Laços Fraternos: Megera escrita por MyKanon


Capítulo 32
XXXII- Doce castigo




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No fim da manhã, Lorrayne abrigou-se no quarto do primo Eduardo, esperando sua chegada. Quando o garoto entrou e a encontrou esticada sobre sua cama, perguntou:

_ Alem de tudo, a tia Martha te tirou o quarto?

_ Quem dera se ela me expulsasse.

_ O que faz aqui tão cedo?

_ Ela também me pôs de castigo. Não posso voltar pra escola enquanto ela não quiser...

Lorrayne notando um violão que Eduardo trazia, perguntou:

_ O que é isso?

_ O que parece ser?

_ Um violão...

_ Talvez seja porque é realmente um violão.

_ Mas de quem é?

_ Roubei enquanto vinha pra casa...

_ Super engraçado. É seu mesmo? Comprou?

_ Eu tinha emprestado pra Fernanda.

_ Oh... Ela toca, é?

_ Tocava.

_ Por quê? Ela morreu?

_ Engraçadinha. Ela tocava quando eu ensinava.

Lorrayne sentou-se na cama, para dar espaço ao primo. Deduziu:

_ Hum... Verbos no passado. “Pretérito imperfeito do finitivo do pessoal”?

_ Se isso significa o fim, está coberta de razão.

_ Vocês terminaram?

_ Não.

_ Não estou entendendo.

_ A gente só foi diminuindo a velocidade, até parar.

_ Ah... Então fala com ela! Pergunta qual o problema!

_ Por quê?

_ Simplesmente pra não ser mais um desses idiotas que deixam as garotas sem mais nem menos, deixando as pobres coitadas arrasadas.

_ Está dizendo que ela está arrasada?

_ Talvez.

_ Não parecia.

_ Talvez ela não queria dar o braço a torcer.

_ Mas eu não quero falar com ela.

_ Por quê?

_ Porque ela já estava mesmo me enchendo.

_ Credo! Como você é insensível! Vai, me dá isso aqui!

Lorrayne tomou o instrumento da mão de Eduardo. Perguntou:

_ A Martha que comprou pra você?

_ Não chama mais ela de mãe?

_ A Catharina que é a minha mãe. Então, foi ela que comprou?

_ Não. Às vezes eu dava aula de inglês e de música na escola.

_ Sério? Nunca soube... Todos sempre diziam...

_ Que eu sou um imprestável que não quer nada com nada. Normal. Mas nunca nem perguntaram onde arrumava dinheiro pra as minhas coisa. Nunca se interessaram em saber. Pra mim, melhor.

Lorrayne encostou-se na cabeceira da cama e permaneceu quieta por um momento. Segurou o violão e tentava se lembrar da única música que Catharina lhe ensinara a tocar. Perguntou:

_ Você se lembra da sua mãe?

_ Não. Eu tinha apenas um ano quando minha mãe morreu.

_ Pensei que você tivesse seis anos quando veio morar com a Martha...

_ E eu tinha. Quando minha mãe morreu, meu pai já tinha um relacionamento com a mãe do Renan, a irmã do seu pai. Então ele me levou pra morar com eles.

_ Puxa... Então você e o Renan são só meio irmãos?

_ Só.

_ Layane não me contou isso. Ela me deu a entender que vocês eram filhos do mesmo casamento. Da minha tia...

_ Eu sou filho de outro casamento do seu tio. O Renan sim, é primo de sangue da Layane. E seu também.

_ E por que nunca me disseram nada?

_ Nem pra você, nem pra ninguém.

_ Como assim?

_ A tia Martha não queria que ninguém entendesse porque me despreza. Assim ninguém desconfiaria que ela me tratava com frieza porque não sou da família.

_ Então é isso. Ela gosta do Renan porque ele é sobrinho dela de verdade... E você é apenas um intruso... Bom, era mesmo de se esperar... E por que você nunca contou pra ninguém?

_ Contar pra quem? Pra quê?

_ Pois é... Pra quem? De que adiantaria... Mas então, você gostava da sua madrasta? Como era a minha tia? Como era o nome dela?

_ Diana.

_ Ela se chamava Diana?

