As Blue As Love Can Be escrita por Menta


Capítulo 6
Perdido


Notas iniciais do capítulo

Um capítulo intermediário. Vai servir de ponte entre o antigo Petyr e o novo Petyr! De grande importância para a fundação de sua nova personalidade, hoho.



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Tudo era fogo. O jovem Petyr Baelish encontrava-se agora deitado, em meio a uma fraca recuperação de seus ferimentos, dominado por febre de altíssima temperatura, em uma cama cujo colchão era recheado por palha, com algumas pulgas como frequentadoras. Levaram-no para um quarto mobiliado com parcos e poucos móveis de madeira: via-se uma pequena cômoda ao lado da cama, junto com um armário baixo e uma cadeira bamba. Seu corpo e mente ardiam, e sofria de dores agudas dos pés a cabeça. O rapaz alternava momentos de lucidez com devaneios, devido à febre altíssima e ao teor grave de seus ferimentos. Aparentemente, estava sendo cuidado por algum curandeiro local, não por um meistre, uma vez que o homem que o tratava não usava as típicas vestimentas da ordem, tampouco o colar característico. Mas estava em um estado sofrível demais para que reparasse nisso. Havia momentos em que não sabia dizer quantos anos tinha, ou em que lugar se encontrava. Perdia parte da memória, e se sentia confuso e desamparado. Em outros, encontrava-se lúcido. Esses eram os piores. Quando se lembrava do duelo que havia perdido, no qual perdera junto o grande amor de sua vida, sentia não apenas uma agonia física como entrava em um estado de extrema angústia, envolto por aguda dor emocional e mental. Não entendia. Por que os deuses mantiveram-no vivo, se tudo o que mais amara havia sido perdido? Era de uma fina e maligna ironia. Além de todo o sofrimento, ainda por cima sentia-se solitário. O homem que cuidava de seus ferimentos nunca falava com ele, e, se Petyr tentasse dizer-lhe as poucas palavras que conseguia encontrar forças para pronunciar, era ignorado.


Uma única tarde, porém, Brynden Tully aparecera para visitá-lo. Petyr desejava nunca mais ter de trocar palavras com nenhum dos Tully que o criaram, mas não conseguiu fingir que não estava acordado, para evitar trocar palavras com o “tio”. Quando o homem abrira a porta do quarto, o rapaz tentava alcançar com as mãos fracas um copo d’água posto em sua cabeceira. Neste momento, estava lúcido, e não desejava ver ninguém.


– Como está indo, garoto?


– Como lhe parece? – Tentara dar um sorriso falso, mas não tinha forças suficientes para mover os músculos necessários do rosto para tanto.

– ....Escute. Não foi por minha vontade que o mandamos para cá. Depois do duelo, bem, Hoster ficou irascível. Tentei meu máximo para convencê-lo de que você pudesse ficar em seu quarto até se recuperar, sendo tratado pelo meistre de Correrrio, mas Hoster se recusou a me ouvir. Tem de saber que fiz meu melhor, filho.


– Não duvido... Se dependesse da hospitalidade de seu querido irmão, provavelmente ele teria mandado que seu capataz terminasse o trabalho de Brandon por ele.


– Petyr... Encontrei este curandeiro do vilarejo em que estamos agora, sabe qual é? Estamos vizinhos ao castelo de Correrrio, e sei de sua reputação. Trata dos aldeões, e até de nossos ferreiros quando se ferem em seus trabalhos. Está em boas mãos.


– Nas mãos que merece um rapaz pobretão dos Dedos...


– Basta, Petyr. Não se faça de vítima. Tinha de ser grato por estar vivo. Todo este duelo foi uma ideia louca sua, assuma a responsabilidade como o homem que foi ao desafiar Brandon. Fico feliz de ver que sua mente ágil não foi prejudicada.


– Você me encontrou em um bom momento. Aparentemente, ando alternando momentos de lucidez com demência. Poético, não? Poderia dar uma bela canção: o rapaz pobre que perdeu sua amada e seus miolos em um estúpido duelo, para o maldito senhor rico sodomita do Norte. - Petyr não entendia o grande valor de ter sobrevivido, se significa apenas mais humilhação e sofrimento.


