Salvatore escrita por Yokichan


Capítulo 4
04




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— Vocês vão pro Blackout amanhã? O Sam disse que...

            Ombros.

            Ela repara nos ombros dele, largos e ossudos sob a camiseta.

            Salvatore está de costas para ela, de pé na beira da calçada conversando com um garoto que, para Annie, não tem rosto nem nome. Ela só vê aquele que quer para si. E pensa, os olhos brilhando no escuro, que gostaria de ir até ele — ir agora — e apertá-lo num abraço sem fim. E envolver aqueles ombros em seu abraço.

— Ei, passa a cerveja pra cá.

            Eles estão sentados na velha mureta do terreno baldio, um bando de adolescentes de tênis surrados rescendendo a álcool e a cigarro. É madrugada e a luz amarela do poste os faz parecer doentes com seus olhos semicerrados e suas risadas alucinadas.

            Mas ela já se esqueceu daqueles que chama de amigos.

— ... e saiu da banda. O cara é pirado.

            Ela só o vê.

            Vê seu sorriso enquanto ele fala.

            Ele está gesticulando e sorrindo naquela conversa da qual ela só ouve palavras soltas. Salvatore está a um metro de distância e ela sente, quase em desespero, que ele está muito longe. Annie só queria que ele fosse se empoleirar no muro ao seu lado como antes. Ela está apaixonada por aquele sorriso que ora a leva ao céu e ora a faz cair até o inferno.

            Annie quer muito que ele sorria para ela.

— Porra, Mark!

            Um copo cai e o cheiro forte de álcool se espalha na noite como veneno.

            Mas isso não importa.

            Só o que importa é o som macio e profundo da risada de Salvatore. Uma risada que dá água na boca e que vicia como heroína direto na veia. Annie sente os pelos de seus braços ficando de pé e abraça a si mesma como se estivesse com frio, embora seja uma noite quente de outono. Ela pensa que poderia ficar ali para sempre o ouvindo rir.

            Então ele vem para o seu lado e ela congela.

— ... jogando bilhar.

            Salvatore acende um cigarro e traga.

— Não, essa música não é do Nirvana.

            Ela o observa soprar a fumaça para o alto num cone perfeito.

            E pensa que nunca um homem fumando foi tão elegante. Seus movimentos simples e suaves, o cigarro pendurado no canto da boca enquanto ele se serve de mais um copo de bebida, a fumaça escapando numa nuvem perfeita por entre os lábios e sendo sugada de volta, o modo distraído como ele prende o cigarro entre os dedos, tudo nele a atrai.

            Ela tem vontade de beijar-lhe a boca com gosto de fumaça.

— Acabou a vodka.

— ... mas a Becca disse que falou com o cara...

— Quem tem dinheiro aí pra comprar mais?

— Quê?

            Números.

            Salvatore é tão bom com números como Annie jamais viu.

            Ela não vê quando os outros tiram moedas e notas amassadas dos bolsos, só o vê ali ao seu lado fazendo contas de cabeça com a mesma rapidez e facilidade de uma calculadora. Ele sabe resolver problemas de matemática e equações físicas que ela nunca imaginou que existissem. Ele sabe biologia e química como nenhum de seus professores de escola sabiam. E toda a sua inteligência a fascina como uma mariposa enfeitiçada pela luz.

— O que foi? — ele pergunta.

            E só então ela percebe que o esteve olhando fixamente por muito tempo. Ela sente o rosto esquentar e balança a cabeça numa negativa enquanto balbucia qualquer coisa. Ela desvia o olhar para as janelas iluminadas do bar do outro lado da rua, para os carros estacionados no escuro, para as pessoas paradas na esquina, mas quando volta a olhá-lo, Salvatore ainda a está encarando.

            Está encarando-a com aquele sorriso que a faz estremecer.

            E ela não pode deixar de olhar bem fundo nos olhos dele.

            E

— Annie?

            se perguntar de onde veio aquele amor.

            Os olhos dele são a coisa mais bonita na qual ela já se viu refletida.

— Eu devo ter dormido acordada. — ela sorri. — Não ligue.

— Estranha. — ele solta mais uma daquelas risadas gostosas.

— Eu sei. — e dá de ombros.

            Annie se pergunta o quão mais estranha ele a acharia se ela pedisse para ser beijada naquele momento.


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Notas finais do capítulo

Gosto em especial desse capítulo. É tão... uh, beija logo.
OEHOAHEOHOEHO



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