_ Foi o que eu disse.

_ Você gostava dela? Como ela era?

_ Ela nunca fez diferenças entre mim e Renan.

_ Ela falava do meu pai?

_ Não. Eu me lembro de ouvi-la falando dele somente uma vez, culpando Catharina pela morte dele.

_ Mas por que?

_ Não sei. Faz muito tempo.

_ Não. A culpa foi da Martha. Ela jamais devia ter saído do país, e separado ele da filha! Foi culpa dela.

_ Mas eu só ouvi isso uma única vez, depois, ela nunca mais tocou no assunto.

_ Ela era parecida com o meu pai?

_ Não sei. Não conheci seu pai.

_ Ela não tinha nenhuma fotografia?

_ Não sei. Não lembro.

_ Como ela morreu?

_ Ela não morreu.

_ Como? Não entendi, pode repetir?

_ Ela não morreu. Está viva da silva em algum lugar do mundo.

_ Mas... Mas... O que aconteceu? Ela foi embora?

_ Foi.

_ Por quê?

_ Parece que ela se casou com um homem muito rico.

_ Não posso acreditar que minha tia, irmã do meu pai se vendeu dessa maneira.

_ Eu sei que meu pai ficou muito arrasado. Não duvido que ele tenha provocado a própria morte.

_ Puxa... Que história... Como ele morreu?

_ Um acidente de carro.

_ E a minha tia? Onde está? Quem é esse homem?

_ Não sei.

Lorrayne levantou-se e colocou o violão sobre a cama. Caminhou até a janela e observou o nada através dela. Eduardo perguntou:

_ Você não acha que eu e Renan é que deveríamos ficar abalados?

_ Não estou abalada. Bom, estou abalada. Mas aposto que você também ficou. É que... Meu pai... Bom, eu sempre achei que ela fosse uma pessoa maravilhosa, tá certo que eu não continuei a achar a mesma coisa depois que descobri que ele trocou uma mulher apaixonada pela irmã, mas depois entendi, e continuei a achar que ela era uma pessoa de boa índole, agora descubro que a irmã dele fez uma sujeira como essa... Meu Deus! Que família é essa? Sabe, cada dia é uma surpresa diferente. Cada surpresa é um acesso de raiva e uma vontade louca de sair correndo daqui. Eu estou cansada. Quero minha mãe.

_ E eu quero a minha maioridade.

_ Eu não vou agüentar esperar a minha maioridade. A Catharina tem que fazer alguma coisa por mim.

Lorrayne voltou a sentar-se na cama. Pegou o violão. Lembrou-se da música que havia aprendido a tocar com Catharina. Tocou a música “Sozinho”.

_ Essa é mesmo a única que eu sei... – lamentou Lorrayne

_ E está cheia de defeitos! – completou Eduardo.

_ E você queria o quê? Faz anos que eu não toco! E até que toquei muito!

_ Quanta desculpa! Vou te mostrar como um verdadeiro músico faz!

Eduardo tomou o violão e tocou a mesma música com a perfeição que Lorrayne imaginou nunca poder ter. Ao fim, estendeu o instrumento a Lorrayne e disse:

_ Sua vez.

_ Obrigada pela humilhação. Não vou tocar.

Ignorando, Eduardo sentou-se atrás de Lorrayne. Passou os braços ao redor da garota, ajudando-lhe a segurar corretamente o instrumento. Explicava:

_ Em primeiro lugar, você deve segurar o vilão com firmeza, e não com força!

_ E o que eu estava fazendo?

_ Faça me o favor! Parecia que o violão ia criar vida e sair correndo!

_ Beleza então. E agora?

_ Também não precisa segurar com tanta moleza! Segura isso direito!

_ Tá bom, tá bom!

_ Agora toca.

