"O Inimigo

Ó dor! O Tempo faz da vida uma carniça,

E o sombrio Inimigo que nos rói as rosas

No sangue que perdemos se enraíza e viça!" (As flores do Mal, Charles Baudelaire)

Dois meses se passaram e a saúde de Sor Willem Darry piorava a cada dia. Rhaneys passeava pela casa com os ouvidos atentos e passos furtivos, procurando entreouvir as conversas entre os criados, e já estava preparada para uma partida imediata. Tinha sua roupas e as joias que poderiam vender bem escondidas em seu quarto. Incitara Viserys e Dany a fazerem o mesmo. Se algo ocorresse, estariam preparados.

Sor Willem não saía mais da cama. Suas forças estavam se desvanescendo a olhos vistos. Quando não estava vagando pela casa, Rhaenys estava junto à sua cabeceira, conversando sobre o clima, os livros que lera recentemente, qualquer acontecimento diferente que sucedesse nas redondezas. Naquele dia, quando já estava perto do anoitecer, ao entrar no quarto de Sor Willem, Viserys já estava lá.

_Ele está pior. E se recusa a nos deixar chamar alguma ajuda.

_Ele não está doente. Está velho. - Rhaenys suspirou e se juntou a Viserys em uma cadeira ao lado da cama, apoiando a cabeça em seu ombro. Ela parecia mais pálida que o normal, sua pele quase confundindo-se com seu cabelo.

_O que vamos fazer?

_O mesmo de sempre. Seguir em frente. Não deverá ser muito difícil. Quem não gostaria de nos auxiliar?

Dito isso os dois permaneceram em silêncio. Viserys tinha os braços ao redor de Rhaenys, e esperava que ela não sentisse seu nervosismo. Ela andava estranha aqueles dias, mal falava, nem mesmo com ele, chegando a tratar Dany rispidamente. Ele nunca tinha visto ela dirigir uma palavra indelicada para Daenerys antes, ela amava aquela garota. Ele sentia que havia algo que ela mantinha escondido, algo terrível o suficient para até mesmo ele ser deixado de fora. E por mais que pensasse, Viserys não conseguia achar uma solução.

Sor Willem morreu tão tranquilamente que mal notou-se o momento exato de sua partida. Rhaenys observou que seu peito não mais se movia, e ao tomar seu pulso, Viserys constatou o que já sabiam.

_Está morto. - Nenhum dos dois derramou uma lágrima ou comoveu-se com a morte do homem que havia sido como um pai por aqueles nove anos.

_Tenho de achar Dany e buscar nossas coisas.

_Tem certeza?

_Não. Mas não podemos nos arriscar. Vá buscar suas coisas.

Rhaenys encontrou Dany sentada no chão de seu quarto com um livro no colo, as mechas de cabelo prateado caindo sobre seu olhos liláses. Por um momento hesitou em interrompê-la, interromper sua paz. Mas era preciso. Curvou-se como se examinasse o livro e sussurrou no ouvido da tia.

_Agora.

Os olhos das duas se encontraram em compreensão e Dany tirou de debaixo da cama uma bolsa de couro que tinham previamente preparado.

_Busque minhas coisas também. Nos espere na porta da biblioteca. As duas se separaram. Rhaenys iria atrás de Viserys. Mas uma mão forte pegou-a pelo braço, forçando-a a se virar. Ela reconhecia aquele rosto, mas nunca se dera ao trabalho de aprender o nome de todos os criados.

_Oh, a princesinha de gelo está assustada? - zombou ele, achando graça - Não se preocupe. Só queremos a casa e os objetos de valor que ela guarda. Espero que goste de mendigar, princesinha. - e dizendo isso ele arrastou-a até a porta, e por mais que ela se debatesse, o aperto em seu braço apenas aumentava. Por fim, as portas vermelhas estavam fechadas em sua cara. Dany já estava do lado de fora, os olhos brilhando com as lágrimas, acariciando o braço direito, no qual se formava uma marca vermelha. Graças aos deuses, as bolsas estavam com ela. E a memória de Dany não era muito boa, ela poderia muito bem esquecer aquilo algum dia. Naquele momento, Rhaenys amaldiçoou sua boa memória. Lembrava-se de tudo claramente. De seus pais e avós, o quanto doera cada uma de suas mortes, a necessidade que sentia de protejer Dany e Viserys, Sor Willem que sempre os tratara bem, embora fosse um pouco rude... Sua cabeça parecia queimar de fúria.

Não demorou muito até Viserys também ser posto para fora, em meio a protestos e xingamentos de ambas as partes. Estava claro no brilho furioso de seu olhar que ele continuaria insistindo, então Rhaenys pôs a mão em seu ombro e fitou-o com firmeza. Seus olhar era claro. Nada mais adiantaria.

_O que faremos agora?

Rhaenys olhou Daenerys. Olhou para aqueles olhos que lhe traziam tantas lembranças.

Flashback

Ele começou a afastá-la, mas ela segurou-se com mais força.

_Venha com a gente.

Seus olhos lacrimejaram. Porque eles não iam com ela? Olhou por cima do ombrode seu pai, encontrando os olhos castanhos de sua mãe. Ela segurava Aegon nos braços com firmeza. Algo estava  acontecendo, por que não lhe contavam o que era?

_Não se preocupe - sussurrou Rhaegar - Os dragões sempre vencem. Em breve nos reencontraremos.

Ela olhou em seus olhos lilases e pode ver ali um brilho de determinação, de certeza. Confiou nele.

Viserys os observava, torcendo as mãos. E se ela escolhesse ficar? Rhaenys era a única coisa que ele pedira para ir embora da Fortaleza Vermelha. Ele iria, mas com ela.

Rhaegar pousou-a no chão, dando-lhe um beijo na testa. Ela foi se encontrar com Viserys e Rhaella, que acariciava sua barriga proeminente com as duas mãos.

Olhou para trás, vendo aqueles olhos tão lilases pelo que seria uma última vez

Fim do Flashback

E agora ela via novamente os olhos de Rhaegar em Daenerys. O olhar de quem não sabia o que ia acontecer mas sabia que tudo ficaria bem.

Mas Rhaegar se enganara.