Quatro Anos Depois. escrita por mandikasilva


Capítulo 5
A amargura.




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A raiva, o ciúme tinham tomado conta de si! Estava cega por Harry. Era a primeira vez que sentia raiva por um amigo! Seria normal? Estaria ela normal? Aahh, controla-te! Controlo- seria capaz de tal?

Hermione tropeçou e caiu no chão. Pretendia regressar a Ottery St. Catchpole, mas a noite escura e a discussão que tivera com Harry não ajudavam em nada. Achava que estava perdida. Alguma vez sairia dali? Será que ia transformar-se em comida para lobos (ali haveriam lobos?)? Não conseguia levantar-se; o seu pé estava inchado!

Deitada no chão, observava o céu estrelado por cima da sua cabeça. De um belo tom azul-escuro, pintalgado de estrelas pequenas e brilhantes, como se fossem diamantes pregados àquela tela. Lembrou-se das noites quentes em Hogwarts, quando ela e os amigos fugiam à socapa dos dormitórios e iam estender-se na relva perto do lago, a observar o céu. Depois, imaginavam desenhos engraçados, gozando com uns e outros.

Estranhamente, parecia-lhe distinguir agora os mesmos desenhos que distinguia há anos atrás: um leão em posição de combate ("- Yeah, Gryffindor ao poder!"), uma vassoura ("- Agora ia jogar Quidditch! Queres, Harry?"), um grupo de livros ("- Oh, não , esqueci-me de estudar a matéria de Poções!!"), uma bota ("- Bota?! Sim, para bater no Malfoy!"),...

Pensava também na discussão que tivera com Harry. Pensando bem, se calhar tinha sido injusta para com ele! Dumbledore tinha falado em rumores, não em factos! Não havia provas que Harry namorava com Ginny, excepto naquelas mãos juntas. Fora cegada pela raiva e pelo ciúme. Tinha de lhe pedir desculpas, sim! Mas acontecia tudo sem ela perceber, de maneira muito confusa! Porquê?

Não soube quanto tempo esteve ali, deitada ao ar livre. Podia ter estado quinze minutos ou duas horas. Porque ali estava apenas o seu corpo; a mente divagava alegremente num lugar ainda desconhecido para ela. Daí que quando viu uma forte luz e alguém chamou o seu nome, pensou que tinha morrido!

- Hermione?! És tu?

- Sou? Sim, sou...

Semicerrou os olhos e olhou contra a forte luz. Parecia pertencer a um carro! E uma cabeça ruiva esticou-se para fora, naquilo que parecia ser uma janela.

- Ron?- murmurou alegremente- Vieste buscar-me...de carro?

- Sentes-te bem, Hermione?

Não, não era Ron. Dentro do carro estavam os gémeos Fred e George, com os inconfundíveis cabelos vermelhos como fogo. Ambos tinham ido passar o dia a Londres e regressavam a casa àquela hora; esperavam tudo, menos encontrar Hermione, há anos presa num sono profundo, quase desmaiada no chão, longe de tudo e de todos, no meio do nada.

Os rapazes pararam carro e saltaram para o exterior. Hermione arranjou forças para se sentar; sentia-se zonza! Agarrou o pé esquerdo e reparou no inchadíssimo tornozelo. Boa, só lhe faltava essa!

- O que te aconteceu?- perguntou Fred (ou seria George?), agarrando a cara da rapariga- Há quanto tempo acordaste? Como te sentes?

- Deixa-a respirar, homem!- contrapôs o gémeo, a sorrir.

- Sinto-me um pouco zonza. Acordei não há muito, ao entardecer- levou a mão á testa- Podem ajudar-me a levantar? Acho que torci um tornozelo quando tropecei...

Os rapazes estenderam as mãos e ajudaram-na a colocar-se na posição erecta. Hermione não conseguia andar muito bem, mas com esforço lá a meteram dentro do carro. Ela queria ir até á estação, talvez os pais lá estivessem, mas como iria lá chegar com o pé naquele estado? Não custava nada ajudar uma amiga; eles levavam-na.

- Então que andavas tu a fazer por estes lados, Hermione?- perguntou George (ou seria Fred? Não os conseguia distinguir!), virando-se para o banco traseiro.

- Fui visitar uns amigos. Mrs. Weasley, Ginny e... Harry.

Fred e George trocaram olhares.

- A... que bom!- falou Fred, o condutor- O Harry deve ter ficado muito contente.

- Tivemos uma discussão!- confessou ela, com amargura- Excedi-me; mas aconteceu tudo tão depressa! Sinto que acordei de uma normal noite de sono, mas nada é o que parece! Ingressei num mundo diferente; faltam-me peças importantes, como Ron; há um vazio desde os 17 aos 21 anos, ninguém pode preencher! Quando vi o meu namorado de mãos dadas a uma amiga, explodi! Mostrei que sou horrorosa nos ciúmes; se calhar, eles não passam de amigos!