– BASTA! – Petyr assustou-se. O “tio” estava sério e irritado, e olhava-o com grande censura, comportamentos nem um pouco típicos de Brynden. – Não aturarei mais esse tipo de coisa vinda de você. Quase se matou por loucura, não permitirei que estrague mais ainda sua própria vida. Já avisei a seu pai que está ferido, porém em processo de recuperação. Creio que eu não preciso informá-lo de que terei um trabalho de dias, ou talvez até de semanas, para convencer Hoster a recebê-lo novamente como agregado. Terá de desculpar-se a ele, assim como renovar seus votos de vassalagem. E, acima de tudo, terá de deixar Catelyn em paz. Por um bom tempo, não poderão sequer se falar. Não estou pedindo que o faça, pois sei que é inteligente o suficiente para saber que é ou escolher isso ou voltar para os Dedos. E o conheço bem demais para saber que não é isso o que quer da sua vida. E agora, meu filho, tenho más notícias para te dar, também. Quer ouvi-las agora?


– Se Brandon não me matou, não vão ser palavras que irão fazê-lo... – Petyr engolira em seco. Sabia que era isso o que teria de fazer se quisesse, algum dia em sua vida, ter alguma ascensão maior do que se tornar o “Lorde Mindinho da bosta de ovelha”. Além de tudo, devia a tentativa a seu pai. Mesmo que não encontrasse mais alegria alguma em viver em meio aos Tully, tinha de fazê-lo, pois a outra escolha conseguia ser ainda pior. E, por falar em pior... Se isso não era a má notícia, o que seria então?


O “tio” se aproximou e tomou-lhe a mão que tocava o copo d’água. – Filho. Não sei como lhe dizer isso com meias palavras, mas, sua mãe faleceu. Enquanto você passava de um estado crítico a uma pequena melhora, nesse meio de tempo de duas semanas, Alayne apanhou um resfriado que se transformou em uma pneumonia e... Não resistiu. Eu realmente sinto muito. – Apertou com força sua mão. – Mas seu pai passa bem, apesar do luto. Avisei-o que você também passa bem, mas deixei de fora os detalhes do duelo. Achei... Recomendável.


Petyr esperou para que o baque viesse. Estranhamente, não sentia nada. Não sentia nada além da dor física, da humilhação e de toda a rejeição que sofrera de Catelyn. Nada, além de solidão. Creio que alcancei um nível em que a dor não pode se tornar maior...


– Filho, não se preocupe. Ela... Não sofreu. E tenho certeza que olha por você, junto aos sete deuses. Estou certo de que ela está feliz por saber que seu filho viverá, forte e sadio. – “Tio” Bryden apertou novamente sua mão. Petyr continuara calado. O que havia para dizer? Sentia como se tudo pudesse explodir à sua frente, e não sentiria mais nada. Se acostumara à dor, assim como as perdas da vida... Vazio. Tudo é vazio.


Lembrava-se muito pouco da mãe: uma senhora bela, de cabelos tão escuros como os dele, de baixa estatura e com os mesmos olhos cinza-esverdeados do filho. Uma moça de nascimento pobre, porém de beleza simples, e sorriso fácil, de mãos calorosas e abraço aconchegante. Mas fora separado dela e de seu pai ainda muito novo, para ser enviado para Correrrio. Do pai, lembrava apenas do rosto melancólico, porém resoluto, de quando se despedira de seu filho no cais dos Dedos, dizendo-o que seria um grande homem, como nunca pudera se tornar.


– Petyr? Filho, se quiser, tentarei vir visitá-lo com maior frequência, deve se sentir solitário...


– Não se preocupe comigo. Agradeço pelo curandeiro e por seus esforços, mas creio que tem mais a fazer do que visitar-me como a uma criança enferma e débil.


Brynden aparentou tristeza por uma fração de segundo, mas recompôs-se. Parecia que decidira de fato a adotar uma postura mais firme com o rapaz. - Então, já vou. Certifique-se de seguir as orientações do curandeiro para que se cure o mais cedo possível. Quando o “tio” estava quase alcançando a porta, Petyr não aguentou e chamou-o.


– “Tio”... Me desculpe. Peço perdão por tudo... Menos por Cat.


Brynden não pôde se segurar. Sorriu, repleto de satisfação, como se recebesse palavras de afeição vindas de um próprio filho de seu sangue.


