Commentarius Angeli - Um Testemunho escrita por Francisco Lima


Capítulo 2
Capítulo 2 Ággelos, o mensageiro




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Capítulo II – Ággelos, o mensageiro.


Os exércitos se encaravam nas campinas. As tropas avançavam e se chocavam com violência ao som de tambores, soldados transpassavam o peito dos cavalos com suas lanças fazendo seus inimigos desabarem e então os generais de cada exercito decretavam o destino de seus homens. A ordem era dada, os arqueiros disparavam suas flechas flamejantes contra os homens restantes no campo e a cavalaria era então enviada para a batalha, para eliminar os soldados inimigos sobreviventes. Está realidade não ficou totalmente no passado, qualquer um que deseje passar por uma experiência similar pode fazê-lo, desembarcando na estação de trem do Brás, na linha doze durante o horário de pico. Está era uma brincadeira comum entre Allan e eu.

26 de Agosto de 2011, agora são 23h16min, eu tive um dia cheio. Começo a ver mais utilidade para um diário, quem mais teria paciência para ouvir os relatos de um dia como este? Será que só nos tornamos verdadeiramente loucos se alguém notar nossa falta de sanidade?

No instante que Allan pronunciou aquele nome por um minuto eu fiquei sem reação, não sabia o que dizer então algo me veio a memoria e retomamos a conversa.

- Gabriel? Qual?  O seu tio? O que ele ia querer comigo? – Essa duvida tranquilizou a minha mente no momento que surgiu, Allan tinha um tio chamado Gabriel que possuía uma oficina mecânica de automóveis, e embora fosse um homem simpático, não imaginei o que poderia querer comigo, eu não sou exatamente o que pode se chamar de candidato ideal para ser seu novo funcionário.

- Não é dele que estou falando Wagner – Disse Allan com ar divertido – Vou lhe apresentar um novo amigo, tenho certeza de que vai gostar dele.

- Não acha que isso tudo é meio repentino Alan? Do meu ponto de vista parece que isto não faz muito sentido.

- Gostaria de poder dizer o mesmo, mas do meu ponto de vista, está é uma situação muito obscura. – Alan estava sempre fazendo piadas que enfatizavam sua deficiência, acho que foi sua forma de superar o preconceito, e ele sempre foi muito bom nisso, todos acreditamos que ele fara muito sucesso fazendo stand up comedy um dia, claro que não esperamos que ele largue a faculdade, está no segundo semestre de direito.

- Qual o sentido em fazer isto Allan? Por que este Gabriel quer me conhecer?

- Sentido? Não há nenhum, o que já enquadra a situação no seu padrão de ações diárias – Algo me dizia que Allan estava inspirado hoje.

- Vamos Wagner, você vai achar legal.

Bem, não vejo razão para continuar descrevendo este diálogo, o fato é que depois de mais uma hora de conversa, Alan me convenceu a sair de casa, nenhum de nós está trabalhando no momento o que nos deixa com a tarde livre para apreciar a paisagem do trajeto realizado pelo trem da linha doze até estação do Brás, onde utilizamos o serviço de metro até a estação São Bento.

O mosteiro São Bento, lar da Ordem dos Franciscanos, a ordem religiosa fundada por São Francisco de Assis na Itália em 1209, este atendeu ao chamado de sua vocação quando Deus lhe falou do crucifixo de São Damião: “Vai e Reconstrói minha igreja”. Seguindo o exemplo de seu fundador, os membros da ordem abrem mão de todos os seus bens materiais, realizando voto de pobreza, castidade e obediência. Os princípios franciscanos são de humildade, simplicidade e justiça, valores que provavelmente o Papa Bento XVI quis transmitir ao mundo quando se hospedou no mosteiro em sua visita ao Brasil em maio de 2007.

- Ordo Fratrum Minorum, a Ordem dos Frades Menores vive aí – Ouvi uma voz feminina falando atrás e mim – É um bonito lugar não acha? Sempre que passo por aqui entro para dar uma olhada.

- Oi Thais, que bom que está aqui! – disse Allan.

- Oi Allan, é bom te ver também – Ela o cumprimentou com um abraço e um beijo no rosto – E a facul como está? Já tá trabalhando?

- Ainda não, mas um dos meus professores me convidou para estagiar em seu escritório no próximo semestre. Foi bem animador, porque naquela mesma semana fui rejeitado em uma entrevista de emprego – Allan falou dando um suspiro de desanimo.

- Isso acontece com todo mundo cara, pra que era a vaga? Perguntou a garota.

- Vigia – Ele respondeu nos fazendo mergulhar em um ataque de risos.

- Como se conheceram? Eu perguntei.

- Cursinho pré-vestibular, ele gostava de me ouvir tocar durante o intervalo. Alias, me desculpe ainda não me apresentei. Prazer sou Thais Vitória.

Thais era uma garota muito bonita, pele clara, olhos verdes, cabelos pretos, lisos e brilhantes até altura dos ombros, onde passavam a ter leves ondulações e cachos definidos que terminavam pouco abaixo da cintura. Os óculos de armação fina e delicada contrastavam com um sorriso doce e atraente. A garota era digna de ser capa de uma destas revistinhas que trazem como destaque dicas de técnicas de beijos espetaculares e previsões falsas, repetidas e alternadas de horóscopo, que fazem sucesso entre as pré-adolescentes mais patricinhas. Bom talvez eu tenha pegado pesado demais, mas acredite diário, ela era muito bonita.

Thais estava carregando uma flauta transversal prateada, o estojo deveria estar dentro de sua bolsa.