Os gémeos não abriram a boca; nenhum dos 3 passageiros abriu mais a boca. Eles não queriam dizer á amiga que talvez Harry e Ginny fossem realmente mais do que amigos. Não com intenções de chamar o rapaz traidor, mas será que ele amava Hermione como antes ou estava apaixonado pela única que o pudera consolar nos piores momentos? Apenas Harry podia responder...

Perto da estação, tiveram o cuidado de conduzirem no chão e não no céu, para não despertar a atenção dos Muggles. E assim que lá chegaram, foi fácil encontrar os pais de Hermione, sentados num banco e com ar cansado e ansioso. Fred parou o carro, ela saiu.

- Mãe! Pai!- chamou, enquanto coxeava sem parar.

Mrs. Granger correu para ela, com lágrimas a escorrer dos seus olhos escuros, para a abraçar. Também lá vinha Mr. Granger, mais moderado que a esposa, mas muito comovido por ver a sua filha sã e salva após quatro anos de temores e receios.

- Oh, Hermione, como estás?- perguntava a mãe- Que aconteceu ao teu pé?

- Só uma entorse, nada de preocupante!

A rapariga voltou-se para trás, onde Fred e George continuavam a sorrir- lhe, dentro do carro. Fez-lhes adeus.

- Obrigada, rapazes!- gritou- Desculpem o incómodo. Obrigada!

Os gémeos acenaram-lhe também e partiram. Mr. Granger viu-os e fez-lhes também adeus.

- Quem são?

- Fred e George Weasley, não se lembram de falar deles?

- Ah, claro! Cabelo ruivo...

Em breve, os três deixaram a estação. Hermione teve de ser auxiliada pelos pais a chegar até ao carro, tendo partido de seguida para o apartamento onde todos viviam na capital inglesa.

Durante a viagem, conversaram. Foram quatro anos sem se verem, cheios de novidades que precisavam de ser contadas. O casal encheu a filha de informações acerca do mundo Muggle, tanto a nível mundial como pessoal. Falavam alegremente, de maneira rápida, como se a noite fosse acabar antes de eles contarem tudo o que queriam.

Já Hermione contou tudo sobre o seu mundo aos pais. Que viviam em paz há dois anos, que aquele período seria complicado, que perdera diversas pessoas ao longo da guerra, entre elas o amigo Ron. Contou tudo o que podia; até mesmo aquilo que fizera após acordar, e que motivara o seu atraso.

Contou tudo; excepto a discussão que tivera com Harry! Sentia-se culpada por discutir assim com o namorado (seria ainda seu namorado?), sem o deixar explicar-se, baseada em rumores. Sabia que eles adoravam a relação dela com o menino feiticeiro. Era cedo para dar palpites e armar mais discussões que aquela que armara...

***

Vira o sol nascer naquela manhã de Julho. Na verdade, Hermione não pregara olho durante toda a noite, quente e seca. Rebolara na cama, atirara os lençóis ao chão e acabou por se levantar às 4 da manhã. Não soube porquê, mas viu todos os vídeos que os Grangers guardavam sobre ela: o baptizado, os aniversários, as festas de Natal, as férias de Verão,... Tempos bons, de felicidade e alegria, sem pensar nas partes mais chatas que fazem parte da vida.

Os seus pais acordaram. Agora, teriam e retomar uma vida normal...não, ela achava que isso era impossível! Porque, para além do facto que ela tinha acordado do coma, ela era uma bruxa. Nada poderia ser normal ou igual ao passado.

Após o almoço, decidiu sair um pouco de casa. Precisava de espairecer as ideias, mexer as pernas, apanhar ar. Só não sabia onde ir: visitar o mundo Muggle, que raramente visitava devido à nova posição de feiticeira; ou visitar o mundo mágico, com tantas coisas novas para descobrir. Mais uma vez, sentiu a mente abandonar o seu corpo, enquanto este percorria as ruas de um deles. Mágico ou Muggle, ela não percebia!

Ruas estreitas e largas, casas pequenas e grandes, pessoas gordas e magras. Vestiam mantos longos, que levou Hermione a perceber que visitava o mundo mágico. Subiu ruelas e montes, parecia mais que alguém lhe ordenara um caminho que tinha de cumprir. Parecia que uma força a chamava para aquele lugar! Porquê?

Abrandou de espanto ao chegar a uma espécie de bairro. Não o conhecia, mas sentiu uma profunda tristeza ao ver as enorme mansões que o compunham destruídas. Conseguia ver o interior delas ali, do meio da rua. Sem telhados, com vidros partidos e paredes destruídas. Vislumbrou também manchas de um estranho vermelho-escuro nalguns locais. Sangue perdido por aqueles que ali habitavam anteriormente! Sangue amigo ou inimigo?

Porque é que ela ali fora? Para quê encontrar aquele cenário horrível? Aquilo não lhe dizia nada, apenas a podia colocar ainda mais triste! Além disso, parecia que naquele local estava mais frio!

Afagando os braços nus, virou costas a uma das mansões, que possuía um jardim sujo e cheio de ervas daninhas, quando ouviu um barulho dentro dela. Estaria lá alguém ou seria apenas um pobre animal?

- Está aí alguém?