– E é claro que eu o perdoo, meu filho.


Esperou o tio deixar-lhe a sós para derramar suas lágrimas. Uma, por sua mãe. Outra, pelo seu pai, agora sozinho em uma terra miserável. Outra, como sempre, por sua Cat, agora perdida para sempre. Deitou-se, e tentou adormecer, torcendo voltar para a terra dos sonhos e não ter mais de acordar. Contanto que sonhe com Cat...


***


O menino Petyr estava deitado na grama, acompanhado de Catelyn criança, que cantava ao seu lado, enquanto segurava sua mão, e movia-a no ritmo da canção. A sua frente estava a costa que banhava os Dedos, e atrás das duas crianças a torre antiga de Pedravelha. Olhou para Cat e viu que ela usava a coroa de flores que fizeram juntos.


Eu amei uma donzela linda como o outono, com o pôr-do-sol nos seus cabelos.


Ela está cantando essa música. Petyr sorria, enquanto a doce voz de Catelyn embalava seus ouvidos e coração. Acima, apenas o céu de azul cerúleo como os olhos de Catelyn. Azul... Tudo estava em paz. Até o momento em que o céu subitamente tornara-se vermelho. Olhou para as suas mãos, e elas estavam repletas de sangue. Nervoso, checou de onde via o líquido, e percebeu que seu corpo inteiro sangrava junto. – Cat? – Chamou desesperado.


Ouviu o riso da menina transformar-se no riso da Catelyn moça, e quando olhou para a frente viu que a menina já era a Catelyn atual, e estava sendo levada no colo por um homem alto com pele de lobo. Ela ria, ria sem parar, e o homem andava rápido, com passos que Petyr não conseguia acompanhar. O homem fedia, um cheiro de neve, de frio e de lobo, onde antes a fragrância era o perfume floral de Cat.


O céu e a grama, as árvores e o mar, as pedras da torre, tudo estava mudando de cor e adquirindo um tom avermelhado. Azul... Onde está o azul? Tentava ver os olhos de Cat, mas não conseguia; o nortenho estava já muito a frente dele. – LARGUE-A. – LARGUE-A AGORA! – Tentava correr atrás do casal, mas estava muito fraco, perdendo sangue que vertia de todo seu corpo, cada vez mais. Caiu na grama, sentindo-se tonto e sem forças. – Caaaaaaaaat! – Tentava gritar, mas a voz não saía. Ao longe, só ouvia o riso fraco da garota, que se afastava...


– Petyr, querido, me dê a mão. A mamãe colherá ervas pra você, tudo vai passar. Você vai ficar bem. – Olhou para trás e sua mãe encontrava-se ali. – Mãe? Mãe, ele levou a Cat, me ajude. – Alayne puxou a mão do menino, com uma força monumental, deixando-o em pé.


O rapaz Petyr do presente acordara com um sobressalto, sentado na cama de palha. Mais um sonho... Chamou o curandeiro até que aparecera no quarto, e implorou por vinho dos sonhos. Estava cansado demais de lutar e sofrer, não tinha paz nem mesmo enquanto dormia. Adormeceu novamente, tendo calafrios por conta da febre, mas não saberia dizer se eram da enfermidade ou trazidos pelo homem do Norte, que roubara-lhe tudo que lhe importava, deixando-o sozinho, entregue ao frio que congelara até seu coração.


***


Acordou novamente com o barulho da porta abrindo, com um rangido agudo. A febre aumentara, e o jovem rapaz estava na curva final da enfermidade, no momento em que a doença atinge um pico para depois apenas melhorar. Encontrava-se, agora, em estado de pleno delírio.


A garota Lysa não sabia disso, aparentemente, pois aproximou-se dele e tomou sua mão, tentando conversar como se ele estivesse em condições para tal.


– Quem é você? Lysa? Lysa, você conhece a minha mãe? Ela é uma senhora muito sábia e bela, mande buscá-la, ela vai saber tratar melhor da minha febre. Está doendo muito. Minha mãe sempre me deu chás curativos quando eu caía adoecido. Aqui nos Dedos têm aldeões que cultivam várias ervas com essas propriedades, chame minha mãe, ela vai saber o que fazer. Depois chame a Cat também, quero vê-la. Preciso. – Petyr pedia com uma voz aguda, diferente da que tinha normalmente, como uma criança desamparada que suplica por ajuda.