- O que mesmo vieram fazer aqui? Ela perguntou.

- Allan quer me apresentar um amigo dele que pediu para me conhecer, você o conhece também?

- Nossa Allan, você não só passou o recado como o trouxe com você? Quanta eficiência ággelos – Ela sorriu.

A interrogação surgiu em minha face.

- É grego, quer dizer mensageiro. – Ela disse

- Ou anjo – Allan completou.

- Por que não entramos? Ela sugeriu.

- Ótimo, eu adoro olhar para as pinturas deste lugar! Allan respondeu.

- Você não precisa fazer estas piadas o tempo todo. Eu disse a ele.

- Eu sei, mas é assim que eu me divirto. Allan devolveu.

O que eu estava escrevendo quando Allan entrou no meu quarto, o lugar onde fomos, o que eu havia visto e aquele lugar espiritual. As conexões que fazia em minha mente eram cada vez mais confusas. Agora são 23h57min, já começo a soltar meus primeiros bocejos. Acho que se alguém um dia ler o meu diário vão pensar que ao invés de escrever sobre a minha vida pessoal eu me trancava no quarto e escrevia historias de ficção.

27 de Agosto de 2011, o relógio do celular marca 0h02min. Às vezes eu me sinto um pouco culpado por não ter que acordar cedo de manha para ir trabalhar, mas ainda estou recebendo o meu seguro desemprego, os vizinhos ainda não estão apontando pra mim e falando palavras inapropriadas e totalmente desnecessárias como diria a minha mãe.

- E então, o que vocês vão fazer mesmo? Já esqueci – Thais perguntou olhando para mim.

- Eu vim falar com Gabriel! Respondi.

- Sobre o que? Ela perguntou curiosa.

- Não faço a menor ideia, pergunte ao Allan. – Eu respondi.

- Sobre o anjo que ele viu – Allan acrescentou.

Eu sei que deveria ter desmentido aquela afirmação, qualquer um teria feito isso, mas eu não esperava que ele fosse falar aquilo. Só consegui olhar pra ele, nenhuma resposta me surgiu, eu então me virei para ela balancei a cabeça em sinal de negação e ela respondeu:

- Sim, foi justamente para isto que veio, foi por está razão que enviei Lucas para te buscar Micael.

- Lucas? Outro agora, quem é Lucas? Perguntei já um pouco impaciente, agora as coisas faziam menos sentido do que antes.

Alan então puxou a manga da minha camisa e me disse:

-Eu Micael, eu sou Lucas!

Mais uma vez este nome surgiu, Micael, neste momento me dei conta de que desde a primeira vez que Alan me chamou desta forma, eu ainda não o havia questionado por isso. Este nome... Realmente, parecia familiar.

- Tá, esse é o jogo mais loco que já vi na minha vida, anjos – falei sentindo o ar fugir dos meus pulmões – do que vocês...

-Acalme o tom de voz, nós estamos dentro de uma igreja. - Allan me advertiu com tom calmo.

- Você vai me apresentar um monge franciscano que na verdade é o arcanjo Gabriel? – Perguntei à Thais.

-Não, eles não são monges, e acho que isso seria um pouco clichê. – Ela disse isto e então pousou sua mão direita sobre meu ombro esquerdo, e então o que vi por trás dela não eram mais as paredes do mosteiro, estávamos em um lugar completamente diferente, uma caverna, uma gruta, no meio do nada, um delírio, o medo apertou o meu peito, embora tentasse eu não conseguia puxar o ar para dentro dos pulmões. Minha bombinha de asma, nunca precisei tanto dela. O medo não desaparecia aquilo não poderia estar acontecendo.

- Você não deveria usar tanto isto. Ela me disse pondo a mão no meu peito e a massagem que ela fez me permitiu respirar melhor, e de uma forma estranha, meu pânico sumiu e minha mente foi tomada por uma calma um tanto quanto artificial, mas acolhedora.

- Me perdoe, deveria ter sido mais discreta, nós estamos na gruta do Lago Azul em Bonito no Mato Grosso do Sul, desculpe eu vi que este era um lugar que você gostaria de conhecer.

Allan parecia agir como se aquilo tudo fosse algo natural. Embora estivesse calmo, sabia que não deveria estar.

- Não é possível – Olhei por de traz dela e vi o lago de aguas intensamente azuladas, como descrito pelos folhetos de passeios turísticos – Você nos transportou pra cá?

- É uma habilidade muito útil para se entregar uma mensagem, mas eu admito que não sou qualificada para substituir os correios, eu não faço serviço de banco – Ela brincou fazendo este comentário, mas o retorno do temor a minha face a fez ficar sem graça.

- Permita-me me apresentar novamente meu caro Wagner, eu Thais Vitoria, apresento-me agora como... Gabriel.

Tudo estava confuso, embora nada tivesse qualquer sentido lógico, não havia como ignorar a atual situação. Mas Gabriel decidiu que não era o momento para conversarmos abertamente sobre tudo, disse que me daria tempo para me recuperar do trauma, que havia se precipitado um pouco, e então nos trouxe de volta e me instruiu a aguardar um sinal, suas ultimas instruções para mim foram: “Aguarde, logo chegará o momento”.

0h47min. Estou com sono e não há mais nada para escrever, bom diário, agora eu vou dormir.

0h54min. O celular tocou, o numero no identificador de chamada era mais do que conhecido.

- Alo, Wagner? Sou eu Allan, olhe pela sua janela!

Quando Wagner se virou para a direção de sua janela, viu Thais de pé olhando em sua direção.

-Venha Micael, o momento chegou!


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