Lorrayne iniciou novamente a tocar. Em meio a muitas correções do tipo “levanta esse braço!”, a garota finalizou. Eduardo ordenou que repetisse, para que dessa vez permanecesse apoiando seu braço. Lorrayne começou:

_ Às vezes no silêncio da noite... – olhou para seu instrutor para ter a certeza que ia bem -... Eu fico imaginando nós dois... – voltou-se para o instrumento -... Eu fico aqui sonhando acordado, juntando, o antes, o agora eu depois... – fitou Eduardo novamente e continuou -... Por que você me deixa tão solta?... – encostou seu rosto ao de Eduardo e o acariciou com a ponta do nariz –...Por que você não cola em mim?... – voltou a olhar em seus olhos, procurando por uma resposta, uma reação –... Tô me sentindo muito sozinha... – Lorrayne largou o instrumento sobre a cama e finalizou -... É que um carinho às vezes cai bem... – procurou por aqueles lábios macios, doces, quentes, que retribuíram suas buscas.

Lorrayne quase tombou quando Eduardo levantou-se de repente. E o garoto aprovou:

_ Está tocando melhor.

_ É. Com certeza. – confusa, Lorrayne levantou-se – Acho que por hoje é só. Vou para o meu quarto.

_ Beleza.

_ Então tá.

Confusa, Lorrayne voltou para seu quarto. Sentou-se na cama quieta e pensativa e assim permaneceu por alguns minutos. Sua concentração só foi interrompida, quando Layane entrou em seu quarto normalmente, como se fosse seu. Sentou-se ao lado da irmã e disse:

_ Sentiu minha falta? É que depois do almoço eu e o Renan fomos comprar nosso remedinho. Você deve ter percebido que nossa mãezinha não almoçou aqui, não é não? E nem percebeu que estava sozinha. Por que você não fugiu?

Lorrayne olhou sem emoção para a irmã e levantou-se. Ignorando a presença de Layane, colocou para tocar um CD que havia surrupiado do quarto de Eduardo. Layane perguntou:

_ Qual o problema, maninha? Conversa comigo, é pra isso que servem as irmãs.

_ Layane, fico feliz que você demonstre solidariedade por mim, mas estou muito bem e no momento meu único problema é você. Agora, se não se importa... – Lorrayne apontou para a porta.

Lorrayne disse antes de Layane sair:

_ Você tem certeza que vai matar sua mãe?

_ Nossa mãe. E eu não quero matar.

_ Mas vai acabar matando. Você sabe.

_ Eu já disse que vou continuar, custe o que custar. Bom, agora acho que você precisa ficar sozinha, já que não quer compartilhar seu problema... Até loguinho.

Lorrayne bateu a porta assim que Layane passou por ela, e lamentou não poder bater na própria irmã. Pensou que logo Layane enterraria a própria mãe, e não gostaria de estar lá pra ver.

Ao se dar por conta, já havia batido na porta de Eduardo.

_ Quem é?

_ Eu.

_ A porta tá aberta.

Lorrayne entrou e sentou-se na cama. Eduardo estava novamente invadindo alguns e-mails. Perguntou:

_ Você não pára com isso?

_ Não. – respondeu o garoto ainda lendo algumas mensagens.

_ Isso é errado.

_ E você veio aqui só pra me dizer que é errado?

_ Não exatamente. Ô, mas que saco, será que você pode dar um tempo aí nesse seu crime?

Eduardo virou-se para Lorrayne e cruzou os braços. Perguntou:

_ Que é?

_ Bom... Sabe, sei lá... Por que... Por que você... Ou melhor, por que a gente... Por que você não... Sabe?

_ Não, não sei.

_ Por que a gente fez aquilo e por que você fez aquilo outro depois daquilo que fizemos?

_ Lorrayne, Lorrayne... “Aquilo” como você disse, foi um embalo. Surgiu o clima com a música, os toques, tudo, mas foi coisa de momento. Por isso, sugiro que você esqueça, se você ainda quiser minha cumplicidade.

_ Eu quero. Eu quero. Eu vou esquecer. Já esqueci. Estou mais aliviada. Então vamos continuar como sempre, sem esse clima chato, esse medo de falar, de conversar, certo?

_ Pra mim está bom.

_ Caramba velho! Que situação.

_ Só isso?

_ Que bom, você continua o mesmo comigo! Certo, certo priminho, não vou te incomodar mais. Pelo menos por hoje. Preciso descansar de você. Até.

Lorrayne voltou para seu quarto com sua consciência mais leve. Mas, por algum motivo, continuava anngustiada.

Continua

 


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