Depois disso, sentira-se muito fraco. - Chame Cat, chame... - Mal terminara de pronunciar a frase, quando seus olhos se fecharam para adormecer novamente, e o último som que ouvira foram os soluços abafados da menina sentada ao seu lado.


Quando acordou novamente, descobrira que havia dormido por três dias. Um homem, aparentemente um criado, estava parada na frente da porta do quarto. - Senhor Petyr? Sou um enviado do senhor seu pai. Estou com as suas coisas, podemos partir quando se achar em condições. O curandeiro informou-me que quando acordasse, provavelmente poderíamos partir.


Petyr olhou para o lado direito do homem, e viu: lá estavam todos os seus pertences que levara a Correrrio, o baú que guardara o lenço de Cat e os outros presentes que acumulara em sua infância no castelo, bem como malas e malas com todas as suas vestimentas e objetos. Não entendia.


– Partir para onde, exatamente? – Olhou o homem com desconfiança.


– Ora, senhor, onde mais? Sua casa. Os Dedos. Deve estar com saudades. O senhor seu pai está.


Petyr sentia-se tonto, mas não mais devido à febre, que já não existia. Dedos? Brynden lhe dissera que iria voltar a Correrrio. O que mais acontecera nesse meio tempo de pesadelos, febre e delírios?


– Ah. A senhora Lysa, em segredo, claro, implorou-me que lhe entregasse essa carta. - O homem se aproximou da cabeceira da cama e lhe estendeu um papel.


Petyr tomou o papel das mãos do homem, e começou a ler, ansioso.


Querido Petyr,


Me perdoe, meu amor. Não aguentei vê-lo nesse estado, temi tanto que pudesse ter enlouquecido, que eu mesma cometi uma loucura. Lembra-se da noite em que nos amamos? Nosso amor era tão puro, que, apenas por causa dessa única noite, engravidei de uma criança nossa. De início, assustei-me, somos muito novos. Mas, depois, vi que isso era apenas a prova de nosso amor concretizado. Quando o vi sofrendo alucinações, não pude me segurar; fui correndo implorar a meu pai que mandasse o meistre tratar-lhe, e contei-lhe que esperava um filho seu, que precisaria do pai querido vivo para cuidar dele e dar-lhe o amor que lhe era devido. Meu pai, o homem horrível que é, me castigou. Obrigou-me a beber chá de lua, tanásia, e todos esses procedimentos abortivos. Por favor, Petyr querido, me perdoe. Sabe que te amo mais do que tudo, e agora nem mais Catelyn poderá nos separar. A minha irmã má nem sequer foi lhe visitar quando esteve doente, sempre lhe disse que ela não tinha coração e manipulava-o. Mas não se preocupe, na verdade tudo isso virá para um bem maior. Darei um jeito de vivermos juntos, agora que irá para sua terra natal. Aguarde, prometo que compensarei meus erros. Teremos a oportunidade de vingar nosso filho, e constituiremos uma linda família.


Da sempre sua, Lysa.

Petyr virou-se para o lado, com as mãos tremendo, e vomitou.

– Senhor? Senhor, está bem? Vou chamar o curandeiro. – O homem saiu correndo do quarto. Maldita. Mil vezes maldita. Lysa Tully conseguira ser mais estúpida do que nunca, e estragou na sua burrice toda a pouca chance que tinha de seguir algum rumo maior. Estou perdido. Agora, definitivamente. Levantou o olhar, desesperado.

Quando olhou para sua cabeceira, notou um objeto estranho. Uma espécie de pano, atrás do vinho dos sonhos. Pela madeira da janela, o sol refletia halos de iluminação na cabeceira, e deixava sombras e luz no móvel. Curiosamente, no feixe de luz mais brilhante, o rapaz reparou em uma figura conhecida. O pequeno tejo, o pássaro das cem línguas, bordado delicamente, junto às palavras “Príncipe das Libélulas”.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado! Desculpem a demora para atualizar, mas comecei em um estágio novo, e tive de direcionar as minhas energias para o trabalho. :3