Respondeu-lhe o silêncio. Pensando de novo num gato ou outro animal, desviou o olhar, quando um outro barulho ainda mais forte se fez ouvir. Virou-se e viu alguém à porta da casa: uma figura magra, pálida, de cabelos loiros corridos e de olhos azuis, sentada numa prateada cadeira de rodas. Reconheceu-a logo:

- Malfoy?- Hermione deixou cair o queixo.

Sim, era ele! Era o mesmo olhar azul e altivo, o mesmo sorriso trocista e manhoso no canto da boca. No entanto, a sua expressão estava agora cheia de mágoa e tristeza. Hermione olhou a cadeira onde ele estava sentado. Era esquisito vê-lo assim.

- Mas... que te aconteceu?

- Ora, Granger- Malfoy esboçou um sorriso trocista- estás preocupada comigo? Querias estar aqui no meu lugar? Que queridinha; pena que eu não seja tão doce como tu! Para que é que acordaste, foi um sossego enquanto dormiste!

Riu sarcasticamente após estas palavras. Continuava nojento e desprezível, como sempre!

- Escusas de ser malcriado ou achas que eu tenho disposição para te aturar?

- Porque não? Sempre pensei que a rata de biblioteca tivesse disposição para tudo! Foi o tijolo que te atingiu o cérebro ou foram os quatro anos que passaste a dormir?

- Foi ter-te visto tão cedo!- disse Hermione como se cuspisse algo desagradável- Afinal que te aconteceu para estares nessa cadeira?

- O que te interessa? Queres gozar comigo, Granger? Sonha, eu não te dou esse prazer. No entanto, existem coisas interessantes acerca de ti para eu falar: vejamos, aposto 10 galeões em como choraste baba e ranho quando descobriste que o querido do namoradinho andava agarrado a outra.

- Cala-te!

- Não queres ouvir, não é? Custa admitir que o amorzinho preferiu uma tonta sem dinheiro à maior inteligência de Hogwarts! Agora choras porque o Potter preferiu a Weasley e já não o agarras outra vez!

- O Harry ainda não namora a Ginny! Não sabes nada do que se passa!

Ele riu novamente. Porque será que o riso dele era sempre tão desagradável?

- Claro que não sei nada! Isso vindo da boca daquela que mal leva uma cacetada fica quatro anos a dormir; ficas a dormir durante toda a guerra, não sabes nada do que aconteceu durante esse tempo! Tu és a única que não percebe aquilo que se passa! NADA! E para agora andares a fazer figuras tristes, era preferível que não tivesses acordado; era um favor que me fazias a mim e ao mundo.

Assim que acabou de gritar, a cadeira onde Malfoy se sentava começou a andar para a frente. Passou pela rapariga, que não encontrava argumentos para lhe atirar á cara. Ele podia magoá-la, mas dizia a verdade: o que é que se passava no mundo agora? Quem a podia ajudar a descobrir a resposta?

- E...- Malfoy virou-se para Hermione de repente- o que é que aqui estás a fazer?

Não soube o que lhe responder. Fora parar ali por acaso, como se um íman a atraísse ao local, mas ela não entendia o porquê. Que lhe trouxera a descoberta? Mas não podia dizer aquilo ao rapaz que a olhava, esperando a resposta.

- Que local é este?

- Que inocente!- os olhos azuis pararam na face dela- Devoradores da Morte. Tudo de Devoradores da Morte! As casas, os jardins, as ruas, o ar deles! Agora pega na varinha e pega fogo a tudo, ninguém se importa; desapareceu tudo. A maior parte deles morreram quando os nojentos dos teus amiguinhos cá chegaram; o resto deles foram presos!

Nova rajada de vento e os caracóis de Hermione emaranharam-se.

- E já agora- o sorriso idiota apareceu no canto dos lábios de Malfoy- ficas a saber que foi ali, frente àquele jardim, que morreu o Weasley, o teu amigo! Morreu com um crucio, dirigido sabe-se lá por quem. Também choraste muito?

- Isso não, Malfoy!- pediu Hermione- Sei que os Crabbe morreram todos, deves saber o que é morrer um amigo. Ops, esqueci-me: tu e o Crabbe não eram amigos, tu nunca tiveste amigos! Era apenas o guarda-costas que te amparava se partisses uma unha...

- Não fales assim comigo, sua Sangue de Lama estúpida! Julgas que só tu és a mulher-maravilha, é? O meu pai morreu aqui, a proteger Voldemort, que nunca fizera nada por nós; a minha mãe morreu aqui, para me proteger a mim, que nunca fizera nada por ela- gritou ele, sem controlo- Se quiseres, goza á vontade comigo. Porque mais uns dias e morro também; e o teu mundo fica feliz, cor-de-rosa e cheio de anjinhos tocadores de harpa porque eu morri e fui fazer companhia aos meus pais, não é?

Hermione olhou Malfoy boquiaberta, sem saber o que dizer. Que poderia ela dizer? Alguém a poderia acudir?

Não foi nada de muito preocupante. Porque o rapaz percebeu que falara demasiado e num instante virou costas a Hermione e abandonou o bairro... de vez.

*Continua...


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