isso. – Felipe, eu não quero mais brigar com você. Isso me deixa péssima.

– Para! – Ele disse. – Se você não tem algo concreto pra dizer, me deixa ir.

– Felipe... – Tuana ia dar um desculpa qualquer, mas parou. Seria mais simples contar logo o que estava sentindo de verdade. – É por causa DELE. – Ela falou quase num sussurro.

Felipe encarou Tuana. Ela estava falando do ex? Ele tentou entender por um instante. Em nenhum momento, durante esse tempo que eles estavam namorando, ela tinha falado sobre o tal ex. Felipe nem sabia o nome dele, e também nem queria. Ele ficou sem saber o que dizer depois disso. Pensava que ela tinha esquecido o cara completamente.

– Então ele ainda te afeta. – Felipe disse bem baixo também. Ele sentiu uma ponta de dor dentro de si por saber que ela ainda pensava no outro.

– Felipe, não é como você está pensando. – Tuana disse logo. – Ele não me afeta... Pelo menos não desse jeito.

– Então é o quê?

Tuana demorou um minuto antes de falar:

– Medo.

– Do quê exatamente? – A voz de Felipe estava ganhando um tom de agonia.

– Do fim. – Ela falou. Tristeza pairava em seu rosto e voz, Felipe percebeu. – E de eu compartilhar minha felicidade, e estou muito feliz com você, acredite, e depois acabar. E eu vou ficar muito mal, e minha tristeza vai afetar minha mãe e todos ao meu redor, e as pessoas vão sofrer por mim, e olhar com pena pra mim, e eu não vou agüentar essa pressão toda, junto com a dor, e vai parecer que a vida é uma droga, e eu não quero isso de novo, e vai doer tanto a ponto de eu pensar que nunca vai passar, e nunca teria passado se você não estivesse lá, e aí você não vai mais estar e não vai ter ninguém... – Ela parou e respirou fundo.

Tuana tinha dito tudo isso de uma vez só. Ela olhou pra Felipe e viu que ele a encarava de testa franzida. Ele não disse nada durante alguns minutos. Os dois estavam parados ali no meio daquela rua deserta, debaixo de um sol quente. Um carro veio e buzinou. Felipe puxou Tuana bem rápido para a calçada. Logo depois a abraçou.

(Música de cena: Sexed Up – Robbie Williams)

Eles não disseram nada durante um tempo. Só ficaram ali nos braços um do outro. Mas Tuana sentia que aquele abraço não passava um conforto completo. Ela podia sentir os músculos de Felipe tensos.

– É como se você não confiasse em mim. – Felipe finalmente tinha falado.

Tuana ia protestar, mas ele não deixou.

– Não estou te julgando. – Ele se afastou um pouco para poder olhar nos olhos dela. – Mas eu prometi que não faria você sofrer. Eu disse que iria te proteger de qualquer dor...

– ELE disse que nunca me abandonaria. – Tuana soltou aquilo. Sua voz saiu baixa, mas com um pouco de raiva.

– Tuana, não fala mais desse cara comigo. – Felipe disse com um tom de raiva na voz. – Ele é passado. Eu não sei o que houve entre vocês, e nem quero saber. Mas ele foi embora, não é?! Só falta você deixá-lo ir de vez. Você precisa guardar essas lembranças em uma caixa, deixar ela fechada e esconder em um canto escuro da sua mente.

– Já está escondida. Mas a cor e o cheiro dessa caixa ainda estão me perturbando. – Ela falou de cabeça baixa.

Felipe se afastou completamente de Tuana. Ele segurou uma de suas mãos e ficou balançado um pouco. Tuana pensou ter visto um leve sorrio triste no rosto dele.

– Eu entendo. – Ele disse. Tuana o viu soltar sua mão e começar a se afastar, ainda olhando para ela. – Mas desse jeito não dá. – Ele balançava a cabeça devagar. – A cor é feia, e o cheiro me incomoda. – Ele falou e seguiu seu caminho.

Tuana não foi atrás dele dessa vez.